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Um dos momentos mais esperados do desenvolvimento da criança é, com certeza, quando ela fala sua primeira palavra, deixando os pais e todos em volta encantados com a nova habilidade adquirida. Entretanto, para que a criança seja capaz de se comunicar pela fala, ela passa por diversos outros estágio de desenvolvimento linguagem, que vão se tornando cada vez mais complexos. Dessa forma, é preciso promover em cada etapa a assistência necessária à criança, uma vez que o processo do desenvolvimento da linguagem é cognitivo mas também social, dependendo dos pais e outros cuidadores para tonar o ambiente propício para a evolução da criança. O desenvolvimento da linguagem O desenvolvimento da linguagem, assim como outros aspectos do desenvolvimento humano, possuem uma sequência e evoluem gradativamente. Durante essas etapas, o bebê vai evoluindo sua comunicação do choro para arrulhos e balbucios. Esse sons são chamados de fala pré-linguística e são usados durante boa parte do nascimento até os 3 anos de idade da criança. Não apenas a habilidade de fazer sons se desenvolve, como também a capacidade de identificar barulhos e fazer gestos. Tudo isso são fases que corroboram para que a criança consiga finalmente utilizar palavras e montar sentenças para expressar suas vontades e opiniões. Durante a vocalização inicial, o recém-nascido utiliza o choro como principal forma de comunicação, fazendo uso de diferentes padrões e intensidades para demonstrar interesses divergentes como fome ou sono. O choro possui um importante valor adaptativo pois, como os adultos tentem a ter aversão àquele barulho, isso os força a cuidar do bebê e atender às necessidades dele. Após cerca de 6 semana, o bebê desenvolve a capacidade de arrulhar, que são gritos agudos ou o pronunciamento de vogais. A partir disso, a criança começa a imitar os barulhos feitos por adultos e brincar com os sons, chegando então ao que chamamos de balbucio, que é a capacidade de repetições de sílabas e sons. Nesse momento inicial, a imitação é de extrema importância e estimula os bebês a combinar os sons aprendidos e formar padrões, inicialmente sem significados. Porém, com o tempo, a criança começa a conferir significados aos padrões e palavras na medida em que se acostumam com elas. O reconhecimento de sons e a percepção de pequenas diferenças dessas sons é o que possibilita o tão importante procedimento de imitação, e o bebê pode fazê-lo desde o nascimento ou até mesmo antes, já que existem estudos que demonstram que o bebê é capaz de diferenciar a voz da mãe e que o choro pode possuir sotaque. Isso indica que o bebê tende a seguir os mesmo padrões linguísticos da mãe desde o útero e sintoniza seus ouvidos para captar os sons dela. Além disso, a criança também é capaz de identificar as estruturas de linguagem de idiomas diferentes e, até certa idade, são capazes de identificar padrões sonoros de qualquer língua. Entretanto, a medida que o tempo vai passando, os bebês vão adquirindo preferência pela(s) língua(s) que possuem maior contato, aumentando o reconhecimento de fonemas da língua nativa e diminuindo a capacidade de reconhecer os de outros idiomas. Porém, caso a criança tenha sido criada com dois idiomas no dia a dia, ela demonstra capacidade de compreensão e diferenciação dos dois sistemas linguísticos. Alguns estudos sobre o desenvolvimento da linguagem nos primeiros anos de vida apontam que a estrutura neural é modificada com os primeiros contatos com a linguagem, restringindo a atenção do bebê para línguas não nativas e tornando mais fácil e rápido o reconhecimento dos padrões da língua nativa. Após terem adquirido a capacidade de detectar padrões, as crianças começam então a tomarem consciência das regras fonológicas da sua língua, demonstrando que estão se habituando e entendendo qual a estrutura de uma sentença. Outra fase importantíssima do desenvolvimento da linguagem é quando a criança começa a se comunicar por gestos, apontando para determinado objeto, pessoa ou ação como forma de demonstrar entendimento e um interesse. Esses gestos vão evoluindo q os bebês começam a fazer gestos sociais convencionais, como balançar a cabeça em afirmação ou negação e gestos representacionais, que são mais elaborados e geralmente indicam alguma vontade da criança. Próximo ao momento em que a criança diz sua primeira palavra, ela começa a fazer uso gestos simbólicos, que são utilizados para substituir uma palavra. Esse tipo de gesto é substituído quando o bebê aprende a palavra que corresponde a ele. Além disso, há indicadores de que os gestos são bons medidores do vocabulário futuro da criança e a ajudam na construção da comunicação pela fala linguística. Diante disso, podemos perceber que as tão esperadas primeiras palavras não acontecem com tanta facilidade e que o bebê passa por diversos processos antes de realmente pronunciar sua primeira palavra, que geralmente é falada entre o 10º e o 14º mês. Inicialmente, a criança tem um repertório verbal pequeno, que se resume a sílabas repetidas ou uma única sílaba com vários significados (holofrase), mas, muito antes de pronunciar as primeiras palavras, o bebê já é capaz de entender o significado de palavras que ele ouve repetidamente, como o próprio nome. Aos 10 meses eles relacionam um nome que eles ouvem à objetos que acham interessantes e à medida que os meses vão passando, o bebê vai associando palavras com mais facilidade. Aos 13 meses já são capazes de entender que cada palavra representa alguma coisa, aprendem novos códigos rapidamente e, dessa forma, o vocabulário passivo cresce cada vez mais. Em contrapartida, o vocabulário expressivo (falado) aumenta muito mais lentamente mas, entre os 16 e 24 meses pode acontecer a chamada “explosão de vocabulário”, que apesar de não acontecer com todas as crianças, é bem comum e pode ajudar tanto no reconhecimento de palavras durante o segundo ano de vida, como da categorização das coisas. Essa, inclusive, é uma teoria piagetiana, que diz que a capacidade imprescindível de categorização é afetada pela capacidade da fala. Após estender um pouco o vocabulário a criança entra na fase de criar suas primeiras sentenças, juntando duas palavras para manifestar sua ideia. Nessa fase, diferentemente da etapa pré-linguística, a idade cronológica não é um fator tão importante e a faixa etária em que os bebês começas a falar pode variar muito, sem causar prejuízos futuros. As primeiras sentenças geralmente são bem simples, possuem apenas o essencial para a expressão da ideia e são chamadas de fala telegráfica. A sintaxe por sua vez, passa a ser utilizada com maior precisão pelos bebês aos 20 ou 30 meses. Além de simplificada, a fala inicial possui outras características que são importantes de serem ressaltadas: Apesar de não saber se expressar corretamente, a criança entende as relações gramaticais. Isso quer dizes que, apesar de entender exatamente o que está acontecendo, nem sempre ela é capaz de formular uma frase completa que expresse o que está vendo ou sentindo. A restrição do significado das palavras também é muito comum e as crianças podem designar a um único objeto uma palavra abrangente, como por exemplo nomear apenas o seu copo especial de “copo” e não utilizar essa palavra para os outros da mesma categoria. A criança pode também fazer o contrário da característica a cima: a supergeneralização da palavra, como chamar de vovó toda mulher grisalha só por que a sua avó possui esse traço. Os bebês podem também superregularizar as regras da linguagem, excluindo as exceções do idioma. Como na maioria das áreas da psicologia do desenvolvimento, o desenvolvimento da linguagemtambém possui teorias divergentes mas que ajudam a explicar esse fenômeno e, por isso, é necessário analisa-las. Teorias clássicas do desenvolvimento da linguagem É sempre importante lembrar que o desenvolvimento humano sofre diversas influências de diferentes naturezas, como genética e ambiental. As duas teorias clássicas do desenvolvimento da linguagem se contrapõem exatamente nessa questão, envolvendo a participação do ambiente e a participação genética. Para Skinner, o principal teórico da teoria da aprendizagem, assim como qualquer outro tipo de aprendizado, o domínio da linguagem é adquirido através da experiência e do condicionamento operante (aprendizagem baseada na associação do comportamento com suas consequências). Nessa teoria, o bebê primeiramente emite sons aleatórios que são reforçados e imitados pelos cuidadores. Em resposta, os bebê tendem a imitá-los de volta e, novamente recebem o reforço dessa ação. Acontece então um reforço seletivo, quando os cuidadores repetem uma palavra somente da presença do objeto ou evento que ela representa. Já para o linguista Noam Chomsky, apesar de concordar que a imitação e o reforço contribuem para o desenvolvimento da linguagem, o bebê possui uma participação mais ativa na construção da linguagem. Essa teoria é chamada de inatismo pois propõe que um dispositivo de aquisição da linguagem (DAL) é o responsável por analisar a língua que a criança ouve e apreender suas regras, sendo assim, para Chomsky, as crianças possuem uma habilidade inata para a linguagem. Para defender sua teoria, Chomsky diz que as combinações de palavras são muito numerosas e seria impossível que apenas por meio da imitação as crianças aprendessem todas. O linguista afirma também que muitas vezes os cuidadores não usam frases gramaticalmente corretas para se comunicar com o bebê. Além disso, a teoria do inatismo é sustentada pela capacidade dos recém- nascidos diferenciarem sons similares, indicando que possuem uma espécie de sinalizador especializados nas características da fala. Os inatistas pontuam ainda que as crianças, mesmo sem educação formal, dominam a língua natal na mesma sequência de evoluções. Apesar dessas afirmações, os defensores da concepção inatista não explicam exatamente o que seria esse mecanismo de aquisição inata da linguagem e não esclarecem por que umas crianças adquirem a linguagem com mais rapidez que outras. Tanto o inatismo como a teoria da aprendizagem são utilizados para explicar o processo do desenvolvimento da linguagem de sinais em crianças surdas, que é estruturada de forma semelhante e possui uma sequência parecida com a da linguagem falada. Bebês surdos parecem imitar a linguagem de sinais utilizada por pais igualmente surdos e fazem o que chamamos de balbucio manual, que são gestos inicialmente sem sentidos, mas que vão formando padrões e posteriormente passam a ter significados claros. Atualmente, a maioria dos cientistas do desenvolvimento defende que na linguagem, assim como em outros aspectos do desenvolvimento, tanto a genética quanto o ambiente influenciam o aprendizado da criança, afirmando que provavelmente os bebês que ouvem e os bebês surdos possuem um aparelho inato para o desenvolvimento da linguagem mas que o ambiente e a atenção parental é essencial para que o aprendizado aconteça da melhor forma. Contudo, não são apenas essas as influências sofridas pelo desenvolvimento da linguagem, que, por ser um processo complexo, envolve muitas outra interferências. Influências no desenvolvimento inicial da linguagem Muitos são os motivos para a criança desenvolver a linguagem com maior rapidez, adquirir um vocabulário maior e ser capaz de formar sentenças com maior facilidade. Entre as influências neurológicas, está o desenvolvimento do cérebro, processo intimamente ligado à fala e às maneiras precedentes de comunicação. O choro, que vimos ser a primeira forma de comunicação, é controlado pelo tronco encefálico e pela ponte, partes do cérebro que se desenvolvem primeiro. Estudos de imageamento e escaneamento do cérebro apontam que o desenvolvimento da linguagem afetam ativamente as vias neurais. Além disso, as regiões corticais associadas à linguagem continuam se desenvolvendo até pelo menos os últimos anos da pré-escola, podendo se estender até a fase adulta. Outra influência importante de ser destacada é a interação social, principalmente com os pais e outros cuidadores, uma vez que a linguagem é um mecanismo social e apenas os desenvolvimentos cognitivos não são capazes de formar uma criança com plena capacidade de se comunicar pela fala. O contato social é de extrema importância pois as crianças necessitam de um locutor vivo, ou seja, nenhum outro tipo de interação, seja ela por qualquer tipo de mídia, substitui o contato face a face. Alguns estudos apontam que bebês não conseguem aprender novas palavras se ela for ensinada apenas pela televisão. Porém, quando se trata de crianças mais velhas, essas habilidades parecem estar mais desenvolvidas, mas, ainda assim, não substituem a interação social. A idade dos cuidadores, a forma como eles interagem com a criança, os métodos de comunicação que utilizam, o nascimento da criança e a escolaridade são fatores ligados a interação que podem interferir no desenvolvimento da linguagem da criança. No período do balbucio, o bebê tende a imitar os pais e ir aprimorando a vocalização e, nesse período é importante que os cuidadores também imitem a criança, para reforçar o comportamento de imitação e ajudá-la a ter a experiência social da fala. Já durante o desenvolvimento do vocabulário, os cuidadores devem repetir a palavra dita pelo bebê de forma correta, estimulando-o a pronunciá-la da maneira correta, melhorando assim, o vocabulário. Nessa fase, o grau de instrução dos cuidadores pode fazer alguma diferença, já que cuidadores mais escolarizados provavelmente terão um vocabulário mais extenso. Entretanto, mais importante do que a extensão do vocabulário, é a sensibilidade e a responsividade dos pais, visto que essas duas virtudes estimulam o desenvolvimento cognitivo da criança. Bebês que crescem em lares bilíngues tendem a alcançar níveis semelhantes nas duas línguas e são capazes de realizar troca de código (trocar de uma língua para outra para falar com pessoas diferentes) e as vezes realizam mistura de códigos, ato de usar na mesma expressão elementos de ambas as línguas. Outra questão importante que tem influência no desenvolvimento linguístico da criança é a fala dirigida à criança (FDC), que é uma espécie de “idioma especial” para falar com bebês e que muitos adultos fazem naturalmente, tornando a voz mais aguda e puxando mais as vogais. Muitos pesquisadores acreditam que a FDC ajuda a criança a desenvolver sua língua nativa ou pelo menos direcionar-se mais rápido a ela. Conclusão Como é possível assimilar a partir deste texto, o desenvolvimento da linguagem não é um processo simples e os primeiro três anos de vida são importantíssimos para que as etapas ocorram da melhor maneira possível. A sequência de evoluções do bebê precisa ser acompanhada e otimizada pelos cuidadores, já que estes possuem papel crucial para que a criança possua futuramente um vocabulário extenso e seja capaz de formar frases corretamente. Referência Papalia, D. E., & Feldman, R. D. (2013). Desenvolvimento humano. Artmed editora.
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