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@STDSELVAGEM FARMACOLOGIA E TERAPÊUTICA 1 As doenças ocasionadas pelos helmintos representam um grande problema socioeconômico. Muitos desses parasitos têm fundamental importância em saúde pública, uma vez que apresentam alto potencial zoonótico. Na Medicina Veterinária, os prejuízos diretos e indiretos causados pelas helmintoses são traduzidos em perdas altíssimas para a pecuária. Os animais de companhia e silvestres também são suscetíveis a um grande número de espécies de helmintos. Nos dias atuais, o controle de helmintos ainda é fundamentado, quase totalmente, na utilização de anti-helmínticos, o termo utilizado para definir os medicamentos empregados para tratamento de animais infectados por helmintos. A finalidade do tratamento é limitar a eliminação de ovos e larvas nas fezes e, consequentemente, reduzir o número de estágios infectantes no meio onde vivem os hospedeiros. Os anti-helmínticos usados no passado apresentavam reduzido espectro de ação e estreita margem de segurança. Na década de 1960, foram descobertos os benzimidazóis, com o lançamento do tiabendazol. Esses medicamentos, com amplo espectro de atividade, maior eficácia e menor toxicidade, revolucionaram o conceito de anti-helmíntico. Entretanto, a emergência de nematódeos resistentes ocorreu alguns anos após o lançamento dos benzimidazóis, em virtude do uso excessivo desses medicamentos. Como consequência da resistência, ainda na década de 1960, foram sintetizadas novas moléculas da mesma classe e de outros anti- helmínticos de amplo espectro de ação: os imidazotiazóis., as pirimidinas e as salicilanilidas. No início da década de 1980, foram descobertas as lactonas macrocíclicas (avermectinas e milbemicinas), com ação sobre endo e ectoparasitos (endectocidas). Em 2008, surgiu uma nova classe de anti-helmínticos: os derivados de aminoacetonitrila (AAD), com a síntese do monepantel. Recentemente, esse princípio ativo passou a ser comercializado no mercado veterinário do Brasil (Zolvix). @STDSELVAGEM FARMACOLOGIA E TERAPÊUTICA 2 Classificação e caracterização Os principais helmintos de interesse veterinário podem ser agrupados em dois filos, de acordo com sua etiologia: o filo Nemathelminthes, que compreende os nematódeos, e o filo Platyhelminthes, formado pelos cestódios e trematódeos. Os nematódeos apresentam corpo cilíndrico, alongado, não segmentado e constituem a classe de maior destaque entre os helmintos, por sua patogenicidade e ampla distribuição geográfica (p. ex., Ascaris spp., Haemonchus spp., Ancylostoma spp.). Os cestódios apresentam corpo achatado e segmentado, semelhante a uma fita (Dipylidium caninum, Moniezia spp., Anoplocephala spp.). Geralmente, esses agentes não causam graves lesões nos animais, mas alguns apresentam alto potencial zoonótico, uma vez que os animais domésticos participam na cadeia epidemiológica de zoonoses, como o complexo teníase/cisticercose, em que suínos são hospedeiros intermediários de Taenia solium, e na hidatidose, em cujo ciclo figura o cão como hospedeiro definitivo de Echinococcus granulosus. Já os trematódeos têm corpo achatado não segmentado, @STDSELVAGEM FARMACOLOGIA E TERAPÊUTICA 3 geralmente com aspecto de folha, como Fasciola hepatica, um dos parasitos de maior interesse para a Medicina Veterinária, em virtude dos prejuízos causados à bovinocultura, e Platynosomum spp., que acomete os gatos. Ação no hospedeiro Os prejuízos decorrentes das helmintoses nos animais se traduzem, principalmente, por perda de peso, crescimento tardio e predisposição a outras doenças. As ações obstrutivas (Ascaris spp., Dirofilaria immitis), compressiva (hidátide), traumática (Bunostomum spp.), espoliadora (Fasciola hepatica) e enzimática (Strongyloides spp.) dos parasitos sobre o hospedeiro resultam, sobretudo, em menor absorção e digestão de nutrientes, interferência no fluxo dos alimentos, lesões teciduais, perda de sangue e de proteínas e bloqueio da passagem do ar, alterando, deste modo, as funções orgânicas do hospedeiro. Outro aspecto das infecções parasitárias refere-se à resposta aos nematódeos gastrintestinais, geralmente do tipo Th2. Essas infecções geralmente estão associadas à eosinofilia tecidual, que contribui para a patogênese das nematodioses, com liberação de mediadores inflamatórios. O controle de helmintos foi sempre fundamentado na aplicação de medicamentos anti-helmínticos em esquemas curativo, tático, estratégico e seletivo. Este último utilizando o método Famacha, que objetiva identificar clinicamente animais resistentes, resilientes e sensíveis às infecções parasitárias, otimizando o uso do anti- helmíntico e retardando o aparecimento da resistência. O desenvolvimento deste método ocorreu em virtude da resistência de Haemonchus contortus de ovinos aos anti-helmínticos, e consiste em identificar os animais por meio da coloração da conjuntiva ocular, que @STDSELVAGEM FARMACOLOGIA E TERAPÊUTICA 4 poderiam apresentar haemonchose clínica, e trata-los individualmente. As colorações da conjuntiva foram preestabelecidas, com auxílio de computação gráfica, representando cinco graus (1 a 5), após o estudo de associação entre a coloração da conjuntiva, o valor do volume globular e a ocorrência do parasito em ovinos. Os medicamentos classificados como anti-helmínticos são usados no controle dos endoparasitos (nematódeos, cestódios e trematódeos), localizados nos órgãos e tecidos dos animais, principalmente no sistema digestório. Alguns anti-helmínticos têm, também, atividade sobre ectoparasitos, sendo conhecidos como endectocidas. Propriedades dos anti- helmínticos O mercado oferece um considerável número de medicamentos eficazes e seletivos no tratamento das helmintoses. Um medicamento anti-helmíntico ideal caracteriza-se por apresentar composição química estável; ação em estágios adultos e imaturos em desenvolvimento ou inibidos; ação em diversas espécies de helmintos; eficácia contra cepas resistentes a outros anti-helmínticos; não interferir no estabelecimento da imunidade; fácil administração; uso em dose única ou esquemas de curta duração; boa tolerabilidade pelo hospedeiro; alta margem de segurança (pelo menos seis vezes mais do que dose terapêutica); boa palatabilidade; compatibilidade com outros compostos; ausência de resíduos no leite e nos tecidos que possam requerer um longo período de carência e favorável relação custo/benefício. A dose ótima de um anti-helmíntico, determinada pelo fabricante, é aquela necessária à eliminação de alta proporção (mais de 95%) de parasitos adultos, com adequada segurança. Classificação dos anti- helmínticos Os anti-helmínticos são classificados por sua constituição química em: Compostos inorgânicos à base de sais de metais, que foram muito utilizados como medicamentos anticestódios (p. ex., arseniato de chumbo). @STDSELVAGEM FARMACOLOGIA E TERAPÊUTICA 5 Compostos orgânicos naturais foram principalmente usados no tratamento das helmintoses de aves (p. ex., arecolina) Compostos orgânicos sintéticos atualmente os mais utilizados, sendo formado por vários grupos químicos (substitutos fenólicos, salicilanilidas, pirimidinas, benzimidazóis, imidazotiazóis, avermectinas, milbemicinas e derivados da aminoacetonitrila). Formulação e administração Com a evolução dos medicamentos anti-helmínticos surgiram, paralelamente, diferentes formulações e modosde aplicação. Os anti-helmínticos são administrados nos animais pelas vias oral, parenteral ou cutânea (pour-on e spot-on). A baixa solubilidade na água de alguns compostos anti-helmínticos tem sido uma das limitações no desenvolvimento de formulações mais estáveis e não irritantes para administração parenteral. Os anti-helmínticos considerados insolúveis são, geralmente, formulados como suspensão e usados pela via oral, enquanto os solúveis são apresentados na forma de solução e utilizados pelas vias cutânea, parenteral ou oral. As preparações injetáveis de anti- helmínticos são administradas pelas vias subcutânea ou intramuscular, dispersando-se facilmente a partir do sítio de aplicação, sendo um método prático para rebanhos numerosos. Na aplicação cutânea, o medicamento é aplicado na linha do dorso (pour-on) ou na região cervical (spot-on) dos animais. A pele dos animais é rica em folículos pilosos, o que, provavelmente, facilita a maior absorção dos medicamentos. Para boa e rápida penetração através da pele é necessário que o medicamento seja lipossolúvel e hidrossolúvel, pois a solubilidade nas gorduras favorece a penetração nos folículos e no estrato córneo, e a solubilidade nos fluidos orgânicos propicia maior absorção a partir do sítio de aplicação. Os elementos climáticos, como temperatura e precipitação, parecem influenciar a eficácia dos produtos com esta formulação. Nas épocas frias e chuvosas ocorre menor absorção cutânea do anti- helmíntico. Em ovinos, a absorção do medicamento é dificultada pela presença de lanolina na lã. Absorção e distribuição Os parasitos entram em contato com o anti-helmíntico pela fração não absorvida da dose, que permanece no sistema gastrintestinal, e pela fração absorvida, que, através da corrente @STDSELVAGEM FARMACOLOGIA E TERAPÊUTICA 6 sanguínea, alcança o intestino e outros órgãos. Os anti-helmínticos são absorvidos no estômago e no intestino (preparações orais), pelos tecidos subcutâneo e muscular (preparações injetáveis) e pela pele (pour-on/ spot-on), penetrando na circulação sistêmica, sendo transportados para diferentes tecidos e órgãos, particularmente para o fígado, no qual são biotransformados e, posteriormente, excretados nas fezes e urina. A biotransformação do anti-helmíntico é importante na determinação da sua eficácia, pois resulta na produção dos metabólitos farmacologicamente ativos, podendo ocorrer no rúmen (fembenbazol e albendazol), no qual são reduzidos de sulfito para sulfóxido (metabólito ativo) e no fígado, local onde acontecem as maiorias das reações de oxidação e hidroxilação dos antiparasitários. Frequentemente, os medicamentos retornam por difusão passiva para o sistema gastrintestinal na forma de metabólitos ativos. Compostos solúveis ou biotransformados em produtos solúveis que não se associam fortemente às proteínas plasmáticas podem ser eliminados pela urina. A associação de medicamentos (salicilanilidas e substitutos fenólicos) com proteínas plasmáticas pode ser importante no transporte e na diminuição da velocidade de eliminação pelo organismo, fazendo com que a meia-vida do medicamento seja longa. Geralmente, esta associação é desfeita no fígado, e, após a biotransformação, o medicamento é eliminado pela bile e fezes. Fatores relacionados com o parasito Espécies e estágios do parasito O hospedeiro geralmente abriga várias espécies de helmintos e nem todos os parasitos têm a mesma sensibilidade aos diversos grupos químicos de anti-helmínticos. Os estágios imaturos são, de um modo geral, menos sensíveis à ação dos medicamentos, quando comparados ao estágio adulto. @STDSELVAGEM FARMACOLOGIA E TERAPÊUTICA 7 Dessa forma, quando os adultos são eliminados, estes podem ser rapidamente substituídos pelo desenvolvimento dos estágios imaturos. Carga parasitária O elevado número de parasitos no sistema gastrintestinal diminui significativamente a biodisponibilidade de alguns medicamentos. O nematódeo Trichostrongylus colubriformes, por exemplo, tem capacidade de reduzir a biodisponibilidade dos metabólitos do febantel, enquanto nas infeções pelo trematódeo F. hepatica, o processo de sulfonação do albendazol é alterado pela redução da enzima mono-oxigenase no fígado. Resistência de parasitos aos anti- helmínticos O tratamento das helmintoses é frequentemente prejudicado pelo desenvolvimento da resistência dos helmintos aos medicamentos. O uso em grande escala, a dosificação inadequada e a rotação continuada de substâncias químicas têm propiciado uma pressão de seleção sobre as populações de parasitos, de forma que apenas os indivíduos que apresentam alguma alteração genética que leve à resistência aos compostos anti-helmínticos sobrevivem à sua exposição. Com isto, doses previamente eficazes tornam-se ineficazes e os helmintos que resistem transmitem esta característica a sua progênie, assegurando o desenvolvimento progressivo de populações resistentes. @STDSELVAGEM FARMACOLOGIA E TERAPÊUTICA 8 Contudo, vale ressaltar que existem populações de helmintos que possuem habilidade natural para sobreviver ao primeiro contato com o anti-helmíntico, o que é conhecido como “tolerância”. A resistência tem sido observada em populações de helmintos que parasitam as mais diversas espécies animais, como cães, equinos e ruminantes. Porém, a frequência é maior em ovinos e caprinos. A resistência pode ser caracterizada como resistência paralela, quando observada entre os princípios ativos do mesmo grupo químico, com modo de ação similar; ou resistência múltipla ou cruzada, quando ocorre entre os grupos químicos que envolvem diferentes mecanismos de ação. A evolução da resistência pode ser retardada pelo desenvolvimento de programas estratégicos que permitam o uso seletivo de anti-helmínticos e o rodízio lento de medicamentos com diferentes mecanismos de ação. Fatores relacionados com o medicamento Tamanho e solubilidade A eficácia e a toxicidade dos anti- helmínticos estão na dependência do tamanho e da solubilidade da partícula do medicamento, por determinarem a taxa de absorção no sistema gastrintestinal. Nos anti-helmínticos pouco solúveis, como alguns benzimidazóis (fembendazol e albendazol), o tamanho da partícula do princípio ativo é fundamental para sua dissolução no fluido gastrintestinal. Quanto menor a partícula, melhor a taxa de dissolução. Estes medicamentos permanecem na forma de precipitados sólidos no lúmen gastrintestinal por um período maior do que os compostos solúveis (tiabendazol) e se dissolvem lentamente, de modo que as concentrações são mantidas por longos períodos no plasma e no intestino, fazendo com que os medicamentos sejam mais efetivos contra vários estágios de desenvolvimento do parasito, incluindo os estágios inibidos. Os compostos solúveis, por sua reduzida absorção gastrintestinal, asseguram a eficácia do medicamento sobre os parasitos que vivem no lúmen do sistema digestório. Estes medicamentos são, consequentemente, menos tóxicos para o hospedeiro. Biotransformação Geralmente é aceito que a biotransformação reduz a potência do medicamento. Isto é menos importante para o closantel e as lactonas macrocíclicas, que são excretados sem sofrer @STDSELVAGEM FARMACOLOGIA E TERAPÊUTICA 9 alteração, mas é relevante para os benzimidazóis, que são absorvidos no sistema gastrintestinal, particularmente no rúmen, e sua forma reduzida, o sulfóxido, que apresenta ótima atividade sobreos helmintos. Dose Um dos principais problemas relacionados aos anti-helmínticos é o uso de doses superiores ou inferiores às recomendadas pelos fabricantes. Quando se aumenta a dose do medicamento, a margem de segurança diminui. Doses repetidas, muitas vezes, são mais efetivas do que uma dose única maior, devido à natureza da ação antiparasitária de alguns medicamentos. Os benzimidazóis, por exemplo, dependem de maior tempo de contato com o parasito para exercer sua ação. As subdosagens, por sua vez, selecionam mais rapidamente os parasitos resistentes dentro da população. Via de administração A biotransformação e a excreção dos anti-helmínticos podem ser influenciadas pela via de administração utilizada. A disponibilidade da ivermectina, após administração intrarruminal, foi de 29 a 40%, quando comparada com 100% na administração intra-abomasal. A melhor eficácia dos benzimidazóis depende da sua passagem pelo rúmen; assim, a administração intrarruminal resulta em maiores níveis de concentração plasmática. Formulação A farmacocinética e a eficácia de um produto estão estreitamente relacionadas com a sua formulação. Os veículos, os estabilizadores e o tamanho da partícula do princípio ativo estão associados à qualidade da formulação de um produto. Fatores relacionados com o hospedeiro Espécie animal e raças Um outro aspecto da eficácia dos medicamentos anti-helmínticos é sua utilização nas várias espécies animais e raças. Muitos medicamentos têm seu uso limitado em determinadas espécies animais, sendo este limite relacionado com a eficácia sobre as espécies de parasitos, a farmacocinética e a tolerabilidade pelo hospedeiro. As doses dos benzimidazóis indicadas para ovinos parecem não ter a mesma eficácia no controle de parasitos em caprinos, isto provavelmente devido a menor biodisponibilidade dos compostos, após administração oral, nos caprinos, @STDSELVAGEM FARMACOLOGIA E TERAPÊUTICA 10 resultante de absorção gastrintestinal menos eficiente. A composição e fisiologia da pele podem aumentar a dissolução do medicamento e, assim, facilitar a absorção percutânea de compostos aplicados topicamente nos animais. A disponibilidade sistêmica da eprinomectina, após tratamento pour- on, foi menor em caprinos do que nos bovinos, como consequência de diferenças na absorção e deposição deste medicamento na pele Condições fisiológicas A condição corporal do animal pode ter influência na distribuição tissular e na meia-vida de eliminação de medicamentos anti-helmínticos, principalmente aqueles com grande afinidade por tecido adiposo, como as lactonas macrocíclicas. A presença de parasitos no sistema gastrintestinal pode modificar o pH do fluido digestivo, a permeabilidade da mucosa e a motilidade intestinal, alterando a farmacocinética dos compostos anti-helmínticos. Doenças hepáticas podem também interferir na biodisponibilidade destes compostos. Tipo e qualidade dos alimentos Variações na dieta podem alterar a biodisponibilidade do medicamento, por interferência no trânsito gastrintestinal e no pH. O comportamento farmacocinético dos compostos pode ser influenciado pelo fluxo da digestão, que interfere na deposição do medicamento no sistema gastrintestinal. O rúmen atua como um reservatório dos benzimidazóis, a partir do qual concentrações plasmáticas podem ser mantidas por longos períodos. A grande dimensão do rúmen e a mistura do anti-helmíntico com o conteúdo ruminal resultam em diminuição da sua taxa de absorção e aumento do tempo de permanência no órgão. Por outro lado, o tempo de permanência do medicamento no rúmen depende do fluxo da digestão, estando este relacionado com a qualidade e a quantidade do alimento. A ingestão de forragem fresca com alto conteúdo de água aumenta a taxa de trânsito gástrico e reduz o período de absorção e reciclagem do medicamento. A parte do medicamento que não foi associada à digestão contribui para o aumento precoce de seus metabólitos no plasma, e a absorção progressiva da parte associada mantém estes níveis plasmáticos Mudanças nos pH ruminal, abomasal e intestinal influenciam a eficácia do medicamento por interferência da solubilidade do princípio ativo. @STDSELVAGEM FARMACOLOGIA E TERAPÊUTICA 11 Os benzimidazóis, como, por exemplo, o fembendazol, é mais absorvido em meio alcalino. Reflexo da goteira esofágica Outro aspecto da administração oral de anti-helmínticos é o efeito do fechamento da goteira esofágica (goteira reticular) sobre a distribuição do medicamento. Este efeito tem sido observado com o uso de benzimidazóis e ivermectina, em caprinos. Com o fechamento da goteira reticular, a dose administrada deixa de passar pelo rúmen e segue diretamente para o abomaso, resultando em rápido aumento da concentração plasmática e redução do tempo de permanência do medicamento nos compartimentos gástricos, consequentemente menor biodisponibilidade plasmática dos metabólitos ativos, interferindo negativamente na sua eficácia As bases farmacológicas empregadas no tratamento dos helmintos interferem, principalmente, na produção de energia, na coordenação neuromuscular e na dinâmica microtubular, causando a destruição dos parasitos por inanição, quando são esgotadas suas reservas energéticas, ou a sua morte e expulsão decorrente de paralisia Os helmintos obtêm sua energia principalmente por meio da fermentação anaeróbica dos carboidratos. A glicose é o maior substrato para produção desta energia e a diminuição de sua absorção para o interior do parasito resulta na redução dos níveis de ATP e glicogênio e, consequentemente, na morte do helminto. A sobrevivência dos parasitos pode ser também comprometida quando o medicamento produz alterações das funções celulares básicas, como o bloqueio na polimerização da tubulina, proteína estrutural, interferindo na dinâmica microtubular, levando a perda de homeostase celular e consequente morte do parasito. A interferência na coordenação neuromuscular ocorre quando o anti- helmíntico inibe a ação de neurotransmissores excitatório (acetilcolina) ou inibitório (ácido gama- aminobutírico – GABA, glutamato), atuam como agonista de alta afinidade sobre a subunidade alfa de canais iônicos seletivos ao cloro, estimulando os receptores pré-sinápticos da latrofilina ou agindo sobre receptores nicotínicos (nAChR) encontrados apenas em nematódeos, o que resulta em paralisia espástica ou flácida do parasito. @STDSELVAGEM FARMACOLOGIA E TERAPÊUTICA 12 As associações de medicamentos têm por finalidade aumentar (sinergismo) ou complementar sua atividade contra os helmintos, ampliando o espectro de ação. Associações de antinematódeos e fasciolicidas, como, por exemplo, ivermectina associada ao clorsulon, @STDSELVAGEM FARMACOLOGIA E TERAPÊUTICA 13 têm sido utilizadas, mostrando maiores vantagens do que preparações de uso restrito para nematódeos ou trematódeos. Associações de compostos efetivos contra ascarídeos, ancilostomídeos e cestódios estão disponíveis para pequenos animais, como o praziquantel associado ao pirantel ou febantel. Outras associações entre nematodicidas e cestodicidas (lactonas macrocíclicas e praziquantel, pamoato de pirantel e praziquantel) estão disponíveis para utilização em equinos, em virtude da cólica verminótica ocasionada pelo cestódio Anoplocephala perfoliata. As associações só têm real valor quando a indicação dos medicamentos coincide com a dosificação estratégica parao controle dos parasitos. O uso intensivo e incorreto dos anti- helmínticos, com o consequente desenvolvimento de resistência pelos parasitos, tem limitado o sucesso de programas de controle fundamentados na utilização desses medicamentos. Ademais, o tempo entre a descoberta de novas moléculas e o lançamento de um novo antiparasitário pode levar anos e consumir milhões de dólares, o que justifica que os produtos atualmente no mercado sejam utilizados de maneira racional. O moderno manejo parasitário envolve um controle integrado e mais sustentável, e é fundamentado na combinação de três princípios básicos: manejo dos sistemas de pastagens; estimulação da resposta do hospedeiro; e modulação da biologia do parasito. A atividade anti-helmíntica de diversas plantas tem sido atribuída aos metabólitos secundários, como taninos, flavonoides, alcaloides, saponinas, componentes sulfurados e óleos essenciais. Esses compostos são produzidos em pequenas quantidades e não essenciais ao desenvolvimento da planta, mas sua produção está relacionada com a defesa da mesma contra agentes externos (microrganismos, insetos e predadores), proteção da radiação ultravioleta e atração de polinizadores. Plantas com moderada atividade anti- helmíntica, mesmo com eficácia inferior aos produtos sintéticos, podem fazer parte de um programa integrado de controle parasitário em sistemas de produção de ruminantes. O uso de produtos obtidos de plantas em associação aos medicamentos sintéticos poderá contribuir para aumentar a vida útil de anti- helmínticos disponíveis no mercado. @STDSELVAGEM FARMACOLOGIA E TERAPÊUTICA 14 SPINOSA, H. S., et al. (2017). Farmacologia aplicada à Medicina Veterinária. 6ª edição. Rio de Janeiro: Guanabara. Koogan Capítulo 42 – Considerações Gerais sobre os Anti-helmínticos.
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