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Cuidados de Enfermagem no Pré-Operatório As cirurgias de emergência e consequentes a traumatismos resultam, na maioria das vezes, em internação prolongada. Os clientes que estão em condição grave ou que são submetidos a cirurgias de grande porte e aqueles com doenças concomitantes podem precisar de cuidados suplementares de suporte de outras áreas da saúde, o que pode ser coordenado com mais facilidade no ambiente hospitalar. O alto nível de agudeza dos clientes cirúrgicos internados e a maior complexidade dos procedimentos impuseram maiores exigências em relação à prática da enfermagem nesse contexto (American Society of PeriAnesthesia Nurses [ASPAN], 2010). Embora cada ambiente (consultório, ambulatório ou internamento) ofereça suas próprias vantagens para a prestação de assistência ao cliente, todos os clientes precisam de avaliação de enfermagem pré- operatória holística, orientações e intervenções de enfermagem para se prepararem para a cirurgia. A comunicação, o trabalho em equipe e a avaliação do cliente são cruciais para garantir bons resultados para o cliente no período perioperatório. As normas profissionais de enfermagem perioperatória e perianestésica abrangem os domínios da resposta comportamental, resposta fisiológica e segurança do cliente, e são usadas como guias para o desenvolvimento de diagnósticos, intervenções e planos de enfermagem. A enfermagem perioperatória, que abrange toda a experiência cirúrgica, consiste em três períodos que começam e terminam em determinados pontos na sequência de eventos da experiência cirúrgica. O período pré-operatório começa quando se toma a decisão de realizar a intervenção cirúrgica e termina com a transferência do cliente para a sala de operação (SO). O período intraoperatório começa quando o cliente é transferido para a mesa cirúrgica na SO e termina com a admissão na URPA. A enfermagem intraoperatória conta com a atuação da enfermeira/técnica circulante ou enfermeira instrumentador. O período pós-operatório começa com a admissão do cliente à URPA e termina com a avaliação de acompanhamento na clínica ou em casa (Capítulo 19). Cada período perioperatório inclui as mais diversas atividades que a enfermeira realiza, tanto pelo processo de enfermagem quanto pelos Padrões de Prática da ASPAN (2010). O Perioperative Nursing Data Set classifica a prática de enfermagem perioperatória em quatro domínios: segurança, respostas fisiológicas, respostas comportamentais e sistemas de cuidados de saúde. Os três primeiros domínios refletem fenômenos de interesse para enfermeiras peroperatórias e são compostos por diagnósticos, intervenções e resultados de enfermagem. O quarto domínio – sistema de cuidados de saúde – consiste em elementos de dados estruturais e se concentra em processos e resultados clínicos. O modelo é usado para descrever a relação dos componentes do processo de enfermagem com o alcance dos resultados ideais para o cliente (Rothrock, 2010). Pré-operatório mediato O cliente é submetido a exames que auxiliam na confirmação do diagnóstico e que auxiliarão o planejamento cirúrgico, o tratamento clínico para diminuir os sintomas e as precauções necessárias para evitar complicações pós-operatórias, ou seja, abrange o período desde a indicação para a cirurgia até o dia anterior à mesma; Período imediato Corresponde às 24 horas anteriores à cirurgia e tem por objetivo preparar o cliente para o ato cirúrgico mediante os seguintes procedimentos: jejum, limpeza intestinal, esvaziamento vesical, preparo da pele e aplicação de medicação pré- anestésica. A decisão de realizar uma cirurgia pode basear-se na facilitação do diagnóstico (um procedimento diagnóstico, como biopsia, laparotomia exploratória ou laparoscopia), na cura (p. ex., a excisão de um tumor ou de um apêndice inflamado) ou no reparo (p. ex., reparação de múltiplas feridas). A cirurgia pode ser reconstrutiva ou estética (como mamoplastia ou lift facial), ou paliativa (para aliviar a dor ou corrigir um problema – como reduzir um tumor para possibilitar o conforto ou remover uma vesícula biliar disfuncional). Além disso, a cirurgia pode ser de reabilitação (p. ex., cirurgia de artroplastia total para corrigir uma dor incapacitante ou a progressão da osteoartrite degenerativa). Também pode ser classificada com base no grau de urgência envolvido: de emergência, urgente, necessária, eletiva e opcional. Concomitantes ao aumento das cirurgias ambulatoriais (cirurgias que não requerem uma estadia noturna em internação hospitalar) estão as mudanças na prestação de cuidados de saúde e o pagamento por esses serviços. Com incentivos para reduzir as internações e conter os custos, foram criados os exames pré-admissão (EPA) diagnósticos e o preparo pré-operatório antes da admissão. Além do hemograma, conferem-se as plaquetas (para o ato cirúrgico, considera-se aceitável um número de plaquetas acima de 50.000, mas há exceções. Cada cirurgia tem um nível plaquetário adequado). Infecções do Trato Urinário 1. Urina – altamente recomendável. 2. Urocultura: • Sintomáticos • ITU de repetição • Incontinência/Menopausa • Prostatismo • Imunodeprimidos Muitas instituições têm um departamento de serviços pré-cirúrgicos para facilitar os EPA e para iniciar o processo de avaliação de enfermagem, o qual focaliza os dados admissionais, como os dados demográficos do cliente, histórico de saúde e outras informações pertinentes ao procedimento cirúrgico (ou seja, os termos de consentimento apropriados, exames complementares e exames laboratoriais) (Rothrock, 2010). Com a cirurgia sendo cada vez mais realizada no consultório, no ambulatório ou em internação breve (hospital dia), o cliente deixa o hospital mais cedo e se recupera mais rápido. Essas mudanças aumentam a necessidade de orientações ao cliente, planejamento de alta, preparação para o autocuidado e encaminhamento para serviços de assistência domiciliar e reabilitação (ASPAN, Schick e Windle, 2010). Atividades de Enfermagem: 1. Comece a avaliação pré-operatória inicial 2. Inicie as orientações apropriadas às necessidades do cliente 3. Envolva a família na entrevista 4. Verifique se os exames complementares pré-operatórios foram realizados 5. Verifique a compreensão das prescrições pré-operatórias específicas dadas pelo cirurgião (ex: preparo do intestino, banho pré- operatório) 6. Discuta e analise o documento sobre o testamento vital 7. Inicie o planejamento de alta, avaliando a necessidade do cliente de transporte e cuidados pós- operatórios Admissão ao centro cirúrgico 1. Reitere a avaliação pré-operatória 2. Avalie os riscos de complicações pós-operatórias 3. Relate achados inesperados ou quaisquer desvios do normal 4. Verifique se o consentimento informado para a cirurgia foi assinado 5. Coordene as orientações ao cliente e o plano de cuidados com a equipe de enfermagem e outros membros 6. Reforce as orientações prévias 7. Explique as fases do período peroperatório e expectativas 8. Responda às perguntas do cliente e da família Na área de espera 1. Identifique o cliente 2. Avalie o estado do cliente, a dor subjacente e o estado nutricional 3. Revise o prontuário do paciente 4. Verifique o local da cirurgia e se ele foi demarcado de acordo com a política da instituição 5. Insira um cateter intravenoso 6. Administre medicamentos, se prescritos 7. Institua medidas para garantir o conforto do cliente 8. Forneça apoio psicológico 9. Comunique o estado emocional do cliente a outros membros pertinentes da equipe de saúde Clientes submetidos a cirurgia de emergência As cirurgias de emergência não são planejadas e ocorrem com pouco tempo para a preparação do cliente ou da equipe perioperatória. A natureza imprevisível do traumatismo e a cirurgia deemergência apresentam desafios únicos para a enfermeira durante todo o período perioperatório. Nessas situações, é importante que a enfermeira se comunique com o cliente e com os membros da equipe do modo mais calmo e eficaz possível. Os fatores que afetam os clientes que se preparam para se submeter a uma cirurgia também se aplicam àqueles submetidos à cirurgia de emergência, embora esta geralmente tenha um prazo muito reduzido. A única oportunidade para a avaliação pré-operatória pode ocorrer ao mesmo tempo que se realiza a reanimação no pronto socorro. O exame de inspeção rápida do cliente é essencial para identificar todos os locais de lesão se a cirurgia de emergência for decorrente de um trauma. O cliente, que pode ter sofrido uma experiência traumática, pode precisar de apoio extra e explicações sobre a cirurgia. Para o cliente inconsciente, é necessário obter o consentimento informado e informações essenciais de um familiar, como o histórico clínico pertinente e de alergias, se disponível. O objetivo no período pré- operatório é que o cliente esteja o mais saudável possível. Implementam-se todos os esforços para avaliar e tratar os fatores de risco que podem contribuir para as complicações pós-operatórias e para retardar a recuperação. Desenvolve-se um plano de ação para que potenciais complicações sejam evitadas. Antes que qualquer tratamento cirúrgico seja iniciado, coleta-se o histórico de saúde, realiza-se exame físico durante o qual se avaliam os sinais vitais, e estabelece-se uma base de dados para futuras comparações (Spry, 2009). Durante o exame físico, muitos fatores que podem afetar o estado do cliente submetido a uma cirurgia são considerados, como a mobilidade das articulações. Considerações genéticas também são levadas em conta durante a avaliação, para evitar complicações com a anestesia (Boxe 17.5). Deve-se perguntar ao cliente sobre o uso de medicamentos de venda controlada ou livre, bem como agentes fitoterápicos e outros suplementos; isso fornece informações úteis. Deve-se determinar o nível de atividade, incluindo a quantidade de exercício aeróbico regular. Alergias conhecidas a medicamentos, alimentos e látex poderiam evitar uma resposta anafilática (Ewan, Dugué, Mirakian et al., 2010). Os clientes podem ter apresentado manifestações de alergia ao látex anteriormente sem consciência disso. Se o cliente afirma que é alérgico a kiwi, abacate ou banana, ou não pode encher balões de festa, pode haver uma associação com a alergia ao látex. Fatores de risco Hipovolemia Desidratação ou desequilíbrio eletrolítico Deficts nutricionais Extremos etários Infecção e sepse Condições tóxicas Anormalidades imunológicas Doença pulmonar Doença obstrutiva Distúrbio restritivo Infecção respiratória Insuficiência renal ou doença do sistema urinário (diminuição da função renal, infecção urinária, obstrução) Gravidez Doenças cardiovasculares Disfunção endócrina Doença hepática Incapacidade mental ou física preexistente Os profissionais de saúde também devem estar alertas a sinais de maus tratos, que podem ocorrer em qualquer idade, em ambos os sexos e em qualquer faixa socioeconômica, étnica e cultural (Buscemi, 2011). Os achados devem ser comunicados de acordo com as normas vigentes (ver discussão mais aprofundada sobre os sinais de maustratos. Os exames de sangue, radiografias e outros exames complementares são solicitados quando indicado por informações obtidas a partir do histórico de saúde e do exame físico. A nutrição ideal é um fator essencial na promoção da cicatrização e resistência à infecção e outras complicações cirúrgicas. A avaliação do estado nutricional do cliente identifica os fatores que podem afetar a evolução cirúrgica, como obesidade, perda de peso, desnutrição, déficits de nutrientes específicos, anormalidades metabólicas e efeitos dos medicamentos sobre a nutrição. Pode-se determinar as necessidades nutricionais pela medida do índice de massa corporal e da circunferência da cintura. Qualquer déficit nutricional deve ser corrigido antes da cirurgia para fornecer a quantidade adequada de proteínas para o reparo tecidual. Desidratação, hipovolemia e desequilíbrios eletrolíticos podem levar a problemas significativos em clientes com comorbidades clínicas ou em adultos mais velhos. Muitas vezes, é difícil determinar a gravidade dos desequilíbrios hidroeletrolíticos. Os déficits leves de volume podem ser corrigidos durante a cirurgia; no entanto, pode ser necessário tempo adicional para corrigir déficits hidroeletrolíticos significativos a fim de promover as melhores condições pré- operatórias possíveis. A mudança atual para técnicas cirúrgicas abdominais mais minimamente invasivas tem aumentado a necessidade de preparo intestinal. A depleção de líquido e eletrólitos após o preparo intestinal pode resultar em desidratação e desequilíbrios químicos, mesmo em clientes cirúrgicos saudáveis. Durante a cirurgia, a desidratação e o desequilíbrio químico são previstos, planejados e tratados de modo a manter o cliente em condição estável (Doran, 2010). O cliente e a família precisam ser informados da necessidade de reposição de líquidos após a cirurgia. A condição da boca é um importante fator de saúde a ser avaliado. A cárie dentária, as próteses dentárias e as próteses parciais são particularmente importantes para o anestesiologista, porque dentes cariados ou próteses dentárias podem se desalojar durante a intubação e obstruir as vias respiratórias. Isso é especialmente importante para os clientes idosos, bem como para aqueles que podem não ter recebido atendimento odontológico regular. A condição da boca também é importante porque qualquer infecção corporal, mesmo na boca, pode ser uma fonte de infecção pós-operatória. A ingestão, mesmo moderada, de bebida alcoólica antes da cirurgia pode enfraquecer o sistema imunológico do cliente e aumentar a probabilidade de infecções pós-operatórias (Porth e Matfin, 2009). Além disso, pode comprometer a efetividade de alguns medicamentos. As pessoas que fazem uso abusivo de substâncias psicoativas (lícitas e ilícitas) ou bebidas alcoólicas com frequência tentam negar ou esconder essa informação. Nessas situações, a enfermeira que coleta o histórico de saúde do cliente precisa fazer perguntas francas com paciência, cuidado e atitude imparcial. Como as pessoas com intoxicação aguda são suscetíveis a lesão, a cirurgia é adiada, se possível. Se a cirurgia for de emergência, utiliza-se bloqueio anestésico local, espinal ou regional para a cirurgia de pequeno porte (Faulk, Twite, Zuk et al., 2010). Em outras situações, para evitar vômitos e potencial aspiração, insere-se um tubo nasogástrico antes da administração de anestesia geral. A pessoa com história de alcoolismo crônico muitas vezes sofre de desnutrição e outros problemas sistêmicos ou desequilíbrios metabólicos que aumentam o risco cirúrgico. Em clientes que são dependentes de bebidas alcoólicas, a síndrome de abstinência alcoólica pode ser prevista para 2 a 4 dias após a última ingestão de bebida alcoólica e está associada a uma taxa de mortalidade significativa quando ocorre no período pós-operatório. Esse aumento da taxa de mortalidade pode ser decorrente de arritmias cardíacas, miocardiopatias e tendência hemorrágica observada em casos de consumo abusivo de bebidas alcoólicas por tempo prolongado (Riddle, Bush, Tittle et al., 2010). Explique e demonstre ao cliente como realizar exercícios respiratórios e utilizar o espirômetro de incentivo, se indicado, para alcançar a melhor função respiratória antes da cirurgia. O potencial comprometimento da ventilação durante todas as fases do tratamento cirúrgico exige uma resposta proativa para infecções respiratórias. A cirurgia normalmente é adiada em casoseletivos se o cliente tiver infecção respiratória. Avaliam-se cuidadosamente os clientes com doença respiratória subjacente (p. ex., asma brônquica, doença pulmonar obstrutiva crônica) à procura de ameaças atuais à sua condição pulmonar. Os clientes também precisam ser examinados quanto a comorbidades, como infecção pelo vírus da imunodeficiência humana e doença de Parkinson, que podem afetar a função respiratória (West, 2011). Solicita-se aos clientes tabagistas que parem de fumar 4 a 8 semanas antes da cirurgia para reduzir significativamente tanto as complicações pulmonares quanto o retardo na cicatrização. As intervenções para o abandono do tabagismo no período pré-operatório podem ser efetivas na mudança do comportamento de tabagismo e na redução da incidência de complicações pós-operatórias. Tabagistas são mais propensos a apresentar cicatrização insatisfatória, maior incidência de infecções do local cirúrgico e complicações que incluem Tromboembolismo Venoso e pneumonia (West, 2011). No preparo do cliente para a intervenção cirúrgica, deve-se assegurar que o sistema cardiovascular pode suportar as necessidades de oxigênio, líquido e nutrição do período peroperatório. Se o cliente tiver hipertensão arterial não controlada, a cirurgia pode ser adiada até que a pressão arterial esteja sob controle. Às vezes, o tratamento cirúrgico é modificado para atender à tolerância cardíaca do cliente. Por exemplo, em um cliente com obstrução do cólon descendente e doença da artéria coronária, pode-se realizar colostomia simples temporária, em vez de ressecção mais extensa do cólon, que exigiria um período prolongado de anestesia. O objetivo pré-cirúrgico é o funcionamento ideal dos sistemas urinário e hepático, de modo que os medicamentos, agentes anestésicos, escórias metabólicas e toxinas sejam adequadamente metabolizados e eliminados do organismo. O fígado, os pulmões e os rins são as vias para a eliminação de toxinas e fármacos. O fígado é importante na biotransformação de compostos anestésicos. Distúrbios hepáticos podem afetar substancialmente o metabolismo desses agentes. A doença hepática aguda está associada a taxa de mortalidade cirúrgica elevada; portanto, a melhora pré- operatória da função hepática é uma meta. A avaliação cuidadosa pode incluir várias provas de função hepática. Os rins estão envolvidos na excreção de fármacos anestésicos e seus metabólitos; portanto, a cirurgia é contraindicada se o cliente tiver nefrite aguda, insuficiência renal aguda com oligúria ou anúria, ou outros problemas renais agudos. As exceções incluem cirurgias realizadas como medidas de salvamento, cirurgias para possibilitar um acesso mais fácil para a diálise ou aquelas necessárias para melhorar a função urinária (ou seja, uropatia obstrutiva ou hidronefrose). O cliente com diabetes que será submetido a uma cirurgia corre risco tanto de hipoglicemia quanto de hiperglicemia. A hipoglicemia pode se desenvolver durante a anestesia ou no período pós- operatório pela administração inadequada de carboidratos ou excessiva de insulina. Hiperglicemia, com potencial de aumentar o risco de infecção da ferida operatória, pode resultar do estresse da cirurgia e, consequentemente, provocar aumento nos níveis de catecolaminas. Outros riscos são a acidose e a glicosúria. Embora o risco cirúrgico no cliente com diabetes controlado não seja maior do que no cliente sem diabetes, o controle glicêmico rigoroso (80 a 110 mg/dℓ) leva a melhores resultados (Alvarex et al., 2010). O monitoramento frequente dos níveis de glicose no sangue é importante antes, durante e depois da cirurgia. Os clientes que receberam corticosteroides correm risco de insuficiência suprarrenal. O uso de corticosteroides para qualquer fim durante o ano anterior deve ser comunicado ao anestesiologista e cirurgião. O cliente é monitorado em busca de sinais de insuficiência suprarrenal. Os clientes com distúrbios da tireoide não controlados estão em risco de tireotoxicose (nos distúrbios de hipertireoidismo) ou insuficiência respiratória (nos distúrbios de hipotireoidismo). O cliente com história associada de distúrbio da tireoide é avaliado no período pré-operatório. Uma função importante da avaliação pré-operatória é determinar a ocorrência de alergias. É especialmente importante identificar e documentar qualquer sensibilidade a medicamentos e reações adversas pregressas (Ascia, 2011). O cliente é solicitado a identificar quaisquer substâncias que precipitaram reações alérgicas anteriores, incluindo medicamentos, transfusões de sangue, agentes de contraste, látex e produtos alimentícios, bem como a descrever os sinais e sintomas produzidos por essas substâncias. A imunossupressão é comum no tratamento com corticosteroides, transplante renal, radioterapia, quimioterapia e distúrbios que afetam o sistema imune, como a síndrome da imunodeficiência adquirida e a leucemia. Mesmo os sintomas leves ou uma pequena elevação na temperatura devem ser investigados. A história de medicação é obtida em razão das possíveis interações com medicamentos que podem ser administrados durante a cirurgia e os efeitos de algum desses fármacos no curso peroperatório do cliente. Quaisquer medicamentos que o cliente esteja usando ou tenha usado no passado são documentados, incluindo as preparações de venda livre e agentes fitoterápicos, bem como a frequência com que eles são usados. Muitos medicamentos têm um efeito sobre as funções fisiológicas; as interações desses medicamentos com os anestésicos podem causar problemas graves, como hipotensão e colapso circulatório. O ácido acetilsalicílico (AAS), um medicamento de venda livre comum que inibe a agregação plaquetária, deve ser descontinuado prudentemente 7 a 10 dias antes da cirurgia; caso contrário, o cliente corre maior risco de sangramento (Rothrock, 2010). O uso de AAS ou outros medicamentos de venda livre é anotado no prontuário do cliente e relatado para o anestesiologista e cirurgião. O anestesista avalia os potenciais efeitos do tratamento farmacológico prévio, considerando o intervalo de tempo em que o cliente utilizou a medicação, a condição física do cliente e a natureza da cirurgia proposta (Miller et al., 2010). A enfermeira deve prever que a maioria dos clientes tem reações emocionais antes da cirurgia – óbvias ou veladas, normais ou anormais. O medo pode estar relacionado com o desconhecido, com a falta de controle ou com a morte. Pode ser influenciado pela anestesia, dor, complicações, câncer ou experiência cirúrgica anterior. A ansiedade pré-operatória pode ser uma resposta preferencial a uma ameaça ao papel do cliente na vida, a uma incapacidade permanente ou à perda da integridade corporal, ao aumento das responsabilidades ou dos ônus sobre os membros da família ou à própria vida. Preocupações menos óbvias podem ser justificadas por experiências anteriores com o sistema de saúde e pessoas que o cliente tenha conhecido com a mesma condição. O sofrimento psíquico influencia diretamente o funcionamento do corpo. A identificação da ansiedade pela equipe de saúde com a orientação de apoio em cada momento do processo peroperatório ajuda a aliviar a ansiedade (Weber e Kelley, 2009). As pessoas expressam o medo de maneiras diferentes. Alguns clientes podem fazer perguntas repetidas, independentemente das informações já compartilhadas com eles. Outros podem afastar-se, evitando deliberadamente a comunicação e se envolvendo em atividades como ler e assistir a televisão, ou falar sobre trivialidades. Consequentemente, a enfermeira deve ser empática, ouvir atentamente e fornecer informações que ajudem a aliviar as preocupações. Um resultado importante da avaliação psicossocial é a determinação da extensão e do papel da rede de apoio do cliente. Avaliam-se a importância e a confiabilidadedos sistemas de apoio disponíveis. Outras informações, como o conhecimento sobre o nível habitual de capacidade funcional e das atividades diárias típicas, podem ajudar no tratamento e na recuperação do cliente. Avaliar a disposição do cliente para aprender e determinar a melhor abordagem para maximizar o entendimento fornece a base para as orientações pré-operatórias do cliente. Isso é de particular importância para os clientes que têm atraso de desenvolvimento e aqueles com comprometimento cognitivo, casos em que as orientações e a obtenção do consentimento incluem o representante legal. As crenças espirituais têm uma participação importante no modo como as pessoas lidam com o medo e com a ansiedade. Independentemente da filiação religiosa do cliente, as crenças espirituais podem ser tão terapêuticas quanto a medicação. É necessário esforçar-se para ajudar o cliente a obter o apoio espiritual que ele solicitar; portanto, a enfermeira deve respeitar e apoiar suas crenças. Perguntar se o conselheiro espiritual do indivíduo está informado sobre a cirurgia iminente é uma abordagem afetuosa e não ameaçadora. Mostrar respeito pelos valores e crenças culturais do cliente facilita o relacionamento e a confiança. Algumas áreas de avaliação incluem a identificação do grupo étnico ao qual o cliente pertence e os costumes e crenças do cliente a respeito da doença e dos profissionais de saúde. Alguns grupos étnicos não têm a tradição de expressar abertamente seus sentimentos com estranhos (Engebretson, 2011). A enfermeira precisa considerar esse padrão de comunicação quando avalia a dor. Talvez a habilidade mais valiosa à disposição da enfermeira seja ouvir atentamente o cliente e observar sua linguagem corporal, especialmente ao conhecer sua história. Informações e dicas valiosas podem ser adquiridas por meio de habilidades de comunicação e entrevista eficazes. Uma enfermeira sem pressa, compreensiva e sensível promove a confiança por parte do cliente. Intervenções de enfermagem pré- operatórias As enfermeiras têm reconhecido o valor das orientações pré-operatórias (Rothrock, 2010). As explicações e demonstrações para cada cliente são individualizadas, levando em consideração quaisquer preocupações e necessidades de aprendizagem específicas. Devem ser utilizadas múltiplas estratégias de orientação (p. ex., verbal, por escrito, demonstração de retorno), dependendo da necessidade e da capacidade do cliente. As explicações e demonstrações pré-operatórias são iniciadas o mais cedo possível, preferencialmente no consultório médico, na clínica ou no momento dos EPA, quando os exames complementares são realizados. Durante os EPA, a enfermeira ou médico disponibiliza os recursos relacionados com as orientações ao cliente, como instruções escritas (projetadas para serem reproduzidas e distribuídas ao cliente), recursos audiovisuais e números de telefone, para garantir que as orientações continuem até que o cliente se apresente para a intervenção cirúrgica. Sempre que possível, as explicações e demonstrações são espaçadas por um período de tempo para possibilitar que o cliente assimile as informações e faça as perguntas que possam surgir. Frequentemente, as sessões de orientações são combinadas a vários procedimentos de preparação para possibilitar um fluxo fácil e oportuno de informações. A enfermeira deve explicar e fazer demonstrações para o cliente sobre os procedimentos e fornecer tempo suficiente para as perguntas. As orientações devem ir além das descrições do procedimento; devem incluir explicações sobre as sensações que o cliente terá. Informar ao cliente que a medicação pré- operatória trará relaxamento antes da cirurgia não é tão eficaz quanto também dizer que a medicação agirá rapidamente e pode resultar em tontura, vertigem e sonolência. Saber o que esperar ajuda o cliente a prever essas reações e a alcançar um grau superior de relaxamento. Descrições excessivamente detalhadas podem aumentar a ansiedade; portanto, a enfermeira deve ser sensível a isso, observando e escutando o cliente, e fornecendo menos detalhes de acordo com as suas necessidades específicas. Proteger os clientes de lesão é um dos principais papéis da enfermeira peroperatória. A adesão às práticas recomendadas pela AORN e às Metas Nacionais de Segurança do Cliente da Joint Commission é essencial (Rothrock, 2010). Elas se aplicam a hospitais, bem como a centros de cirurgia ambulatorial e instituições que fazem cirurgias em consultório (Joint Commission, 2012). Os pesquisadores estão investigando o near miss, ou seja, “quase erro”, incidente que quase ocorreu no cenário peroperatório, mas foi identificado antes – potencial evento adverso (Boxe 17.9). A principal finalidade de suspender alimentos e líquidos antes da cirurgia é evitar a aspiração pulmonar. Até recentemente, os líquidos e alimentos eram restringidos desde a noite anterior à cirurgia e frequentemente por um tempo ainda maior. A American Society of Anesthesiologists revisou essa prática e fez novas recomendações para as pessoas saudáveis submetidas a cirurgias eletivas. As recomendações específicas dependem da idade do cliente e do tipo de alimento ingerido. Por exemplo, os adultos podem ser aconselhados a jejuar por 8 h após a ingestão de alimentos gordurosos e por 4 h depois da ingestão de produtos lácteos. Clientes saudáveis podem tomar líquidos claros até 2 h antes de um procedimento eletivo (Crenshaw, 2011). Os enemas não são comumente prescritos no pré- operatório, a menos que o cliente seja submetido a uma cirurgia abdominal ou pélvica. Nesse caso, um enema de limpeza ou laxante pode ser prescrito na noite anterior à cirurgia e talvez repetido na manhã da cirurgia. Os objetivos desse preparo incluem a visualização satisfatória do local cirúrgico, e evitar traumas ao intestino ou prevenir a contaminação do peritônio por material fecal. A menos que a condição do cliente apresente alguma contraindicação, deve-se usar o banheiro ou cadeira sanitária em vez da comadre para evacuar o enema se o cliente estiver hospitalizado durante esse período. Além disso, podem ser prescritos antibióticos para reduzir a flora intestinal. O objetivo do preparo da pele no período pré-operatório é reduzir as bactérias sem comprometer a integridade da pele. Se a cirurgia não for realizada em caráter emergencial, o cliente pode ser orientado a usar um sabão contendo um detergente germicida para limpar a área de pele durante vários dias antes da cirurgia, a fim de reduzir a contagem de microrganismos na pele; esse preparo pode ser realizado em casa. Em geral, os pelos não são removidos antes da cirurgia, a menos que os pelos do local da incisão ou em torno dele possam interferir no procedimento. Se precisarem ser removidos, utilizam-se depiladores elétricos para uma depilação segura imediatamente antes da cirurgia (AORN, 2011). Para garantir o local correto, o sítio cirúrgico normalmente é marcado pelo cliente e pelo cirurgião antes do procedimento. Intervenções de Enfermagem no período pré-operatório imediato Imediatamente antes do procedimento, o cliente veste um avental hospitalar, que é deixado desamarrado e aberto na parte de trás. O cliente com cabelos longos pode trançá-los, remover os acessórios e cobrir a cabeça completamente com uma touca descartável. A boca é inspecionada e removem-se próteses ou placas dentárias. Se deixados na boca, esses itens podem facilmente cair para a parte de trás da garganta durante a indução da anestesia e causar obstrução respiratória. Não se utilizam joias na SO; alianças de casamento e joias ou piercings devem ser removidos para evitar lesões. Se um cliente se recusar a remover um anel, algumas instituições permitem que ele seja fixado firmementeao dedo com fita adesiva. Todos os artigos de valor, incluindo dispositivos de assistência, próteses dentárias, óculos e próteses em geral, são entregues aos familiares ou são rotulados de modo claro com o nome do cliente e armazenados em local seguro e protegido de acordo com a política da instituição. Todos os clientes (exceto aqueles com distúrbios urológicos) devem urinar imediatamente antes de ir para a SO. Isso é importante principalmente para promover a visibilidade anatômica e a continência durante a cirurgia abdominal baixa. O cateterismo urinário é realizado na SO apenas quando necessário. O uso de medicação pré- anestésica é mínimo na cirurgia realizada em ambulatório ou consultório. Se for prescrita, normalmente é administrada na área de espera pré-operatória. Se for administrada medicação pré-anestésica, o cliente é mantido no leito com as grades laterais elevadas, porque a medicação pode causar tonturas e sonolência. Durante esse tempo, a enfermeira observa o cliente quanto a qualquer reação indesejada aos medicamentos. As imediações são mantidas tranquilas para promover o relaxamento. Algumas instituições colocam uma música clássica calma no ambiente (Moradipanah et al., 2009). Muitas vezes, a cirurgia é adiada ou o seu horário, trocado, o que impossibilita a solicitação de que uma medicação seja administrada em um momento específico. Nessas situações, a medicação pré-operatória é prescrita para “assim que chamado à SO”. A enfermeira pode deixar o medicamento pronto para ser administrado assim que receber a ligação da equipe da SO. Em geral, leva-se de 15 a 20 min para preparar o cliente para a SO. Se a enfermeira administrar a medicação antes de atender a outros detalhes do preparo pré-operatório, o cliente terá ao menos o benefício parcial da medicação pré-operatória e terá um curso anestésico e operatório suave. A lista de verificação pré- operatória contém os elementos essenciais que devem ser verificados no pré-operatório (Rothrock, 2010). A enfermeira completa a lista. O prontuário preenchido (com a lista de verificação pré- operatória e a modalidade de verificação) acompanha o cliente para a SO com o termo de consentimento cirúrgico em anexo, juntamente com todos os resultados dos exames laboratoriais e registros de enfermagem. Quaisquer observações incomuns de última hora que possam ter influência sobre a anestesia ou a cirurgia são anotadas com destaque na frente do prontuário. O cliente é levado para a área de espera ou sala pré- cirúrgica cerca de 30 a 60 min antes de a anestesia ser administrada. A maca deve estar o mais confortável possível, com cobertores suficientes para evitar que o cliente se resfrie em uma sala com ar condicionado. Geralmente se fornece um pequeno travesseiro para a cabeça. O cliente é levado para a área de espera pré-operatória, cumprimentado pelo nome e posicionado confortavelmente na maca ou leito. A área circundante deve ser mantida calma para que a medicação pré-operatória tenha o máximo efeito. Sons ou conversas desagradáveis devem ser evitados, porque o cliente sedado pode interpretá-los mal. A segurança do cliente na área pré-operatória é uma prioridade. Um processo ou procedimento padrão para verificar a identificação do doente, o procedimento cirúrgico e o local da cirurgia é essencial para maximizar a segurança do cliente (World Health Organization, 2008), possibilitando a intervenção imediata se forem identificadas quaisquer discrepâncias. A maioria dos hospitais e centros de cirurgia ambulatorial tem uma sala de espera, em que os familiares e outros entes queridos podem aguardar enquanto o cliente está em cirurgia. Essa sala pode ser equipada com cadeiras confortáveis, televisões, telefones e refeições leves. Voluntários podem permanecer com os familiares, oferecer-lhes café e mantê-los informados do progresso do cliente. Após a cirurgia, o cirurgião pode reunir a família na sala de espera e discutir o resultado. Os familiares e entes queridos nunca devem julgar a gravidade de uma cirurgia pelo tempo que o cliente passa na SO. O cliente pode ficar ali por muito mais tempo do que o tempo real de cirurgia, por vários motivos: Os clientes rotineiramente são transportados com bastante antecedência ao momento real da cirurgia O anestesiologista muitas vezes faz preparativos adicionais, que podem levar de 30 a 60 min O cirurgião pode levar mais tempo do que o esperado com o caso anterior, o que atrasa o início do procedimento cirúrgico seguinte. Depois da cirurgia, o cliente é levado para a URPA para garantir que ele acorde da anestesia de modo seguro. Os familiares e outros entes queridos que esperam para ver o cliente depois da cirurgia devem ser informados de que ele pode estar com determinados equipamentos ou dispositivos (p. ex., cateter IV, cateter urinário, tubo nasogástrico, cateter de oxigênio, equipamentos de monitoramento, cateter de transfusão sanguínea) ao retornar da cirurgia. Quando o cliente retorna ao quarto, a enfermeira fornece explicações sobre o que frequentemente se observa no pós-operatório. No entanto, é de responsabilidade do cirurgião, não da enfermeira, retransmitir os achados cirúrgicos e o prognóstico, mesmo quando os achados são favoráveis. Smeltzer, Suzanne C., and Brenda G. Bare. "Brunner & Suddarth, Tratado de enfermagem médico-cirúrgica." Brunner & Suddarth, Tratado de enfermagem médico-cirúrgica. 2005. 1133-1133.
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