
Apocalipticos e Integrados
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entre grupos humanos, então é possível estabelecer tanto a natureza da mensagem como o có- digo s8bre o qual ela repousa, sem fazec referência a elementos estra- nhos à mensagem, como quem emite e quem recebe. Isso era o que pretendíamos no primeiro volume ao sublinhar o potencial de informação diverso constitufdo por uma mensagem de feliz aniversário, conforme viesse ela de um amigo ou do presidente do conselho dos ministros da URSS (onde a recepção de um dado número de "bits", informacionahnente deduzíveis com base num normal código Morse, válido objetivamente em qualquer circunstãncia, e portanto traduzíveis eletr8nicamente em têrmos de unidades físicas, é, ao contrário, historicizada e situacionali- zada, devendo ser avaliada segundo o equipamento do sistema de as- sunções com que o receptor decodifica a mensagem). Além do mais, o insistir s6bre a teoria da comunicação permite-nos reportar as mesmas análises informacionais à� pesquisas esttntturalistas de ordem lingãfstica. Inspiramo-nos, de fato, para t8da a análise que se segue, nos estudos de Ronann Jexoesow e, em particular, na antologia de escritos (publicados, originàriamente, em várias línguas) aos cuidados de Nicolas Ruwet com o título Essais de Iinguistique gfnfrale, Paris, Editions de Minuit, 1%3. 91 # Também na teoria da informação, a emissão de uma mensagem compreensível se baseia na existência de um sistPma de possibilidades previsiveis, num siste- ma de classificações que servirá de base para conferir um valor e um significado aos elementos da mensagem: e êsse sistema é o próprio código, �nquanto conjunto de regras de transformação, convencionalizadas de pon- ta a ponta, e reversíveis. Na mensagem lingüística, o código é constituído pelo sistema de instituições convencionalizadas que é a lingua. A língua, enquanto código, estabelece a rela- ção entre um significante e o seu significado ou - se quisermos - entre um símbolo e o seu referente, bem como o conjunto das regras de combinação entre os vários significantesl�. Dentro de uma língua, estabele- cem-se escalas sucessivas de autonomia para o autor de mensagens: "na combinação de traços distintivos em fonemas, a liberdade de quem fala é nula; o códi- go já estabeleceu tôdas as possibilidades utilizáveis na língua em questão. A liberdade de combinar os fonemas em palavras é circunscrita [estabelecida pelo léxico] e li- mitada à situação marginal da criação de palavras. Na formação das frases, a partir das palavras, as constri- ções de quem fala são menores. Finalmente, na combi- nação das frases em enunciados, a ação das regras cons- tritivas da sintaxe detém-se, e a liberdade de cada pes- soa ctue fala se enriquece substancialmente, embora convenha não esquecer o número dos enunciados es- tereótiposl7". Cada signo lingüístico compõe-se de elementos constituintes e surge em combinação com outros signos: é um contexto, e insere-se num contexto. Mas é esco- lhido para ser colocado num contexto através de um trabalho de seleção entre têrmos alternativos. Assim, cada receptor que venha a compreender uma mensa- (16) Naturalmente entende-se "língua" na acepção saussuriana como "um produto social da faculdade da linguagem e um coniunto de conven- çôes necessárias, adotadas pelo corpo social para permitir o exercício dessa faculdade entre os indivíduos" (Cours de linBuistique générale). "Em ç oç ossibi- McKay, a palavra-chave da teoria da comunica ão E a n Ho e e B áças à Iidades preordenadas: a lingúlstica diz a mesma coisa.. i elaboração dos problemas de codificação feita pela teoria da comunicação a dicotomia saussuriana entre língua e palavra pode receber uma nova formulação, muito mais precisa, que Ihe confere umdpô�o��n�caç ór pode Recìprocamente na lingllística moderna a teor a encontrar informações bastante ricas sôbre a estruturaJ kobson�aop· c�b aspectos múltiplos e complexos do código lingúístico" ( a p. 90, e, em geral, o capítulo V ) . (17) Op. cit., p. 47. 92 #gem, entende-a camo comúiruição de partes constituin- tes (frases, palavras, fonemas: que podem ser cambina- dos ou sob forma de concatenação ou de concorrência, segundo se estabeleçam num contexto ambíguo ou linear), selecionndas naquele repertório de tôdas as possíveis partes constitumtes, que é o cádigo ( e, no caso, a língua em questão). ·Portanto, o receptor deve continuamente reportar as signos que recebe não só ao código como ao contextols. Sublinhemos, como lembra Jakobsan, que "o có- digo não se limita ao que os engenheiros chamam de a conteúdo puramente cognitivo do discurso' [e, por- tanto, o seu aspecto semântico] : a estratificação esti- lística dos símbalos léxicos, camo as pretensas varia- ções livres, tanto na sua constituição como nas suas regras de cambinação, são `previstas e preparadas' elo códigol�". p Mas se o código concerne a um sistema de orga- nização que vai além da ordenação dos significados cumpre não esquecer que a noção de cóãigo também concerne a um sistema da organização que está aquém do nível dos significados, aquém da mesma organização fonológica pela qual a língua distingue, no discurso oral, aquela série finita de unidades informativas ele- mentares que são os fanemas (organizados num sistema de opasições binárias). A própria psicologia aproveita a teoria da informação para descrever os processos de recepção em nível sensorial como recepção de uni- dades informativas; e os pro�cessas de coordenação dêsses estímulos-informações cnmo decodificação de mensagens baseada num código. Que êsse código seja considerado fisiològicamente inato ou cvlturalmente adquirido (reproduzindo ou não o código objetivo, baseados no qual os estímulas se canstituíam ern formas antes mesmo de serem recebidos e decodificados como mensagens), eis um problema que exarbita do nosso discurso. O fato é que a noção de código deverá ser (g187 Op cit., pp 48-49. Aqui entretanto parece-nos quc Jakobson distig ue nìtidamente demais a ordem da sele ão códi o e portanto às referências semânticas daçmensagem � daeó dem da combinação - como referência ao contexto, e portanto k cstrutura sintã- tica da mensagem. Evidentemente, tambóm a estrutura sintática obedece a uma sórie de prescrições devidas ao código e essas 1 que ç nam um arranjo sintático ta conferem um luga prescn oes determi- r definido aos vários têrmos selecionados· portanto, tambóm a referência ao contexto implica uma referência ao cbdigo, e a referência à estrutura sintática auxilia a compreensão semãntica. I197 Op. cle.. P. 91. 93 #tomada também nessa acepção, no momento em que nos preparamos para definir a mensagem poética, visto que nela há que avaliar também a percepção da men- sagem enquanto organização concreta de estimulos sensoriais. Esse recurso ao código perceptivo adquirirá depois tanto maior valor quanto mais se passar da consideração de mensagens que revestem precisas fun- ções significativas (como a mensagem lingüística) para mensagens, como a plástica au a sonora, de onde emerge sobretudo a necessidade de uma decodificação em nível perceptivo, dada a maior liberdade que existe nos níveis de organização mais complexa, não cons- trangidos pelas malhas de códigos institucionalizados camo a língua. Esclarecido êsse ponto, voltemos a examinar a relação mensagem-recepção, em nível língüístico. O receptor encontra-se, pois, diante da mensagem, em enhado num ato de interpretação que consistelnessqen- cia mente numa decodificação. Na medida e ue o autor exigir que a mensagem seja decodificada, de modo a dar um significado unívaco e preciso, exata- mente correspondente a tudo quanto pretendeu comu- nicar, introduzirá êle na própria mensagem elementos de refôrço, de reiteração, que ajudam a restabelecer sem e uívoco seja as referências semânticas dos têrmos, sj a as relações sintáticas entre êles: a mensagem será, assim, tanto mais unívoca quanto mais redundante, e os significadas