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Carne de frango originada a partir de cultivo celular histórico e procedimentos

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Carne de frango originada a partir de cultivo celular: histórico e procedimentos
Baseado na notícia: “Cingapura: Primeiro país do mundo a oferecer entrega de frango com
cultura celular”
De acordo com a OMS (Organização Mundial de Saúde), a população mundial em 2014 chegou a
sete bilhões de pessoas (WHO, 2014), e estima-se que alcance 9,7 bilhões em 2050 (Wilson,
2013). Tendo como base o crescente aumento da demanda por carne calcula-se que o consumo
dela deverá aumentar em aproximadamente 73% do ano de 1999 até 2050 (FAO, 2011). Isso
ocorre principalmente devido ao aumento da população mundial e das melhores condições
econômicas de algumas classes sociais (FAO, 2011). Assim, surge essa necessidade de que haja
um melhoramento e eficiência na produção agropecuária por conta dessa alta demanda de carne
mas é preciso estar atento para os problemas que podem vir junto com esse impulso da produção
de carne pelos modelos tradicionais de produção, como por exemplo: A emissão de gases do efeito
estufa, que são provocados pelas queimadas e pelo desmatamento para abertura de novas áreas
de pastos e o uso descontrolado da água doce (POST, 2014a), que são problemas que já ocorrem e
com esse aumento poderiam ser intensificados. Nesse contexto, uma alternativa seria a produção
de carne de laboratório ou in vitro. A “carne cultivada” como está sendo chamada, faz parte do
campo científico da agricultura celular, que mesmo estando em estágio inicial, busca desenvolver
produtos de origem animal com pouco envolvimento ou quase nenhum envolvimento do animal
nesse processo. Desse modo, a tecnologia de carne cultivada ela vai integrar os campos da
biomedicina e agroalimentar.
E daí surgiu o interesse nesse tema, e por isso abordaremos um pouco mais sobre ele hoje,
descrevendo seu histórico, explicando como acontece a produção deste tipo de carne e
apresentando seus benefício e desafios para o futuro.
Histórico
Em 1912, Alexis Carrel, clínico francês e Prêmio Nobel de Medicina, conseguiu manter um pedaço
de músculo do coração de embrião de galinha batendo em uma placa de Petri, demonstrando que
era possível manter vivo o tecido muscular fora do corpo, desde que ele fosse mantido com
nutrientes (Bhat & Bhat, 2011a).
Essa ideia de se produzir carne in vitro só foi prevista ou sugerida por Winston Churchill em 1931,
no livro “Daqui a 50 anos”, em que ele falava sobre as perspetivas para o futuro e no qual ele
afirma considerar ao invés de criar um frango inteiro para comer só o peito ou a asa, cultivar essas
partes em meio de cultivo adequado.
Em 1950, o cientista holandês Willem Van Eelen, teve a ideia de usar cultura de tecidos para a
geração de carne in vitro.
Só que demorou até 1999 para que a ideia teórica dele fosse patenteada, já que nessa época o
conceito de células-tronco e cultura in vitro de células ainda não havia surgido. A patente foi
intitulada “Produção industrial de carne utilizando métodos de cultura celular”, onde a ideia seria
construir um suporte muito fino (scaffold), que deveria ser comestível, para permitir que as células
musculares se fixassem ali e crescessem em meio de cultura, trocando o meio quantas vezes fosse
necessário.
Já em 2000, a NASA iniciou suas primeiras experiências para produção de carne in vitro a partir do
peixe-japonês, mais conhecido como peixe-dourado (Carassius auratus), produzindo células
musculares em placas de Petri a partir do músculo esquelético abdominal dorsal de peixes adultos,
usando pra isso técnicas de engenharia celular, visando a produção de alimentos no espaço. O
principal objetivo do estudo era encontrar um tipo de alimento alternativo para permitir uma longa
jornada no espaço da Terra à Lua ou a Marte.
Mas a primeira carne de células musculares cultivadas e comestíveis foi produzida em 2003 em
um evento que juntava arte, culinária e experimento onde serviram bifes de rã in vitro a partir da
engenharia celular.
Somente 10 anos depois, foi apresentado em Londres o primeiro hambúrguer bovino criado em
laboratório, na Universidade de Maastricht, na Holanda, usando-se células-tronco colhidas da
paleta de uma vaca. As pessoas que participaram desse evento disseram que o hambúrguer era
“quase” como um convencional. (Maastricht University, 2013).
O esperado é que com os avanços na pesquisa esse tipo de carne possa ter uma melhora no sabor
e que haja uma maior qualidade da carne, tornando-a mais acessível.
Assim, a carne cultivada foi considerada uma alternativa em relação a produção de carne
tradicional e aliada contra as mudanças climáticas e a degradação do meio ambiente.
Atualmente, existem cerca de 30 startups ao redor do mundo que desenvolvem este tipo de
tecnologia. Vale mencionar que algumas delas, como as norte-americanas Just e Memphis Meats,
hoje em dia investem para produzir carne em laboratório sem a necessidade de uma simples
biópsia no animal. Elas usam células-tronco coletadas de penas para produzir carne de frango.
Técnicas de produção
A metodologia para a produção de uma carne cultivada envolve basicamente o cultivo de tecido
muscular em um meio de cultura com um sistema altamente controlado. Essa metodologia foi
inspirada, principalmente, em técnicas de regeneração da medicina humana para reconstrução de
tecido muscular que está deteriorado a partir das células dos próprios pacientes.
Resumidamente, para produzir uma carne in vitro, se utiliza de células-tronco (também chamadas
de células estaminais) que vão ser retiradas dos animais a partir de uma biópsia dos animais vivos
ou de embriões e então colocadas em meio de cultura apropriado (esse meio contém nutrientes,
fontes de energia, fatores de crescimento, etc.), e a partir daí essas células vão começar à se
proliferar e crescer, independentemente da espécie de animal que está sendo usada. Quando elas
estiverem multiplicadas e diferenciadas em células musculares (ou seja, mioblastos), elas se
fundem para construir as fibras musculares. Assim que as fibras musculares estão maduras, então,
elas podem ser coletadas para a montagem do produto final, podendo também ser acrescentados
outros compostos para dar sabor, cor e textura, melhorando a qualidade organoléptica do produto
final.
Assim, podemos dividir a tecnologia de células-tronco para produzir carne cultivada em quatro
etapas principais: (1) A coleta das células-tronco, (2) Depois a expansão do número de
células-tronco, (3) Em seguida a diferenciação dessas células-tronco em células musculares
esqueléticas e fibras, e (4) por fim a montagem do produto final.
Para que fique ainda mais claro, nestas técnicas, se utilizam de células satélites, que são células
responsáveis pela regeneração do músculo esquelético. Elas serão originadas de embriões ou da
biopsia do músculo esquelético para a produção dos mioblastos embrionários que depois serão
isolados e então proliferados em meio de cultura celular, aderidos a um scaffold ou a alguma rede
de colágeno, porque essas células-tronco musculares tem propriedades aderentes. Os scaffolds
são suportes nos quais as células, como por exemplo, as células-tronco, podem ser cultivadas com
o propósito de construir um tecido in vitro. A estrutura do scaffold fornece sustentação mecânica ao
desenvolvimento celular e permite o transporte de nutrientes, metabólitos, fatores de crescimento
e outras moléculas do meio para a célula;
Depois disso, então, elas são introduzidas em um biorreator com parâmetros controlados e
preenchidos com um meio de cultura rico em nutrientes e fatores de crescimento. Com a ajuda de
variáveis ambientais, essas células se fundem para formar miotubos, que se diferenciam em
miofibras com a ajuda de fatores de diferenciação. O grande número de miofibras produzidas pode
então ser colhido a partir do scaffold (que é o suporte), triturado e usado na preparação de
produtos de carne à base de emulsão. A produção desse tipo de carne para produtos triturados e
processados, como salsichas, hambúrgueres e nuggets é mais fácil de desenvolver em relação às
peças de carne tridimensionais,e atualmente pesquisas trabalham com este tipo de tecnologia.
Para a produção comercial de carnes não processadas que sejam bem estruturadas, ou seja,
tridimensionais, ainda é necessário muitas pesquisas para ser consolidado.
Conclusão
É evidente que nossa sociedade em algum momento enfrentará desafios nas próximas décadas,
principalmente em relação ao suprimento da alimentação e os cuidados com o meio ambiente e
bem-estar animal. Os métodos atuais de produção de carne estão relacionados a muitos
problemas ambientais, e com a crescente demanda da população por carne, é incerto se inovações
na gestão da pecuária poderiam continuar a atender a crescente demanda nos moldes atuais.
Neste cenário, com o avanço da engenharia celular e da biotecnologia nos últimos anos, inovações
tecnológicas no setor produtivo da carne poderão mudar a cadeia de produção.
Entretanto, ainda existem muitos desafios, assim como debates acerca dos efeitos negativos que
permanecem como incertezas, principalmente aqueles que serão sentidos a longo prazo. E é devido
a isso, que se faz necessário a realização de mais pesquisas e estudos para estabelecer uma maior
compreensão sobre a produção de carne cultivada e seus efeitos sociais e ambientais, bem como
para encontrar mais metodologias que possam tornar possível o cumprimento dos objetivos dessa
tecnologia inovadora.

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