Buscar

Dialetica da Mercadoria - Reinaldo Carcanholo (1)

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 41 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 41 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 41 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

A DIALÉTICA DA MERCADORIA: GUIA DE LEITURA* 
 
 Reinaldo A. Carcanholo 
 
 
Sente-se na própria essência do dinheiro algo da 
essência da prostituição. G. Simmel 
 
 
Se o dinheiro, segundo Augier, vem ao mundo com 
uma mancha natural de sangue numa de suas 
faces, o capital, ao surgir, escorrem-lhe sangue e 
sujeira por todos os poros, da cabeça aos pés. 
K. Marx 
 
 
 
I - PRELIMINARES 
 
 
 
1. A teoria do valor de Marx é, na verdade, muito mais ampla do que se tende a pensar. 
Em primeiro lugar, não se trata de uma teoria que se preocupe simplesmente em 
especificar os fatores que determinam os preços relativos ou o nível dos preços no 
mercado. Ela não é isso. Seus objetivos são muito mais amplos e complexos e seu ponto 
de partida é a determinação teórica da natureza da riqueza capitalista. 
 
Em segundo lugar, ela não se limita ao que se encontra desenvolvido no primeiro 
capítulo d'O Capital, mesmo que complementada por aqueles dedicados ao problema da 
transformação dos valores em preços de produção. Os conceitos de capital e mais-valia, 
capital industrial, capital fictício, por exemplo, são aspectos fundamentais da 
mencionada teoria do valor, sem os que ela não estaria completa e seria 
incompreensível. Na verdade, tais conceitos não são mais que formas desenvolvidas do 
valor e, portanto, os capítulos e seções d'O Capital dedicados a eles são indispensáveis 
para a referida teoria; eles aparecem discutidos ao longo de toda a mencionada obra, em 
seus três diferentes livros. Capital, por exemplo, é o próprio valor em fase avançada de 
seu desenvolvimento. Assim, poderíamos dizer, sem nenhum exagero, que a exposição 
da teoria marxista do valor encontra-se no conjunto da obra econômica de Marx e, em 
particular, em seu livro maior: O Capital. 
 
2. Talvez essa seja uma das razões para que, desde sempre e até hoje, tenha existido 
exagerada incompreensão sobre a teoria de Marx sobre a sociedade capitalista, inclusive 
entre muitos daqueles que se consideram iniciados nesse tema. Essa incompreensão, 
além disso, tem como fundamento o fato de que muitos tratam de encontrar ali, de 
maneira imediata, resposta a perguntas não pertinentes ou, pelo menos, mal formuladas. 
 
3. Nosso objetivo, neste trabalho, é construir um roteiro de estudos sobre os aspectos 
básicos da teoria marxista do valor; sobre aqueles aspectos que aparecem desenvolvidos 
 
* Agradeço os comentários de Mário Duayer e de Maurício Sabadini. 
 2
no primeiro capítulo d'O Capital. Para isso seremos obrigados a apresentar nossa 
interpretação sobre o tema. 
 
4. Devemos advertir imediatamente sobre uma importante característica d'O Capital. 
Não vamos encontrar nesse livro a exposição dos resultados finais de uma pesquisa 
terminada; algo assim como um resumo das conclusões. De certa maneira, o que ali se 
expõe é a trajetória da pesquisa, os passos metodológicos necessários para ir 
descobrindo progressivamente cada nova categoria. Veremos que, ao lermos atenta e 
ordenadamente cada um dos seus sucessivos parágrafos, estaremos sendo conduzidos de 
mãos dadas pelo autor. Ele nos levará da observação sistemática e metódica da 
realidade, ao descobrimento das categorias; destas e de uma nova observação do real, 
nos guiará para o descobrimento de novas categorias. Começaremos logo a sentir-nos 
como os verdadeiros descobridores das mesmas. 
 
Aceitemos o convite do autor, caminhemos sob sua condução durante algum tempo, nos 
passos mais simples ou nos mais difíceis. Não tardará muito e nos daremos conta de 
que, em alguns passos, já não necessitaremos sua mão; poderemos caminhar sozinhos. 
 
5. No entanto, como estamos acostumados a exposições sobre resultados finais, sobre 
conclusões, inicialmente não entenderemos o convite do autor. Suas palavras soarão 
como afirmações conclusivas. 
 
Nossa intenção nos próximos parágrafos é, em relação exclusivamente ao primeiro 
capítulo, demonstrar ao leitor que o autor d'O Capital efetivamente entregou-nos o 
referido convite e dar os passos mais importantes ali explicitados, aceitando as duas 
mãos de Marx. Em algumas oportunidades nos atreveremos a dar alguns passos sem sua 
ajuda; nesse momento estaremos convidando o leitor para que nos acompanhe. 
 
6. Antes de entrarmos diretamente no tema, é indispensável uma última observação. Na 
verdade, a exposição d'O Capital não expressa de maneira completa o caminho de uma 
verdadeira pesquisa. Esta, na realidade, tem caminhos tortuosos; há momentos de êxito 
e também de fracassos; às vezes as perguntas formuladas são corretas, outras vezes é 
necessário começar de novo; uma ação específica pode resultar produtiva ou deve ser 
abandonada antes de terminar. A pesquisa, por melhor projetada que seja, não 
transcorre por uma linha reta, como poderia se pensar inicialmente; em outras palavras, 
ela não é um processo que possa ser totalmente planificado a priori. 
 
É certo que se encontrará em O Capital a exposição do processo de pesquisa científica, 
mas não do processo real, tal como efetivamente se deu. O processo de pesquisa 
científica que ali se explicita é ideal, no sentido de que se abstraem os erros, os 
fracassos, as ações realizadas, mas improdutivas; ali o processo aparece como se 
transcorresse por uma linha reta previamente traçada. As categorias vão sendo 
descobertas uma depois das outras; não existe lugar para a intuição, para a imaginação e 
a criação. Quem se tenha dedicado a uma verdadeira pesquisa científica saberá que 
aquele processo descrito como linear não é mais do que uma caricatura. No entanto, o 
procedimento expositivo usado por Marx é adequado: aos novos pesquisadores no tema, 
só é necessário comunicar os aspectos produtivos da pesquisa realizada e não os seus 
caminhos equivocados. Assim, a posteriori, é possível e correto fazer a exposição como 
se ela houvesse transcorrido por uma linha reta, sem desvios. 
 
 3
 
 
II - MERCADORIA: VALOR-DE-USO E VALOR-DE-TROCA 
 
 
7. Aceitemos o objeto de estudo assinalado pelo autor em O Capital, já no seu primeiro 
parágrafo: a riqueza capitalista, isto é, a riqueza na época de domínio do capital. O 
nosso problema é identificar a natureza dessa riqueza, em outras palavras, nossa 
pergunta é: 
 
 o que é riqueza na época capitalista ? 
 
 
8. O autor diria que, para responder a essa pergunta, não temos outro instrumento 
científico que a observação da realidade: 
 
 
"A riqueza das sociedades onde rege a produção capitalista configura-se em 
imensa acumulação de mercadorias (...)"1 
 
Em outras palavras, observamos que a riqueza capitalista é uma "imensa acumulação de 
mercadorias"; aparece como, apresenta-se como uma imensa quantidade de 
mercadorias. Não se trata de uma definição2: riqueza capitalista é mercadoria. Trata-se 
de uma constatação, a partir da simples observação da realidade. 
 
1. Marx, K. O Capital. Crítica da Economia Política. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,1980. Volume 1, p. 55. 
 
Obs.: 
 
a. Todas as próximas citações, salvo quando explícito, referem-se ao mesmo autor, obra e volume. Por isso, só indicaremos, 
depois de cada uma delas, entre parênteses, o nome do autor e o número da página. 
 
b) As diversas edições da DIFEL são todas iguais à edição citada (Civilização, 1980) com a mesma paginação. Na nova 
edição da Civilização Brasileira (1998), embora se trate rigorosamente da mesma tradução, a paginação é diferente. 
 
c) Outras edições d'O Capital, muito utilizadas entre nós são as da Coleção "Os Economistas" da Nova Cultural 
(anteriormente, Abril Cultural). No que se refere ao primeiro capítulo (A Mercadoria), a paginação sempre é a mesma, 
salvo na última edição (1996). 
 
d) Para indicar a página correspondente nas diversas edições utilizaremos o seguinte procedimento : 
 
- Dentro do parênteses, em seguida ao nome de Marx, aparecerá o número da página 
correspondenteàs edições da Difel (ou às antigas edições da Civilização Brasileira). . . . . . . . 
 
→ ( ) 
 
 
- 
 
Em seguida, entre colchetes, aparecerá o correspondente à edição de 1998 da Civilização 
Brasileira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 
 
 
→ [ ] 
 
- 
 
A seguir, entre chaves, o correspondente às antigas edições da Coleção dos Economistas . . . . . 
 
→ { } 
 
- 
 
 Finalmente, entre < >, o correspondente à última edição da Coleção dos Economistas (Nova 
Cultural, 1996) . . . . . . . . . . . . 
 
 
→ < > 
 
No que se refere à edição da Coleção dos Economistas de 1988 (brochura de capa azul), por razões de redução de 
custos, sua paginação foi alterada (salvo para o primeiro capítulo, como já assinalávamos). Por isso, quando 
necessário, incluiremos chaves adicionais { }, com a página correspondente a essa edição entre aspas, dentro dessas 
chaves {" "}. 
 
Assim, a citação anterior, ficaria assim: (Marx, p. 55)[57]{45}{"45"}<165>. Em caso similar (capítulo da Mercadoria), 
no entanto, incluir {"45"} seria redundante e, por isso, não será feito. 
2 . Não tratar-se de definição é extremamente importante. Na teoria de Marx, ao contrário do que estamos acostumados, não existem 
definições. 
 4
 
Seria possível, aqui, dizer que riqueza é dinheiro, ao invés de dizer que é mercadoria. 
No entanto, esse simples e sujo pedaço de papel (embora muito complexo e misterioso 
do ponto de vista teórico) constituído pelo dinheiro só pode ser considerado riqueza por 
ser capaz de comprar mercadorias; qualquer mercadoria. 
 
9. Assim, se quisermos conhecer a riqueza capitalista e se olharmos a sociedade onde 
rege esse regime de produção, veremos que tal riqueza está formada por mercadorias e, 
portanto, não teremos outra coisa a fazer senão observar3 a mercadoria mais de perto. 
Isso é o que diz implicitamente o nosso autor. 
 
10. Se observarmos a mercadoria, nos daremos conta de que ela apresenta duas 
características; tem dois aspectos imediatamente observáveis. Ela é "antes de mais 
nada, um objeto externo, uma coisa que, por suas propriedades, satisfaz necessidades 
humanas, seja qual for a natureza, a origem delas, provenham do estômago ou da 
fantasia." (Marx, p. 41) [57]{45}<165>4. Em segundo lugar, ela é um objeto capaz de 
intercambiar-se com outros objetos, com outras mercadorias; ela é capaz de comprar 
outras mercadorias. 
 
11. Essas duas características da mercadoria não são produto da imaginação do autor 
d'O Capital; elas são facilmente observáveis por qualquer de nós. O que Marx fez foi 
dar nomes a tais características, criar termos relativos a esses aspectos. A mercadoria é 
um valor-de-uso pela sua capacidade de satisfazer necessidades; é um valor-de-troca 
(ou tem valor-de-troca) devido a sua capacidade de comprar outras. 
 
Assim, podemos dizer neste momento que a mercadoria (M) é valor-de-uso (Vu) e é 
valor-de-troca (Vt); é a unidade desses dois aspectos. 
 
 
 
 
 M = 
 
 
 
 
12. Nossa pesquisa não tem outro caminho a seguir senão observar mais de perto os 
dois aspectos da mercadoria. Aqui não analisaremos o valor-de-uso uma vez que não 
nos interessa neste momento. Corremos o risco, no entanto, de que se pense que esse 
aspecto da mercadoria tem um papel secundário na teoria de Marx, coisa que é, 
evidentemente, incorreta. A verdade é que destacar aqui sua importância implicaria 
demasiado espaço; mais do que poderíamos dispor neste lugar5. 
 
3. A observação da realidade é o primeiro passo do método científico da dialética materialista, característica do pensamento de Marx. 
 
4. O primeiro parênteses corresponde à edição DIFEL; o segundo às diversas edições da Coleção "Os Economistas". Ver 
observações da nota número 1. 
 
5. Afirmemos, no entanto, que, se a teoria de Marx for entendida adequadamente, em toda a sua profundidade, seu conceito de 
utilidade pouco tem a ver com o mesmo conceito neoclássico. Enquanto para os autores dessa corrente, a utilidade se esgota em uma 
relação subjetiva entre indivíduo e objeto, na teoria marxista essa relação subjetiva deve ser entendida como mera aparência. O 
estudo adequado dos esquemas da reprodução (livro II d'O Capital) permite entender que a utilidade, em sua essência, refere-se às 
necessidades do capital e não de cada indivíduo, pois o sujeito social, no capitalismo, sofre uma inversão (o ser humano é 
 Vu 
 
 Vt 
 5
 
 
 
III - DO VALOR-DE-TROCA AO VALOR 
 
 
13. O que é valor-de-troca de uma mercadoria? Valor-de-troca é a "relação quantitativa 
entre valores-de-uso de espécies diferentes"6 (Marx, p. 43)[58]{46}<166>, é a 
proporção em que se trocam valores-de-uso de um tipo por valores-de-uso de outro. 
 
Isso significa que uma mercadoria não tem um valor-de-troca, tem valores-de-troca. 
Quantos? Por exemplo: 
 
 
1 kg. de trigo = 5 kg. de milho 
= 0,5 kg. de carne 
= 2 litros de leite 
= 6 kg. de mandioca 
= 3 kg. de feijão 
 etc. 
 
Poderíamos dizer, assim, que uma mercadoria tem tantos valores-de-troca quantas 
mercadorias diferentes dela existam no mercado e possam, portanto, intercambiar-se 
consigo. 
 
14. Tomemos agora um particular valor-de-troca de uma mercadoria qualquer. Essa 
proporção ou relação quantitativa, que é o valor-de-troca, "muda constantemente no 
tempo e no espaço". (Marx, p. 43)[58]{46}<166> 
 
Em outras palavras, se observarmos no mercado o valor-de-troca de uma mercadoria 
com outra qualquer, veremos que essa proporção não permanece invariável: ela muda 
com o tempo. Por outro lado, se no mesmo momento observarmos diferentes mercados, 
distantes uns dos outros, veremos distintos valores-de-troca de uma mercadoria em 
relação a outra determinada. 
 
15. Essa variabilidade em relação ao tempo e ao espaço, pode sugerir que o valor-de-
troca tem a casualidade como uma de suas características. 
 
16. Por outro lado, o valor-de-troca de uma mercadoria como proporção que é, muda 
conforme a outra mercadoria com a qual se troca a primeira. 
 
17. A variabilidade do valor-de-troca de uma mercadoria dependendo da outra 
mercadoria com a que se intercambia determina naquele a característica de relatividade. 
 
substituído pelo capital, no papel de sujeito econômico e social). Assim, a utilidade para os neoclássicos está muito longe da 
utilidade para Marx. E isso é natural que ocorra, pois estamos frente a duas teorias: a primeira com uma perspectiva unidimensional 
da realidade e a outra, dialética. Observe-se que, para Marx, a afirmação de que a utilidade seja uma relação subjetiva 
indivíduo/objeto não constitui erro ou engano; ela é correta, mas insuficiente, pois a aparência é uma das duas verdadeiras 
dimensões da realidade. O erro ocorreria se pensássemos que a utilidade é só isso; que tem só essa dimensão; o engano está 
constituído pela crença na unidimensionalidade do real. Para maiores informações sobre a importância do valor-de-uso na teoria 
econômica de Marx, cf. Rosdolsky (2001), cap. 3, pp 75-92, cf. também Marx (1966), pp. 719-720. 
 
6. Tampouco, aqui, se trata de definição. Frente a uma das características da mercadoria, Marx atribui um nome. 
 6
O valor-de-troca é uma característica relativa a ambas mercadorias que participam de 
uma relação de intercâmbio. 
 
18. Em conclusão, a observação sistemática do mercado permite, ao nosso autor, 
descobrir duas características imediatamente observáveis do valor-de-troca: a 
variabilidade e a relatividade. A variabilidade, característica facilmente visível, obriga 
que Marx manifeste suspeita sobre a possibilidade de que o valor-de-troca seja casual. 
A variabilidade sugere, assim, a possibilidade da casualidade . 
 
"Por isso, o valor-de-troca parece algo casual e puramente relativo e, portanto, 
uma contradição em termos, um valor-de-troca inerente,imanente à 
mercadoria." (Marx, p. 43)[58]{46}<166> 
 
Em outras palavras, parece um contra-senso pensar a existência de um valor no interior 
mesmo da mercadoria. 
 
19. Então, a conclusão do nosso autor é a seguinte: a) se é certo que o valor-de-troca é 
relativo e se ele possuísse uma explicação científica, ela não se encontraria na 
mercadoria ("imanente" a ela) cujo valor-de-troca perguntamos; a explicação deveria 
ser encontrada em ambas mercadorias em conjunto: na que está à esquerda e na que está 
à direita da igualdade; b) no entanto, se o valor-de-troca fosse puramente casual 
(parágrafo 18), não teria nenhum sentido buscar uma explicação para ele; as coisas 
casuais não têm explicação científica, exceto por meio da lei das probabilidades, o que 
na verdade não é o que interessa aqui. 
 
20. No entanto, esse aparente contra-senso de buscar uma explicação para o valor-de-
troca e, além do mais, de buscá-la no interior da mesma mercadoria e não na sua relação 
com outra, não leva nosso autor a renunciar na busca de uma teoria do valor. Veremos 
que a conclusão de que não tem sentido buscar essa explicação, isto é, buscar o valor, é 
resultado exclusivo da observação imediata, preliminar da realidade; da superfície dos 
fenômenos reais. 
 
21. Não existe outra maneira de superar essa conclusão preliminar ⎯ de superar o nível 
aparencial ⎯ senão a própria observação dos fenômenos. É por isso que o nosso autor 
afirma: "parece ... uma contradição em termos, um valor-de-troca inerente, imanente à 
mercadoria. Vejamos a coisa mais de perto." (Marx, p. 43)[58]{46}<166> 
 
22. Vejamos, então, a coisa mais de perto. A aparente casualidade do valor-de-troca era 
conseqüência do fato da sua variabilidade no tempo e no espaço. Eliminemos as 
mudanças que ocorrem no tempo e no espaço; se dessa maneira encontrarmos alguma 
regra sistemática à qual atenda o valor-de-troca, então poderemos concluir que, na 
verdade, ele não é casual e que, portanto, pode e deve encontrar-se uma explicação 
científica causal para ele. 
 
Observemos que, encontrada uma única regularidade em um fenômeno que supomos ser 
casual, a casualidade deve ser afastada. Basta considerar o exemplo de sorteios de 
loteria. Se, na observação dos seus resultados sucessivos, encontrarmos uma única 
regularidade que permaneça por tempo mais ou menos prolongado, em algum momento 
chegaremos à conclusão que algo está interferindo de maneira deliberada; não pode ser 
casual. Assim, procuremos uma regularidade no valor-de-troca; uma única regularidade. 
 7
 
23. Como dissemos, eliminemos as variações no tempo e no espaço. Observemos de 
novo o mercado e suponhamos que encontramos ali que: 
 
1 kg. de trigo = 5 kg. de milho 
= 0,5 kg. de carne 
= 2 litros de leite 
= 6 kg. de mandioca 
= 3 kg. de feijão 
 etc. 
 
Perguntemos agora qual seria o valor-de-troca, nesse mesmo instante e nesse lugar, de 2 
litros de leite em termos de mandioca. Não é necessário buscar muito essa resposta, pois 
o mesmo mercado nos indica: 
 
2 litros de leite = 6 kg. de mandioca 
 
 
E se quiséssemos saber o valor-de-troca dessa quantidade de leite em termos de todas as 
demais mercadorias, a resposta seria: 
 
2 litros de leite = 6 kg. de mandioca 
= 5 kg. de milho 
= 0,5 kg. de carne 
= 3 kg. de feijão 
= etc.7 
 
 
24. O que significa o anterior? Dados os valores-de-troca do trigo, os valores-de-troca 
do leite não são casuais, estão determinados. Por outro lado, se tivéssemos partido do 
valor-de-troca do leite, o valor-de-troca do trigo não poderia ser qualquer, já estaria 
determinado e, portanto, não seria casual. A casualidade, como característica do valor-
de-troca era puramente da aparência. Devemos então buscar a explicação do valor-de-
troca. 
 
25. Tomemos outra vez as diferentes expressões do valor-de-troca de 1 kg de trigo: 
 
5 kg de milho, 
0,5 kg de carne, 
2 litros de leite, 
6 kg de mandioca, 
3 kg de feijão. 
 
Podemos ver que todas essas quantidades de diferentes mercadorias são intercambiáveis 
entre si no mesmo mercado e no mesmo momento assinalado anteriormente, exatamente 
 
 
7. Este raciocínio poderia ser vítima de uma crítica baseada no fato da existência de lucro do intermediário. Para evitar maiores 
discussões, basta indicar que o que nos interessa aqui é somente chegar à conclusão de que os diferentes valores-de-troca da mesma 
mercadoria são todos iguais entre si e que essa igualdade é determinada pelo próprio mercado. Para demonstrar isso talvez fosse 
suficiente argumentar que, com as quantidades especificadas das diferentes mercadorias, qualquer possuidor poderá adquirir sempre 
a mesma quantidade da mercadoria trigo, isto é, daquela cujo valor-de-troca estamos estudando. 
 8
no volume ali indicado. Isso significa que elas são, no mercado, todas iguais entre si. 
Todos os diferentes valores-de-troca da mercadoria trigo são iguais entre si, e quem 
afirma isso é o próprio mercado. 
 
Isso constitui uma regularidade. É verdade que isso ocorre em um mercado e em um 
determinado momento, isto é, eliminando-se as variações de espaço e tempo, como 
dissemos acima. Mas também é verdade que isso é um fato no interior de qualquer 
mercado e em qualquer instante do tempo. Trata-se de uma regularidade que sempre 
ocorre e, portanto, podemos descartar a idéia da casualidade. 
 
26. Vejamos novamente as expressões de troca de 1 kg de trigo e perguntemos: o que 
fazem todas essas coisas iguais entre si, do lado direito da igualdade? 
 
Em outras palavras, o que obrigou que todas essas quantidades de diversas mercadorias 
sejam iguais? Esse resultado não é casual, ele é necessário. 
 
Esse algo que impõe a existência da igualdade de todas elas só pode ser uma 
característica da própria mercadoria trigo. Quem atrai para si as demais mercadorias é o 
trigo, e as atrai em quantidades que as fazem iguais entre si. Assim, não pode ser outra 
maneira: alguma propriedade interior ao trigo é a responsável. Essa propriedade 
imanente à mercadoria, descoberta por meio da observação sistemática, é denominada 
valor, pelo nosso autor 8. 
 
27. Resumamos todas as considerações anteriores com as extremamente resumidas 
palavras do nosso autor: 
 
"Qualquer mercadoria se troca por outras, nas mais diversas proporções, por 
exemplo, um quarter de trigo por X de graxa, ou por Y de seda ou Z de ouro etc. 
Ao invés de um só, o trigo tem, portanto, muitos valores-de-troca. Mas, uma vez 
que cada um dos itens, separadamente — X de graxa, Y de seda ou Z de ouro, — 
é o valor-de-troca de um quarter de trigo, devem X de graxa, Y de seda e Z de 
ouro, como valores-de-troca, ser permutáveis e iguais entre si. Daí se deduz, 
primeiro: os valores-de-troca vigentes da mesma mercadoria expressam, todos, 
um significado igual; segundo: o valor-de-troca só pode ser a maneira de 
expressar-se, a forma de manifestação de uma substância que dele se pode 
distinguir." (Marx, p. 43)[58 e 59]{46}<166> 
 
 
28. Portanto, o valor-de-troca de uma mercadoria é a maneira de expressar-se, a forma 
de manifestação, a expressão de um conteúdo da (algo imanente à) mercadoria . Essa 
substância que se pode distinguir do valor-de-troca tem um nome dado por Marx: 
valor9. 
 
 
8. Algo similar ocorre com o magnetismo. Um ímã atrai outros objetos de ferro devido à sua propriedade interior chamada 
magnetismo. De maneira similar (nesse aspecto), o valor é uma propriedade imanente às mercadorias que não pode ser observada 
diretamente. Só sabemos da sua existência devido às suas manifestações: os valores-de-troca. Podemos olhar um ímã por todos os 
seus lados, jamais saberemos da existência de sua imantação a não ser por suas manifestações: a atração de outros objetos de ferro. 
Da mesma maneira como a imantação transforma um objeto de ferro em ímã, em um objeto que era mais ou menos misterioso 
antigamente, o valor transforma os valores-de-usoprodutos do trabalho humano em mercadorias, objetos total e absolutamente 
misteriosos até hoje. Talvez, mais hoje do que ontem. 
 
 9
 
 
29. Façamos uma breve pausa neste momento e vejamos, nos parágrafos anteriores, o 
processo metodológico utilizado para chegar aos resultados encontrados. Já havíamos 
destacado que o ponto de partida do nosso autor é sempre a realidade mesma e não 
conceitos criados pela sua própria imaginação, por seu pensamento; seu método de 
investigação científica é a observação sistemática dessa realidade10. 
 
Por sorte existe referência do próprio autor sobre essa questão: 
 
"... eu nunca parto dos 'conceitos', nem portanto do 'conceito de valor' ... Eu 
parto da forma social mais simples na que se corporifica o produto do trabalho 
na sociedade atual, que é a mercadoria. Analiso-a e o faço fixando-me 
especialmente na forma sob a qual ela se apresenta. Descubro, assim, que 
'mercadoria' é, por um lado, na sua `forma material, um objeto útil ou, em 
outras palavras, um valor-de-uso e, por outro, encarnação do valor-de-troca e, 
desde este ponto de vista, 'valor-de-troca' ela própria. Sigo analisando o 'valor-
de-troca' e descubro que ele não é mais do que uma 'forma de manifestar-se', 
uma maneira especial de aparecer o valor contido na mercadoria, razão pela 
qual procedo à análise deste último."11 
 
 
 
IV - O VALOR 
 
 
30. Portanto, como vimos, o valor é uma qualidade, um atributo, uma propriedade da 
mercadoria12. Essa qualidade ou propriedade da mercadoria consiste na sua capacidade 
de comprar (de intercambiar-se com) outras mercadorias, todas as demais mercadorias, 
sem exceção. Até agora, não sabemos muito sobre ela, praticamente nada. Só sabemos 
que se trata de um determinado poder de compra. Observemos, então, a coisa mais de 
perto. 
 
31. A propriedade valor da mercadoria não aparece (não se expressa) por si mesma, não 
aparece como tal propriedade, mas por meio de sua manifestação: o valor-de-troca. Por 
isso o valor-de-troca é a forma necessária, imediata, de manifestação do valor. 
 
32. Essa propriedade-valor que as coisas possuem na sociedade mercantil não é natural 
a elas. Em outras palavras, as coisas não têm valor por serem coisas. Só possuem valor 
 
9. Identificar valor-de-troca e valor, o que equivale a confundir valor e preço, é um erro absolutamente primário; trata-se de 
identificar essência e aparência. O que é mais surpreendente é a freqüência com que podemos nos encontrar com essa equivocada 
interpretação. Mais adiante veremos que o próprio Marx tem algo de culpa ao induzir seus leitores menos atentos a esse engano; e 
não foi intencional (cf. parágrafo 51 mais adiante). O que é inegável é que, em muitas passagens d'O Capital não fica a menor 
dúvida de que se trata de conceitos diferentes, embora relacionados. 
 
10. O método utilizado por Marx e implícito desde o começo poderia ser resumido da seguinte maneira: formular uma questão, 
observar, descobrir, descrever o descoberto, dar nome; em seguida, se necessário, observar mais de perto antes de uma nova questão. 
 
11. Marx, K., 1966, pp. 717 e 718 (trad. nossa). 
 
12. O valor não será uma simples propriedade da mercadoria para sempre. Como qualquer outro conceito da teoria de Marx ele se 
refere não a algo dado, mas a um processo de desenvolvimento. Ele chegará a transformar-se de simples propriedade adjetiva em 
realidade substantiva, em ser com vida própria. É o que se chama substantivação do valor. Para melhor compreensão disso, cf. 
Carcanholo e Nakatani (1999). 
 10
porque encontram-se dentro de uma sociedade mercantil. É essa sociedade, ao igualar o 
trigo com o milho no mercado, que confere ao trigo sua propriedade de ser valor; ela e 
só ela lhe confere o poder de comprar. 
 
33. Então, o valor é uma qualidade entregue às coisas pela sociedade; mas não por 
qualquer sociedade, exclusivamente pela sociedade mercantil. Logo, o valor é uma 
qualidade social e histórica das coisas. 
 
34. Algo, quando é produto do trabalho humano, adquire valor porque na sociedade 
ocorre intercâmbio mercantil. Este é resultado da existência de certo tipo de relações 
sociais entre os produtores, de relações entre produtores formalmente independentes e 
autônomos, que produzem uns para os outros, para a troca. 
 
Portanto, o valor não é mais que a expressão, nas coisas, das particulares relações 
sociais de produção existentes na sociedade mercantil. Assim, as relações mercantis de 
produção expressam-se nas coisas, como uma qualidade social destas: como valor. 
 
35. O valor é uma espécie de carimbo que a sociedade estampa sobre a materialidade 
física de cada valor-de-uso, transformando-o em mercadoria. Essa marca indelével, 
impressa na face da mercadoria, diz: VALOR. Indelével, mas invisível. Ele é algo 
similar, na mercadoria, à nacionalidade de uma pessoa. A nacionalidade indica, em 
geral, o local de nascimento do indivíduo: "sou brasileiro", por exemplo. O valor revela 
que o valor-de-uso que o possui, provém de (ou é originário de, foi produzido sob) 
relações sociais mercantis de produção. O valor é uma espécie de passaporte que 
confere ao seu possuidor (a mercadoria) o poder de comprar (de trocar-se por) suas 
similares (isto é: outras mercadorias). 
 
Muitas vezes se diz que o valor é uma relação social. Essa não é uma afirmação 
rigorosamente correta. O valor é, na realidade, a relação social mercantil expressa nas 
coisas produzidas pelo trabalho como uma propriedade (ou qualidade específica delas), 
propriedade essa que consiste num certo poder de compra sobre as demais coisas. 
 
36. Portanto, o valor não tem materialidade física mas, ao mesmo tempo, não é uma 
simples idéia, um simples pensamento. O valor é real e tem materialidade, só que 
materialidade social e histórica. 
 
 
 
V- VALOR E TRABALHO13 
 
 
37. Qual é o mecanismo que a sociedade utiliza para estampar nas coisas o carimbo 
VALOR, a característica valor? 
 
 
 
13. A relação entre valor e trabalho humano, isto é, o fato de que este seja a fonte do valor, não nos parece que tenha recebido, n'O 
Capital, o tratamento mais adequado e suficiente. Provavelmente isso se explica pelo fato de que, na época de sua redação, pelo 
menos entre os grandes autores, o assunto não era tão controvertido. A verdadeira razão que permite a Marx sustentar ser o trabalho 
humano o que produz valor é muito mais significativa do que pode parece no capítulo de seu livro sobre a mercadoria. Nos dias de 
hoje, quando muito se discute o assunto, é indispensável um tratamento diferente. Por isso, deixaremos para discutir mais 
amplamente o assunto nos “Temas Complementares”, incluído no final deste trabalho. 
 11
Esse mecanismo é o trabalho humano. 
 
38. O mercado, ao igualar duas mercadorias quaisquer, em certas quantidades, por 
exemplo trigo e ferro, 
 
x trigo = y ferro , 
 
 
ao mesmo tempo nos diz que o trabalho do produtor de trigo, incorporado a esse bem, e 
o que produziu o ferro são iguais. 
 
No entanto, é evidente que esses dois trabalhos são objetivamente diferentes entre si e, 
então, não é que eles sejam iguais no mercado; este os faz iguais, os iguala, abstrai suas 
diferenças. 
 
39. Assim, da mesma maneira que a mercadoria é a unidade de dois aspectos (valor-de-
uso e valor), o trabalho mercantil (especialmente na sociedade mercantil por excelência, 
que é a sociedade capitalista) é ao mesmo tempo trabalho concreto (ou útil) e trabalho 
abstrato. É trabalho concreto (ou útil) na medida em que prestamos atenção nas suas 
propriedades específicas, as que permitem distinguir entre o trabalho de um tipo, do 
trabalho de outro. É trabalho abstrato na medida em que o consideramos como simples 
trabalho humano, indistinto14. 
 
 
"Se prescindirmos do valor-de-usoda mercadoria, só lhe resta ainda uma 
propriedade, a de ser produto do trabalho. Mas, então, o produto do trabalho já 
terá passado por uma transmutação. Pondo de lado seu valor-de-uso, 
abstraímos, também, das formas e elementos materiais que fazem dele um valor-
de-uso. Ele não é mais mesa, casa, fio ou qualquer outra coisa útil. Sumiram 
todas as suas qualidades materiais. Também não é mais o produto do trabalho 
do marceneiro, do pedreiro, do fiandeiro ou de qualquer outra forma de 
trabalho produtivo. Ao desaparecer o caráter útil dos produtos do trabalho, 
também desaparece o caráter útil dos trabalhos neles corporificados, 
desvanecem-se, portanto, as diferentes formas de trabalho concreto, elas não 
mais se distinguem umas das outras, mas reduzem-se, todas, a uma única 
espécie de trabalho, o trabalho humano abstrato." (Marx, pp. 44 e 
45)[60]{47}<167 e 168> 
 
40. Assim, o trabalho mercantil capitalista tem duas faces ou, em outras palavras, é a 
unidade de dois aspectos (ou pólos): trabalho concreto (ou útil) e trabalho abstrato. 
 
 
 
 trabalho humano = 
 
 
 
14. "Pondo-se de lado o desígnio da atividade produtiva e, em conseqüência, o caráter útil do trabalho, resta-lhe apenas ser um 
dispêndio de força humana de trabalho. O trabalho do alfaiate e o do tecelão, embora atividades produtivas qualitativamente 
diferentes, são ambos dispêndio humano produtivo de cérebro, músculos, nervos, mão etc., e, desse modo, são ambos trabalho 
humano". (Marx, p. 51)[66]{51}<173> 
 
 
trabalho concreto 
 
trabalho abstrato 
 12
 
 
 
É justamente por possuir esse duplo aspecto que ele é capaz de produzir uma 
mercadoria, isto é, produzir duas coisas ao mesmo tempo: valor-de-uso e valor. 
 
Como trabalho concreto (útil) o trabalho cria valores-de-uso15, como trabalho abstrato 
produz valor. 
 
"Como configuração dessa substância social que lhes é comum (trabalho 
humano indistinguível, abstrato, RC), são valores-mercadorias." (Marx, p. 
45)[60]{47}<168> 
 
"Um valor ou um bem só possui, portanto, valor, porque nele está 
corporificado, materializado, trabalho humano abstrato." (Marx, p. 
45)[60]{47}<168> 
 
 
41. É necessário insistir. O caráter abstrato do trabalho mercantil não é um simples 
produto do pensamento, da imaginação. É o mercado, a própria realidade do 
capitalismo, quem cria a indiferença do trabalho, o trabalho abstrato. O mercado produz 
a indiferenciação dos trabalhos. 
 
 Na verdade, os dois pólos contraditórios do trabalho (útil e abstrato) são pontos de vista 
diferentes, a partir dos quais podemos observar o trabalho. Podemos olhar o trabalho de 
um marceneiro, por exemplo, do ponto de vista do que sua ação particular tem de 
diferente em relação ao trabalho de outros produtores. Assim, estaremos vendo o 
trabalho útil ou concreto. Podemos olhá-lo, também, de outro ponto de vista: 
observando apenas o que ele tem em comum com o trabalho de todos os demais tipos. 
Assim, estaremos vendo o trabalho abstrato; estaremos fazendo a abstração do trabalho. 
 
Dessa maneira, a abstração é produto do nosso pensamento; é uma idéia. É verdade. No 
entanto, na sociedade capitalista essa idéia não é arbitrária, pois é o próprio mercado 
que iguala trabalhos diferentes. Desejar utilizar o conceito de trabalho abstrato para 
entender sociedades não capitalistas, não mercantis, aí sim seria uma arbitrariedade do 
pensamento. É por isso que podemos dizer que o trabalho abstrato, no capitalismo, é um 
conceito próprio da realidade e não um simples e arbitrário pensamento16. 
 
 
15. "O casaco é valor-de-uso que satisfaz uma necessidade particular. Para produzi-lo, precisa-se de certo tipo de atividade 
produtiva, determinada por seu fim, modo de operar, objeto sobre o que opera, seus meios e seu resultado. Chamamos 
simplesmente de trabalho útil aquele cuja utilidade se patenteia no valor-de-uso do seu produto ou cujo produto é um valor-de-
uso." (Marx, pp. 48 e 49)[63]{50}<171> 
 
"Sendo casaco e linho valores-de-uso qualitativamente diversos, também diferem qualitativamente os trabalhos que dão origem a 
sua existência - o ofício de alfaiate e o de tecelão." (Marx, p. 49)[63 e 64]{50}<171> 
 
16. A ação do nosso pensamento de produzir abstrações é muito mais freqüente do que se poderia pensar. A todo momento estamos 
fazendo abstrações. É completamente diferente quando pensamos em um gato, por exemplo, e não no "meu" gato. Este é cheio de 
particularidades e é por isso que o identificamos como "o meu". "Gato" ou "um gato" é o resultado, no pensamento, da abstração das 
diferentes particularidades. Trata-se de uma idéia, mas ela não é arbitrária; corresponde à realidade e a prova disso é que, entre eles, 
os gatos, há a possibilidade de reprodução. O mesmo acontece com o conceito de cão ou "cachorro"; trata-se de um conceito não 
arbitrário do pensamento. No entanto, embora seja possível, se quisermos, pensar em um "gachorro" (mistura de cão e gato), trata-se 
de uma idéia arbitrária, não correspondente à realidade. 
 
 13
 
 
VI - A MAGNITUDE OU GRANDEZA DO VALOR 
 
 
42. Observemos uma vez mais o valor-de-troca. Sabemos que ele não é mais do que 
expressão, forma de manifestação do valor. Sabemos também que ele é uma 
determinada proporção quantitativa. 
 
Então, de onde procede essa característica quantitativa do valor-de-troca? 
 
Como o valor-de-troca não é senão a expressão fenomênica do valor, suas 
características só podem ser expressões das propriedades inerentes ao próprio valor. A 
característica quantitativa do valor-de-troca só pode corresponder a uma dimensão 
quantitativa do valor. Essa dimensão quantitativa do valor, descoberta dessa maneira, 
denomina-se magnitude ou grandeza do valor. 
 
Observemos, antes de prosseguir, um aspecto formal extremamente importante. Muitas 
vezes, Marx, quando quer se referir à magnitude ou grandeza do valor, escreve 
simplesmente valor. Assim, encontraremos com muita freqüência referências do tipo: o 
valor de determinada mercadoria é igual a 10 horas de trabalho. Obviamente, o autor 
está aqui referindo-se à magnitude do valor da mercadoria. Esse é um procedimento 
simplificador e aceitável se pudermos ter sempre presente o seu significado. 
 
43. Como "um bem só possui (...) valor, porque nele está corporificado, materializado, 
trabalho humano abstrato" (Marx, p. 45)[60]{47}<168>, a magnitude do valor 
determina-se pela quantidade ou volume de trabalho humano socialmente necessário à 
produção do bem. 
 
Por outro lado, "a quantidade de trabalho, por sua vez, mede-se pelo tempo de sua 
duração, e o tempo de trabalho, por frações do tempo, como hora, dia etc." (Marx, p. 
45) [60]{47}<168> 
Aliás, devemos destacar que é muito importante diferenciar claramente o que é medida 
do valor (o tempo de trabalho socialmente necessário) do que é a sua determinação 
(quantidade de trabalho socialmente necessário). Isso é relevante, sobretudo se tivermos 
em consideração o conceito de intensificação do trabalho, aspecto que desenvolveremos 
nos “Temas Complementares”, ao final deste trabalho. 
Outra observação importante aqui é a de que, na verdade, a magnitude do valor de uma 
mercadoria não se determina pela quantidade de trabalho socialmente necessário para 
produzi-la, mas pela quantidade de trabalho socialmente necessário para reproduzi-la. 
Isso significa que a magnitude do valor de uma mercadoria produzida no ano passado, 
por exemplo, não está determinada pelas condições tecnológicas vigentes naquele 
instante, mas nas presentes hoje. Por tanto, a grandeza do valor dessa mercadoria é igual 
à quantidade de trabalho socialmente necessário para produzir uma mercadoria 
exatamente igual a ela, hoje; neste instante. 
 
44. Por tempo de trabalho socialmente necessário, nosso autor, entende "o tempo de 
trabalho requerido para produzir-se um valor-de-uso qualquer, nascondições de 
 14
produção socialmente normais, existentes, e com o grau social médio de destreza e 
intensidade do trabalho." (Marx, p. 46)[61]{48}<169> Por certo, o trabalho 
socialmente necessário é a dimensão quantitativa do trabalho humano abstrato. 
 
Aqui não entraremos em mais detalhes relativos ao trabalho socialmente necessário. 
 
 
 
VII - CATEGORIAS ABSTRATAS 
 
 
45. Vejamos novamente o primeiro parágrafo d'O Capital. O autor nos diz ali que a 
riqueza, na época capitalista, está constituída por um "imensa acumulação de 
mercadorias". 
 
Portanto, a primeira categoria que aparece nesse livro é a de riqueza. Mas essa riqueza 
como tal, não se refere a nenhuma época em particular, a nenhuma sociedade particular; 
é uma categoria GERAL, adequada a qualquer forma histórica, a qualquer tipo de 
sociedade. 
 
A mercadoria, por seu lado, é a riqueza na época mercantil, especialmente na época 
capitalista (esta é, na verdade, a sociedade mercantil levada ao seu máximo 
desenvolvimento). Então, a mercadoria é uma categoria PARTICULAR, exclusiva da 
sociedade mercantil. 
 
As categorias abstratas de GERAL e PARTICULAR correspondem, neste caso, 
respectivamente, às categorias: RIQUEZA (R) e MERCADORIA (M). 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
46. Como a riqueza capitalista é mercadoria, então aquela é ao mesmo tempo, e de 
maneira contraditória, duas coisas: é valor-de-uso e é valor. 
 
Essa característica contraditória da riqueza capitalista pode facilmente revelar-se, por 
exemplo, se observamos sua dimensão quantitativa: pode ser encontrada uma situação 
real na qual a riqueza capitalista esteja em crescimento desde o ponto de vista do valor-
de-uso, e não esteja (ao mesmo tempo) desde o ponto de vista do valor. 
 
Marx faz referência a uma situação que indica esse caráter contraditório da riqueza 
capitalista : 
 
"Uma quantidade maior de valor-de-uso cria, de per si, maior riqueza material: 
dois casacos representam maior riqueza que um. Com dois casacos podem-se 
agasalhar dois homens, com um casaco, só um etc. Não obstante, ao acréscimo 
GERAL PARTICULAR
R M 
 15
da massa de riqueza material pode corresponder a uma queda simultânea no 
seu valor. Esse movimento de sentidos opostos se origina no duplo caráter do 
trabalho". (Marx, p. 53)[68]{52 e 53}<175> 
 
47. A riqueza capitalista, ou a mercadoria é a unidade contraditória de valor (V) e valor-
de-uso (Vu): 
 
 
 
 Rc = M = 
 
 
 
O valor-de-uso é uma dimensão da riqueza capitalista comum à riqueza em qualquer 
época histórica, em qualquer tipo de sociedade. Em outras palavras, a riqueza, em 
qualquer tipo de sociedade, sempre está constituída de valores-de-uso. Por isso, o valor-
de-uso é o CONTEÚDO material da riqueza. 
 
"Os valores-de-uso constituem o conteúdo material da riqueza, qualquer que 
seja a forma social dela." (Marx, p. 42)[58]{46}<166> 
 
Por outro lado, o valor, como expressão nas coisas das particulares relações mercantis 
de produção, é a FORMA SOCIAL E HISTÓRICA da riqueza na época capitalista. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
48. Logo, a mercadoria (ou a riqueza capitalista) é a unidade contraditória de dois pólos: 
do conteúdo (valor-de-uso) e da forma (valor). 
 
49. Da mesma maneira, o trabalho mercantil (na época capitalista) é a unidade 
contraditória de dois pólos: do conteúdo (trabalho útil ou concreto) e da forma (trabalho 
abstrato). 
 
 
 
 trabalho = 
 
 
 
 
A dimensão trabalho útil (ou concreto) do trabalho mercantil (ou capitalista) é própria 
do trabalho em qualquer forma de sociedade, é portanto própria do trabalho em geral. 
Assim, o trabalho útil é o conteúdo do trabalho mercantil e do trabalho em qualquer 
outra sociedade. 
 Vu 
 
 V 
 
trabalho concreto 
 
trabalho abstrato 
CONTEÚDO FORMA SOCIAL E HISTÓRICA 
Vu V 
 16
 
Por outro lado, a indiferenciação do trabalho, a dimensão abstrata do trabalho mercantil, 
é produto da realidade capitalista. Então, o trabalho abstrato é a forma social e histórica 
do trabalho na sociedade capitalista. 
 
 
 
trabalho = 
 
 
 
50. Vimos que o valor não é imediatamente observável na realidade. O valor-de-troca, 
por outro lado, não só é imediatamente observável, na sociedade capitalista, como 
apresenta duas características aparenciais: a casualidade e a relatividade. Somente 
ultrapassando tais características aparenciais do valor-de-troca é que nos encontrávamos 
com a realidade valor. Portanto, o valor-de-troca é uma categoria aparencial, da 
APARÊNCIA, enquanto que o valor é uma categoria relativa à ESSÊNCIA. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
51. Assim, o valor-de-troca é a aparência do valor, sua forma de expressão ou sua forma 
de manifestação. Ele forma com o valor, também, uma unidade de dois pólos 
contrapostos: 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Qual é o nome que Marx atribui a essa unidade contraditória? Umas vezes ele a chama 
pelo nome de valor; outras de valor–de-troca e isso, no nosso entendimento, é um ponto 
de partida para muitos equívocos17. Por isso é que, acreditamos, muitos chegam a 
 
17. Por exemplo, quando ele faz afirmações do tipo "o valor de tal mercadoria é 10 libras esterlinas", está chamando o preço ou o 
valor-de-troca de valor. Na verdade, rigorosamente, deveria estar dizendo: o valor (unidade essência/aparência), na sua dimensão 
aparencial, dessa mercadoria é tantas libras. 
Por outra parte, no início do capítulo I, sobre a mercadoria, quando afirma que "o valor-de-troca revela-se ...", tudo indica que está 
verdadeiramente referindo-se à unidade valor (com seus dois pólos) e não propriamente ao valor-de-troca: 
 
"O valor-de-troca revela-se, de início, na relação quantitativa entre valores-de-uso de espécies diferentes, na relação 
em que se trocam, relação que muda constantemente no tempo e no espaço." (Marx, p. 43)[58]{46}<166> 
 
APARÊNCIA ESSÊNCIA
Vt V 
V 
 
 Vt 
ESSÊNCIA
APARÊNCIA
 
 forma social e histórica 
 
 conteúdo material 
 
trabalho concreto 
 
trabalho abstrato 
 17
identificar, como se fossem sinônimos, valor e valor-de-troca, o que constitui erro grave 
e ingênuo18. 
 
Assim, 
 
 
 V = ou Vt = 
 
 
 
Por outro lado, outra observação sobre terminologia: não devemos confundir forma de 
expressão ou de manifestação com forma social e histórica. A palavra forma é usada 
aqui em dois sentidos totalmente distintos. É indispensável, também, atenção sobre esse 
aspecto. 
 
52. Vimos que mercadoria é a unidade contraditória de valor-de-uso e valor, mas 
tínhamos visto antes que era, ao mesmo tempo, valor-de-uso e valor-de-troca. 
 
Imediatamente observada, portanto na aparência, a mercadoria é a unidade de valor-de-
uso e valor-de-troca. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Na essência, a mercadoria é a unidade contraditória de dois pólos: valor-de-uso e valor. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Não fosse correta nossa interpretação, ele deveria ter dito: o valor de troca é uma relação quantitativa entre valores-de-uso de 
espécies diferentes. 
 
18. Ver nota de rodapé anterior número 9. 
 Vu 
 
 Vt 
APARÊNCIA
M =
 Vu 
 
 V 
ESSÊNCIA
M =
 Vt 
 
 V 
 Vt 
 
 V 
 18
VIII - A EXPRESSÃO DO VALOR 
 
 
 
53. Já tínhamos visto, no parágrafo 31, que o valor não se expressa por si mesmo. O 
valor, como qualidade social das coisas, só pode revelar-se (expressar-se ou manifestar-
se) através da relação social de umas mercadorias com outras; através do valor-de-
troca19: 
 
"Em contraste direto com a palpável materialidade da mercadoria, nenhum 
átomo de matéria se encerra no seu valor. Vire-se e revire-se, à vontade, uma 
mercadoria: a coisa-valor se mantém imperceptível aos sentidos. 
"As mercadorias, recordemos, só encarnam valor na medida em que sãoexpressões de uma mesma substância social, o trabalho humano; seu valor é, 
portanto, uma realidade apenas social, só podendo manifestar-se, 
evidentemente, na relação social em que uma mercadoria se troca por outra." 
(Marx, p. 55)[69]{53 e 54}<176> 
 
54. O valor, então, se expressa através do valor-de-troca; este é forma do valor, forma 
necessária do valor. Veremos depois, com precisão, que o preço é um valor-de-troca 
especial, o valor-de-troca de uma mercadoria com o dinheiro. O preço é, então (e 
também o dinheiro), uma forma do valor. 
 
55. O que faz nosso autor na seção 3 do primeiro capítulo d'O Capital? 
 
"Partimos do valor-de-troca ou da relação de troca das mercadorias, para 
chegar ao valor aí escondido. Temos, agora, de voltar a essa forma de 
manifestação do valor." (Marx, p. 55)[69]{54}<176> 
 
O que ocorre é um retorno ao valor-de-troca. Mas não se trata de repetir ali o que já se 
descobrira inicialmente. Tínhamos visto o valor-de-troca como um fenômeno 
imediatamente observável, e não descobrimos mais do que era possível a partir de uma 
simples observação superficial. Agora já temos sua explicação científica, o valor. 
Partindo dele, trata-se de descobrir novas determinações do valor-de-troca, aquelas que 
não podiam ser conhecidas antes. Veremos que o descobrimento de novas 
determinações do valor-de-troca (como expressão do valor que é) enriquecerá o nosso 
saber sobre o próprio valor. 
 
Se quiséssemos expor o anterior através de categorias mais abstratas, poderíamos dizer 
o seguinte: 
a) Nossa primeira aproximação à aparência de um fenômeno faz-se através da simples 
observação do mesmo, da observação da superfície do fenômeno. 
b) Depois, um tratamento sistemático, metodologicamente adequado, permite-nos 
descobrir sua essência, sua explicação essencial. 
 
 
19. Em nota anterior de rodapé, havíamos feito uma analogia entre o valor e o magnetismo em objetos de ferro. Aqui, podemos 
também apelar para uma analogia com a personalidade de uma pessoa. Da mesma maneira que o valor, a personalidade humana não 
se apresenta como tal, mas se expressa. Manifesta-se através da relação da referida pessoa com todas as demais. É o conjunto das 
formas através das quais se dá seu relacionamento com todas as demais pessoas, o que nos permite conhecer a exata personalidade 
dela. É precisamente o mesmo que ocorre com o valor das mercadorias. O fato de que a personalidade não seja diretamente visível, 
não nos permite negar sua realidade. 
 19
c) Mas, isso não é suficiente, é necessário, a partir daí, retornar à manifestação 
fenomênica e descobrir suas determinações; veremos então que a explicação 
científica ganhará toda sua riqueza. 
 
56. O propósito do nosso autor, na referida seção, é descobrir a gênese (o surgimento) 
do dinheiro e do preço e, assim, a natureza deles: 
 
"Importa realizar o que jamais tentou fazer a economia burguesa, isto é, 
elucidar a gênese da forma dinheiro. Para isso é mister acompanhar o 
desenvolvimento da expressão do valor contida na relação de valor existente 
entre as mercadorias, partindo da manifestação mais simples e mais apagada 
até chegar à esplendente forma dinheiro. Assim, desaparecerá o véu misterioso 
que envolve o dinheiro." (Marx, p. 55)[70]{54}<176 e 177> 
 
57. Em que sentido afirmamos que o nosso autor estuda ali a gênese do dinheiro? Na 
verdade, ele só se preocupa com os momentos fundamentais do desenvolvimento 
histórico da forma do valor, desde o escambo até chegar ao dinheiro. Não expõe a 
história concreta dele, com toda a riqueza das suas determinações. 
 
58. O autor nos fala do "enigma do dinheiro". Em que consiste o enigmático, o 
fascinador, o mistério do dinheiro? Isso é algo que se compreenderá posteriormente. No 
entanto, podemos adiantar que o enigmático relaciona-se com o fato de que o ouro 
parece que funciona como dinheiro por ser ouro, por suas qualidades materiais, naturais 
e imanentes. Veremos que isso é pura ilusão, embora necessária, produto da realidade 
mesma e não de um erro do observador20. 
 
 
 
IX - A FORMA FORTUITA DO VALOR (FORMA A) 
 
 
59. Nosso autor parte da expressão mais simples, mais primitiva do valor: a troca, o 
escambo. 
 
 x A = y B ou x A "vale" y B 
 
 
60. Essa forma do valor corresponde à etapa mais primitiva do desenvolvimento das 
relações mercantis de produção; na verdade, à pré-história da sociedade mercantil. As 
relações mercantis ainda não existem; ou só existem como potenciais ou, no máximo, 
como embrionárias. Poderíamos, talvez mais apropriadamente, identificar essa troca 
como um intercâmbio pré-mercantil de presentes. Nessa etapa, o objetivo do produtor é 
a produção de valores-de-uso e só eventualmente, excepcionalmente, o excedente 
 
 
20. Talvez seja conveniente, aqui, destacar mais uma vez o fato de que a aparência nunca deve ser vista como resultado de um erro ou 
engano do observador. Ela é um aspecto fundamental do real, ao lado da essência. O erro está , como já dissemos, em considerar que 
a realidade só apresenta seu aspecto observável; o engano está em acreditar na unidimensionalidade do real. Em que sentido, então, a 
essência pode ser vista como superior à aparência? Talvez somente no sentido de que só a essência permite entender os nexos 
íntimos da realidade; só ela permite explicar a razão da própria conformação da aparência, a estrutura e as leis de funcionamento 
além das tendências e potencialidades futuras do real. 
 20
produzido, ou parte dele, chega a ser trocado. Não existe, portanto, intercâmbio 
sistemático de mercadorias; sua ocorrência é eventual, casual, fortuita. 
 
As relações mercantis não se encontram desenvolvidas, tampouco a mercadoria o está. 
Na realidade o que existe não é ainda uma verdadeira mercadoria, com todas as suas 
determinações; é um embrião de mercadoria. 
 
61. O processo de desenvolvimento da forma do valor, que vamos estudar aqui nesta 
parte do capítulo inicial d’O Capital, corresponde ao processo de desenvolvimento do 
próprio valor e, portanto, da mercadoria. Além do mais, esses processos refletem o 
processo de desenvolvimento das relações mercantis de produção, processo através do 
qual essas relações tornam-se progressivamente dominantes na sociedade inteira. 
 
Por isso, a forma simples ou fortuita do valor corresponde ao momento mais primitivo 
do valor e da mercadoria e refere-se às primeiras manifestações, que são eventuais, das 
relações mercantis na sociedade: 
 
"Em conseqüência, a forma simples de valor da mercadoria é também a forma-
mercadoria elementar do produto do trabalho, coincidindo, portanto, o 
desenvolvimento da forma-mercadoria com o desenvolvimento da forma do 
valor." (Marx, p. 70)[83]{63}<189> 
 
62. Apesar de simples e primitiva, nessa forma já se encontra o segredo de todas as 
formas mais desenvolvidas do valor. E, o mais importante, aqui pode-se descobrir esse 
segredo: 
 
"Todo o segredo da forma do valor encerra-se nessa forma simples do valor. Na 
sua análise reside a verdadeira dificuldade." (Marx, p. 56)[70]{54}<177> 
 
63. Analisemos, então, a forma simples: 
 
 
 x A = y B ou 1 litro de leite = 5 Kg. de trigo. 
 
 
Nessa expressão, a pergunta que se faz é: 
 
- Qual é o valor de x A ?, ou 
- Qual é o valor de 1 litro de leite? 
 
E a resposta, é: 
 
- O valor em trigo de um litro de leite é 5 kg. 
- O valor em B de x A é y. 
 
 
64. Portanto, a mercadoria A, como não pode fazer por si mesma, expressa seu valor21 
através da relação com B; através de B . Assim, B serve de material de expressão do 
 
21 que é um relação social expressa. 
 21
valor de A. A materialidade de B funciona como a forma de manifestação do valor da 
mercadoria A. 
 
65. Através de que mecanismo a mercadoria A declara ao mundo que é um valor ? 
 
O mecanismo usado por Apara declarar-se como valor é sua relação, no mercado, com 
uma mercadoria distinta, com B: 
 
"Ao dizermos que, como valores, as mercadorias são trabalho humano 
cristalizado, nossa análise as reduz a uma abstração, a valor, mas não lhes dá 
forma para esse valor, distinta de sua forma física. A questão muda quando se 
trata da relação de valor entre duas mercadorias. Aí a condição de valor de 
uma se revela na própria relação que estabelece com a outra." (Marx, p. 58) 
[72]{56}<179> 
 
66. Observemos uma vez mais a expressão x A = y B. O valor de A aparece como um 
valor relativo, relativo a B, portanto reveste a forma relativa do valor. A mercadoria B 
aparece, na relação, como equivalente do valor de A e, portanto, é a forma de 
equivalente do valor de A. 
 
"Duas mercadorias diferentes A e B, em nosso exemplo, linho e casaco, 
representam, evidentemente, dois papéis distintos. O linho expressa seu valor no 
casaco, que serve de material para essa expressão de valor. O papel da 
primeira mercadoria é ativo, o desempenhado pela segunda, passivo. O valor 
da primeira mercadoria apresenta-se como valor relativo, ela se encontra sob a 
forma relativa do valor. A segunda mercadoria tem a função de equivalente ou 
se acha sob a forma de equivalente." (Marx, p. 56)[70]{54}<177> 
 
67. É evidente que a relação x A = y B pode ser invertida: y B = x A. Mas, nesta nova 
relação, a pergunta é diferente, modificou-se. Agora, na expressão y B = x A, a pergunta 
é: 
 
- Qual é o valor de B ? 
 
 
Nesta última relação, B representa a forma relativa22 e A é o equivalente. 
 
No entanto, uma coisa não pode ocorrer; uma mercadoria não pode ser ao mesmo tempo 
forma relativa e equivalente pois, então, seria o equivalente de si mesma. 
 
68. Observando mais de perto a relação do valor x A = y B, vemos que o valor de uma 
mercadoria (A) expressa-se através do valor-de-uso de outra (B). A mercadoria que 
funciona como equivalente empresta a A sua materialidade (a materialidade de B, isto é, 
o seu valor-de-uso) para que A possa expressar o seu valor23: 
 
 
 
22. Assim, podemos considerar como sinônimas as expressões "valor-de-troca", "valor relativo" e "preço relativo". 
 
23. Que uma determinada mercadoria seja equivalente da minha pressupõe, aqui, que eu deseje seu valor-de-uso e que, então, aceite 
trocar minha mercadoria por ela. 
 22
"Na relação de valor, em que o casaco constitui o equivalente do linho, a figura 
do casaco é considerada a materialização do valor. O valor da mercadoria 
linho é expressa pelo corpo da mercadoria casaco, o valor de uma mercadoria 
pelo valor-de-uso de outra." (Marx, p. 60) [74]{56 e 57}<180> 
 
E também: 
 
"A primeira peculiaridade que salta aos olhos, ao observar-se a forma de 
equivalente, é que o valor-de-uso se torna a forma de manifestação do seu 
contrário, isto é, do valor." (Marx, p. 64)[78]{59}<184> 
 
69. Por que o valor-de-uso B tem o poder de ser equivalente do valor de A ? Ou, em 
outras palavras, por que pode ser representante do valor ? 
 
O que permite a B emprestar a A seu "vulgar corpo" de casaco, emprestar sua 
materialidade corpórea, seu valor-de-uso, para servir de material de expressão do valor 
de A (do linho), é o fato de que também é um valor: 
 
"Na relação de valor com o linho, considera-se o casaco, por ser um valor, 
qualitativamente igual ao linho, coisa da mesma natureza." (Marx, p. 
59)[73]{56}<179> 
 
70. O exposto até agora não é suficiente para entender a forma de equivalente, para 
compreender que um valor-de-uso seja capaz de representar valor, sobretudo pelo fato 
de que aquele se refere à materialidade física de uma mercadoria e este a sua 
materialidade social. O problema estará solucionado se entendermos o seguinte: 
 
"O casaco, o corpo dessa mercadoria, é um simples valor-de-uso. O casaco, 
como qualquer quantidade do melhor linho, tampouco expressa valor. Isto 
demonstra que o casaco, dentro da sua relação com o linho, significa mais do 
que fora dela ..." (Marx, p. 59)[73]{56}<179 e 180> 
 
"Por meio da relação de valor, a forma natural da mercadoria B torna-se a 
forma do valor da mercadoria A, ou o corpo da mercadoria B transforma-se no 
espelho do valor da mercadoria A." (Marx, p. 60)[74]{57}<181> 
 
Então, é precisamente a relação de valor que transforma o valor-de-uso B em 
representante de valor; ela é que lhe confere a magia da representação do seu contrário: 
do valor. 
 
71. Já tínhamos visto que, como qualquer outra mercadoria, B tem dois aspectos (dois 
pólos): valor-de-uso (conteúdo) e valor (forma social e histórica), 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Vu 
 
 V 
CONTEÚDO
FORMA SOCIAL E HISTÓRICA
B = 
 23
 
sendo a forma histórica e social valor (V) um poder entregue pela sociedade ao valor-
de-uso B. 
 
Mas vimos no parágrafo anterior (70) que, na relação x A= y B, B adquire um poder 
extra; um poder que não se deve nem às propriedades do seu valor-de-uso, nem 
tampouco às de seu valor; adquire o poder de ser equivalente. 
 
Esse novo poder, da mesma maneira que o anterior, também é entregue a B pela 
sociedade mercantil; é expressão das relações mercantis. Portanto, o poder de ser 
equivalente constitui uma nova forma social adquirida por B. 
 
Esquematicamente poderíamos escrever: 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 onde Eq = equivalente. 
 
Assim, a forma de equivalente é uma forma social que se agrega à que B já possuía, ou 
seja, ao valor. 
 
72. Resumindo, poderíamos dizer que ser forma equivalente permite ao valor-de-uso B 
ser expressão (exteriorização) do valor de A; ser representação de valor: 
 
"Nessa relação (x A = y B, RC), o casaco representa a forma de existência do 
valor, é a figura do valor..." (Marx, p. 58)[72]{55}<178> 
 
"O casaco nessa relação, passa por coisa através da qual se manifesta o valor, 
ou que representa o valor por meio de sua forma física palpável." (Marx, p. 
59) [73](56}<179> 
 
"E, na relação de valor com o linho, (o casaco, RC) é considerado ... como 
valor corporificado, como encarnação do valor." (Marx, p. 59)[73-
74]{56}<180> 
 
Além disso, poderíamos dizer que o trabalho concreto ou útil, ao qual a mercadoria que 
funciona como equivalente deve a sua materialidade, é a forma de expressão (de 
manifestação) do trabalho humano abstrato. (Cf. parágrafo 67 deste texto) 
 
 
 
Vu 
 
 V+Eq 
CONTEÚDO
FORMA SOCIAL E HISTÓRICA
B = 
 24
O Caráter Misterioso da Forma De Equivalente 
 
 
73. Em que consiste o caráter misterioso da forma equivalente ? 
 
Consiste no seguinte: O poder de ser equivalente de uma determinada mercadoria (B) - 
que não é mais do que uma nova forma social que a ela se adere - parece como se fosse 
um poder natural dela mesma (de B); parece derivar-se da sua própria natureza física, 
da sua materialidade corpórea. Em outras palavras, aquilo que é na verdade a expressão 
de uma relação social, aparece como uma propriedade natural. 
 
74. Essa aparência não se apresenta no caso da forma relativa, pois ela nos permite 
entrever a existência de uma relação social: 
 
"A forma relativa do valor de uma mercadoria (o linho) expressa seu valor por 
meio de algo totalmente diverso do seu corpo e de suas propriedades (o 
casaco); essa expressão está assim indicando (sugere, RC) que oculta uma 
relação social." (Marx, p. 65)[79]{60}<185> 
 
75. Como tínhamos visto no parágrafo 73, a situação é diferente no caso da forma 
equivalente: 
 
"O oposto sucede com a forma de equivalente. Ela consiste justamente em que o 
objeto material, a mercadoria, como o casaco, no seu estado concreto, expressa 
valor, possuindo de modo natural, portanto, forma de valor. Isto só vigora na 
relação de valor em que a mercadoria casaco ocupa a posição de equivalente 
em face da mercadoria linho. Ora, as propriedades de uma coisa não se 
originam de suas relações com outras, mas antes se patenteiam nessas relações; 
por isso, parece que o casaco tem,por natureza, a forma de equivalente, do 
mesmo modo que possui a propriedade de ter peso ou de conservar calor. Daí o 
caráter enigmático da forma equivalente ... " (Marx, pp. 65 e 66)[79 e 
80]{60}<185> 
 
 
 
Adequação da Forma para Expressar Magnitude de Valor 
 
 
76. Já tínhamos visto que o valor-de-troca (ou valor relativo) é a forma necessária de 
expressão do valor de uma mercadoria (A). Por isso, a magnitude do valor de A e suas 
alterações só encontram expressão direta na proporção de troca entre A e seu 
equivalente e nas modificações dessa proporção. Em outras palavras, as mudanças na 
magnitude do valor de A só podem encontrar expressão imediata nas alterações 
quantitativas que experimente a forma relativa do valor de A (seu preço relativo). 
 
77. Devido ao anterior, são relevantes as seguintes perguntas: 
 
Em que medida a expressão relativa do valor (o valor relativo) é adequada para 
expressar a verdadeira magnitude do valor? Em que medida é capaz de refletir, de 
maneira completa e inequívoca, as mudanças que se produzem na magnitude do valor? 
 25
Atenção para o fato de que são duas diferentes perguntas: uma se refere à magnitude do 
valor e a outra às suas variações. 
 
78. Antes da tentativa de resposta a essas perguntas é necessária uma importante 
observação. 
 
Embora, na verdade, a única forma de expressão direta da magnitude do valor seja a 
forma relativa do valor (o valor-de-troca ou valor relativo) essa magnitude consiste (fica 
determinada por) numa certa quantidade de trabalho humano abstrato, que se mede pelo 
tempo.24 
 
Assim, quando teoricamente seja necessária a categoria magnitude do valor, devemos 
pensá-la como quantidade de trabalho e não como uma quantidade do valor-de-uso da 
mercadoria que funciona como equivalente. 
 
79. Vamos responder, em primeiro lugar, à segunda das perguntas antes formuladas, 
partindo da seguinte situação suposta: 
 
 
 mgVA = 10 horas de trabalho 
 mgVB = 1 hora de trabalho 
 
 
Aí, B é a mercadoria que funciona como equivalente e mgV significa magnitude do 
valor. 
 
Então o valor-de-troca de A é: 
 
 1 A = 10 B 
 
 
80. Comparemos duas novas situações diferentes como a anterior: 
 
 
 a) mgVA = 10 horas de trabalho 
 mgVB = 2 horas de trabalho 1A = 5B 
 
 b) mgVA = 5 horas de trabalho 
 mgVB = 0,5 horas de trabalho 1A = 10B 
 
81. Entre a situação "a" e a inicial, vemos que o valor relativo se altera, sem que exista 
mudança na magnitude do valor de A. Entre a situação "b" e a inicial, altera-se a 
magnitude do valor de A, mas não muda o seu valor relativo. 
 
 
 
24. No capítulo 3 do mesmo Livro I, Marx dirá a propósito do dinheiro já funcionando como equivalente: 
 
"O dinheiro, como medida do valor, é a forma necessária de manifestar-se a medida imanente do valor das 
mercadorias, o tempo de trabalho." (Marx, p. 106)[121]{87}<219> 
 
 26
"A verdadeira variação da magnitude do valor não se reflete, portanto, clara e 
completa em sua expressão, isto é, na equação que expressa a magnitude do 
valor relativo." (Marx, p. 63)[77]{58}<182> 
 
82. Podemos dizer, então, que a expressão relativa do valor (o valor relativo) não é 
totalmente adequada para expressar as verdadeiras modificações da magnitude do valor. 
Isso, obviamente, deve-se às variações na magnitude do valor sofridas pela mercadoria 
equivalente. 
 
Essa disparidade entre o movimento da magnitude do valor e o de sua expressão revela, 
em concreto, para esse caso particular, a contradição que existe entre a essência e a sua 
manifestação (a aparência). Seus movimentos, aqui, são contrapostos. 
 
83. Podemos assinalar agora, para simples ilustração, o movimento contraposto que 
apresenta, na sociedade capitalista atual, a magnitude do valor das mercadorias em 
geral, por um lado, e seus preços, por outro. 
 
Na sociedade capitalista opera uma lei que implica uma tendência à progressiva redução 
da magnitude do valor das mercadorias. No entanto, essa tendência aparece expressa 
através de um processo progressivo e sistemático de incremento dos preços, a inflação. 
 
O processo inflacionário não nega a validez da referida lei; o que faz é refletir a 
contradição que existe entre a essência e a sua manifestação, no caso concreto. 
 
84. O autor, no primeiro capítulo d' O Capital, só mostra que a expressão relativa do 
valor não é totalmente adequada para expressar as modificações que se produzem na 
magnitude do valor. Não se preocupa em mostrar, ali, que essa expressão tampouco é 
totalmente adequada para refletir a própria magnitude do valor. Deixa esse assunto para 
depois 25. No entanto, devido à relevância do mesmo para entender a relação entre os 
conceitos de preço e valor, trataremos dele rapidamente. 
 
 
 
25. No capítulo 2 do mesmo Livro I e a propósito do preço de mercado (ou simplesmente preço, isto é, valor-de-troca quando o 
dinheiro é o equivalente), Marx discute o assunto. Ali, assinala a possibilidade de flutuação do preço de mercado em torno daquele 
que expressaria de maneira cabal a verdadeira magnitude do valor: 
 
"A magnitude do valor da mercadoria expressa uma relação necessária entre ela e o tempo de trabalho socialmente 
necessário ... Com a transformação da magnitude do valor em preço, manifesta-se essa relação necessária através da 
relação de troca de uma mercadoria com a mercadoria dinheiro ... Nessa relação pode o preço expressar tanto a 
magnitude do valor da mercadoria quanto essa magnitude deformada para mais ou menos, de acordo com as 
circunstâncias. ... Isso não constitui um defeito dela (da forma, RC), mas torna-a a forma adequada a um modo de 
produção, em que a regra só se pode impor através de média que se realiza, irresistivelmente, através da irregularidade 
aparente." (Marx, pp. 114 e 115)[129]{92}{"91"}<226>* 
 
* O penúltimo número corresponde à página da edição "Os Economistas", capa azul (ver nota 1). 
 
No entanto, a contradição entre a forma relativa do valor (ou entre o preço) e a magnitude do valor é ainda maior e isso fica 
indicado, de passagem, em nota de rodapé (número 37, no capítulo 3 do Livro I: 
 
"...os preços médios não coincidem diretamente com as magnitudes do valor das mercadorias, conforme pensam A. 
Smith, Ricardo e outros." (Marx, p. 186)[196]{138}{"134"}<284 – nota nº 260> 
 
E também, no capítulo 7 do Livro I: 
 
"Admitiu-se (no exemplo anterior, RC) que os preços = valores. No Livro III veremos que essa equiparação não se 
processa de maneira tão simples, nem mesmo para os preços médios." (Marx, pp. 246 e 247)[257]{179}{"171"}<335 – 
nota nº 331> 
 27
 
85. Em que sentido podemos afirmar que o valor relativo (ou a expressão relativa do 
valor) tampouco é totalmente adequado para expressar a verdadeira magnitude do 
valor? 
 
No sentido de que, no mercado, não encontraremos necessariamente que a proporção de 
intercâmbio entre A e B seja igual à inversa da proporção entre as suas respectivas 
magnitudes de valor. 
 
Assim por exemplo, se 
 
 mgVA = 10 h. de trabalho e 
 mgVB = 1 h. de trabalho, 
 
 
não existe razão, na sociedade capitalista, para esperar que no mercado ocorra 
necessariamente: 
 
 
 1 A = 10 B. 
 
 
Poderíamos encontrar, por exemplo: 
 
 
 1 A = 9 B, ou 
 
 1 A = 11 B26. 
 
 
 
Capacidade da Forma Simples 
 
 
86. Mesmo na forma simples, a mercadoria (ou melhor, seu embrião) realiza um grande 
esforço: trata de mostrar aos homens que valor e valor-de-uso não se confundem; que o 
seu valor não é o seu valor-de-uso. 
 
87. No entanto, quanto menos desenvolvida é a produção mercantil e, portanto, menos 
desenvolvida a mercadoria, a linguagem que ela é capaz de utilizar é mais pobre. 
 
88. Na etapa de seu desenvolvimento que estamos estudando, isto é, enquanto o 
intercâmbio é eventual, fortuito, não sistemático, a linguagem da mercadoria(linguagem que ela utiliza para dizer-nos que o seu valor não é o seu valor-de-uso) é 
muito pobre: sua linguagem, neste caso, é a forma simples do valor. 
 
 
 
26. É por isso que atribuir ao conceito de valor de Marx o papel de norma de intercâmbio, sem nenhuma mediação, constitui um erro 
primário. Desse fato, derivam-se os conceitos de produção, apropriação e transferência de valor, além de outro mais, o de preço 
correspondente ao valor, que serão tratados, no final deste trabalho, nos “Temas Complementares”. 
 28
Sob essa forma, a mercadoria A, para dizer que o seu valor não se identifica com o seu 
valor-de-uso, diz: 
 
 "o meu valor é igual ao valor-de-uso B." 
 
"Para expressar que sua sublime objetivação de valor difere da sua tessitura 
material, diz ele (o linho, RC) que o valor se apresenta sob a figura de um 
casaco ... " (Marx, p. 60)[74]{57}<180> 
 
 
 
Insuficiência da Forma Simples do Valor 
 
 
89. A insuficiência da forma simples do valor consiste precisamente na pobreza da 
linguagem através da qual a mercadoria afirma ao mundo que o seu valor não é idêntico 
ao seu valor-de-uso: 
 
"Percebe-se, à primeira vista, a insuficiência da forma simples do valor, forma 
embrionária que atravessa uma série de metamorfoses para chegar à forma 
preço. 
 
"A expressão do valor da mercadoria A através de uma mercadoria B qualquer, 
serve apenas para distinguir o valor de A do seu próprio valor-de-uso ... À 
forma relativa simples do valor de uma mercadoria corresponde a forma de 
equivalente singular de outra. Assim, o casaco, na expressão do valor relativo 
do linho, possui forma de equivalente ... apenas em relação a esse único tipo de 
mercadoria, o linho." (Marx, p. 70)[83 e 84]{63 e 64}<189> 
 
 
 
Trânsito à Forma Total 
 
 
90. É a própria insuficiência da forma simples que pode determinar a sua superação: 
 
"Todavia, a forma simples do valor converte-se, por si mesma, numa forma mais 
completa." (Marx, p. 70)[84]{64}<189> 
 
"O número das possíveis expressões de valor dessa única mercadoria só é 
limitado pelo número das mercadorias que lhe são diferentes. Sua expressão 
singular de valor converte-se numa série de expressões simples de valor, sempre 
ampliável." (Marx, p. 70) [84](64}<189> 
 
O eventual surgimento de uma série crescente de trocas fortuitas, entre duas 
comunidades humanas, pode determinar a passagem para a forma seguinte, que se 
distingue desta por implicar intercâmbio regular. O resultado da prática social de 
experimentar uma série de trocas circunstanciais, pode fazer com que as comunidades 
sintam a conveniência de estabelecer trocas regulares e não mais fortuitas. 
 
 29
X - A FORMA TOTAL OU EXTENSIVA DO VALOR (FORMA B) 
 
 
91. Nesta nova forma, o valor da mercadoria A é expresso através de um conjunto de 
relações de intercâmbio, que a vincula a todas as outras mercadorias da sociedade: 
 
z A = u B 
 = v C 
 = w D 
 = x E 
 etc. 
 
 
92. A diferença desta nova forma com uma ampla série de expressões simples do valor 
consiste em que aqui o intercâmbio mercantil é sistemático. O valor-de-uso A deixou de 
ser uma mercadoria fortuita; agora ele é uma mercadoria de maneira sistemática: 
 
"Desaparece a relação eventual de dois donos individuais de mercadorias" 
(Marx, p. 70)[85]{64}<190> 
 
A forma total, desdobrada ou extensiva do valor, como também é chamada, é uma 
forma que se amplia progressivamente. Cada vez mais, cresce o número de novas 
mercadorias que aparecem como equivalentes de A. Inicialmente o seu número é 
reduzido, mas vai se ampliando cada vez mais. Assim, amplia-se progressivamente a 
dependência do produtor de A em relação ao mercado. 
 
 
 
Capacidade da Forma Extensiva do Valor 
 
 
93. Evidentemente, na forma total ou extensiva, a mercadoria está em melhores 
condições de afirmar que o seu valor não se confunde com o seu valor-de-uso, nem 
tampouco com qualquer valor-de-uso em particular. 
 
94. Para dizer o anterior, a mercadoria afirma: 
 
‘Tanto é verdade que o meu valor não se confunde com nenhum valor-de-uso em 
particular, que eu posso fazê-lo igual a todos e a cada um dos diferentes valores-de-uso 
das demais mercadorias’: 
 
"A forma B (forma extensiva, RC), distingue o valor de uma mercadoria do 
próprio valor-de-uso, de maneira mais completa que a primeira. Com efeito, o 
valor do casaco revela-se em todas as formas possíveis, iguala-se ao linho, ao 
ferro, a chá, enfim, a toda mercadoria menos o casaco." (Marx, p. 74)[87 e 
88]{66}<192> 
 
E também: 
 
 30
"Através da forma extensiva em que se manifesta seu valor, está o linho, agora, 
em relação social não só com uma mercadoria isolada de espécie diferente, mas 
também com todo o mundo das mercadorias. Como mercadoria, é cidadão do 
mundo. Ao mesmo tempo, da série infindável das expressões da forma extensiva 
se infere que ao valor não importa a forma específica do valor-de-uso em que se 
manifesta." (Marx, pp. 71 e 72)[85]{64}<190> 
 
 
 
Coexistência Histórica da Forma B com a Forma A 
 
 
 
95. Imaginemos a possibilidade de que, entre as mercadorias que aparecem como 
equivalentes de A, uma delas (por exemplo, a mercadoria E) seja um valor-de-uso que 
só eventualmente aparece no mercado, como mercadoria: 
 
 z A = x E 
 
Se invertermos a relação, estaremos frente a forma simples do valor da mercadoria E: 
 
 x E = z A 
 
96. Assim, na história, junto com a forma B (extensiva), podem coexistir formas 
simples do valor. 
 
Por isso podemos afirmar que, na seção 3 do primeiro capítulo d'O Capital, seu autor 
não analisa a história das formas do valor. O que faz é analisar os momento teóricos 
fundamentais dessa história. 
 
 
 
Defeitos ou Insuficiências da Forma Extensiva do Valor 
 
 
 
97. Em que consiste a insuficiência ou os defeitos da forma extensiva do valor ? 
 
Em primeiro lugar, vejamos o problema naquilo que se refere à forma relativa 
extensiva: 
 
 a. "Primeiro, a expressão do valor fica incompleta, por nunca terminar a 
série que a representa. A cadeia em que uma equiparação se liga a outra 
distende-se sempre com cada nova espécie de mercadoria que surge, 
fornecendo material para nova expressão do valor. 
 
 b. "Segundo, é um mosaico multifário de expressões de valor, díspares, 
desconexas. 
 
 31
 c. "Se, por fim, se expressasse o valor relativo de toda mercadoria, 
nessa forma extensiva, a forma relativa de valor de cada mercadoria seria uma 
série infindável de expressões de valor, ao lado das formas relativas de valor de 
cada uma das demais mercadorias:" (Marx, p. 72)[86]{65}<191> 
 
98. Obviamente, a insuficiência ou os defeitos da forma relativa extensiva, vai se refletir 
na forma de equivalente: 
 
 a. "Uma vez que a forma natural de cada tipo de mercadoria é uma 
forma de equivalente particular, ao lado de inumeráveis outras, só existem, no 
final de contas, formas de equivalente limitadas, cada uma excluindo as demais. 
 
 b. "Do mesmo modo, a espécie determinada de trabalho concreto, útil, 
contido em cada mercadoria equivalente particular, é apenas forma 
particularizada de manifestação do trabalho humano, incompleta, portanto. 
 
 c. "Este (o trabalho humano abstrato, RC) possui, na verdade, sua forma 
completa ou total de manifestação no circuito inteiro daquelas formas 
particulares. Mas, falta uma forma unitária de manifestação do trabalho 
humano." (Marx, p. 73)[86]{65}<191> 
 
99. O que significa tudo isso? O desenvolvimento da mercadoria (ou, em outras 
palavras, a expansão das relações mercantis) no seio de uma sociedade, em um 
determinado momento, se vê impedido de continuar devido à contradição inerente à 
forma extensiva do valor. Vejamos: 
 
100. A mercadoria A quer relacionar-se com uma mercadoria que, por sua vez, tem de 
reconhecer naquela (em A) seu valor e, portanto, seu valor-de-uso. Mas não é suficiente 
qualquer mercadoria; é necessário que seja uma mercadoria determinada, por exemplo,

Outros materiais