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Infecção do Trato Urinário e outras intercorrências urinárias na infância Atenção Integral à saúde da criança Thaynara da Silva Relembrando a Anatomia... Relembrando embriologia... Infecção do Trato Urinário (ITU) Definição: Multiplicação de patógenos nas vias urinárias (desde meato uretral até o parênquima renal). Multiplicação de um único germe patogênico em qualquer segmento do trato urinário, identificado por urocultura coletada por método confiável (SBP, 2016). ITU alta x ITU baixa Trato urinário: · Estéril: Rins, Ureteres, bexiga, uretra posterior. · Colonizado: Uretra anterior, região periuretral. Vale a pena lembrar que: Colonizado≠ Contaminado≠ Infectado Importância: ITU é a principal causa de febre em lactentes Risco alto de sepse em lactentes menores Se recorrentes, podem ter sequelas, como HAS, doença renal crônica. Epidemiologia MENINOS MENINAS + comum nos primeiros anos de vida + comum nos não circuncidados Proteus= E.coli 1º ITU ocorre ~5 anos de idade, durante o treinamento esfincteriano 70-90% das ITUs são causadas por: E.coli uropatogênica (UPEC) Klebsiella Proteus spp. Picos de incidência: 1º pico =>1º ano de vida => meninos => anomalias 2º pico => 2º ano de vida => meninas => controle esfincteriano 3º pico => meninas => início da atividade sexual 1-3% das meninas e 1% dos meninos Após o primeiro ano de vida a prevalência entre sexo feminino e masculino é de 10:1 (grande preponderância nas meninas) podendo chegar até a 20:1. A incidência de pielonefrite é maior em menores de 1 ano e diminui gradativamente quando se aproxima da idade escolar. Mas pode ocorrer em qualquer idade Taxa de Recorrência: Meninos: 15-20 % sendo mais raras após o primeiro ano de vida Meninas: 30% apresentam novo ep. dentro do primeiro ano após o ep inicial. 50% recidivam em 5 anos Etiologia Bacteriana: E. coli Klebsiella Proteus Enterobacter Citrobacter Serratia Staplylococcus Enterococcus Bactérias GRAM negativas da microbiota intestinal do cólon, pertencentes à família Enterobacteriacae. Associadas às infecções nosocomiais, cateterismo e bexiga neurogênica. Alcalinizam a urina (degradam ureia)=> predispõe formação de cálculos de estruvita Pseudomonas sp Chamydia trachomatis Ureaplasma urealuticum Mycoplasma hominis Mycobacterium tuberculosis ou bacilo de Koch (BK) Gram negativa relacionada a procedimentos de manipulação das vias urinárias + frequentes na puberdade e causam infecções uretrais ou vesicais Comprometimento renal bilateral e assimétrico geralmente com piúria maciça e asséptica Fungos: Cândida albicans Cândida tropicalis Vírus: Adenovírus 11 e 21 Polimovírus Pcte com antibioticoterapia sistêmica prolongada Sondagens vesicais DM, imunocomprometidos Quadro de cistite hemorrágica (+ comum em meninos) Fisiopatologia Vias de contaminação: ● Principal: via ascendente ● Exceção: Hematogênica. Importante no período neonatal. O desenvolvimento da infecção depende da Virulência do MO (principal é a E.coli) ● P fímbria (ptte a II resistente à manose. ● Prevalência de antígeno capsular K. ● Produção de hemolisina. ● Produção de aerobactina. ● Resistência à atividade bactericida do soro. Resistência do Hospedeiro: ● “Clearance bacteriano” ● Baixo pH urinário ● Lisozima ● IgG e IgA ● Alta concentração de Ur e amônia na urina. Principais Fatores de Risco associados à ITU: Sexo feminino Incircuncisos RVU (presente em 20-40% das crianças na primeira ITU) Uropatia obstrutiva Roupas apertadas Secagem vulvar inadequada infestação por Enterobius vermiculares Constipação intestinal Atividade sexual Disfunção de eliminações Bexiga neurogênica Treinamento de toilette Instrumentação do trato urinário Anormalidades anatômicas: ● Adesão de grandes lábios ● VUP ● Ureterocele ● Estenose de JUP ● Duplicação de estruturas anatômicas Outros (DM, DEP…) Manifestações clínicas => De acordo com a faixa etária: ITU em RN Apresenta-se como quadro séptico. sinais e sintomais mais inespecíficos -ganho ponderal insuficiente -sucção débil -alteração na temperatura -irritabilidade -hipoatividade -convulsão -moteamento de pele -icterícia e palidez ITU em lactentes - Ganho ponderoestatural insuficiente - Febre sem sinais localizatórios - hiporexia - recusa alimentar - náuseas - vômitos - diarreia - dor abdominal - alteração no odor da urina ITU em pré escolares e escolares Sintomais mais relacionados ao trato urinário -disúria - polaciúria - urge- incontinência - enurese (em crianças que já apresentam controle esfincteriano prévio) - febre -dor lombar - calafrios - PPL positiva (Giordano) Manifestações clínicas => De acordo com a localização: Pielonefrite/ Pielite - febre - dor lombar ou abdominal - Giordano + - mal-estar - náuseas - vômitos - diarreia Cistite e uretrite - NÃO provocam febre nem evoluem com lesão do parênquima renal - polaciúria - disúria - dor suprapúbica - colúria - alteração no volume e odor da urina Diagnóstico A importância do diagnóstico precoce da ITU é prevenir e minimizar a formação e progressão de cicatriz renal, principalmente no neonato e lactente mais susceptíveis à formação de cicatrizes que como consequência numa fase mais tardia poderão levar à hipertensão e/ou IRC. (SBP, 2016) Diagnóstico =>Anamnese minuciosa =>Exame físico completo (avaliar crescimento ponderoestatural, exame de genitália). => Avaliação laboratorial: ● Análise de urina EAS/ urinálise/ urina tipo 1/ urina rotina: Não substitui a urocultura no diag da ITU mas pode apresentar alterações permitindo iniciar precocemente o tto, já que cultura demora 24 a 72h Urocultura: colhida por método adequado é padrão ouro para confirmação de ITU. Atenção com a fase pré- analítica ● Orientar bem os pais e/ou responsáveis ● coleta mais asséptica possível ● Análise rápida (se precisar, geladeira por no máximo 4h) ● Criança tem controle esfincteriano => urina de jato médio após limpeza do períneo e genitália (Contraindicado usar antisséptico). ● Criança não tem controle esfincteriano: ● Saco coletor de urina infantil (trocas a cada 30 min) ● cateterismo vesical ● Punção suprapúbica (PSP) Sensibilidade e especificidade dos componentes do exame de urina tipo 1 ● pH alcalino: Produtoras de urease? (ex: Proteus) ● Hematúria: pielonefrite? cistite? ● Nitrito positivo: Bactérias GRAM negativas? ● Esterase leucocitária positiva: piúria? PIÚRIA: Presença de 5 ou+ piócitos/leucócitos por campo microscópico de grande aumento (400X) OU >10.000 leuc/ml Para ajudar no diag dx, lembrar outras doenças que causam piúria: ● TB renal ● desidratação grave ● apendicite ● Glomerulonefrites ● lesão química Piúria estéril: Leucócitos + urocultura - Análise Microbiológica dos fluidos corporais (Giovanna Ferreira Matheus Nunes e Thaynara da Silva, 2020) Bacterioscopia 1 gt de urina não centrifugada Urocultura/ Urinocultura Solicitar Antibiobrama/ TSA => norteará possível troca de ATB diante de uma evolução desfavorável com o antibiótico iniciado de uma forma empírica. Cuidado na hora de interpretar Falso- negativo ● ph<5 ● diluição urinária ● presença de agentes bacteriostáticos na urina ● uso de ATB ● micções frequentes ● obstrução total do ureter do lado afetado ● Bactérias de difícil cultura Falso-positivo ● coleta inadequada ● demora no processamento ● contaminação vaginal, balanoprepucial Interpretação do resultado da Urocultura Saco coletor Valoriza-se o resultado quando a cultura é negativa. >100.000 UFC/ml de um único patógeno em criança sintomática ITU presumível Jato médio >= 100.000 UFC/ml ou >50.000 UFC/ml associada com análise de urina demonstrando evidência de piúria ITU confirmada Cateterismo vesical >= 1.000 UFC/ml ITU confirmada PSP qualquer crescimento bacteriano ITU confirmada •Meio CLED •Semeadura quantitativa com alça calibrada ou inoculação com pipetaEstudos mostram resultados falso-negativos em até 80% dos casos Diagnóstico diferencial de cistite do trato urinário inferior ● vaginite ● corpo estranho vaginal ● corpo estranho uretral ● oxiuríase ● irritantes locais: sabonetes, maiôs… ● Abuso sexual Tratamento objetivo:Erradicar processo infeccioso e prevenir recorrências, que podem cursar com HAS e perda progressiva da função renal. recomendações gerais: ● ingesta hídrica adequada ● ritmo intestinal fisiológico e micções frequentes (correção da constipação) ● tratar inflamação perineal: balanopostite, vulvovaginite, oxiuríase. O tto nunca deve ser inferior a 7 dias, e deve ser preferentemente por 10 dias contínuos (SBP, 2016). Quando internar? comprometimento do estado geral/ sepse vômitos/ desidratação baixa adesão ao tto maior risco de evolução grave: menores de 3 meses imunocomprometidos doenças urinárias prévias (ex. litíase) Antibioticoprofilaxia Tema bastante controverso! Em crianças com trato urinário normal, a profilaxia deve ser avaliada com cautela devido à possibilidade de aparecimento de cepas mais resistentes aumentando o risco de infecção Indicações: ● RVU grau III pra frente ● Até correção de disfunção miccional ● Até correção cirúrgica de processos obstrutivos Investigação por imagem Investigação por imagem USG de aparelho urinário Padrão para investigar crianças com ITU febril Quando fazer? durante a fase aguda da infecção atípica em <3 anos ou infecção recorrente em <6 meses. programado não urgente para infecções típicas em <6 meses e infecção recorrente em > 6 meses Investigação por imagem Uretrocistografia miccional (UCM) Método de escolha para o diagnóstico do RVU (e seus diferentes graus I, II, III, IV e V) e avaliação morfológica da uretra. Técnica: cateterização de bexiga e injeção de contraste iodado Quando fazer? Após término do tto do episódio agudo. “não há evidências de que este retardo seja necessário.” (SBP & SBU, 2020) Em quem fazer? ITU febril de repetição Alteração no USG Alteração na Cintilografia Cintilografia Renal Estática 99TC-DSMA padrão-ouro no diagnóstico de defeitos do parênquima renal Detecção de cicatrizes e diag de pielonefrite. e também permite avaliação da função renal Dinâmica 99TC-DTPA Avalia capacidade de filtração renal Em quem fazer? ITU febril em <2 anos Pielonefrite e pcte com RVU Quando fazer? 4 a 6 meses do ep inicial de ITU Todas as crianças em qualquer idade, em ambos os sexos. após o primeiro episódio de ITU bem documentado, devem ter seu trato urinário investigado anatômica e funcionalmente (Tratado de Pediatria SBP 4 ed) < 2 anos: USG de vias urinárias, UCM se detectado Hidronefrose ou suspeita de obstrução Refluxo Cintilografia dinâmica DTPA Cintilografia estática DSMA Prognóstico Fator de risco para cicatriz renal: ● < 1 ano ● Atraso no início do tto ● Crianças com altos graus de RVU ● malformações de trato urinário de caráter obstrutivo (ex. VUP) ● ITU recorrente