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O DIREITO NA REPÚBLICA VELHA

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AULA 6 – 2ª PARTE - O DIREITO NA REPÚBLICA VELHA
A proclamação da República como um golpe militar, os tensionamento políticos nos primeiros anos da República, o Código Penal de 1890, a Constituição de 1891 (seu perfil político-ideológico e principais aspectos da organização do Estado Brasileiro), a República Oligárquica, o Código Civil de 1916, a crise da República Velha.
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AS INCERTEZAS DOS PRIMEIROS TEMPOS DA REPÚBLICA...
Os primeiros tempos posteriores à Proclamação da República foram de grande incerteza. O “15 de novembro”, um episódio, a princípio, pacífico, fez com que emergissem uma multiplicidade de posições e de interesses.
Isto significa dizer que os diversos grupos que apoiavam a substituição da Monarquia pela República tinham interesses diversos e claramente divergiam em suas concepções de como o Estado Republicano deveria ser organizado.
Tal situação ficou ainda mais complicada com a passagem do comando do movimento para as mãos de um oficial-general do Exército, conservador, amigo do imperador e que pretendia, na verdade, derrubar o gabinete do Visconde de Ouro Preto.
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De acordo com o historiador José Murilo de Carvalho, podiam ser identificadas três correntes distintas dentro do movimento republicano: 
A corrente formada por políticos civis e “históricos” (o Partido Republicano Paulista e os políticos se apresentavam como representantes de um liberalismo de inspiração norte-americana).
A corrente positivista (predominante no Rio Grande do Sul e que se apresentava como a expressão política de grupos civis de perfil autoritário).
Os militares (que não se constituíam como um grupo homogêneo, havendo rivalidades entre o Exército e a Marinha e entre os partidários de Deodoro e de Floriano Peixoto).
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OBSERVAÇÕES IMPORTANTES...
Apesar da profunda rivalidade existente dentro do Exército entre os partidários de Deodoro da Fonseca e de Floriano Peixoto, eles se aproximavam em um ponto fundamental: eram porta-vozes de uma instituição (o Exército) que fazia parte do “aparelho do Estado”.
Os oficiais do Exército, em virtude das características de suas funções e da cultura institucional que os havia configurado, mostravam-se, majoritariamente, avessos ao liberalismo.
A República, segundo a “vertente militar”, deveria ser dotada de um Poder Executivo forte ou deveria passar por uma fase de DITADURA. A autonomia das províncias (ou estados) era vista com reserva pelo Exército porque serviria aos interesses dos grandes poderes locais
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Em seu primeiro pronunciamento, no dia 15 de novembro o Governo Provisório que se instalava naquele momento prometia e garantia, “por todos os meios a seu alcance”, a todos os habitantes do Brasil, nacionais e estrangeiros, a segurança da vida e da propriedade, o respeito aos direitos individuais e políticos, com ressalvas que fossem exigias pelo bem a Pátria e pela defesa do Governo que havia sido proclamado pelo povo, pelo Exército e pela Armada Nacional.
Por este pronunciamento ficavam abolidos o Conselho de Estado e a vitaliciedade do Senado e dissolvia-se a Câmara dos Deputados. Por outro lado, as funções da justiça comum, da administração civil e militar, continuariam a ser exercidas pelos órgãos até então existentes, assim como, com relação às pessoas, respeitar-se-iam todas as vantagens e direitos adquiridos por cada funcionário. 
O Governo Provisório se comprometia também a reconhecer e acatar todos os compromissos internos e externos assumidos pelo regime monárquico.
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Assinaram este primeiro pronunciamento, esta primeira proclamação do Governo Provisório da recém-instalada República Brasileira no dia 15 de novembro de 1889, os seguintes membros:
Marechal Manoel Deodoro da Fonseca (alagoano da Cidade de Alagoas, atualmente Município de Marechal Deodoro): Chefe do Governo Provisório.
Aristides da Silveira Lobo (paraibano de Cruz do Espírito Santo – jurista e jornalista): Ministro do Interior. 
Tenente-coronel Benjamin Constant Botelho de Magalhães (fluminense de Niterói): Ministro da Guerra.
Chefe de Esquadra, Eduardo Wandenkolk: Ministro da Marinha. 
Quintino Bocaiúva (fluminense de Itaguaí - jornalista): Ministro das Relações Exteriores e interinamente da Agricultura, Comércio e Obras.
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Passados poucos meses, a composição do Governo Provisório se alterou:
 Rui Barbosa (baiano de Salvador – advogado e jornalista) que ocupava inicialmente a vice-chefia do Governo Provisório, foi substituído pelo General Floriano Peixoto (alagoano de Maceió) e passou a ocupar a pasta da Fazenda.
Manoel Ferraz de Campos Sales (paulista de Campinas – advogado e ex-deputado republicano no Parlamento do Império), ocupou a pasta da Justiça.
Quintino Antonio Ferreira de Souza Bocaiúva (fluminense de Itaguaí - jornalista), ocupou a pasta dos Negócios Estrangeiros.
Demétrio Nunes Ribeiro (gaúcho de Porto Alegre – educador, engenheiro, jornalista) – ocupou a pasta da Agricultura, interinamente ocupada, no início do Governo provisório, por Quintino Bocaiúva.
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OS PRIMEIROS PASSOS NO SENTIDO DA INSTITUCIONALIZAÇÃO DO NOVO REGIME...
Já nos primeiros dias que se seguiram à Proclamação da República, o Governo Provisório editou uma série de decretos através dos quais buscava a rápida institucionalização do novo regime.
O Decreto nº 1, de 15 de novembro de 1889, proclamava provisoriamente e decretava, como forma de Governo do Brasil (dos Estados Unidos do Brasil), a República Federativa, ao mesmo tempo em que estabelecia normas que deveriam reger os Estados Federais.
O Decreto nº 2, de 16 de novembro de 1889, previa a concessão de um montante de recursos de cinco mil contos de réis (5000$000) à família imperial, sem prejuízo das vantagens asseguradas ao chefe da dinastia deposta e de sua família, na mensagem do Governo Provisório desta data de 16 de novembro de 1889.
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O Decreto nº 3, de 16 de novembro de 1889, reduzia o tempo de serviço de algumas classes da Armada (recrutados e oriundos das escolas de aprendizes de marinheiros) para 09 anos e extinguia nela os castigos corporais.
O Decreto nº 4, de 19 de novembro de 1889, fixava os novos símbolos da Nação: bandeira, armas, selos e sinetes da República.
O Decreto nº 5, de 19 de novembro, assegurava assegurava a continuidade dos subsídios com que o ex-imperador sustentava, de seu bolso, necessitados, enfermos, viúvas e órfãos.
O Decreto nº 6, de 19 de novembro, estabelecia os critérios para o exercício do voto, incumbindo o Ministério da Justiça da expedição de instruções e da organização dos regulamentos para a qualificação e o para o processo eleitoral.
O Decreto nº 7, de 20 de novembro de 1889, dissolvia as Assembléias Provinciais e fixava as atribuições dos governadores dos Estados.
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O GOVERNO PROVISÓRIO E O PROCESSO CONSTITUINTE...
Em dezembro de 1889, foi criada uma comissão de cinco elementos para a elaboração de um anteprojeto da Constituição – membros da comissão: Saldanha Marinho (presidente da comissão), Américo Brasiliense de Almeida Melo (vice-presidente da comissão), Antonio Luís dos Santos Werneck, Francisco Rangel Pestana e José Antonio Pedreira de Magalhães Castro.
O decreto nº 510, de 22 de junho de 1890, além da convocação da futura assembléia constituinte (que deveria se instalar em 15 de novembro de 1890) e do estabelecimento das eleições constituintes para o dia 15 de setembro de 1890, trazia a “constituição dos Estados Unidos do Brasil” (na verdade, o projeto da constituição). 
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A inépcia política e administrativa de Deodoro e alguns atos arbitrários seus, assim como a desconfiança em relação a suas intenções (possivelmente ditatoriais) levaram os partidários de um regime republicano de perfil liberal e federativo a apressarem a convocação da Assembléia Constituinte.
Em 15 de novembro de 1890, o Congresso Constituinte se instalou no antigo Palácio Imperial (na Quinta da Boa Vista) depois de uma série de sessões preparatórias realizadas entre os dias 04 e 14 de novembro no prédio do antigo Automóvel Club. 
Após três meses de minucioso trabalho, de muitas
discussões e de algumas emendas, o texto da nova constituição foi promulgado em 24 de fevereiro de 1891.
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PRINCIPAIS ASPECTOS DA CONSTITUIÇÃO DE 1891.
 A mais concisa das constituições brasileiras, vazada em 91 artigos e mais 08 artigos das Disposições Transitórias – dividia-se em 05 títulos, subdivididos em seções e estas em capítulos. 
 O Título I era o mais longo e tratava da ORGANIZAÇÃO FEDERAL (do art. 1º ao art. 62).
 O Título II era reservado aos Estados-membros (do art. 63 ao art. 67).
 O Título III regulava os Municípios em um único artigo (art. 68).
 O Título IV (do art. 69 ao art. 68) tratava dos cidadãos brasileiros, definindo os que estivessem no gozo de seus direitos e de todos os estrangeiros que estivessem no Brasil em 15/11/1889 e que não declarassem, em 06 meses após a promulgação da Constituição, o desejo de conservar a nacionalidade de origem - neste título encontrava-se a Declaração de Direitos (Seção II) assegurados aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país.
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 O Título V (do art. 79 ao art. 91) trazia as Disposições Gerais, acompanhadas das Disposições Transitórias (compostas por 07 artigos). 
 
Nas Disposições Gerais, encontravam-se fixados a aplicação do Estado de Sítio, a responsabilidade dos funcionários, o serviço militar obrigatório e a organização do Exército e da Armada, a proibição de guerra de conquista, a instituição de um Tribunal de Contas, o modo de reformar a Constituição (art. 90 e art. 91).
Nas Disposições Transitórias, determinava-se a eleição do primeiro Presidente e do primeiro Vice-Presidente da República pelo Congresso, a concessão de uma pensão vitalícia a D. Pedro II, a compra da casa em que faleceu Benjamin Constant, localizada no bairro de Santa Teresa, no Rio de Janeiro (tratado como Grande Patriota e Fundador da República), cabendo o usufruto desse imóvel à viúva de Constant.
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 A Constituição de 1891 estruturava como forma de governo, a República Federativa, sob o regime representativo e presidencial, constituindo-se como Estados Unidos do Brasil pela união perpétua de suas antigas províncias (art. 1º), erigidas à condição de Estados-membros da federação, ao mesmo tempo em que o antigo Município Neutro passaria a constituir o Distrito Federal, continuando sua condição de capital do país (art. 2º).
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Pelo art. 3º deste Título I, reservava-se para a União, no Planalto Central, uma área de 14.400 Km² destinada ao estabelecimento da futura capital federal.
Pelo art. 6º, o governo federal não poderia intervir em questões próprias aos Estados, salvo em questões que envolvessem conter invasão estrangeira ou a de um Estado pelo outro, manter a forma republicana, restabelecer a ordem e a tranquilidade a pedido dos governos dos Estados e assegurar a execução de leis e sentenças federais.
De acordo com o art. 15 deste Título I, ficava estabelecida a divisão tripartite dos poderes, sendo o Executivo, o Legislativo e o Judiciário considerados como “órgãos da soberania nacional”, atuando harmônica e independentemente entre si.
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DESTAQUE IMPORTANTE...
 O regime constitucional de 1891 optou pelo presidencialismo de modelo norte-americano - o Poder Executivo não podia dissolver a Câmara dos Deputados e nem era obrigado a escolher Ministros de confiança desta ou exonerá-los se perdessem essa confiança.
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 Foram garantidas as eleições diretas e majoritárias para Presidente e Vice-Presidente da República (art. 47), dentre brasileiros natos que estivessem no exercício de seus direitos políticos e que tivessem mais de 35 anos (art. 41, § 3º).
 Os mandatos de ambos eram de 04 anos, não podendo haver reeleição do Presidente para o período seguinte (art. 43). 
Caso ocorresse a vacância, por morte ou por outra causa, da Presidência ou da Vice-Presidência quando ainda não houvessem decorridos dois anos do quadriênio para o qual tivessem sido eleitos, proceder-se-ia nova eleição. Se ocorresse a vacância decorridos dois anos ou mais (art. 42) do mandato, assumiria o Vice-Presidente.
 O Vice-Presidente que ocupasse a Presidência no último ano de mandato, não poderia ser eleito para a Presidência no ano seguinte (art. 43, § 1º).
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O processo e julgamento dos crimes de responsabilidade do Presidente da República davam-se perante o Senado Federal, após declarada procedente a acusação pela Câmara dos Deputados, sendo que, nos crimes comuns, o processo e julgamento far-se-ia perante o Supremo Tribunal Federal (Capítulo V, art. 53), seguindo as disposições de impeachement da Constituição americana de 1787, que vêm sendo adotada até os dias atuais.
O Poder Legislativo era BICAMERAL e deputados e senadores eram invioláveis por suas palavras e opiniões no exercício do mandato e gozavam de imunidade, não podendo ser presos nem processados sem licença da Câmara, salvo flagrante (art. 19 e art. 20).
Os deputados eram eleitos por 03 anos, na proporção de 01 para cada 70.000 (sendo que o número mínimo de deputados era de 04 por Estado – art. 28, § 1º) e os senadores, em número de três para cada estado, eram eleitos por nove anos, ocorrendo a renovação de 1/3 do Senado a cada triênio (art. 31).
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Eram eleitores os cidadãos maiores de 21 anos que se alistassem na forma da lei. Não poderiam alistar-se para as eleições federais ou estaduais os mendigos, os analfabetos, as praças de pré, excetuando os alunos das escolas militares de ensino superior, os religiosos de ordens monásticas, companhias, congregações, ou comunidades de qualquer denominação, sujeitas a voto de obediência, regra ou estatuto que importe a renúncia da liberdade individual (art. 70, § 1º).
Os direitos de cidadão brasileiro só eram suspensos por incapacidade física ou moral ou por condenação criminal enquanto durassem os seus efeitos (art. 71, § 1º). A perda dos direitos se daria para aqueles que se naturalizarem em país estrangeiro ou por aceitação de emprego, pensão, condecoração ou título estrangeiro sem licença do Poder Executivo Federal (art. 71, § 2º).
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A Constituição garantiu e enunciou as clássicas liberdades privadas, civis e políticas aos brasileiros e estrangeiros residentes no país (Seção II – Declaração de Direitos - art. 72) silenciando sobre a proteção ao trabalhador.
Como decorrência dessa declaração de direitos, ocorreu um abrandamento das penas criminais, suprimindo-se as penas de galés, morte e banimento. Eleva-se o instituto do HABEAS CORPUS, que havia sido instituído no ordenamento jurídico brasileiro com o Código de Processo Criminal de 1832, à CATEGORIA CONSTITUCIONAL (art. 72, § 22).
O Congresso votava orçamento anual, autorizava empréstimos, regulava comércio exterior e interno, guerra e paz, resolvia sobre tratados com nações estrangeiras, declarava estado de sítio, concedia anistia, votava, como competência privativa, as leis de naturalização e legislava sobre todas as matérias de competência da União.
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A ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA NA REPÚBLICA VELHA.
 O Poder Judiciário, na Constituição de 1891, estava assim disposto: “art. 55 - O Poder Judiciário, da União terá por órgãos um Supremo Tribunal Federal, com sede na Capital da República e tantos Juízes e Tribunais Federais, distribuídos pelo País, quantos o Congresso criar”.
 O Superior Tribunal de Justiça passava a Supremo Tribunal Federal, através do Decreto nº. 1, de 26/02/1891, composto por 15 ministros (art. 56), nomeados pelo Presidente da República (conforme o disposto no art. 48, 12º). 
 O Supremo Tribunal Federal passou a ter função uniformizadora da jurisprudência em matéria de direito constitucional e federal através da emenda constitucional de 3 de setembro de 1926, reparando-se, assim, o equívoco do sistema judiciário imperial, que não fora corrigido com a promulgação da Constituição de 1891.
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A Constituição de 1891 previu a instituição dos Tribunais Federais, mas estes nunca chegaram a ser criados durante a República Velha durante o tempo em que perdurou nossa primeira carta política. Assim, pelo Decreto 3.084, de 5 de novembro de 1898, instituiram-se
apenas os JUIZADOS FEDERAIS, sendo sua lotação por Estado distribuída da seguinte forma: 1 juiz seccional, 3 juízes substitutos e 3 juízes suplentes.
Os Tribunais de Relação das Províncias passavam a Tribunais de Justiça dos Estados (19 Tribunais), como órgãos de cúpula da Justiça Comum Estadual. ostentando, inicialmente, as mais variadas denominações:
A República manteve os juízes de direito (que no Rio Grande do Sul eram denominados de Juízes de comarca), os juízes municipais (denominados em alguns Estados como juízes distritais), os tribunais do júri e os juízes de paz (que continuavam sendo eletivos). 
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 A justiça estabeleceu-se em DOIS NÍVEIS: a justiça federal e as justiças estaduais, além do Supremo Tribunal Federal.
 A justiça federal (os juízes e os tribunais federais) julgariam causas fundadas na Constituição e as de interesse da União.
 O STF julgaria ORIGINARIAMENTE os crimes comuns do Presidente e de quaisquer ministros, dos ministros diplomáticos, causas entre União e Estados, conflitos entre juízes federais ou entre estes e os juízes estaduais.
 Julgaria em GRAU DE RECURSO, as causas julgadas pelos juízes e tribunais federais, competindo-lhe a revisão criminal e em RECURSO EXTRAORDINÁRIO, as decisões dos tribunais e dos juízes dos Estados quando se discutisse a vigência e a validade de leis federais negadas por alguma justiça estadual, as divergências entre tribunais estaduais e questões de Direito Criminal ou Civil Internacional.
 O controle da constitucionalidade era difuso, mas a declaração de inconstitucionalidade de leis e decretos somente se produzida para casos concretos – a justiça não revogava nem declarava uma lei inconstitucional ERGA OMNES, como pode fazer hoje.
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UMA SÍNTESE IMPORTANTE...
 A constituição de 1891 estabeleceu a federalização do poder (que abriria caminho para o fortalecimento dos poderes locais, fortalecimento este que se consubstanciou no POLÍTICA DOS GOVERNADORES, definido na gestão de Campos Sales), promoveu a separação entre Igreja e Estado, eliminou o Conselho de Estado e o contencioso administrativo – do ponto de vista tributário estabeleceu-se uma divisão de tributos entre a União e os Estados, determinando-se que os Estados escolheriam alguns de seus impostos para os Municípios.
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 Durante a década de 1920, a desilusão com o regime republicano da Constituição de 1891 era muito grande em virtude do seguinte quadro:
A mentira eleitoral resultante das práticas dos “currais eleitorais” e do “voto de cabresto”, agravada pelas “degolas” que ocorriam na apuração no Congresso.
As intervenções federais pretensamente baseadas no Art. 6º da Constituição – em muitos casos, intervenções militares.
O revezamento (pelo menos, em tese) entre Minas e São Paulo no comando do executivo federal.
Os acordos resultantes da “política dos governadores” em que os chefes locais fraudavam os resultados das eleições federais e estaduais e em troca os governadores lhes retribuía com nomeações de delegados e subdelegados, juízes de paz, professores e outros cargos com que garantiam seu poder, protegendo os apaniguados e perseguindo os adversários.
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 Com o desencanto com a ordem constitucional de 1891, ganhou força um movimento revisionista (onde se destaca a figura de Rui Barbosa) que buscava corrigir os defeitos da Constituição de 1891, em prol da democracia e do liberalismo. 
 A iniciativa da revisão coube a Artur Bernardes em 1926 e que se mostrou tímida (restrição da aplicação do HABEAS CORPUS à proteção ao direito de ir, vir e permanecer sem que se estabelecessem outros remédios jurídicos mais rápidos que garantissem outros direitos individuais, permissão de veto parcial nas votações de projetos de leis e submissão dos vencimentos dos juízes aos impostos gerais).
 Com a crise mundial iniciada em 1929 e com o desgaste das instituições da República Velha, esta etapa da história republicana brasileira seria superada pelo regime instalado com a Revolução de 1930.
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O DIREITO PENAL NO CÓDIGO DE 1890
 As leis penais sofreram sensíveis mudanças ao final do século XIX em razão da Abolição da Escravatura e da Proclamação da República. Este último acontecimento histórico interrompeu um trabalho que ia caminhando no Parlamento para alterar o código anterior. Leis avulsas haviam eliminado, por exemplo, as penas de galés e reduziram para 30 anos o que antes era prisão perpétua.
Sob a denominação de Código Penal, em 11 de outubro de 1890 foi promulgado o novo diploma, com o Decreto 847. 
A estrutura desse código, com 412 artigos, estava assim estabelecida: Livro I — Dos crimes e das penas (art. 1º a 86); Livro II — Dos crimes em espécie (arts. 87 a 363); Livro III — Das contravenções em espécie (arts. 364 a 404); Livro IV — Disposições gerais (arts. 405 a 412).
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ALGUNS ASPECTOS DO CÓDIGO PENAL DE 1890 
 Nos artigos 1º e 4º o código definia os Princípios da Legalidade e da Territorialidade.
 As penas que deveriam ser aplicadas eram variadas (art. 43): 
 a) prisão celular.
    b) banimento.
    c) reclusão.
    d) prisão com trabalho obrigatório.
    e) prisão disciplinar.
    f) interdição.
    g) suspensão e perda do emprego publico, com ou sem inabilitação para exercer outro.
    h) multa.
 Muitas dessas penas confundiam-se entre si, assemelhando-se muito, umas às outras.
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 Havia uma pena prevista no art. 49 e que se destinava aos menores de 21 anos e que deveria ser cumprida em estabelecimentos industriais especiais. 
 De acordo com o art. 44, não haveria penas infamantes e a pena restritiva de liberdade individual não poderiam exceder a 30 anos.
Previa-se a progressão da pena (art. 50, §§ 1º e 2º) e o art. 27 estabelecia as condições de inimputabilidade:
 § 1º Os menores de 9 anos completos.
    § 2º Os maiores de 9 e menores de 14, que obrarem sem discernimento.
    § 3º Os que por imbecilidade nativa, ou enfraquecimento senil, forem absolutamente incapazes de imputação.
    § 4º Os que se acharem em estado de completa privação de sentidos e de inteligência no ato de cometer o crime.
    § 5º Os que forem impelidos a cometer o crime por violência física. irresistível, ou ameaças acompanhadas de perigo atual.
    § 6º Os que cometerem o crime casualmente, no exercício ou prática de qualquer ato licito, feito com atenção ordinária.
    § 7º Os surdos-mudos de nascimento, que não tiverem recebido educação nem instrução, salvo provando-se que obraram com discernimento.
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 A defesa da liberdade para o exercício dos cultos religiosos (art. 185 e art. 186) esbarrava na criminalização do espiritismo e de algumas de suas práticas (explicitada no art. 157 – Capítulo III: Dos crimes contra a saúde pública).
No art. 261, havia a previsão do crime de falso testemunho que era penalizado diferentemente para causas cíveis (§ 1º - prisão celular, de 03 meses a 01 ano), causas criminais em depoimentos de absolvição dos acusados (§ 2º - prisão celular, de 06 meses a 02 anos) e causas criminais em depoimentos de condenação (§ 3º - prisão celular, de 01 a 06 anos).
 O Título VIII tratava DOS CRIMES CONTRA A SEGURANÇA DA HONRA E HONESTIDADE DAS FAMÍLIAS E DO ULTRAJE PUBLICO AO PUDOR, sendo que o Capítulo I deste título tratava da VIOLÊNCIA CARNAL.
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 O art. 268 previa a punição para o crime de estupro, fazendo-se todavia uma diferenciação de penalização de acordo com a condição “sócio-moral” da mulher - se o estupro fosse cometido contra MULHER VIRGEM ou não, mas HONESTA, a pena para o acusado seria de prisão celular, de 01 a 06 anos (caput do art. 268). Se cometido contra MULHER PÚBLICA OU PROSTITUTA, a pena seria de prisão celular de 06 meses a 02 anos (§ 1º do art. 268).
 A caracterização do estupro encontrava-se fixada no art. 269, definindo os meios de que se poderia valer o agressor, além da força física, para o atingimento de suas intenções libidinosas (uso de anestésicos e narcóticos em geral, como por exemplo, o ÉTER e o CLOROFÓRMIO e de práticas de HIPNOTISMO). 
O crime de adultério tinha tratamento semelhante àquele do Código
de 1830, estando prevista a sua punição no art. 279 – Capítulo IV: DO ADULTÉRIO OU INFIDELIDADE CONJUGAL.
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O PROCESSO HISTÓRICO DE ELABORAÇÃO DE NOSSA PRIMEIRA CODIFICAÇÃO CIVIL (O CÓDIGO DE 1916)
 Proclamada a Independência, foi promulgada a Lei de 20 de outubro de 1823 que determinou vigorassem no Império do Brasil as Ordenações Filipinas, as Leis e Decretos de Portugal promulgados até 25 de abril de 1821, até que se publicasse um novo Código; 
A Constituição de 1824 expressou “a necessidade de se organizar, o quanto antes, um Código Civil e um Criminal, fundado nas sólidas bases da Justiça e da Eqüidade” - em 1830 e 1850 foram promulgados os Códigos Criminal e Comercial, respectivamente.
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Para a legislação civil, adotou-se um outro critério, o de aperfeiçoá-la em duas fases distintas: primeiro, seria feito o levantamento e a consolidação de toda a legislação vigente até ali (“formar um novo corpo, mas de direito já vigente”); a seguir, com o auxílio do que fora feito, seria elaborado o texto do novo Código Civil (“formar um corpo novo de direito novo”).
Em 15 de fevereiro de 1855, o Governo, representado pelo então Ministro da Justiça, José Tomás Nabuco de Araújo, celebrou contrato com o Bacharel Augusto Teixeira de Freitas, a quem foi concedido o prazo de cinco anos para “coligir e classificar toda a legislação pátria, inclusive a de Portugal, anterior à Independência do Império”.
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Teixeira de Freitas iniciou seu trabalho situando os limites do Direito Civil, que toma na sua significação mais rigorosa. Observou, com a nitidez que a doutrina da época não percebera, que a distinção entre o Direito Civil e o Direito Penal está na natureza da sanção.
Segundo Freitas, “não são as pessoas e as coisas que se devem distinguir, mas suas obrigações e seus direitos”.
Conclui, portanto, que “na distinção dos direitos reais, e dos direitos pessoais repousa todo o sistema do Direito Civil”.
E acrescenta que “os chamados direitos absolutos - liberdade, segurança e propriedade - entram na compreensão da legislação criminal, que os protege e assegura com a penalidade. Desses direitos, o de propriedade unicamente entra na legislação civil. É no direito de propriedade que havemos de achar os direitos reais”.
Essa limitação de matéria civil hoje certamente não teria razão de ser, pois os direitos da personalidade integram também o Direito Privado, mas o autor expressava idéia que correspondia ao desenvolvimento da ciência e a cultura naquela época histórica.
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Depois de haver realizado com pleno êxito a tarefa de promover a Consolidação das Leis Civis do Império, em 1859, Augusto Teixeira de Freitas foi contratado pelo governo imperial para elaborar o primeiro anteprojeto, contrato esse rescindido em 1872.
O Esboço de código civil elaborado por Freitas foi dividido em duas partes (uma geral e outra especial).
Na parte geral eram regulados os designados elementos do direito, quais sejam: o sujeito, o objeto e o fato jurídico.
Na parte especial (subdividida em três livros), encontra-se a disciplina sobre os direitos pessoais e os direitos reais. 
Não poderiam ser esquecidas, ainda, a influência do privatismo doméstico e as condições sociais, ou melhor, a estrutura social brasileira, ao tempo da elaboração do Código - Teixeira de Freitas almejava em seu projeto de Código Civil a incorporação do direito comercial no direito civil.
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Seguiu-se a contratação de Nabuco de Araújo, que veio a falecer em 1878, prosseguindo os trabalhos de redação com Felício dos Santos. 
Com a Proclamação da República, a tarefa de redação do código foi conferida ao senador Coelho Rodrigues, cujo projeto não foi aceito. Por fim, em 1899, foi contratado Clóvis Beviláqua, redator do texto que viria a se transformar no Código Civil Brasileiro.
O Código Civil de 1916 reproduzia as concepções predominantes ao final do século XIX e início do século XX. Hoje, ante o novo diploma civil, a maior parte desses entendimentos encontra-se ultrapassada, uma vez que estavam baseados no individualismo então reinante, especialmente no que respeita ao direito de propriedade e à liberdade de contratar – refletia, na verdade, o ambiente liberal-conservador que marcava a sociedade brasileira naquele período.
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Pelo Código Civil de 1916, a FAMÍLIA apresentava um perfil transpessoal, hierarquizada e patriarcal, tendo ocorrido a incorporação de princípios morais, dando-lhes conteúdo jurídico.
Pode-se dizer, com isso, que o Código manteve-se fiel à tradição e ao estado social, conservando a indissolubilidade do matrimônio, o regime de comunhão universal e a legítima.
Em vários dispositivos do Código, o homem se apresentava como o “cabeça do casal”, cabendo à a mulher função de colaboração do marido no exercício dos encargos da família, cumprido a ela velar por sua direção material e moral .
O casamento do menor de 21 anos necessitava do consentimento de ambos os pais, mas, no caso de haver discordância, prevalecia a vontade paterna. O que configurava uma posição privilegiada da figura masculina na sociedade conjugal.
A mulher era considerada relativamente incapaz (art. 6°, II), de modo que, muitas mulheres sequer chegaram a ser capazes durante toda sua vida, pois como poderiam casar-se a partir dos dezesseis anos e só adquiririam a capacidade aos 21 anos, aquelas que casaram antes dessa idade não chegaram a possuir a capacidade plena.
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O Código apresentava o INSTITUTO DA PROPRIEDADE em termos absolutos e o INSTITUTO DO CONTRATO sob a perspectiva LIBERAL. 
 Apesar do caráter absoluto da propriedade, o Código Civil de 1916, no campo destinado ao direito de vizinhança, algumas limitações a esse direito:
o proprietário, ou inquilino de um prédio teria o direito de impedir que o mau uso da propriedade vizinha pudesse prejudicar a segurança, o sossego e a saúde dos que o habitam (art. 554). 
O dono do prédio rústico, ou urbano, que se achasse encravado em outro, sem saída pela via pública, fonte ou porto, teria o direito de reclamar do vizinho que lhe deixe passagem forçada (art. 559). 
Outro artigo, que implicava em limitação ao direito de propriedade, é o 572, pois o proprietário poderia levantar em seu terreno as construções que lhe aprouvesse, salvo direito dos vizinhos e os regulamentos administrativos.
No que se referia ao CONTRATO, na doutrina liberal do século XIX, este tinha, como direção, o dogma da AUTONOMIA DA VONTADE, sem limites. As partes poderiam livremente estipular o conteúdo das cláusulas contratuais, que o tornava obrigatório. Não se levava em conta o desequilíbrio na formação ou na execução do contrato.
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Segundo Antonio Carlos Wolkmer, o Código Civil de 1916, em que pesem seus reconhecidos méritos de rigor metodológico, sistematização técnico-formal e avanços sobre a obsoleta legislação portuguesa anterior, era avesso a grandes inovações sociais que já se infiltravam na legislação dos países mais avançados do Ocidente, refletindo a mentalidade patriarcal, individualista, e machista de uma sociedade agrária preconceituosa, presa aos interesses dos grandes fazendeiros de café, dos proprietários de terra e de uma gananciosa burguesia mercantil. 
UMA OBSERVAÇÃO FINAL A RESPEITO DO CÓDIGO CIVIL DE 1916.
Lvia 
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