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0 - Políticas Públicas, Gestão e Desenvolvimento Territorial ‘ A geografia do Pará em múltiplas perspectivas - 1 Coordenadores Rosângela Aparecida de Medeiros Hespanhol Everaldo Santos Melazzo Organizadores Antonio Cezar Leal Carlos Alexandre Leão Bordalo João Osvaldo Rodrigues Nunes Colaboradora Leonice Seolin Dias A GEOGRAFIA DO PARÁ EM MÚLTIPLAS PERSPECTIVAS Políticas Públicas, Gestão e Desenvolvimento Territorial 1a edição TUPÃ-SP ANAP 2017 2 - Políticas Públicas, Gestão e Desenvolvimento Territorial Editora ANAP - Associação Amigos da Natureza da Alta Paulista Pessoa de Direito Privado Sem Fins Lucrativos Fundada em 14 de setembro de 2003 Rua Bolívia, nº 88, Jardim América, Cidade de Tupã, Estado de São Paulo. CEP 17.605-310 www.editoraanap.org.br www.amigosdanatureza.org.br editora@amigosdanatureza.org.br Revisor ortográfico - Maurício Dias Marques Editoração e diagramação - Leonice Seolin Dias; Sandra Medina Benini Capa: Vila da Barca, Belém-PA. Autor: José Queiroz Miranda Neto (2008). FICHA CATALOGRÁFICA G298 A geografia do Pará em múltiplas perspectivas: políticas públicas, gestão e desenvolvimento territorial [recurso eletrônico] / coordenadores Rosângela Aparecida de Medeiros Hespanhol, Everaldo Santos Melazzo; organizadores Antonio Cezar Leal, Carlos Alexandre Leão Bordalo, João Osvaldo Rodrigues Nunes; colaboradora Leonice Seolin Dias - Tupã: ANAP, 2017 228 p; il.; 14.8x21cm ISBN: 978-85-68242-63-6 1. Políticas públicas. 2. Gestão. 3. Desenvolvimento territorial. 4. Estado do Pará. I. Hespanhol, Rosângela Aparecida de Medeiros. II. Melazzo, Everaldo Santos. III. Leal, Antonio Cezar. IV. Bordalo, Carlos Alexandre Leão. V. Nunes, João Osvaldo Rodrigues. VI. Dias, Leonice Seolin. VII. Título. Ficha catalográfica elaborada pela Seção Técnica de Aquisição e Tratamento da Informação - Diretoria Técnica de Biblioteca e Documentação - UNESP, Campus de Presidente Prudente Alessandra Kuba Oshiro Assunção - CRB-8/9013 Índice para catálogo sistemático Brasil: Geografia A geografia do Pará em múltiplas perspectivas - 3 Coordenadores e Organizadores Coordenadores Rosângela Aparecida de Medeiros Hespanhol Docente da Faculdade de Ciências e Tecnologia da UNESP, Campus de Presidente Prudente; coordenadora do GEDRA e bolsista produtividade (PQ) do CNPq. Possui mestrado e doutorado em Geografia pela UNESP de Rio Claro e pós-doutorado pelo Centre de Recherche sur le Brèsil Contemporain (CRBC) da Ècole des Hautes Études en Sciences Sociales (EHESS) de Paris – França. Atua nas áreas de Geografia Humana e Agrária. Endereço eletrônico para contato: rosangel@fct.unesp.br Everaldo Santos Melazzo Economista pela Universidade Federal de Uberlândia - MG. Doutor em Geografia pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho e Mestre em Planejamento Urbano e Regional pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Bolsista Produtividade do CNPq -2. É professor da Universidade Estadual Paulista - Unesp em Presidente Prudente- SP, junto ao Departamento de Planejamento, Urbanismo e Ambiente e docente do Programa de Pós-Graduação em Geografia. Membro do Conselho Fiscal da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Geografia. Atualmente coordena o Programa de Pós-Graduação em Geografia acadêmico da FCT/Unesp. Organizadores Antonio Cezar Leal Geógrafo, com especialização em Ensino de Geociências, Mestre em Geociências e Meio ambiente e Doutor em Geociências. Professor nos cursos de graduação em Geografia, Engenharia Ambiental e Arquitetura e Urbanismo e dos Programas de Pós-Graduação em Geografia (Acadêmico e Mestrado Profissional) da Faculdade de Ciências e Tecnologia/Universidade Estadual Paulista - Campus de Presidente Prudente. Coordenador do Grupo de Pesquisa Gestão ambiental e Dinâmica Socioespacial - GADIS, com projetos de pesquisa e de extensão universitária sobre gerenciamento de recursos hídricos e gerenciamento integrado de resíduos sólidos urbanos, realizados com apoio do CNPq, CAPES, FEHIDRO e FAPESP. Pesquisador do CNPq e representante da UNESP em colegiados do sistema de gerenciamento de recursos hídricos. Carlos Alexandre Leão Bordalo Geógrafo pela Universidade Federal do Pará, bacharel em Geografia pela Universidade Federal do Pará, especialização em Gestão Ambiental pela Universidade Federal do Pará, mestrado em Geografia pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, e doutorado em Desenvolvimento Sustentável do Trópico Úmido pela Universidade Federal do Pará. Atualmente é professor adjunto da Universidade Federal do Pará, diretor da Faculdade de Geografia e Cartografia - FGC/UFPA, professor adjunto do Programa de Pós-Graduação em Geografia - PPGEO/UFPA, professor colaborador da pós-graduação do Núcleo de Meio Ambiente - NUMA/UFPA, professor colaborador da pós-graduação da Faculdade Integrada Brasil Amazônia 0 FIBRA Joao Osvaldo Rodrigues Nunes Geógrafo pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1990), doutorado em Geografia pela Universidade Estadual Júlio de Mesquita Filho (2002), Pós-doutorado pela Universidade de Alicante, Espanha (2008-2009) e Livre Docência em Geografia Física pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2014). Atualmente é Professor Adjunto do Departamento de Geografia da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP/FCT), sendo Bolsista de Produtividade em Pesquisa 2 do CNPq. Orientador de mestrado e doutorado no Programa de Pós- graduação em Geografia da UNESP/FCT (CAPES-nota 7). Tem experiência na área de Geografia Física, com ênfase em Geomorfologia, atuando principalmente nos seguintes temas: Geomorfologia, mapeamento geomorfológico, erosão, depósitos tcnogênicos e Ambiente. 4 - Políticas Públicas, Gestão e Desenvolvimento Territorial A geografia do Pará em múltiplas perspectivas - 5 Conselho Editorial Interdisciplinar Profª Drª Alba Regina Azevedo Arana – UNOESTE Prof. Dr. Alexandre Carneiro da Silva Prof. Dr. Alexandre França Tetto – UFPR Prof. Dr. Alexandre Sylvio Vieira da Costa – UFVJM Prof. Dr. Alfredo Zenen Dominguez González – UNEMAT Profª Drª Alina Gonçalves Santiago – UFSC – UFV Profª Drª Aline Werneck Barbosa de Carvalho Profª Drª Ana Klaudia de Almeida Viana Perdigão – UFPA Profª Drª Ana Lúcia Reis Melo Fernandes da Costa – IFAC Profª Drª Ana Paula Santos de Melo Fiori – IFAL Prof. Dr. André de Souza Silva – UNISINOS Profª Drª Andrea Holz Pfutzenreuter – UFSC Prof. Dr. Antonio Fábio Sabbá Guimarães Vieira – UFAM Prof. Dr. Antonio Marcos dos Santos – UPE Profª Drª Arlete Maria Francisco – FCT/UNP Profª Drª Beatriz Ribeiro Soares – UFU Prof. Dr. Carlos Andrés Hernández Arriagada – Prof. Dr. Carlos de Castro Neves Neto –UNESP/PP Profª Drª Carmem Silvia Maluf – Uniube Profª Drª Célia Regina Moretti Meirelles – UPM Prof. Dr. Cesar Fabiano Fioriti – FCT/UNESP Prof. Dr. Cledimar Rogério Lourenzi – UFSC Prof. Dr. Crescencio L. Calva Alejo – Pesquisador/México Profª Drª Cristiane Miranda Martins – IFTO Profª Drª Daniela de Souza Onça – FAED/UESC Profª Drª Denise Antonucci – UPM Profª Drª Diana da Cruz Fagundes Bueno – UNITAU Prof. Dr. Edson L. Ribeiro – Unieuro –Ministério das Cidades- BR Profª Drª Eliana Corrêa Aguirre de Mattos – UNICAMP Profª Drª Eloisa Carvalho de Araujo – UFF Profª Drª Eneida de Almeida – USJT Prof. Dr. Erich Kellner – UFSCar Profª Drª Fátima Aparecida da SIlva Iocca – UNEMAT Prof. Dr. Felippe Pessoa de Melo – Centro Universitário AGES Profª Drª Fernanda Silva Graciani – UFGD Profª Drª Flávia Akemi Ikuta – UMS Profª Drª Flávia Maria de Moura Santos – UFMT Prof. Dr. Francisco Fransualdode Azevedo – UFRN Prof. Dr. Francisco Marques Cardozo Júnior – UESPI Prof. Dr. Frederico Braida Rodrigues de Paula – UFJF Prof. Dr. Frederico Canuto – UFMG Prof. Dr. Frederico Yuri Hanai – UFSCar Profª Drª Gelze Serrat de Souza Campos Rodrigues – UFU Prof. Dr. Generoso De Angelis Neto – UEM Prof. Dr. Geraldino Carneiro de Araújo – UFMS Prof. Dr. Gerardo Bernache Pérez – CIESAS – México Prof. Dr. Glauco de Paula Cocozza – UFU Profª Drª Isabel Cristina Moroz Caccia Gouveia – FCT/UNESP Prof. Dr. João Cândido André da Silva Neto – UEA Prof. Dr. João Carlos Nucci – UFPR Prof. Dr. João Roberto Gomes de Faria – FAAC/UNESP Prof. Dr. José Aparecido dos Santos – FAI Prof. Dr. José M. Mateo Rodriguez – Univ. de Havana – Cuba Prof. Dr. José Sobreiro Flho – UFPA Prof. Dr. Josep Muntañola Thornberg – UPC/Barcelona, Espanha Profª Drª Josinês Barbosa Rabelo – UFPE Profª Drª Jovanka Baracuhy Cavalcanti Scocuglia – UFPB Profª Drª Juliana Heloisa Pinê Américo-Pinheiro – FEA Prof. Dr. Júnior Ruiz Garcia – UFPR Profª Drª Karin Schwabe Meneguetti – UEM Profª Drª Leda Correia Pedro Miyazaki – UFU Profª Drª Lidia Maria de Almeida Plicas – IBILCE/UNESP Profª Drª Lisiane Ilha Librelotto – UFS Profª Drª Luciana Ferreira Leal – FACCAT Profª Drª Luciana Márcia Gonçalves – UFSCar Prof. Dr. Marcelo Campos – FCE/UNESP Prof. Dr. Marcelo Real Prado – UTFPR Profª Drª Maria José Martinelli Silva Calixto – UFGD Profª Drª Márcia Eliane Silva Carvalho – UFS Profª Drª Marcia Aparecida da Silva Pimentel – UFPA Prof. Dr. Márcio José Catelan –UNESP/PP Prof. Dr.Marcio Douglas Brito Amaral – UFPA Profª Drª Margareth de Castro Afeche Pimenta – UFSC Profª Drª Maria Ângela Dias – UFRJ Profª Drª Maria Ângela Pereira de Castro e Silva Bortolucci – IAU Profª Drª Maria José M. Silva Calixto – UFGD Profª Drª Maria Augusta Justi Pisani – UPM Profª Drª Maria Betânia M. Amador – UPE – Campus Garanhuns Profª Drª María Glória F. Rodríguez – IEA/Cienfuegos – Cuba Profª Drª Maria Helena Pereira Mirante – UNOESTE Profª Drª Maria José Neto – UFMS Profª Drª Maristela Gonçalves Giassi – UNESC Profª Drª Marta Cristina de Jesus Albuquerque Nogueira – UFMT Profª Drª Martha Priscila Bezerra Pereira – UFCG Prof. Dr. Maurício Lamano Ferreira – UNINOVE Profª Drª Natacha Cíntia Regina Aleixo – UEA Prof. Dr. Natalino Perovano Filho – UESB Prof. Dr. Nilton Ricoy Torres – FAU/USP Profª Drª Olivia de Campos Maia Pereira – EESC – USP Profª Drª Onilda Gomes Bezerra – UFPE Prof. Dr. Paulo Cesar Rocha – FCT/UNESP 6 - Políticas Públicas, Gestão e Desenvolvimento Territorial Profª Drª Gianna Melo Barbirato – UFAL Prof. Dr. Ricardo Toshio Fujihara – UFSCar Profª Drª Risete Maria Queiroz Leao Braga – UFPA Prof. Dr. Rodrigo Simão Camacho – UFGD Prof. Dr. Rodrigo Barchi – UNISO Prof. Dr. Rodrigo Gonçalves dos Santos – UFSC Prof. Dr. Rodrigo José Pisani – UNIFAL-MG Prof. Dr. Ronaldo Rodrigues Araujo – UFMA Prof. Dr. Salvador Carpi Júnior – UNICAMP Prof. Dr. Sérgio Augusto Mello da Silva – FEIS/UNESP Prof. Dr. Renan Antônio da Silva – UNESP – IBRC Prof. Dr. Ricardo de Sampaio Dagnino – UNICAMP Prof. Dr. Sergio Luis de Carvalho – FEIS/UNESP Profª Drª Sílvia Carla da Silva André – UFSCar Profª Drª Silvia Mikami G. Pina – Unicamp Profª Drª Simone Valaski – UFPR Profª Drª Tânia Paula da Silva – UNEMAT Prof. Dr. Vilmar Alves Pereira – FURG Prof. Dr. Vitor Corrêa de Mattos Barretto – FCAE/UNESP Prof. Dr. Xisto Serafim de Santana de Souza Júnior – UFCG A geografia do Pará em múltiplas perspectivas - 7 Sumário Prefácio 09 Apresentação 13 Capítulo 1 AGENTES, PROCESSOS E DINÂMICAS ESPACIAS: o papel da Usina Hidrelétrica Belo Monte como evento na reestruturação da cidade de Altamira José Queiroz de Miranda Neto; Eliseu Savério Sposito 17 Capítulo 2 PRECEDENTES E INTERESSES ENVOLVIDOS NA TERRITORIALIZAÇÃO DO SETOR ENERGÉTICO NA AMAZÔNIA E NO PROJETO DA UHE BELO MONTE Ivana de Oliveira Gomes e Silva; Antonio Thomaz Jr. 41 Capítulo 3 GRANDES OBJETOS NA AMAZÔNIA: os impactos da Hidrelétrica de Belo Monte às escalas da vida. Marcel Ribeiro Padilha; Arthur Magon Whitacker 67 Capítulo 4 A PRODUÇÃO DE LEO DE PALMA A PARTIR DA SUBORDINAÇÃO DE TERRIT RIOS CAMPONESES EM ASSENTAMENTOS DE RE ORMA AGR RIA NA AMAZÔNIA Adolfo da Costa Oliveira Neto; Bernardo Mançano Fernandes 99 Capítulo 5 AS POLÍTICAS PÚBLICAS E OS LIMITES DA REGIONALIZAÇÃO DO TURISMO NO ESTADO DO PAR Hugo Rogério Hage Serra; Antonio Nivaldo Hespanhol 125 Capítulo 6 POLÍTICAS PÚBLICAS DE TURISMO NA AMAZÔNIA: UMA AN LISE SOBRE OS MUNICÍPIOS DE CAMET E SANTARÉM NO ESTADO DO PAR José Carlos da Silva Cordovil; Rosângela Custódio Cortez Thomaz 153 Capítulo 7 AN LISE DA GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS NA BACIA HIDROGR ICA DO RIO CAETÉ/ PAR – BRASIL Francisco Emerson Vale Costa; Antonio Cezar Leal 181 Capítulo 8 (DES) CAMINHOS DA GESTÃO DOS RESÍDUOS S LIDOS URBANOS NO MUNICÍPIO DE BARCARENA – PAR (1897-2017) Antônio de Pádua de Mesquita dos Santos Brasil; José Tadeu Garcia Tommaselli 207 8 - Políticas Públicas, Gestão e Desenvolvimento Territorial A geografia do Pará em múltiplas perspectivas - 9 Prefácio Joao Marcio Palheta1 “A Geografia do Pará em Múltiplas Perspectivas: políticas públicas, gestão e desenvolvimento territorial” é o título deste livro, coordenado e organizado por Rosângela Aparecida de Medeiros Hespanhol, Everaldo Santos Melazzo, Antônio Cezar Leal, Carlos Alexandre Leão Bordalo e João Osvaldo Rodrigues Nunes, professores/pesquisadores que tornaram possível a parceria CAPES/UNESP/UFPA/UEPA durante o Doutorado Interinstitucional, trazendo aqui importantes resultados das teses dos discentes com seus respectivos orientadores que fizeram a ponte aérea Belém – Presidente Prudente/SP. A parceria que se consolida neste livro, vem sendo construída há tempos entre os professores da Faculdade de Geografia e Cartografia e do Programa de Pós-Graduação em Geografia da UFPA/Belém e do Programa de Pós Graduação em Geografia da FCT/UNESP, campus Presidente Prudente-SP. As distâncias geográficas foram superadas pela parceria e pelo caminho das pesquisas, estes, por sua vez, transformados em capítulos que fazem parte deste belíssimo livro que reúne importantes temas e pesquisadores das duas instituições; dividido em oito cenários que fundamentam o resultado das pesquisas desenvolvidas pelos autores, analisando o espaço geográfico da Amazônia Paraense em diferentes processos e escalas. Esses percursos geográficos começam pelos Agentes, Processos e Dinâmicas Espaciais: o papel da Usina Hidrelétrica Belo Monte como evento na reestruturação da cidade de Altamira, de autoria de José Queiroz de Miranda Neto e Eliseu Savério Sposito, analisando o resultado de grandes empreendimentos que provocam no espaço geográfico amazônico diferentes territorialidades e impactos de natureza distinta, como ressaltam os autores ao destacar a ideia central do capítulo: “articular a noção de ‘evento’ apresentada por Santos (2014) com os efeitos produzidos na cidade de Altamira a partir de 2010, considerando o momento em que as ações 1 Graduado em Licenciatura e Bacharel em Geografia pela Universidade Federal do Pará, Mestrado em Planejamento doDesenvolvimento pela Universidade Federal do Pará/NAEA e Doutorado em Geografia pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho/Faculdade de Ciências e Tecnologia (FCT/UNESP) de Presidente Prudente-SP. Atualmente é professor Associado II da Universidade Federal do Pará, pertencente à Faculdadede Geografia e Cartografia e Coordenador do Programa de Pós-graduação em Geografia- UFPA. E-mail: jmarciopalheta@uol.com.br. 10 - Políticas Públicas, Gestão e Desenvolvimento Territorial direcionadas à construção de Belo Monte tornam-se mais evidentes”. Seguindo os cenários pelos Precedentes e Interesses Envolvidos na Territorialização do Setor Energético na Amazônia e no Projeto da UHE Belo Monte, de autoria de Ivana de Oliveira Gomes e Silva e Antônio Thomaz Jr. Os autores buscam analisar a inserção da Amazônia de “forma particular, considerando as políticas de aproveitamento hidrelétrico dos rios que constituem sua extensa bacia hidrográfica, destacando os conflitos presentes no processo de construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte”, um dos grandes empreendimentos que impactaram as dinâmicas territoriais no espaço geográfico paraense. Continuamos a leitura pelos cenários dos grandes empreendimentos com os autores Marcel Ribeiro Padilha e Arthur Magon Whitacker na sua Análise dos Grandes Objetos na Amazônia: das Velhas Lógicas Hegemônicas às Novas Centralidades Insurgentes, os Impactos da Hidrelétrica de Belo Monte às Escalas da Vida. Os autores explicam que “os impactos, de natureza socioespacial, causados pela construção de grandes empreendimentos, ― os Grandes Projetos, à escala da vida das pessoas há muito localizadas nos espaços onde são implantados estes empreendimentos”, destacando os impactos territoriais na escala da vida na subregião da Transamazônica e Xingu no estado paraense. A leitura segue pelos Territórios Subordinados: Análise da Política de Desenvolvimento Territorial a partir da Produção de Óleo de Palma Pela Agropalma em Assentamentos de Reforma Agrária no Pará, de Adolfo da Costa Oliveira e Bernardo Mançano Fernandes. Neste capítulo os autores analisam o espaço geográfico e seus impactos territoriais a partir do “avanço do cultivo de palma no Brasil para atender à demanda presente no mercado nacional e internacional de óleo de palma aberto pela indústria de agrocombustíveis, farmacêutica, industrial e alimentícia”, tema importante e fundamental para a compreensão das lógicas capitalistas de produção e seu rebatimento no território amazônico. O leitor continuará sua caminhada pela Amazônia Paraense com As Políticas Públicas e os Limites da Regionalização do Turismo no Estado do Pará, dos autores Hugo Rogério Hage Serra e Antônio Nivaldo Hespanhol. Neste capítulo destaca-se a importância das “políticas públicas de turismo no território paraense que foram regionalizadas em seis regiões-polo: Belém, Araguaia-Tocantins, Amazônia-Atlântica, Marajó, Tapajós e Xingu”. Os autores escolheram duas dessas regiões para sua análise: a região-polo de Turismo Belém e região-polo de Turismo Araguaia-Tocantins. A geografia do Pará em múltiplas perspectivas - 11 A leitura do livro volta-se novamente para as políticas públicas de turismo e continua seu caminho pelo capítulo Políticas Públicas de Turismo na Amazônia: Uma Análise Sobre os Municípios de Cametá e Santarém no Estado do Pará, dos autores José Carlos da Silva Cordovil e Rosângela Custódio Cortez Thomaz, dando-se ênfase também para os municípios de Cametá e Santarém. Os rios, de fundamental importância aos povos amazônidas, debatidos em verso e prosa, como as estradas e caminhos das comunidades tradicionais, principalmente, que vivem e sobrevivem das relações com os recursos naturais, voltam a ser foco de análise através das bacias hidrográficas, com a Análise da Gestão dos Recursos Hídricos na Bacia Hidrográfica do Rio Caeté/ Pará – Brasil, autoria de Francisco Emerson Vale Costa e Antônio Cezar Leal, que analisam as políticas públicas voltadas para o sistema de gestão dos recursos hídricos no espaço geográfico paraense, tendo como locus dessa análise a bacia hidrográfica do rio Caeté, uma das mais importantes bacias hidrográficas do espaço geográfico paraense, e a importância da gestão dos recursos hídricos numa região como a Amazônia. O livro termina sua brilhante análise sobre o espaço geográfico do estado paraense com os (Des) Caminhos da Gestão dos Resíduos Sólidos Urbanos no Município de Barcarena – Pará (1897-2017), dos autores Antônio de Pádua de Mesquita dos Santos Brasil e José Tadeu Garcia Tommaselli. Os dois pesquisadores percorrem analiticamente o modelo de gestão de resíduos sólidos urbanos, com ênfase no município de Barcarena, e seus rebatimentos das políticas públicas no território e, assim, analisam o espaço geográfico paraense diante de novos tempos e novas territorialidades no contexto globalizante dos usos dos territórios no cenário internacional, do qual cada parte dessas pesquisas neste livro não deixou de relacionar. Este importante livro para o cenário amazônico paraense, serve para todos os geógrafos comprometidos com as mudanças socioambientais e com uma geografia cada vez mais presente no nosso dia a dia, destacando o todo e suas partes, os espaços e seus territórios, as redes e as suas sociedades, os recursos naturais e seus diferentes usos, dentro de um contexto contemporâneo, de mudanças socioeconômicas e ambientais. Este livro é para ler e aproveitar a leitura geográfica, resultado de uma parceria que continuará forte e responsável, entre as universidades brasileiras, demonstrando que é possível construir a geografia em parceria e com qualidade. 12 - Políticas Públicas, Gestão e Desenvolvimento Territorial Parabéns à UEPA e à UNESP, campus de Presidente Prudente-SP, pelo desafio de aceitar e compartilhar suas experiências e qualidade científico-acadêmica com a Universidade Federal do Pará, que só tem a ganhar com essa parceira. Ótima leitura a todos! A geografia do Pará em múltiplas perspectivas - 13 Apresentação Os textos que compõem o livro “A Geografia do Pará em Múltiplas Perspectivas: políticas públicas, gestão e desenvolvimento territorial” são resultantes do Doutorado Interinstitucional – DINTER, realizado entre a Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Campus de Presidente Prudente, a Universidade Federal do Pará (UFPA) e a Universidade Estadual do Pará (UEPA), com financiamento da CAPES. Os DINTERs visam qualificar os docentes de regiões distantes dos "centros de excelência", a partir da sua participação e titulação nos Programas de Pós-Graduação stricto- sensu em nível de doutorado já consolidados no país. No Estado do Pará, tal necessidade era ainda maior, já que, até 2013, não havia na Região Norte, nenhum curso de pós-graduação em Geografia, em nível de doutorado. Porém, havia na região uma significativa demanda para a qualificação dos docentes que atuavam, sobretudo, nos cursos de Graduação em Geografia da Universidade Federal do Pará e da Universidade Estadual do Pará. Tal demanda tornou-se ainda mais relevante em decorrência da realização de concursos públicos pelas duas instituições nos últimos anos, tendo sido contratado um corpo docente jovem e que atua nas diversas unidades das duas instituições, as quais estão distribuídas em todo o território paraense. A realização deste DINTER em Geografia também se justificou: a) pela afinidade entre os temas das pesquisas dos docentes das duas instituições paraenses com as Linhas de Pesquisa do Programa de Doutorado da instituição promotora, no caso o Programa de Pós-Graduação em Geografia da UNESP, Campus de Presidente Prudente; b) pelo intercâmbio já existente entre alguns docentes que compõem o corpo docente da UFPA, que foram alunos do Programa de Mestrado e Doutorado em Geografia na FCT-UNESP/Presidente Prudente; c) pelos vínculos já existentes entre essas instituições a partir dos Grupos de Pesquisa, sediados na UNESP, que contam coma participação de docentes da instituição receptora, e de Grupos de Pesquisa da UFPA, que contam com a participação de docentes da instituição promotora; d) pelos laços constituídos por meio de eventos, em que docentes da UNESP de Presidente Prudente participaram e colaboraram com as atividades da UFPA e vice-versa. 14 - Políticas Públicas, Gestão e Desenvolvimento Territorial A realização do DINTER poderá contribuir para o fortalecimento e consolidação do Programa de Pós-Graduação em Geografia da UFPA, com novas oportunidades de formação acadêmica para os estudantes e profissionais da região norte do país, seja no mestrado ou com a implantação do curso de doutorado, tendo em vista a titulação dos professores da UFPA e da UEPA. A titulação dos docentes, possibilitada pelo DINTER, certamente reforçará a capacidade de intervenção desses profissionais na realidade regional do Pará e favorecerá o estreitamento dos vínculos das Universidades participantes com a sociedade civil e com os poderes públicos nos níveis municipal, estadual e federal, ampliando ainda mais a importância das instituições por meio das suas atividades de ensino, pesquisa e extensão. Para o Programa de Pós-Graduação em Geografia da FCT/UNESP, esse DINTER também se revestiu de especial importância, em decorrência de ter propiciado a sua atuação mais direta na região amazônica, em especial no Estado do Pará, o que gerou novos temas e reforçou as linhas de pesquisa do programa. Nesse contexto, o DINTER teve como objetivos principais: - Qualificar parte do corpo docente dos cursos de Geografia da UFPA e da UEPA, da capital e do interior do Estado do Pará, contribuindo para o fortalecimento das atividades de pesquisa e para a formação de recursos humanos visando aprimorar o ensino em seus diferentes níveis; - Fortalecer as relações interinstitucionais já existentes entre a Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Estadual Paulista (FCT/UNESP), Campus de Presidente Prudente, como promotora, e as Universidades Federal e Estadual do Pará, como receptoras; - Contribuir para a consolidação dos Grupos de Pesquisa, qualificando a formação docente; - Favorecer para a consolidação do Programa de Pós-Graduação em Geografia (Mestrado) na UFPA junto à CAPES; - Consolidar a interiorização dos cursos de licenciatura e bacharelado em Geografia nos municípios paraenses, tais como Altamira, Marabá, Cametá, entre outros, oferecidos pela UFPA e UEPA; - Aprofundar as pesquisas e reflexões sobre a dinâmica territorial da Região Norte com vistas a verticalizar as análises sobre o desenvolvimento regional sustentável no campo e na cidade, com respeito e valorização da diversidade sociocultural e dos diversos ecossistemas amazônicos; - Fortalecer a relação entre a UFPA e a UEPA, com vista a ampliação das atividades desenvolvidas em parceria, no âmbito do ensino, da pesquisa e da extensão universitária. A geografia do Pará em múltiplas perspectivas - 15 A realização do DINTER em Geografia consolidou a parceria entre os Programas de Pós-Graduação em Geografia da FCT/UNESP, Campus de Presidente Prudente, e da UFPA, e possibilitou a construção de novos vínculos com a UEPA. O Programa de Pós-Graduação em Geografia da FCT-UNESP, dado o caráter abrangente de sua área de concentração (Produção do Espaço Geográfico), pode acolher uma diversidade de temas e problemáticas que estão expressos nos oito (8) textos que compõem este livro. Realizado entre os anos de 2013 e 2017, o referido DINTER envolveu docentes/doutorandos da UFPA e da UEPA e professores do Programa de Pós-graduação em Geografia da UNESP – Campus de Presidente Prudente, muitos dos quais ministraram disciplinas no Estado do Pará e/ou na UNESP, Campus de Presidente Prudente. Além disso, muitos docentes realizaram trabalhos de campo com os docentes/doutorandos sob sua orientação em diversas localidades do Estado do Pará que se constituíam nos recortes territoriais das pesquisas. Os docentes/doutorandos, por sua vez, permaneceram na UNESP, Campus de Presidente Prudente, em diferentes etapas do curso de doutorado para cursar disciplinas e participar dos Seminários de Doutorado oferecidos pelo programa, bem como para se integrarem aos grupos de pesquisa que estruturam o Programa de Pós-Graduação em Geografia, vivenciando, assim, a Universidade e suas atividades acadêmicas. Os textos publicados no livro enfocam, sob diferentes perspectivas teórico- metodológicas, diversos temas realizados à realidade do espaço geográfico amazônico e, em particular, do espaço geográfico paraense que se vinculam a diferentes processos que ocorrem em diversas escalas. Desvendar essa realidade, a partir das contribuições dos autores, é uma das possibilidades proporcionadas pelo DINTER. Esperamos que essa parceria tenha continuidade e seja fortalecida ao longo do tempo para que resulte em novos frutos de boa qualidade, como é o caso desta obra. Os Coordenadores e Organizadores Tupã-SP, 2017. 16 - Políticas Públicas, Gestão e Desenvolvimento Territorial A geografia do Pará em múltiplas perspectivas - 17 Capítulo 1 AGENTES, PROCESSOS E DINÂMICAS ESPACIAIS: o papel da Usina Hidrelétrica Belo Monte como evento na reestruturação da cidade de Altamira José Queiroz de Miranda Neto2; Eliseu Savério Sposito3 INTRODUÇÃO Em processo de construção no rio Xingu, a usina hidrelétrica de Belo Monte é uma obra desenvolvida pelo Governo Federal, com capacidade instalada de 11.233 MW. O conjunto técnico previsto manifesta profundas mudanças na ordem urbana e motiva a mobilização de diferentes sujeitos com vistas a reprodução de suas relações no espaço. A partir de 2010, quando é liberada a licença de instalação4, a cidade de Altamira começa a atravessar um conjunto de alterações significativas em sua estrutura interna, dentre as quais a ampliação da população urbana, a criação de novas infraestruturas, as alterações nas localizações residenciais, a ampliação e a diversificação das atividades no espaço intraurbano. Percebe-se, portanto, uma dinâmica urbana diferenciada por conta da introdução da usina hidrelétrica, marcada sobretudo pela produção de novas espacialidades urbanas. No trabalho em questão, o desafio interposto foi o de reconhecer em que medida os processos desencadeados pelo grande empreendimento apontam para uma reestruturação da cidade (SPOSITO, 2005). A ideia central é articular a noção de “evento” apresentada por Santos (2014) com os efeitos produzidos na cidade de Altamira a partir de 2010, considerando o momento em que as ações direcionadas à construção de Belo Monte tornam-se mais evidentes. 2 Doutor em Geografia (FCT/UNESP) e prof. Adjunto da Universidade Federal do Pará (UFPA). E-mail: essposito@gmail.com 3 Doutor em Geografia (USP) e professor titular da FCT/UNESP – Campus de Presidente Prudente. E-mail: geoneto@msn.com. 4 Licença de Instalação (LI) é o documento liberado pelo IBAMA que autoriza o início da obra ou instalação do empreendimento. O prazo de validade dessa licença é estabelecido pelo cronograma de instalação do projeto ou atividade, não podendo ser superior a seis anos, conforma informação obtida em: https://servicos.ibama.gov.br/index.php/licencas/licenca-de-instalacao >. Acesso em: 15 nov. 2016. 18 - Políticas Públicas, Gestão e Desenvolvimento Territorial Por tratar-se de uma perspectiva de estudo relacionada à ideia de reestruturação, é necessário encontrar os aspectos que se relacionam às propriedades de movimento e de transformação. O exercício proposto neste trabalho consiste, então, em verificar as qualidades individuais das partes que formam o todo (os aspectos que, em conjunto, constituem a cidade)e tentar discernir de que forma estes se alteram no contexto de instalação da usina hidrelétrica. Por esse caminho, será possível identificar se as mudanças processadas a partir da usina hidrelétrica promovem os saltos qualitativos para se relacionar, de fato, com a realidade em estudo ao que se entende por reestruturação da cidade. As fontes de dados utilizadas na execução da pesquisa estão relacionadas aos centros de estudo, pesquisa e informação sobre as cidades no Brasil e às instituições regionais e locais de planejamento, assim como às empresas responsáveis pela elaboração dos Estudos de Impacto Ambiental (EIA) e Plano de execução de projetos locais ligados ao projeto Belo Monte, como a LEME Engenharia e a Norte Energia S.A. A NOÇÃO DE EVENTO E SUA RELAÇÃO COM O FENÔMENO DE REESTRUTURAÇÃO DA CIDADE Como propõe o objetivo deste artigo, pretende-se entender de que maneira um evento de grande magnitude funciona como um fator determinante à reestruturação de uma cidade localizada na Amazônia. Para isso, cabe estabelecer, em princípio, a relação entre a noção de evento apresentada por Santos (2014) e as diferentes abordagens a respeito da reestruturação da cidade, considerando sobretudo os rebatimentos espaciais da transição histórica marcada pela crise do fordismo e pela emergência de uma economia flexível, como designa Harvey (2005a). No que diz respeito ao papel desempenhado pela usina hidrelétrica enquanto fator de transformação, considera-se que esse grande objeto técnico incorpore, em si mesmo, a qualidade de um “evento”. Na definição de Santos (2014, p. 95) um evento é “resultado de um feixe de vetores, conduzidos por um processo, levando uma nova função ao meio preexistente”. No caso em questão, o feixe de vetores corresponderia às ações diversas (normas, acordos e decisões tomadas nas escalas nacional e global) necessárias ao desenvolvimento do grande empreendimento hidrelétrico. Entende-se que esse “feixe de vetores” (SANTOS, 2014) possa constituir um fator determinante para a disseminação de novas lógicas no espaço intraurbano, sobretudo associadas a um momento de transição que envolve a cidade e o urbano na contemporaneidade. A geografia do Pará em múltiplas perspectivas - 19 A respeito desse momento de transição, Harvey (2005b) trata do despontamento de um ajuste espacial que funciona como mecanismo de absorção da superacumulação de capital, uma vez que “promove a produção de novos espaços dentro dos quais a produção capitalista possa prosseguir no teste de novas possibilidades de exploração da força de trabalho” (HARVEY, 2005b, p. 172). Soja (1993), por sua vez, trabalha na perspectiva de uma “reestruturação”, isto é, de “uma ruptura nas tendências seculares e uma mudança em direção a uma ordem e uma configuração significativamente diferente da vida social” (SOJA, 1993, p. 193). Portanto, trata-se de um conjunto de modificações devidamente ancoradas no processo produtivo, porém com rebatimentos que vão para além dos circuitos espaciais da indústria, estendendo-se em toda a cadeia de relações entre a sociedade e o espaço. Ao debater a respeito do conceito de reestruturação, Soja (1993) pondera dois grandes argumentos no seio das ciências sociais: a) aquele baseado em esquemas evolucionistas que sugerem uma passagem inevitável para o progresso; e b) uma visão que “se enquadra entre a reforma parcial e a transformação revolucionária, entre a situação de perfeita normalidade e algo completamente diferente” (SOJA, 1993, p. 194). Partindo deste segundo tipo de análise, o autor defende que mesmo as mudanças mais radicais admitem fragmentos de uma organização da sociedade em período anterior, de modo que a reestruturação não se manifesta como um processo mecânico ou automático. As cidades estão no centro das grandes mudanças na ordem capitalista. Por essa razão, entende-se que a disposição da estrutura espacial na escala da cidade é um fator de importância para identificar os níveis de inserção dos grupos humanos na sociedade global contemporânea. Nas últimas décadas, um debate recorrente é aquele que relaciona os estudos urbanos com o conceito de “reestruturação”, que na perspectiva de Soja (1993) corresponde a uma mudança radical na configuração espacial, com importantes implicações no que tange à configuração da forma urbana. Ao se falar das mudanças na estrutura espacial da cidade capitalista, considera-se uma abordagem que busca evidenciar os modos de produção do espaço centralizando a análise naqueles que detêm o poder social, como os proprietários de terras que agem na gestão de seu próprio patrimônio e as organizações econômicas que utilizam o espaço para suas próprias finalidades (RONCAYOLO, 1982). Nessa perspectiva, a estrutura da cidade modifica-se conforme os interesses e finalidades dos agentes capitalistas que, ao mesmo tempo em que competem entre si, são movidos a agir de acordo com uma lógica tácita que transcende as suas estratégias individuais. 20 - Políticas Públicas, Gestão e Desenvolvimento Territorial No caso do Brasil, alguns estudos recentes desenvolvidos em áreas mais dinâmicas do país também apontam uma reestruturação, trazendo à tona processos diferenciados de usos do solo, de re-localização das atividades empresariais, de novas disposições dos espaços de moradia e suas contradições. As metrópoles são os espaços que mais incorporam essas mudanças, traduzindo-se, dentre outros fenômenos, na “desindustrialização” de algumas áreas pioneiras ao mesmo tempo em que se inserem novas atividades ligadas ao setor terciário. As cidades médias5, por sua vez, também experimentam uma alteração na configuração de seus espaços internos, notadamente a partir de novas relações centro- periferia. Nessa perspectiva, Sposito (2005) identifica três características essenciais nessa mudança: a) o aparecimento de “periferias” no centro (desvalorização das áreas centrais tradicionais) e de “centralidades” na periferia (áreas de concentração de atividades comerciais, shopping centers etc.); b) maior articulação entre cidades de diferentes portes (intensidade de relações na rede urbana); e c) aumento da segmentação socioespacial. Ainda no que diz respeito à reestruturação, Sposito (2005) afirma que essa expressão deve ser “guardada para se fazer referência aos períodos em que é amplo ou profundo o conjunto de mudanças que orienta os processos de estruturação urbana e das cidades” (p. 312). Entende-se que a reestruturação estaria vinculada, assim, às novas lógicas espaciais do capitalismo, que se coadunam aos efeitos da reestruturação produtiva e da emergência de uma economia flexível (Harvey, 2005a) do mundo contemporâneo. Ao referir-se ao caráter de mudança na geografia histórica do capitalismo, Soja (1993) afirma a existência de “uma sequência de reestruturações parciais e seletivas, que não apagam o passado nem destroem as condições estruturais profundas das relações sociais e espaciais capitalistas” (p. 206). Nesse caso, o movimento apresentado por Soja (1993) é de “crise e reestruturação”, de modo que antes de uma reestruturação atual havia outro ciclo de reestruturação em andamento e que, por circunstância da não linearidade do movimento social, acabam por se encontrar na contingência espaço-temporal. A seção a seguir evidencia o cenário caracterizado pelo empreendimento hidrelétrico, que conduz à alteração dos conteúdos sociais tanto na área central quanto no espaço periférico da cidade de Altamira-PA, a exemplo da produção de novos espaços residenciais e outras alterações significativas no espaço intraurbano. 5 Neste trabalho, as cidades médias são concebidas como aquelas que: a) possuem papéis de centralidade bem definidos na rede urbana; b) encontram-se em uma faixa populacional próxima de 100 mil habitantes; ec) situam-se relativamente distantes da área de influência direta de uma metrópole. Cidades de porte médio, por sua vez, são concebidas como as que possuem população entre 100 e 500 mil habitantes, porém não necessariamente precisam cumprir um papel de centralidade determinado em uma rede urbana. As definições aqui expressas estão baseadas no trabalho de Sposito (2005). A geografia do Pará em múltiplas perspectivas - 21 USINA HIDRELÉTRICA E A REESTRUTURAÇÃO DA CIDADE DE ALTAMIRA Nascida a partir da dinâmica econômica e populacional do período áureo da borracha, a cidade de Altamira6 tinha sua dinâmica interna influenciada pela presença do rio Xingu como principal eixo de circulação, configurando uma estrutura urbana disposta de modo similar às demais cidades ribeirinhas amazônicas. Com a ascensão da economia da borracha no início do século XX, desenvolveu-se uma área central onde se localizavam a praça, a igreja, os trapiches das embarcações e os estabelecimentos ligados ao setor terciário (em especial o comércio e os serviços públicos). Nessa mesma área, passou a residir a elite local formada por comerciantes, seringalistas e representantes do Estado. Nos espaços mais afastados desse centro, as residências alteravam o seu padrão construtivo e se confundiam com a paisagem rural, como se registrou para as habitações da Rua Sete de Setembro na década de 1940, denominada de “rua de palha”. Essa pode ser entendida como a disposição inicial da relação centro-preferia em Altamira. As alterações mais significativas nessa estrutura inicial se dão a partir da década de 1970, quando se instala a rodovia Transamazônica e o rio deixa de ser o principal vetor de crescimento da cidade. Tourinho (2011) desenvolveu vários modelos representativos de algumas das principais cidades médias amazônicas no que tange à estrutura espacial interna, tomando como referências os meios de acessibilidade associados a elas, notadamente o rio e a rodovia. Dentre as representações sugeridas pela autora, ressalta-se aquela que compreende “as cidades ribeirinhas que possuem estradas e em que as estradas superam a hidrovia na realização dos fluxos interurbanos” (TOURINHO, 2011, p. 411), que inclui as cidades de Cametá e Altamira. Como a formação inicial de Altamira ocorre atrelada ao rio como eixo de transporte, a nucleação terciária principal (associada ao núcleo histórico) se localiza próxima aos atracadouros de embarcações. O traçado que corresponde à rodovia torna-se, nessa nova lógica, um vetor de expansão da cidade, onde se desenvolve um corredor de comércio e serviços relacionados à estrada e algumas áreas residenciais de média e de baixa renda, porém dispostas de forma descontínua em relação ao eixo inicial de ocupação. Tal representação é importante para se entender que “os rios ainda desempenham algum papel nas dinâmicas socioespaciais locais, mas é pelas rodovias que ocorre a maior intensidade de fluxos interurbanos de pessoas e mercadorias” (TOURINHO, 2011, p. 414). 6 O município de Altamira foi criado a partir da Lei nº 1234, de 06 de novembro de 1911, que também determinou que a Vila de Altamira fosse a sede da recém-criada unidade territorial. 22 - Políticas Públicas, Gestão e Desenvolvimento Territorial Tal como outras cidades de importância no estado do Pará, Altamira também se inseriu de modo periférico no sistema urbano nacional. Com a crise da colonização dirigida, ela desempenhou o papel de absorção dos fluxos populacionais provenientes do campo, gerando uma massa populacional subempregada que passou a morar e trabalhar na cidade, aquilo que Rochefort (1998, p. 37) denominou de “receptáculo das migrações de miséria”. Entre as décadas de 1970 e 1990, a cidade sofreu um incremento de mais de 40 mil habitantes que passaram a reproduzir o modo de habitação ribeirinha nos leitos dos igarapés que adentram ao perímetro urbano. Como consequência, manifesta-se uma expansão acelerada, precária e povoada por lotes urbanos desprovidos de sistemas de saneamento e de abastecimento de água. A paisagem urbana passa a exibir como principal característica o aspecto da pobreza, com áreas dominadas por favelas (baixadas urbanas) e marcadas pela ausência de serviços públicos essenciais. Embora a rodovia Transamazônica tenha sido concluída ainda na década de 1970, este grande objeto técnico vai demonstrar seus efeitos na cidade de Altamira somente a partir da década de 1980, orientando um processo de expansão que segue o seu traçado nas direções nordeste e sudoeste. O eixo rodoviário passa a ser, portanto, o caminho privilegiado para a instalação de novos assentamentos residenciais, bem como a inserção de novas atividades econômicas. Notadamente, os grupos econômicos mais fortes tendem a absorver os terrenos e as instalações mais favoráveis no contexto da cidade, tendo em vista que a relação localização/acessibilidade quase sempre favorece os sujeitos de maior poder aquisitivo. Cabe ressaltar, entretanto, que apenas a rodovia em si não é suficiente para pensar a estruturação interna de Altamira. O fato de se instalarem os novos eixos de transporte não suplanta as centralidades historicamente definidas, sobretudo demarcadas pela força de uma nucleação terciária ainda situada próxima ao rio. Observa-se, assim, a existência de quatro fatores a serem combinados para a seleção das áreas residenciais nesse primeiro momento em Altamira: a) a proximidade em relação à nucleação terciária principal (de preferência contígua, mas não no interior da mesma); b) a proximidade em relação ao rio (em cotas altimétricas não sujeitas à inundação), assim como a existência de localizações “raras” que permitam a vista para o rio; c) a proximidade em relação às vias estruturantes (estradas que interligam o centro às diversas áreas da cidade e para fora dela); e d) a existência de uma infraestrutura mínima no entorno residencial (pavimentação, energia elétrica, saneamento, etc.). A partir do momento em que as populações de alta e média renda passam a ocupar as áreas que reúnem essas condições, os proprietários se valem dos mecanismos de valorização dos terrenos aí situados, A geografia do Pará em múltiplas perspectivas - 23 produzindo artificialmente a escassez. Como resultado, uma parte da população que não consegue adquirir os terrenos nas localizações mais favoráveis é submetida à segregação residencial induzida (SOUZA, 2005) e passa a habitar os leitos dos igarapés Altamira, Ambé e Panelas, em geral em assentamentos precários. No Mapa 1 é possível visualizar a malha urbana do município de Altamira consolidada em 1980, com definição do núcleo principal ao sul do igarapé Altamira e do núcleo secundário ao norte do mesmo igarapé, separados por uma área imprópria para ocupação. Mapa 1. Expansão Urbana de Altamira: 1960 – 2010. Fonte: Miranda Neto, 2016. As áreas classificadas como sujeitas a alagamentos foram ocupadas de forma irregular na década de 1980, formando favelas que se estendiam ao longo dos cursos dos igarapés Altamira e Ambé. As zonas de expansão se dirigiam, especialmente, aos eixos sudeste (Estrada do Panelas e Antigo Aeroporto) e Nordeste (sentido da Transamazônica). Nos anos seguintes, até 1997, a soma de lotes planejados atingia a quantia de 8.166 unidades, que apresentava os loteamentos registrados na Prefeitura de Altamira entre 1976 e 2000. 24 - Políticas Públicas, Gestão e Desenvolvimento Territorial Desde a década de 1980, quando da criação dos loteamentos da Prelazia do Xingu, tem-se uma caracterização semelhante à definida no Mapa 2, com a presença de dois núcleos residenciais separados pelo igarapé Altamira: a) o núcleo principal, que inclui o centro histórico, a área comercial principal e as áreas residenciais mais antigas; e b) o núcleo secundário,situado ao norte do Igarapé Altamira, que inclui uma extensa área residencial e uma área comercial secundária (COSTA, 2013). O Mapa 2 apresenta, também, as áreas de expansão residencial nas direções Norte, Nordeste, Leste, Oeste e Sudoeste, tomando-se como base apenas a expansão registrada até o ano de 2010. Mapa 2. Altamira: Caracterização intraurbana em 2010. Fonte: Miranda Neto, 2016. As áreas de expansão correspondem aos assentamentos criados entre 2000 e 2010, que tomam preferencialmente as direções Norte e Nordeste, mas também se estendem ao Leste, Oeste e Sudoeste. Correspondem, portanto, a loteamentos criados de forma articulada aos principais eixos viários, porém relativamente distantes do centro histórico, como Nova Altamira, Bela Vista e Jardim França. Tem-se, por conseguinte, uma maior periferização urbana, onde se verifica a redução da densidade demográfica de 55,5 para 39,3 habitantes por hectare (COSTA, 2013). A geografia do Pará em múltiplas perspectivas - 25 A oferta dos novos lotes deu-se, por um lado, em decorrência das novas opções de crédito destinadas à população de baixa e média renda em nível nacional, em geral disponibilizadas pela Caixa Econômica Federal e pelo Banco do Brasil. Por outro lado, por conta da perspectiva de instalação dos projetos do PAC para a região, sobretudo o asfaltamento da Transamazônica (iniciado em 2010) e a construção de Belo Monte (licenciada em 2010), criou-se uma imagem de que, com a efetivação desses grandes empreendimentos, os preços dos imóveis e dos aluguéis sofreriam uma intensa valorização. Diante desse cenário, os agentes imobiliários mobilizam uma oferta de 414 lotes ao ano, diferente do período demarcado entre 1976 e 1997, de 388 lotes/ano, manifestando uma ampliação do mercado (COSTA, 2013). Considera-se que entre 2000 e 2010 houve uma certa recuperação econômica que acompanhou a do país. A facilitação do crédito bancário para diversos fins, inclusive de moradia, aliada ao anúncio do asfaltamento da BR-230 (Transamazônica), bem como a existência de movimentos locais em favor da implantação da UHE Belo Monte são fatores importantes a considerar na retomada do crescimento populacional urbano, diante das ações e projetos dos PAC I e II do Governo Federal e das expectativas geradas com relação aos grandes projetos para a microrregião. Apenas nesse período, foram criados 2.902 novos lotes, o que equivale a 35,62% dos trinta anos anteriores (COSTA, 2013), demonstrando a recuperação do mercado local. Esses empreendimentos foram constituídos, em geral, por capitais locais e por proprietários que efetivaram o parcelamento de suas glebas rurais em lotes urbanos com tamanho médio de 250 m² (COSTA, 2013). Trata-se, portanto, da incidência de práticas de valorização do solo urbano, bastante comum em áreas onde se tem uma previsão de ampliação dos fatores que elevam o preço dos terrenos, sobretudo associados à extração das rendas absoluta e/ou de monopólio (HARVEY, 1980). Nesse caso, os lotes urbanos são adquiridos (ou apenas desmembrados de glebas rurais maiores) visando a troca futura com valores elevados em relação ao preço de aquisição, alimentando o ciclo dinheiro-terreno- mercadoria-dinheiro, como descrito por Topalov (1979). Nessa atividade, registra-se a partir de 2007 a atuação da Imobiliária Bacana, uma empresa de pequeno porte sediada em Altamira que atuou na oferta de vários lotes urbanos nos bairros Jardim França e Alberto Soares, incluindo o loteamento conhecido como “Residencial Bacana”, situado próximo à PA-415 com 40 residências voltadas à população de baixa renda. Observa-se que, em um primeiro momento, as estratégias para obtenção da renda do solo se valem da comercialização direta, com ou sem a intermediação bancária, porém não se verifica a ação mais intensa de empresas incorporadoras e de outros grandes promotores imobiliários. 26 - Políticas Públicas, Gestão e Desenvolvimento Territorial Grande parte dos loteamentos desenvolvidos no período não dispõem de uma infraestrutura própria de abastecimento de água, de redes de esgoto e de pavimentação, porém ainda assim abrigam instalações residenciais de padrão médio, como no caso dos loteamentos Altaville e em alguns pontos do bairro Ibiza (Loteamento Don Lorenzo). Nesses casos, os novos proprietários precisam criar suas próprias condições de habitabilidade e saneamento, com a perfuração de poços rasos para obtenção de água, bem como da instalação fossas sépticas e sumidouros para despejo do esgoto residencial. Tal condição deu-se como resultado de uma expansão desigual da infraestrutura urbana, onde as melhorias desencadeadas pelo Estado se concentraram apenas em alguns pontos da cidade. Mais tarde, com o adensamento das áreas residenciais mais antigas, as opções mais acessíveis em termos de preço dos terrenos seriam as novas áreas periféricas, mesmo sem as condições básicas de instalação residencial. Assim, por um lado, a cidade cresce em condições precárias para uma população com nível de renda capaz de criar estruturas para minimizar os problemas de moradia. Por outro lado, as populações de estratos de renda mais baixos e com parcas possibilidades de realizar alterações no ambiente ocupam as áreas menos privilegiadas da cidade, compondo um cenário de elevada pobreza urbana. A Figura 1 apresenta o perfil de algumas casas situadas às margens do Igarapé Ambé, no assentamento popularmente conhecido como “Invasão dos Padres”. Figura 1 – Assentamento “Invasão dos Padres” Fonte: Miranda Neto, 2015. A geografia do Pará em múltiplas perspectivas - 27 Retomando as diferentes fases de crescimento de Altamira desde a década de 1970, o Mapa 3 representa como se dispõem essas camadas concêntricas até o ano de 2014, sendo possível também definir os eixos que orientaram a expansão urbana. Esses dados foram obtidos a partir de trabalho de campo e de várias fontes auxiliares, com destaque às imagens de satélite do Software Google Earth Pro. Mapa 3 – Evolução da Malha Urbana de Altamira entre 1970 e 2014. Fonte: Miranda Neto, 2016. Pela leitura do Mapa 3, observa-se um crescimento estruturado a partir das vias de transporte, seguindo a tendência dos períodos anteriores, em várias direções. O eixo com menor crescimento é o Sul-Sudoeste, que até 2014 ainda possuía o aeroporto como limitação física para expansão, embora já se verificasse uma tendência de ocupação nessa área com a expectativa de ampliação do perímetro urbano por parte da Prefeitura Municipal, sobretudo por conta da instalação do Residencial do Pedral. Verifica-se, também, a maior extensão absoluta da malha urbana entre 2010 e 2014, pautada especialmente pela criação de novos loteamentos urbanos desenvolvidos por empresas incorporadoras. 28 - Políticas Públicas, Gestão e Desenvolvimento Territorial Porém, a cidade não apenas se expandiu enquanto extensão absoluta da malha urbana, uma vez que se percebe uma maior densificação da ocupação a partir da utilização de espaços não ocupados em fases anteriores (glebas rurais com ou sem uso produtivo), principalmente aqueles destinados aos assentamentos da Norte Energia que se encontravam mais próximos às áreas de ocupação já consolidadas da cidade. A densificação ocorre, também, pelo aumento do número de pavimentos, tendência que já havia sido evidenciada em levantamento realizado em 2013, quando se verificou que, de 148 novas construções situadas na cidade, 40% possuem dois pavimentos ou mais (GEDTAM, 2014). Essa verticalização, ainda que não muito expressiva, é mais um fator da intensificação do uso do solo urbano nas áreas centrais, sobretudo para a finalidade comercial. Mas se for considerado o último período de crescimento, entre 2010 e 2014, percebe-se pela primeira vez a existência de áreas com relativa distância em relação aoespaço mais denso da cidade. Com exceção do eixo sul-sudoeste (em direção ao aeroporto), todos os demais eixos de crescimento possuem em suas extremidades pelo menos um loteamento criado no período demarcado após a instalação do empreendimento hidrelétrico. Tal padrão começa a manifestar uma forma de crescimento baseada na existência do transporte individual (automóvel e motocicleta) como meios necessários à população que se desloca frequentemente entre o centro e a periferia da cidade. Essas descontinuidades dos espaços residenciais, entretanto, não são acompanhadas de uma tendência de criação de outros núcleos comerciais. Pelo menos até o final de 2016, percebe-se uma ampliação muito rarefeita de novos espaços de consumo e infraestruturas coletivas (lojas de departamento, praças, novas vias de transporte etc.) para além da nucleação terciária principal, salvo em relação aos pequenos negócios informais (lojas, armarinhos, salões de beleza, minimercados etc.). Essa tendência coaduna com a perspectiva de Whitacker (2010) para o caso de algumas cidades médias como Campina Grande (PB), Passo Fundo (RS) e Guarapuava (PR) “nas quais o centro tradicional ainda possui forte centralidade em vários níveis e para parcelas consideráveis da população, com segmentos distintos” (p. 13). Essa característica mononuclear de Altamira se dá, em especial, por conta de uma expansão recente e pouco consolidada em termos de produção residencial, o que desencoraja os investimentos do mercado na expansão da atividade terciária e do Estado na produção de infraestruturas para além do centro tradicional. A geografia do Pará em múltiplas perspectivas - 29 Como se percebe, a dinâmica imobiliária presente em Altamira antes da construção da usina hidrelétrica já aponta alguns sinais de alteração no período anterior a 2010, mas nem de longe corresponde à quantidade de lotes urbanos criados entre 2010 e 2015. Nesse período, além da ação da Norte Energia através do reassentamento urbano, tem-se a criação de residências do PMCMV (Programa Minha Casa Minha Vida) e a produção de mais de 22 mil lotes conduzidos por empresas incorporadoras. Se somados apenas os espaços criados no período delimitado, estes representam um acréscimo de 1.698 hectares, o que corresponde a mais de 70% da malha urbana medida em 2010, de 2.200 hectares. Tais mudanças são conduzidas por diferentes estratégias que envolvem as políticas do Estado (em especial pela atuação da Prefeitura de Altamira e do Governo Federal), e as ações promocionais conduzidas pelo capital incorporador e por outros agentes privados. Tomando como base a malha urbana atualizada, é possível constatar a presença de novos loteamentos instalados em Altamira entre 2010 e 2015, como descrito no mapa 4. Nele são destacados os assentamentos ligados à atuação das incorporadoras, os residenciais de interesse social do PMCMV, bem como aqueles destinados ao Reassentamento Urbano Coletivo (RUC) da população diretamente atingida pela inundação da barragem na área urbana (Projeto de Reassentamento Urbano). A numeração indica a denominação de cada um dos assentamentos descritos no mapa. Mapa 4 – Loteamentos Urbanos em Altamira – 2015. Fonte: Miranda Neto, 2016. 30 - Políticas Públicas, Gestão e Desenvolvimento Territorial A atividade da incorporação imobiliária é relativamente recente na região amazônica e começou a instalar-se em Altamira somente após 2011, por ocasião do forte deslocamento populacional evidente a partir de então. Acredita-se que a ação das incorporadoras inaugurou uma nova fase para o mercado imobiliário em Altamira, até então dominado por empreendimentos de pouca expressão e geralmente conduzidos por proprietários individuais. De acordo com Smolka (1987) o capital incorporador seria aquele que “desenvolve o espaço geográfico organizando os investimentos privados no ambiente construído, em especial aqueles destinados à produção de habitações” (p. 47). Trata-se de uma atividade que se desdobra em várias frentes, incluindo a compra ou a aquisição de direito sobre os terrenos, a contratação de profissionais especializados nas áreas de planejamento e construção, assim como de corretores responsáveis pela comercialização final do produto. De modo geral, os novos loteamentos privados capitaneados pelas empresas incorporadoras em Altamira possuem as seguintes características: a) são destinados aos extratos de renda mais elevados (em comparação aos loteamentos anteriores a 2010), mas não se pode afirmar que se destinam ao uso exclusivo das famílias de alta renda ; b) apresentam infraestrutura própria, com pavimentação, rede de abastecimento de água, sistemas de saneamento e energia elétrica; c) estão localizados em zonas mais afastadas da área central; d) apresentam tamanho médio de 120 hectares; e e) possuem elevado volume de investimentos, com a presença tanto de capitais locais como externos à região. No caso de Altamira, são poucas as situações em que as empresas atuam na construção de residências. Pelo menos no que se refere aos grandes loteamentos, o produto final é quase sempre o lote urbano em área aberta, dotado das condições infraestruturais necessárias ao funcionamento residencial. Acredita-se que tal estratégia esteja relacionada ao menor tempo necessário à comercialização do produto, ao contrário do que seria se os terrenos fossem dotados de edificações. Essa lógica sugere, então, que o tempo das empresas se relaciona aos estágios de ascensão e declínio das atividades do grande empreendimento hidrelétrico. Desse modo, se os preços dos lotes urbanos dependem de uma valorização futura com o objetivo de se extrair a “renda virtual” (ABRAMO, 1989) ou de se chegar ao “Momento III” na valorização do preço (SMOLKA, 1987), os ganhos podem tornar-se decrescentes caso essa perspectiva seja freada pela decadência esperada ao final das obras de Belo Monte. O capital incorporador valeu-se, portanto, de uma “janela aberta” no momento de maior otimismo em relação ao crescimento da cidade e aos fatores de emprego e renda ainda positivos até meados de 2014. A geografia do Pará em múltiplas perspectivas - 31 O Quadro 1 identifica as incorporadoras em atuação na cidade de Altamira até o final de 2015. Quadro 1 – Incorporadoras que atuam em Altamira até dezembro de 2015. Empresa Loteamento em Altamira N° de Lotes Hectares Direção norte incorporadora Terras de Bonanza 6.615 471 Buriti empreendimentos Imobiliários Cidade Jardim 11.378 382 Nova bairros planejados Cidade Nova 7.000 304 Brasil Desenvolvimento Urbano (BRDU) Viena 2.458 70 Mac Empreendimentos São Francisco 709 32 Bacana Imobiliária Loteamento Bacana 500 37 Fonte: Miranda Neto, 2016. Das seis empresas assinaladas, apenas duas têm origem na cidade de Altamira: a Direção Norte Incorporadora e a Bacana Imobiliária. A primeira pertence ao grupo empresarial iniciado a partir das iniciativas de Maurício Bastazini, cujo capital teve origem em Altamira com base no agronegócio (pecuária bovina), posteriormente estendendo-se para o ramo de veículos (caminhões, automóveis e motocicletas) e, mais recentemente, voltou-se à atividade imobiliária. A Imobiliária Bacana, por sua vez, é o nome fantasia da empresa de pequeno porte LCI - Locação, Construção & Incorporação Bacana Ltda. e atua, desde 2007, em Altamira, com a oferta de residências destinadas às populações de baixa renda e, mais recentemente, de loteamentos urbanos abertos em áreas periféricas. Pelo porte de ambos os empreendimentos, a Direção Norte Incorporadora (do grupo Bastazini) possui maior capacidade de investimentos e já executa empreendimentos em outros lugares do país, como na cidade de Ananás – TO. As demais incorporadoras possuem origem em outras regiões, com destaque aos grupos empresariais do Centro-Oeste (Brasília - DF e Goiânia - GO) e doNorte (Palmas - TO e Parauapebas - PA), ambos com empreendimentos já consolidados em vários estados do Brasil. Como se trata da comercialização de terrenos urbanos, é compreensível que essas empresas estejam em constante mobilidade geográfica pela busca de novos mercados, divisando as regiões Norte e Centro-Oeste como fronteiras de atuação. 32 - Políticas Públicas, Gestão e Desenvolvimento Territorial Por ocasião das mudanças nos instrumentos de ordenamento do solo urbano em Altamira e da penetração incisiva dos novos empreendimentos imobiliários, uma parte importante da população de mais baixa renda viu-se excluída das opções de moradia na cidade, especialmente devido à elevação dos preços dos imóveis e da maior fiscalização em relação ao surgimento de novas áreas de ocupação irregular. Uma das alternativas para garantir a oferta de habitações é a criação de assentamentos planejados do programa MCMV do Governo Federal. Criado em 2009 a partir da política habitacional do Governo Lula (2003-2011), o programa em questão possui faces contraditórias, pois ao mesmo tempo em que inclui alguns segmentos sociais antes pouco evidenciados no contexto imobiliário, também amplia a financeirização do território, favorece a ação dos capitais incorporadores e reforça a segregação urbana existente (ROLNIK, 2016). Em Altamira, dois loteamentos foram planejados após o início das obras de Belo Monte, ambos voltados para a Faixa 1. O primeiro foi contratado no ano de 2010 e entregue no ano de 2012 (residencial Santa Benedita) e o segundo, contratado em 2013, estava com a previsão de ser entregue em 2015 (residencial Ilha do Arapujá), entretanto suas obras se encontram paralisadas pelo fato de o tamanho das residências se encontrar fora das especificações mínimas exigidas pela Caixa Federal. O Quadro 2 descreve os residenciais do programa MCMV em Altamira. Quadro 2 – Empreendimentos do Programa MCMV em Altamira. Informações Residenciais Santa Benedita Ilha do Arapujá Loteamento particular de construção de casas populares com subsídios do Governo Federal, localizado próximo ao Bairro Nova Altamira com distância de 5,5 km da área central, destinado às famílias de faixa 1. Localizado na fronteira entre os municípios de Altamira e Vitória do Xingu, com 8,7 km de distância em relação ao centro. Também é destinado para as famílias de faixa 1, com renda máxima de R$1.600 reais. Empresa Construtora Emcasa LTDA Resecom Construtora LTDA N° de casas 958 1.444 Valores contratados R$ 37.895.012,23 R$ 86.061.723,08 Hectares 28,74 43,32 Conclusão 2012 2015 (embargado) Fonte: Miranda Neto, 2016. A geografia do Pará em múltiplas perspectivas - 33 O residencial Santa Benedita foi construído pela construtora Emcasa LTDA, com origem em Belo Horizonte e atuante em mais 26 empreendimentos do MCMV Faixa 1 nos estados do Pará, Tocantins, Espírito Santo, Minas Gerais, Sergipe e Rio Grande do Sul e já recebeu mais de 829 milhões em contratos desde 2014 (BRASIL, 2016). Com 958 casas, o Santa Benedita foi entregue no ano de 2012 e se encontra plenamente consolidado, ainda que sua estrutura inicial (pavimentação, esgoto e rede de água) se encontre parcialmente deteriorada. O residencial Ilha do Arapujá, por sua vez, é de responsabilidade da Construtora e Incorporadora Resecom LTDA, sediada em Santarém – PA, que também atua em outros empreendimentos do programa MCMV (Faixa 1) nas cidades de Alenquer, Oriximiná e Uruará, ambas no estado do Pará, somando mais de 263 milhões em contratos entre 2010 e 2013 (MINISTÉRIO DAS CIDADES, 2016). A empresa em questão foi contratada em abril de 2013, porém as obras foram marcadas por diversos problemas que impediram a sua continuidade, como a paralização de 180 trabalhadores em janeiro de 2014 em função de problemas salariais e das precárias condições de trabalho. Além disso, houve ocupação do residencial (ainda em construção) em maio de 2015 por cerca de 800 famílias, que chegaram a realizar protestos em frente ao prédio da CAIXA exigindo o enquadramento das famílias ocupantes no programa. Atualmente a obra encontra-se paralisada pela CAIXA devido ao fato de empresa não cumprir com as especificações mínimas do projeto. De acordo com Abramo (2002) a lógica do Estado é aquela em que “a sociedade civil e os indivíduos se submetem a uma decisão do poder público, que assume a responsabilidade de definir a escolha que garanta o maior grau de bem-estar social” (p. 103). Entretanto, no caso em questão a lógica do Estado foi sobrepujada pela lógica do mercado, de modo que as melhores localizações para a instalação residencial foram rapidamente utilizadas por outras empresas incorporadoras ou se encontram reservadas para novos ciclos de valorização do solo urbano. Diante disso, acredita-se que mesmo com a oferta de 2.402 residências pelo programa MCMV, elas terão pouco significado diante da carência habitacional em Altamira que, nos últimos anos, apenas foi ampliada em função da escassez de moradia artificialmente criado pelo mercado. Pelo fato de a cidade de Altamira sofrer os efeitos diretos da inundação da barragem, uma extensa e densamente habitada área urbana de 387 hectares foi modificada pela Norte Energia nas proximidades dos igarapés Altamira, Ambé e Panelas entre 2014 e 2015. No Plano Básico Ambiental do Projeto Hidrelétrico (PBA), as áreas em questão são denominadas de Áreas Diretamente Afetadas Urbanas (ADA Urbana), as quais são classificadas de acordo com o igarapé ao qual se relacionam. 34 - Políticas Públicas, Gestão e Desenvolvimento Territorial A ADA Urbana é formada por espaços residenciais constituídos a partir da década de 1990, que devido à ausência de opções para a população migrante de baixa renda avançaram em direção ao leito dos igarapés, formando as baixadas urbanas7. Grande parte dessas habitações estavam situadas bem próximas à área central da cidade, em ocupações informalmente conhecidas como Baixão do Tufi, Açaizal, Invasão do Padres, Chifre de Ouro, dentre outras. Em levantamento realizado pelo grupo de pesquisa GEDTAM em residências situadas nas imediações dos igarapés Altamira e Ambé antes do processo de desapropriação, constatou-se que uma parte importante da população residente (em torno de 53,8%) trabalhava no setor terciário, destacando-se profissões como doméstica, comerciante, auxiliar de serviços gerais, vigilante e pedreiro (GEDTAM, 2014). Percebe-se, então, que havia uma relação direta entre a localização das habitações e o tipo de ocupação dos residentes, com atividades ligadas aos setores de comércio e serviços proeminentes na área central da cidade. As famílias que optaram pela indenização em forma de reassentamento foram remanejadas para os novos loteamentos urbanos planejados e construídos pela Norte Energia, os quais são denominados de Reassentamentos Urbanos Coletivos (RUC). A Tabela 1 apresenta algumas características dos RUC e também da Vila Residencial de Trabalhadores. Tabela 1 – Áreas de reassentamento urbano coletivo (RUC). RUC N° de Lotes (Estimativo) Residenciais RUC Vila Residencial Jatobá 1244 1230 14 São Joaquim 1038 932 106 Casa Nova 452 452 - Água Azul 806 806 - Laranjeiras 599 599 - TOTAL 4139 4029 120 Fonte: Norte Energia, 2014. Por essa configuração, a população que se encontrava na ADA do Igarapé Ambé foi reassentada nas RUC Jatobá e Água Azul e aqueles que residiam na ADA do Igarapé Altamira foram transferidos para as RUC São Joaquim e Casa Nova. Os habitantes que residiam na ADA do Igarapé Panelas, por sua vez, se deslocaram para a RUC Laranjeiras. A Tabela 2 define as distâncias da ADA Urbana e das RUC em relação à área central da cidade. 7 Trata-se de uma forma de ocupação que reproduz o padrão construtivo das palafitas ribeirinhas.Porém, no ambiente urbano prevalece a alta densidade habitacional os fatores que permitem caracterizar esses assentamentos como precários e “associados à pobreza e às diversas estratégias de reprodução social nas periferias da cidade” (RODRIGUES et al, 2013, p. 2). A geografia do Pará em múltiplas perspectivas - 35 Tabela 2 – Distâncias em relação à Área Central – ADA e RUC. ADA (origem) Distância da área central (km) RUC (destino) Distância da área central (Km) Variação (km) Ambé 2,7 Jatobá 3,5 0,8 Água azul 5,4 2,7 Altamira 0,79 Casa Nova 3,9 3,2 São Joaquim 2,4 1,7 Panelas 3,2 Laranjeiras 5,2 2,0 Orla 1,6 Laranjeiras 5,2 3,2 MÉDIA 2,07 4,0 2,2 Fonte: Trabalho de Campo e levantamento cartográfico. Organização: Autores, 2016. Como argumenta Harvey (1980), “as mudanças na forma espacial da cidade e nos processos sociais, que operam na cidade, provocam mudanças na renda do indivíduo” (p. 42). Desse modo, com a alteração dos locais de residência dos habitantes da ADA Urbana para áreas afastadas do centro da cidade, é possível avaliar um relativo prejuízo para aqueles que são desprovidos de veículo particular. Como grande parte dos reassentados é representada por trabalhadores do terciário (GEDTAM, 2014), a ampliação das distâncias pode interferir diretamente no custo do deslocamento para a área central e, igualmente, no tempo de trabalho em relação ao tempo de vida. Outro fator a ser considerado é a ampliação dos custos da nova residência, a exemplo dos valores relativos ao consumo de energia, já que na ADA Urbana as ligações elétricas eram, em sua maioria, clandestinas e essas despesas não impactavam diretamente na renda dos indivíduos. Como veiculou o Jornal Estadão em abril de 2016 “a conta de luz virou uma dor de cabeça para os moradores, que preferem vender os imóveis novos e procurar algo mais em conta, ou até voltar para um barraco” (ESTADÃO, 02/03/2016). Essa realidade escancara, mais uma vez, a face da desigualdade social na cidade, pois apesar de as residências possuírem melhores condições de habitabilidade, os rendimentos familiares e as suas condições de trabalho e emprego permanecem as mesmas. Ademais, os custos relacionados à moradia são ampliados por conta das faturas de energia, água, IPTU etc. que devem ser arcadas pelos moradores. Como um processo associado à reprodução da vida, resta então a decisão de se desfazer do imóvel do RUC, adquirir outro terreno (possivelmente em área irregular) e utilizar o valor restante para suprir, pelo menos por algum tempo, as despesas familiares. Com a apresentação desse último componente, é possível se chegar a uma síntese das principais transformações na cidade de Altamira após a instalação da usina hidrelétrica de Belo Monte. No Quadro 3, foram selecionados alguns itens necessários para exemplificar como a cidade se configurava em momento anterior e como se configura atualmente. 36 - Políticas Públicas, Gestão e Desenvolvimento Territorial Quadro 1 – Resumo das transformações no espaço intraurbano de Altamira. Característica Antes de Belo Monte Depois de Belo Monte (entre 2010 e 2016) População urbana Apesar do crescimento acelerado típico das cidades médias e da alta taxa de urbanização, havia uma tendência de redução nos incrementos médios anuais da população urbana, resultado da diminuição das migrações rural- urbanas. Embora não se tenha uma avaliação estatística oficial, entre 2010 e 2014 se registrou, segundo estimativa da Prefeitura Municipal, um crescimento aproximado de 65% da população urbana. Como é típico dos projetos hidrelétricos no Brasil, parte dessa população continua residindo no espaço urbano. Expansão territorial urbana Pela avaliação do crescimento da cidade (extensão absoluta) desde 1970, percebe-se que, apesar de ter havido um crescimento maior entre 1970 e 1980, as demais fases de crescimento são regulares. Registra-se a maior expansão urbana da história de Altamira, com significativa ampliação do perímetro urbano, multiplicação de grandes loteamentos planejados e densificação da ocupação. Loteamentos urbanos Prevalência de loteamentos irregulares ou planejados de forma precária, sem as condições de infraestruturas exigidas pela regulamentação nacional. Com a regulamentação dos novos instrumentos de ordenamento urbano e a maior regulamentação do uso do solo, os novos loteamentos passaram a conter os itens exigidos na regulamentação nacional (sistemas de água, esgoto e terraplanagem). Os valores dos terrenos, entretanto, se tornam elevados em comparação ao momento anterior. Mercado imobiliário Baseado em capitais locais, sem grandes investimentos de infraestrutura ou marketing. A maioria dos loteamentos não possuía muitas unidades e os preços eram mais acessíveis à população de mais baixa renda. Capitaneados por empresas incorporadoras, os novos produtos imobiliários são baseados em capitais locais, regionais e nacionais, com investimento em infraestrutura e marketing. O volume de lotes é grande e os preços atendem especialmente à classe média, ainda que não se verifique a intermediação financeira direta. Padrão construtivo das residências Em áreas situadas junto aos leitos dos igarapés ainda prevaleciam as habitações do tipo “ribeirinha”, com casas em palafitas e acessos improvisados a partir de pontes de madeira (estivas). As condições de habitabilidades se faziam precárias. Promove-se a remoção quase completa da habitação ribeirinha em função do reassentamento. Com isso, o padrão habitacional dominante passa a ser de alvenaria em terra firme. Há a melhoria das condições de habitabilidade no interior das residências e em seu entorno, embora prevaleçam as condições precárias em alguns focos de ocupação irregular. Localizações da habitação e desigualdades espaciais Pela relação entre a localização das habitações e os estratos de renda, percebe-se uma heterogeneidade nas localizações habitacionais, sem prevalência de zonas de alto padrão ou áreas de autossegregação residencial. Com a remoção das residências de baixo padrão da área central e a criação de novas áreas de expansão na borda do perímetro urbano, percebe-se uma tendência a maior homogeneidade interna em determinadas áreas. Paisagem urbana Ainda dominada por objetos que remetem à tradição ribeirinha. As casas em palafitas, a arquitetura tradicional das habitações e as vias de acesso ao rio. correspondiam às formas remanescentes de uma fase anterior da cidade. Com os projetos de requalificação urbana, as áreas situadas no entorno dos igarapés e próximas à orla do rio passam a ser dominadas pela nova paisagem moderna, pensada e articulada do ponto de vista do empreendedor. Assim, a paisagem tradicional se torna menos presente na composição do espaço geográfico. Fonte: Miranda Neto, 2016. A geografia do Pará em múltiplas perspectivas - 37 O caso da usina de Belo Monte apresenta importantes exemplos que devem ser devidamente expostos como forma de revelar os mecanismos de dominação e de reprodução do capital. Um deles se refere à nova localização das habitações no espaço intraurbano, que pela remoção das populações da ADA Urbana aponta uma tendência de afastamento das populações de mais baixa renda dos espaços próximos à área central. Pela análise empreendida, se torna evidente que os pobres são quase sempre desprovidos de boas opções no contexto da cidade: ou com uma habitação precária na área central ou com uma residência de média qualidade, porém situada em área periférica. Essa lógica se mostra semelhante tanto em relação aos espaços das RUC quanto aos projetos do programa MCMV, que abrigam populações semelhantes em termos de estratos de renda. Enquanto a cidade ainda convive com os conflitos pela posse do solo, prevalecem as estratégias de valorização de lotes urbanos
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