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Abordagem da dor abdominal na APS A dor abdominal está entre as 25 principais causas de consultas e o médico deve ser resolutivo em cerca de 80% dos casos (lembrando que ser resolutivo inclui o tratamento, mas tbm o encaminhamento adequado), sendo os diagnósticos de causas funcionais e orgânicas e os outros 20% dos casos permanecem sem diagnóstico específico. A dor abdominal pode ser sintoma de diversas patologias e isso torna o seu diagnóstico um desafio. Já na primeira avaliação o médico deve saber diferenciar casos de maior gravidade e risco de vida dos casos que seguirão tratamento ambulatorial. Possíveis causas de dor abdominal: Pode ser por alguma obstrução (Ex: colecistite, cálculo renal, etc), irritação peritoneal (Ex: inflamação sistêmica), insuficiência vascular (Ex: dissecção de aorta), ulcerações (Ex: úlceras pépticas), alteração de motilidade (Ex: gastroenterite), distúrbios metabólicos (Ex: cetoacidose diabética), lesão nervosa (Ex: herpes- zóster), lesão (Ex: trauma), dor referida (Ex: pneumonia) e causas psicopatológicas (Ex: depressão). Dentre todas essas etiologias, as causas obstrutivas, de irritação peritoneal e insuficiência vascular são mais graves e devem ter diagnóstico muito rápido. Classificação: Quadros crônicos: Podem ser de origem funcional (dispepsia funcional e síndrome do intestino irritável SII – ocorre na ausência de causa anatômica, inflamatória ou dano tecidual) ou de origem orgânica (neoplasias, apendicite, gastroenterite inflamatória, infecção do trato urinário, ulcera péptica, isquemia – associada a causa anatômica, inflamatória ou de dano tecidual). Os de origem funcional são mais prevalentes! Quadros agudos: Podem ser inflamatórios (pancreatite, apendicite), obstrutivos (bridas), perfurativos (úlceras pépticas), isquêmicos (isquemia mesentérica) e hemorrágicos (ruptura de aneurismas). O abdome agudo é um quadro de forte intensidade e de início súbito (recente). Para facilitar o diagnóstico é importante que no exame físico o médico saiba em qual região está determinado órgão, dividido por quadrantes. Abordagem na APS com 3 passos: 1° Passo: saber lidar com a incerteza (nem sempre será possível identificar o diagnóstico) 2° Passo: Ter habilidades na comunicação e entrevista clínica se atentando ao método clínico centrado na pessoa (se atentar não apenas à doença, mas tbm para a percepção que o paciente tem sobre ela). 3° Passo: Nesse passo deve contextualizar o atendimento com base nos atributos da APS (longitudinalidade, integralidade, coordenação de cuidado). Associando esses princípios com um atendimento de qualidade, garante-se a prática preventiva de danos e de iatrogenia. Anamnese: - História Geral: É importante saber quem é o paciente, caracterizar a dor, identificar outros sinais e sintomas, analise de dor referida (causas pulmonares ou cardíacas podem dar dor abdominal), analisar uso prévio de fármacos ou substâncias, revisar as comorbidades e a história pregressa (análise de caráter recorrente das queixas, passado cirúrgico), além da história familiar e histórico psíquico. Importante lembrar que na APS a consulta tem uma visão integral, mas é orientada ao problema. - História familiar: Identificar doenças familiares é importante, pois algumas doenças possuem grande componente genético (hereditário). - Grupos especiais (idosos e mulheres em idade fértil): No idoso a apresentação e a percepção da dor abdominal pode estar modificada (redução na intensidade da dor – lembrar da isquemia mesentérica na qual alguns idosos podem sentir dor de fraca intensidade e mesmo assim ser fatal). Na mulher em idade fértil, sempre devemos pensar na possibilidade de gravidez. - Sinais de alerta: Alguns sinais predizem patologias de maior gravidade e risco de vida. Ex: dor que muda de localização, dor que desperta do sono, dor que persiste por mais de 6h ou piora, dor com vômitos e perda de peso. Exame físico: O exame é focado nos dados colhidos na anamnese e de acordo com a probabilidade diagnóstica. Devemos observar aspectos da ectoscopia, colher sinais vitais e realizar o exame físico dirigido. - Exame abdominal: Paciente deve estar em decúbito dorsal e então seguiremos o padrão semiológico: inspeção (cicatrizes, hérnias, etc), ausculta (RHA, sopros abdominais “aneurisma de aorta”, etc), palpação (massas e tamanho dos órgãos) e percussão (análise de visceromegalias, ascite, excesso de ar). Na análise herniações a posição ortostática pode ser útil! Em alguns casos de dor abdominal pode ser necessária a realização de exame ginecológico ou toque retal. Sinais e sintomas dos problemas mais frequentes de dor abdominal na APS: (EXEMPLOS) - Quadros Agudos: ♦ Gastroenterite infecciosa: dor em cólica com diarreia difusa. ♦ ITU: Dor suprapúbica com sintomas urinários irritativos, disúria, urgência miccional. Em casos com comprometimento renal: febre, calafrios, dor lombar e Giordano positivo. ♦Apendicite: doe em fossa ilíaca direita, associada a febre, rigidez abdominal e dor à descompressão (Blumberg) - Quadros Crônicos: Funcionais: ♦ Dispepsia funcional: Dispepsia persistente sem evidencias de doença orgânica, não alivia com defecação e sem alteração no formato das fezes e em sua frequência. ♦ SII: pelo menos 12 semanas de sintomas contínuos de dor abdominal associada a algum dos seguintes sintomas: alteração em frequência ou formato das fezes, eleiminação anormal das fezes, eliminação de muco e sensação de distenção abdominal. Não funcionais (orgânicas): ♦ Diverticulite: dor em quadrante inferior esquerdo, febre e anorexia, podendo ter náuseas, vômitos e diarreias. ♦ Esofagite: queimação retroesternal, associada a disfagia, a eructações e à epigastralgia e que piora com ingestão de alimentos. ♦ Colelitíase: dor tipo cólica em hipocôndrio direito. Grande dilema: O grande dilema do médico da família ´distinguir os quadros funcionais dos orgânicos. Sintomas relacionados ao estresse tem forte associação com quadros funcionais, já a perda de peso é mais relacionada com quadros orgânicos. Entretanto, são apenas preditores e não sintomas que definem a doença e por isso não podemos descartar um problema ou outro na vigência desses sintomas. Exames Complementares: A solicitação de exames complementares vai depender das hipóteses diagnósticas e depende do local de atendimento (APS ou hospital), pois cada nível de serviço tem propriedades específicas e diferenciadas. O médico deve ser eficiente e custo-efetivo na solicitação para ter um diagnóstico acurado, mas sem desconsiderar o contexto na qual trabalha e a disponibilidade dos métodos. - Exames laboratoriais - Exames de Imagem - Outros exames (EDA, ECG, etc) Abordagem: A conduta no tratamento visa tratar a causa base da dor abdominal, mas tbm podem ser utilizadas medicações que promovem alivio dos sintomas. Conduta Proposta: ♦ Fazer um bom registro no prontuário com dados importantes para correto entendimento em análise posterior ♦ Se atentar a crianças, idosos e imunossuprimidos por sinais e sintomas atípicos. ♦ Reavaliar diagnostico em caso de piora ou surgimento de sinais de alerta. ♦ Não descartar patologia orgânica principalmente em pacientes com idade maior de 45 anos, com dor que desperta, febre e perda de peso. Quando referenciar: Referenciar para serviço de urgência pacientes com dor abdominal aguda que precise de elucidação diagnóstica por exames mais complexos ou atendimento especializado para diagnóstico ou que necessite de intervenção cirúrgica de urgência (Ex: apendicite). Referenciar para especialista focal os casos que necessitem de elucidação diagnóstica de quadros crônicose para tratamento específico. Exemplos de especialistas focais: urologistas, cardiologistas, psiquiatras, etc. Erros cometidos na abordagem do paciente: Não permitir um bom diálogo na anamnese, fechar diagnóstico prematuramente, não fazer manobras no exame físico, ignorar o iam como diagnóstico diferencial da dor epigástrica, não valorizar sinais de alerta, solicitar exames complementares desnecessários, indicar cirurgia para quadros sem confirmação diagnóstica, não fornecer informações seguras e claras, não fazer o seguimento de casos referenciados e referenciar quando a queixa poderia ser resolvida na APS. Atividades preventivas e de educação relacionadas a dor abdominal: Prevenção primária: prevenção de parasitoses por orientação educativa de higiene e saneamento ambiental adequado; prevenção de diarreia do viajante por orientação a evitar certos alimentos e bebidas; reforçar a importância da imunização. Prevenção secundária: Orientação baseada em evidências, onde busca diagnóstico precoce e rastreamento seletivo. Prevenção terciária: Instrução para diminuir o risco de recidivas de sintomas em pessoas já submetidas à intervenção cirúrgica e promover orientação para prevenção de hérnias incisionais no pós-operatório. Prevenção quaternária: Evitar indicações desnecessárias de exames e discutir riscos e benefícios de certas cirurgias, reforçando o cuidado contra o uso inapropriado de medicações como de inibidores de bomba de prótons e AINEs. Não esqueça de curtir e salvar se gostou, por favor!
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