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A Geografia Tradicional e o Alicerce Positivista Henrique Borges de Oliveira Número USP: 11878873- Noturno Auguste Comte, a fim de concretizar o seu projeto de melhoria e progresso social, através do positivismo, considerou como necessária a criação de uma nova ciência que, assim como as ciências naturais, examinasse e classificasse a sociedade com a finalidade de compreendê-la e modificá-la. Assim, desta forma, nasce a Sociologia, atrelada ao positivismo, como uma sombra que persegue a disciplina desde o ínicio. Foi inicialmente batizada como "física social", o que torna evidente o caráter naturalista proposto. Émile Durkheim e Auguste Comte postularam a necessidade de se estudar as ciências humanas de maneira empirista e naturalista. Durkheim propôs que os fatos sociais deveriam ser tratados como “coisas” e que, posteriormente, poderiam ser divididos em tipos, a constituição destes tipos sociais deveria seguir um método: primeiro, investigar cada sociedade individualmente; segundo, realizar monografias exatas e detalhadas; terceiro, confrontá-las buscando semelhanças e diferenças; e, por fim, classificar as sociedades em grupos, conforme estas semelhanças e diferenças. Todo este conjunto de métodos e concepções decaíram, de semelhante modo, profundamente na Geografia. O conceito de Geografia como ciência da diferenciação de áreas e o método de estudo da chamada Geografia Regional (individualização de determinada porção do espaço terrestre de dimensão variável) são exemplos que se assemelham à Sociologia positivista que tem seu início em meados do século XIX. Esta influência está atrelada ao período chamado tradicional da Geografia, que se estende de meados de 1870, quando a disciplina se institucionalizou nas universidades européias, até a década de 1950, quando ocorre a revolução teorético-quantitativa. Seguindo esse raciocínio, vale a atenção para o entendimento de Moraes, que argumenta: “Os postulados do positivismo (aqui entendido como o conjunto das correntes não-dialéticas) vão ser o patamar sobre o qual se ergue o pensamento geográfico tradicional, dando-lhe unidade.”. (1981, p. 7). Dentre esses postulados, o empirismo surge como redutor da realidade ao universo dos sentidos, o geógrafo se torna um mero observador frente aos fenômenos que o são apresentados. Desta forma, os estudos científicos se limitavam ao mensurável, ao que era palpável, como se os acontecimentos se apresentassem diretamente ao geógrafo; tão logo, as monografias, formas de pesquisas geográficas, passaram a se restringir sobre as sucessivas descrições, as enumerações e aos fichamentos dos fatos ocorridos no plano terrestre. E, desta forma, comprometeu estes próprios procedimentos, ora fazendo relações entre elementos de qualidade distinta, ora ignorando mediações e grandezas entre processos, ora formulando juízos genéricos apressados. E sempre concluindo com a elaboração de tipos formais, a-históricos e, enquanto tais, abstratos (sem correspondência com os fatos concretos). (MORAES, 1981, p. 7). Vale lembrar que, dentre os postulados do positivismo, a adesão aos padrões de investigação típicos das ciências naturais é posto como o único método eficiente de pesquisa. Assim, as disciplinas humanas deveriam se orientar segundo o domínio das naturais. Ocorre, desta forma, uma naturalização dos fenômenos humanos, pois havia pouco interesse referente às relações sociais; a natureza torna-se quase que central enquanto o homem atua como um coadjuvante a mais no espaço, como mais uma manifestação na superfície terrestre, o que se pode apreender através de Vidal: “é evidente que, por seus órgãos de respiração, nutrição e secreção, [o Homem] permanece, como os animais, impregnado das influências do meio ambiente”. (MERCIER, 1995, p. 14). Desta maneira, dentre tantos outros fatores como clima, relevo, população, ecossistemas etc, o homem atua como mais um fator, demonstrando que, “Na verdade, a Geografia sempre procurou ser uma ciência natural dos fenômenos humanos”. (MORAES, 1981, p. 7). Assim, a concepção, já acima mencionada, de que a geografia é uma ciência de contato entre as disciplinas que estudam a natureza, o que vai desde a Física à Biologia, e as ditas humanas, Economia à Antropologia, permeia o pensamento tradicional geográfico. E, a fim de realizar esse propósito integrador, os autores dessa corrente recorreram, como já dito, a um leque bastante eclético de conceitos originados do positivismo, dos quais pode-se citar outra ideia que, indiretamente, influencia o pensamento tradicional: a hierarquização das disciplinas. Esta ideia alimenta a premissa de que a Geografia é uma ciência de síntese, isto é, a disciplina se relacionaria e ordenaria os conhecimentos realizados por todas as demais ciências, tornando-se, portanto, o auge do conhecimento científico. Moraes enfatizou esse raciocínio, ao afirmar que: Para se ter uma ideia de quão abrangente pode ser esta concepção, basta lembrar a afirmação de Humboldt de que os homens se relacionam com os fenômenos celestes através da luz e da gravitação. 6 Esta concepção atribui à Geografia um caráter anti-sistemático, que a distinguiria das demais ciências, sendo por excelência um conhecimento sintético, que unificaria os estudos sistemáticos efetuados pelas demais ciências (MORAES, 1981, p. 8). Esta concepção, todavia, serviu, tão somente, para manter, por debaixo dos panos, a indefinição latente do objeto de estudo da disciplina. Pois a Geografia, mais especificamente no século XVIII, passa a ser encarregada de sustentar o título de ciência de síntese, o que se manifesta nas múltiplas definições que lhe são atribuídas. É importante grifar que, para Kant, a geografia seria a única ciência apta a descrever a superfície da Terra em sua totalidade, isto é, a descrever e representar a natureza enquanto um sistema. Desse modo, Kant afirma ser a geografia uma descrição raciocinada de tudo o que é visível à superfície terrestre. (Ribas, 2009) Esta questão se aflora de modo mais contundente durante a Geografia Tradicional, pois os movimentos de renovação da disciplina, mais especificamente a Geografia Crítica, despiram-se parcialmente, ou integralmente, das amarras positivistas; evitou-se, portanto, a divisão das ciências, em detrimento da operacionalidade frente as demandas sociais. Em suma, o saber sistematizado e a possibilidade, enfim, de afirmar proposições e se institucionalizar como ciência, através de um certo grau de precisão, nos limites de uma linguagem lógica, promoveu à Geografia forte filiação ao positivismo. Esta filiação, a partir de postulados, enfraqueceu as monografias e os estudos da disciplina, como também, potencializou a vaguidade de seu objeto de estudo. Referências Bibliográficas: ● RIBAS, Alexandre Domingues y VITTE, Antonio Carlos. O Curso de Geografia Física de Immanuel Kant (1724-1804): entre a Cosmologia e a Estética. Biblio 3W. Revista Bibliográfica de Geografíay Ciencias Sociales, Universidad de Barcelona, Vol. XIV, nº 844, 25 de octubre de 2009. <http://www.ub.es/geocrit/b3w-844.htm>. ● MORAES, Antonio Carlos Robert. Geografia: pequena história crítica, 1981. ● MERCIER, Guy. A região e o Estado segundo Friedrich Ratzel e Paul Vidal de la Blache. http://www.ub.es/geocrit/b3w-844.htm ● SOUZA, Karoline Coelho de Andrade e. A Sociologia Positivista de Émile Durkheim. Revista Alamedas, Vol. 6, n. 1, 2018. Disponível em: http://e-revista.unioeste.br/index.php/alamedas/article/view/18397/12706 http://e-revista.unioeste.br/index.php/alamedas/article/view/18397/12706
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