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➢ Orientações gerais para a obtenção de amostras biológicas para exames microbiológicos: De uma forma geral, os profissionais da saúde devem ter em mente a importância dos seguintes itens: I. Utilização de antimicrobianos / Coletar antes de iniciar a antibioticoterapia: O profissional analisa certa cultura qualquer e visa encontrar nessa amostra bactérias que estejam causando um quadro infeccioso. A coleta antes de iniciar o tratamento com antimicrobiano é essencial para poder verificar o tipo de microrganismo que está causando os sintomas/doença. Sempre que possível deve ser colhida uma amostra ANTES do tratamento com antimicrobiano. Caso a coleta seja feita posteriormente ao uso de antibióticos, pode resultar em um falso negativo, ou seja, o paciente está com a infecção, porém começou há 48h a tomar antibióticos e a quantidade de bactérias já começa a diminuir, haja vista esse medicamento em questão ser efetivo contra as bactérias. Também pode ocorrer o inverso, o paciente já está em uso de uma cefalexina, por exemplo, e colheu a urina após 2 dias de uso, contudo, mesmo assim, o resultado veio positivo para a presença de bactérias. Caso seja necessário iniciar o uso de antibióticos antes da coleta (seja por qualquer motivo da clínica; ex.: paciente incomodado com a infecção), o médico pode dar início ao tratamento. A intervenção medicamentosa é iniciada e o médico tem o dever de transmitir essa informação ao laboratório. Ex.: paciente em uso de azitromicina, há 48h, deve-se anotar “paciente em uso de azitromicina, há 48h”. Com essa informação prévia, o microbiologista terá como observar se o crescimento bacteriano está sendo inibido pelo antibiótico ou não. O médico também poderá orientar o paciente a fazer a coleta de urina (é o mais comum na prática), entregar ao laboratório e só assim começar a antibioticoterapia para aliviar a dor, febre e outros incômodos. II. Obrigatoriamente todo e qualquer dispositivo utilizado necessita estar esterilizado (não apenas passar pelo processo de desinfecção): De forma imprescindível, todo dispositivo utilizado para coleta, quer seja recipientes coletores (para urina, fezes, escarro), hastes plásticas (swab), seringa ou qualquer outro material que vai estar em contato com a espécime clínica, DEVE estar esterilizado. O médico tem o dever de assegurar que o que vai crescer naquela amostra está isento de contaminantes, tanto advindos da fonte do paciente, por exemplo, da microflora dele (por isso a extrema importância da descontaminação local e dos processos de assepsia), quanto dos materiais utilizados para a coleta. III. O material deve ser colhido no verdadeiro local da infecção, em quantidade suficiente: A coleta da secreção de um paciente que apresenta faringite, com placas de pus nas amígdalas, por exemplo, deve ser feita com um swab e este, por sua vez, deve ir em direção a tocar direto a lesão. NÃO pode, de forma alguma, antes de chegar à lesão, tocar no dente, no lábio, na bochecha, na língua, no céu da boca e só depois chegar ao local lesionado. Quando isso acontece, ainda que rápido, está ocorrendo a contaminação do swab da amostra com as bactérias da microbiota da cavidade oral. As bactérias contaminantes crescem mais rápido em um meio de cultura do que as bactérias patogênicas. Nesse caso supracitado, as bactérias comensais da cavidade oral vão ter crescimento mais veloz que as patogênicas da orofaringe. As amostras contaminadas inibem o crescimento das bactérias patogênicas. As bactérias trazidas de forma indevida à cultura crescem no meio, utilizam-se da umidade e dos nutrientes, de forma que não deixam quase nada para a bactéria patogênica, a qual necessita, também, dessas condições para crescer. Em um paciente com gastroenterite, deve ser analisado suas fezes diarreicas. Essa é sua amostra verdadeira. Logicamente, o médico não vai fazer nenhum procedimento para ir ao local da infecção e colher. É colhida pelo processo natural da evacuação ou por swab retal. IV. O envio da amostra ao laboratório deve ser imediato: Não se pode colher urina hoje para levar ao laboratório amanhã, colher um swab de uma lesão hoje para semeá-lo amanhã. Esses materiais são colhidos e ar-condicionados em locais específicos (em meios de cultura de transporte) e seguem para o laboratório, a fim de serem processados. Esses exames, por si só, já demoram. Não se pode esperar mais 24 horas para começar o processamento do material, por exemplo. É inviável, pois a bactéria pode morrer e demorar ainda mais o retorno do resultado. ➢ Sobre os exames mais frequentes e sítios anatômicos mais solicitados: Diante de uma secreção de orofaringe deve ser solicitada uma cultura de secreção de orofaringe. Nesse caso, a suspeita é de, por exemplo, amigdalite bacteriana, faringite estreptocócica, sobre a qual o paciente chega relatando grande incômodo na garganta, sendo possível visualizar placas de pus, vermelhidão e outros sinais de infecção e inflamação. Não é necessário ficar sem higienizar a boca para realizar a coleta (pacientes costumam perguntar), mas de preferência não se alimentar antes, a fim de evitar que a amostra seja confundida com restos alimentares e contaminada. Para colher, é importante que o paciente esteja com a boca bem aberta e pede-se para que ele prenda a respiração por alguns segundos para evitar ânsia de vomito. Com a palheta, abaixa-se a língua e pede para que ele diga “aah”. Nesse momento, com uma leve rotação no centro da lesão, coleta-se a amostra. Orofaringe e trato respiratório superior: cultura de orofaringe. Paciente com suspeita de faringite estreptocócica, o principal agente da pesquisa para o clínico e para o laboratório é o streptococcus pyogenes beta-hemolítico do grupo A, que tem como complicações mais graves as infecções pós supurativas de uma infecção que não foi detectada anteriormente, como é o caso da glomerulonefrite. Trato respiratório inferior: não se pode deixar de discutir a questão do escarro. É importante lembrar que ao suspeitar de tuberculose, os exames solicitados devem ser: baciloscopia e cultura de escarro para micobacteria tuberculose. Se for solicitado apenas cultura de escarro, o laboratório vai realizar a cultura de escarro para germes comuns que podem estar causando, por exemplo, uma pneumonia. É muito difícil não vir contaminantes no escarro, pois ele passa por toda a cavidade até cair no coletor externo. Por isso, é importante explicar como o paciente vai forçar a expectoração para sentir que a amostra veio realmente de um local profundo (brônquios), uma vez que é muito comum alguns deles apenas juntarem saliva e cuspirem, tornando muito difícil positivar o exame. Desse modo, o indivíduo deve tossir e forçar até expectorar. No caso de pacientes muito debilitados, incapazes de realizar esse processo, é feito uma indução com soro fisiológico e uma aspiração, o que é bem mais invasivo e só indicado em casos isolados. Se estiver muito difícil de expectorar, pode-se sugerir uma nebulização para fluidificar mais a secreção. A coleta é feita pela manhã, pois subtende-se que à noite houve produção que se acumulou, o que facilita a coleta, após a higienização bucal e antes de se alimentar. Entre os exames mais solicitados na prática clínica e, por conseguinte, mais realizados nos laboratórios estão as uroculturas/urinoculturas ou culturas de urina (formas corretas de solicitar). Nesse caso, a melhor amostra para a análise é o jato médio. Quando é idoso, criança ou paciente que não esteja controlando os esfíncteres existe outro método, outro tipo de amostra. O jato médio é o mais indicado, porque, por mais que haja higienização dos genitais, um terço da entrada da uretra sempre vai ser povoado por bactérias naturais da flora. Nesse sentido, dispensar os jatos iniciais minimiza a contaminação, uma vez que o primeiro jatopassa e lava a entrada da uretra. Assim, após o primeiro jato, deve-se prender a urina e coletar em seguida o jato médio. Analisando as diferenças entre o sexo feminino e o masculino, percebe-se que as mulheres têm mais infecções urinárias que os homens. Umas das causas é o fato de que elas possuem uma uretra menor, mais curta. Essa uretra fica entre os pequenos e grandes lábios e, também, possui uma proximidade com o ânus. Já nos homens, a uretra é bem maior e, também, mais distante do ânus. Tendo isso em vista, o processo de coleta das amostras torna-se mais dificultoso devido a essa anatomia. A mulher precisará separar os pequenos e grandes lábios, realizar toda a higienização com sabão neutro, enxugar a região e, por fim, expor bem essa uretra para fazer o procedimento. O homem também precisará fazer um passo a passo semelhante, entretanto de forma bem mais prática/fácil. Assim, além das mulheres terem mais infecções que os homens, elas também possuem um maior índice de contaminação da amostra. O coletor para cultura deve ser estéril e não desinfectado (esse só serve para sumário de urina e parasitológico de fezes). Existem, também, outras duas formas de se coletar a urocultura: I. Aspiração de urina supra púbica (método invasivo): ▪ É mais indicado para crianças (primeiros meses de vida), que já tiveram infecções recorrentes (por exemplos, mais de 3 vezes), sem eficácia terapêutica; ▪ Essa urina vem diretamente da bexiga, isenta de microrganismos contaminantes; ▪ Precisa de anestesia e é feita em centros cirúrgicos. II. Urina coletada por saco coletor (método não invasivo): ▪ Normalmente, usa-se esse procedimento antes de realizar a aspiração supra púbica; ▪ Muito utilizada na pediatria; ▪ Saco coletor é estéril e com região adesiva para se colocar na região pubiana; ▪ Forma simples e não invasiva; ▪ Possui um alto índice de contaminação; ▪ O saco deve ficar no máximo 30 a 60 minutos, após esse tempo, se não tiver coletado a urina, é preciso colocar um novo saco coletor. ➢ Coprocultura/ Cultura de fezes: ▪ Indicada para pacientes com sintomas de diarreia / dores abdominais; ▪ As fezes precisam ser colhidas no período agudo da infecção. Quando for solicitada uma cultura de fezes, é necessário informar ao paciente que as fezes precisam ser colhidas no dia em que foi solicitado o exame, o quanto antes. Isso porque é muito mais fácil isolar a bactéria no quadro agudo, quando o paciente apresenta, por exemplo, fezes diarreicas, odor fétido ou fezes sanguinolentas do que após 1 semana, quando as fezes já se encontram normais e endurecidas. É importante transmitir essa orientação ao paciente, tendo em vista que coletar fezes diarreicas pode parecer uma situação desconfortável para ele, fazendo-o pensar em coletar as fezes quando estiverem mais endurecidas, tornando a situação mais confortável. No entanto, isso não é o adequado para avaliação do material. Obs.: a quantidade mais ou menos necessária de fezes para conseguir avaliar o material é de uma alçada. Com uma alça bacteriológica de platina (figura abaixo), “enche-se” a parte circular da alça, sendo suficiente para a cultura. Logo, uma evacuação normal é mais do que suficiente para a coprocultura. A coleta com o swab é realizada sobretudo em recém-nascidos, os quais estão no serviço de saúde e começam a apresentar um surto de shigellose no berçário ou na enfermaria. O swab retal é uma forma de conseguir rapidamente o material e fazer a cultura de fezes. O procedimento consiste em colocar o swab no reto – mais ou menos 1/3 –, realizar um movimento rotatório e tirar o swab. Com isso, observa se o algodão saiu com uma coloração de fezes ou não. Caso não, é preciso aprofundar o swab um pouco mais até conseguir coletar as fezes. O principal benefício consiste na rapidez de coleta do material. É destinado, na maior parte das vezes, para infecções com shigella, devido tal bactéria ter um tropismo pela ampola retal, ou seja, desce em grande quantidade e fica concentrada nesse local. Isso facilita a coleta, tornando-a rápida e permitindo já atuar e proceder com a vigilância em saúde. ➢ Feridas, abcessos e exsudatos: São materiais altamente contaminados. Portanto, é necessário, inicialmente, uma higienização e assepsia com soro fisiológico. A orientação principal dos manuais consiste em realizar uma punção com agulha para coletar o material. No entanto, há discordâncias entre os microbiologistas e médicos de hospitais quanto a isso, visto a forma mais utilizada ser através do swab. Caso a lesão comporte um swab, é fundamental realizar a higienização, lavar com bastante soro fisiológico e no centro da lesão aprofundar o máximo que puder e, assim, coletar o material. Caso a lesão seja pequena – como é o caso de feridas, exsudatos –, que não tem como o swab entrar, é necessário fazer a punção. É um erro comum a solicitação de coleta com o swab para lesões pequenas, o que dificulta o manejo da lesão, devido à alta contaminação por bactérias hospitalares e da pele. Existem bactérias que causam lesões com bordas mais “inchadas”, por aglomerarem-se nessas bordas. Nesses casos, é necessário escarificar, passar o bisturi ou lâmina na borda e, então, o material sairá pela linfa, permitindo a coleta. ➢ Fluidos orgânicos estéreis: Isso se aplica, por exemplo, ao líquor. Um paciente com suspeita de meningite bacteriana vai ser submetido a uma punção. Para isso, é solicitado que ele fique em posição fetal, então a coleta será feita na terceira ou quarta vértebra lombar. É um procedimento realizado em ambiente hospitalar. Esses materiais coletados de líquidos estéreis não podem ser perdidos, no sentido de inviabilizar o exame. Eles precisam ser imediatamente semeados. Isso porque as bactérias que estão no líquor são sensíveis as condições ambientais, como temperatura e, por isso, não se pode demorar a semeá-las. Além dessa questão, há também a demora para realização do exame, demorando, portanto, o retorno do resultado ao médico e ao paciente. Essa demora é devido ao crescimento bacteriano variar por volta de 24 a 72 horas, após isso é preciso descobrir qual a bactéria presente no material (+24 horas) e depois realizar o antibiograma (+24 horas). ➢ Aparelho genital feminino: ▪ Secreção vaginal: Para uma paciente que se encontra com um quadro de prurido vaginal, secreção, odor fétido e/ou ardor pode ser solicitada uma cultura de secreção vaginal. Esse tipo de cultura é destinado às pacientes adultas e jovens que já tenham uma atividade sexual. De início para realizar a coleta, é necessário tirar o excesso de muco vaginal (fisiológico). Em seguida, com o swab, colhe-se a amostra do fundo vaginal, por meio de movimentos rotatórios. No caso de crianças e/ou jovens, os quais ainda não tenham iniciado atividade sexual, faz-se a coleta do introito vaginal (amostra da vagina distal), não se faz a coleta de secreção vaginal. Por isso, a análise de uma possível contaminação pode ficar um pouco prejudicada, uma vez que serão encontradas as bactérias inerentes ao local coletado, mesmo que seja feita a higienização. Quando é solicitada a análise de uma amostra mais interna do trato genital feminino, é feita a coleta endocervical, seguindo o procedimento: passagem do espéculo, retirada do muco com gaze esterilizada, introdução do swab estéril (1-2cm no canal endocervical) e giro a 180º. O terceiro tipo de cultura é um dos mais comuns, a análise da secreção uretral. Apesar da uretra feminina ser bem pequena, quando há um processo infeccioso vigente, ocorre bastante secreção na uretra, a qual deve ser retirada com soro fisiológico (pois diz- se que é uma secreção envelhecida), depois é feita uma “massagem” para liberar mais as gotinhas que serão colhidas. Caso não consiga liberar a secreção, é introduzido umswab fininho, próprio para o canal uretral, o qual é girado em 180º. Após retirado, deve-se analisar a coloração do swab para verificar se a secreção foi coletada. Então na mulher, tem-se a cultura da secreção vaginal – colhida do fundo do canal vaginal –, a endocervical – colhida a 1-2cm do canal da endocévice – e a uretral. Obs.: a gonorreia pode ser identificada também na análise da urina de primeiro jato, porém a identificação na coleta uretral é mais garantida. No homem, também podem ser coletadas 3 tipos de amostras. São elas: a uretral, a urina de primeiro jato e o esperma. Para coletar a amostra uretral, faz-se a higienização com soro fisiológico após exposição da glande, então é feita a massagem para saída da secreção. Caso não saia, é feita a introdução do swab, a qual é dolorosa. A cultura da urina de primeiro jato é feita para pacientes com história clínica de DST, gonorreia, por exemplo. Porém, a cultura mais realizada é a cultura de jato médio. O paciente pode estar com infecção no esperma e para verificar é realizada a cultura da amostra do esperma – espermocultura –, colhida pelo próprio paciente no laboratório. Obs.: lembrar que a espermocultura é diferente do espermograma, o qual estuda a fertilidade do homem. Ambos são coletados pelo próprio paciente no laboratório. Obs.: o quadro clínico da infeção no esperma cursa com ardência ou desconforto, odor não característico e aspecto mais purulento. Para finalizar, os médicos podem solicitar a hemocultura ou cultura de sangue nos casos de suspeita de bacteremia ou quadros mais graves de septicemia, infecção generalizada. Essa coleta é feita a partir da punção venosa, com 1, 2 ou 3 amostras de locais diferentes, com o fito de aumentar as chances dessa bactéria circulante ser detectada. Dessa forma, depois de expostos os principais procedimentos de coleta de amostras para cultura, é importante mencionar que o estudo dessas amostras tem o aspecto diagnóstico, o aspecto de controle/vigilância e ainda epidemiológico, para se identificar as bactérias mais presentes no ambiente hospitalar, na UTI etc. Além disso, o laboratório de microbiologia hospitalar também analisa o perfil de resistência das principais bactérias encontradas nesse local em questão. Ainda é válido destacar que a coleta adequada das amostras biológicas, seguindo todos os cuidados e procedimentos, está diretamente relacionada a excelência de laudos microbianos. Isso porque, em se tratando de uma coleta errada, um contaminante pode ser isolado e o médico irá elaborar sua conduta a partir disso, podendo fazer uso desnecessário de medicamentos.
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