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p. 1 Rafael Calvano PATOLOGIA II – FISIOPATOLOGIA RENAL Deve-se saber as principais funções fisiológicas do rim para começo de conversa, pois sem saber isto não há como saber o que ele irá deixar de fazer, logo: - Converter 1,7l de sangue em 1l de urina; - Excretar resíduos do metabolismo; - Regular a concentração corporal de água, sódio, cálcio e fósforo; - Secretar eritropoietina, renina e prostaglandina (atuando também como órgão endócrino); Os rins têm 4 componentes básicos e principais: glomérulos, túbulos, interstício e vasos sanguíneos. Essa divisão de regiões é importante pois existem distinções de causas em cada localidade, por exemplo a maioria das doenças glomerulares são imunomediadas, já os distúrbios tubulares e intersticiais são causados por agentes tóxicos ou infecciosos. Vale ressaltar que os distúrbios dos vasos sanguíneos afetam TODAS AS ESTRUTURAS supridas por esses vasos. Glomérulo: É uma rede anastomosada de capilares revestida por um endotélio fenestrado e envolvida por duas camadas de epitélio. É sustentado principalmente por células mesangiais, as quais são contráteis, fagocíticas, capazes de se proliferarem, produzir matriz mesangial e ainda secretar mediadores biológicos. São contráteis pois vão agir de acordo com o tamanho da molécula a ser filtrada. Patogenia da lesão glomerular: Basicamente mediada por mecanismos imunológicos, sendo estes divididos em duas partes: I. Lesão por anticorpos que reagem dentro do glomérulo, de forma a causarem uma reação de hipersensibilidade; II. Lesões que resultem da deposição do complexo Antígeno-anticorpo circulantes no glomérulo; Mediadores da lesão glomerular: Células inflamatórias como neutrófilos, monócitos, macrófagos, linfócitos T; Plaquetas; Células glomerulares mesangiais; Mediadores solúveis como angiotensina, endotelina, citocinas, quimiocinas, óxido nítrico, sist. complemento e até sist. de coagulação; Lesão das células epiteliais, podócitos; Respostas patológicas do glomérulo à lesão (Glomerulopatias): são reações teciduais básicas; Hipercelularidade: proliferação celular que influencia diretamente na filtração glomerular, dificultando-a; pode ser subdividida em 3 partes; 1. Proliferação celular de mesangio/endotélio; 2. Infiltração de leucócitos; 3. Acúmulo de células epiteliais parietais proliferantes em forma de meia lua crescente; formação de crescentes; Espessamento da membrana basal: também pode ser subdividida em 3 partes e é melhor vista na microscopia eletrônica; 1. Deposição de material amorfo – complexos imunes – na membrana basal glomerular; 2. Amento da síntese de proteínas pela membrana basal; 3. Formação de camadas adicionais de membrana basal, as vezes formando uma lâmina densa duplicada; Hialinose: acúmulo de material extracelular e amorfo composto de proteínas plasmáticas, sendo ele homogêneo e eosinofílico. Quando excessiva, oblitera as luzes dos capilares do tufo glomerular. Esclerose: deposição extracelular de matriz colágena. O processo esclerosante pode resultar em uma obliteração das luzes dos capilares glomerulares. p. 2 Rafael Calvano Glomerulosclerose segmentar focal: Se caracteriza basicamente por uma fibrose progressiva envolvendo parte do glomérulo, que se desenvolve após lesões renais repetitivas. Pode levar à proteinúria e ao avanço da incapacidade funcional. Fibrose tubulointersticial: dano tubular (fibrose) e inflamação intersticial. A proteinúria pode causar lesão direta e ativação de células tubulares. O glomérulo deixa passar proteína, mas nos túbulos há a reabsorção delas. Quando há uma disfuncionalidade tubular, essas proteínas param de serem reabsorvidas e haverá proteinúria. Síndrome nefrítica: Basicamente consiste em uma inflamação nos glomérulos. Existem sinais e sintomas como hematúria, azotemia – altas concentrações de uréia, creatinina e ácido úrico no sangue – oligúria – diminuição da excreta de urina. Vale lembrar que na síndrome nefrítica há a presença de cilindros hemáticos na urina, há hipertensão arterial leve a moderada e proteinúria <1g/dia. Tipicamente é característica da glomerulonefrite exsudativa e proliferativa aguda. Glomerulonefrite proliferativa aguda: É causada por estreptococos B hemolítico do grupo A e é caracterizada por ter uma proliferação difusa das células glomerulares associadas ao influxo de leucócitos. Geralmente são causadas por complexos imunológicos e o antígeno pode ser endógeno – dentro da cápsula – ou exógeno causando por exemplo uma faringite. Se ele for em decorrência à uma faringite ou infecção na pele, aparecerá de 1 – 4 semanas após a infecção e sua patogenia consiste em complexos imunes contendo antígenos de estreptococos e anticorpos específicos formados in situ, que induzem uma resposta inflamatória. O curso clínico consiste em mal estar, febre, náusea, oligúria e hematúria, geralmente após 1 a 2 semanas após a recuperação de outra infecção. Aparecerão hemácias dismórficas na urina por conta da contratilidade, cilindros hemáticos, haverá proteinúria leve, edema periorbital facial e hipertensão leve a moderada. Microscopia: glomérulo aumentado e hipercelular, com infiltração global e difusa de leucócitos como neutrófilos e monócitos, membrana endotelial espessada, proliferação de células mesangiais e endoteliais. Microscopia de fluorescência: depósitos granulares de IgG, IgM e C3 no mesangio e ao longo da membrana basal glomerular. Embora difusamente presentes, os complexos imunes são vistos de forma focal e esparsa. Microscopia eletrônica: depósitos elétron-densos, bem individualizados e amorfos, no lado epitelial da membrana, tendo a aparência de protuberâncias. Síndrome nefrótica: também se caracteriza por uma inflamação glomerular, mas diferentemente da síndrome nefrítica, na síndrome nefrótica haverá proteinúria maciça, com uma perda de cerca de >3,5g/dia. Além disso, haverá hipoalbuminemia, edema generalizado, hiperlipidemia – aumento da produção de proteínas pelo fígado - e lipidúria – perda de lipídeos na urina. Pielonefrites (Infecção no trato urinário): é um tipo de inflamação que afeta os túbulos, o interstício e a pelve renal. É uma complicação séria das infecções que afetam a bexiga (cistite) e os rins. Ela é causada por bacilos gram negativos residentes da flora intestinal – E. coli, Proteus, Klebsiella, Enterobacter, Streptococcus faecalis. A bactéria pode chegar aos rins de duas formas, pela infecção hematogênica – acontece em algum lugar e chega aos rins – ou por uma infecção no trato urinário inferior que faz uma ascensão – há a colonização da uretra distal por bactérias coliformes e depois há o acesso da uretra para a bexiga por cateterização ureteral ou outra instrumentação. Nesse caso existe uma predisposição feminina, visto que a uretra feminina é mais curta do que a masculina e há a ausência de substâncias antimicrobianas, que estão presentes na função prostática. É importante salientar que no exame é possível constatar nitrito positivo na urina, visto que as bactérias gram negativas fazem a transformação do nitrato em nitrito. Há ainda a importância de citar os mecanismos de deslocamento da bexiga para os rins e diferenciar a pielonefrite aguda da pielonefrite crônica: Mecanismos de deslocamento da bexiga para os rins: I. Obstrução do trato urinário e estase de volume residual da urina na bexiga, de modo a ser um ambiente propício para a multiplicação bacteriana; II. Refluxo vesicoureteral é a incompetência da válvula vesicoureteral, de modo a permitir a subida das bactérias parao ureter e até a pelve renal; é uma válvula de mão única que evita o fluxo retrógrado de urina quando a pressão intravesical aumenta; III. Refluxo intrarrenal é um refluxo da pelve até o interior das papilas renais; p. 3 Rafael Calvano Pielonefrite aguda: inflamação supurativa – neutrofílica – do rim causada por infecção bacteriana, que pode atingir o órgão por disseminação hematogênica ou ascendente. As principais causas são a obstrução do trato urinário, refluxo vesicoureteral, gravidez – compressão do rim e da bexiga – lesões renais pré-existentes, diabetes – não sente estímulo para esvaziar a bexiga – e imunossupressão – diminuição da defesa contra os microorganismos. Até um ano de idade é mais prevalente em meninos, pois é quando as anomalias congênitas no sexo masculino se manifestam. Já acima de um e até os 40 anos é mais prevalente em mulheres, por conta da uretra mais curta e a possibilidade de gravidez nas mulheres e por conta da função prostática nos homens. Por fim, acima dos 40 anos volta a ser mais prevalente em homens, por conta da hipertrofia prostática. ▪ A clínica do paciente com pielonefrite aguda consiste em febre, mal-estar, calafrios, irritação da bexiga e da uretra, aumento da frequência de urinar, urgência de urinar e dor no ângulo costovertebral (também há dor na manobra de Giordanno). ▪ O exame laboratorial demonstra uma urina com leucócitos (piúria), cilindros leucocitários e urinocultura positiva com nitrito urinário. ▪ A macroscopia da pielonefrite aguda consiste na presença de abscessos focais, nítidos na superfície cortical e após a resolução do quadro os focos inflamatórios são substituídos por cicatrizes irregulares – depressões fibrosas na superfície. ▪ Já a microscopia da pielonefrite aguda consiste na presença de infiltrado neutrofílico nos túbulos, seguido de infiltração neutrofílica no interstício, produzindo abscessos e levando à destruição dos túbulos envolvidos. ▪ Algumas possíveis complicações são: necrose papilar com áreas branco-acinzentadas ou amareladas, pielonefrose – obstrução total ou quase completa onde o exsudato é incapaz de drenar e preenche a pelve renal, os cálices e ureter com puz – e um abscesso perinéfrico – extensão da inflamação supurativa através da cápsula renal para o tecido perinéfrico. Pielonefrite crônica e nefropatia de refluxo: inflamação tubulointersticial crônica e cicatrização envolvendo os cálices da pelve renal. Somente essas duas afetam os cálices. Nefropatia de refluxo: é resultado de uma sobreposição de infecção urinária em portadores de refluxo vesicoureteral congênito. A obstrução predispõe o rim à infecção, por isso não se pode deixar a urina estagnar. ▪ A macroscopia consiste em cicatrizes irregulares e assimétricas – quando bilateral – e cicatrizes córtico-medulares grosseiras e nítidas, sobrepondo-se aos cálices dilatados, aplanados ou deformados e achatamento das papilas. Há perda de tecido mesmo, e a cicatriz vai até o cálice. ▪ Já na microscopia as alterações envolvem predominantemente os túbulos e interstício. Haverá túbulos com áreas de atrofia e outras de hipertrofia ou dilatação. Os túbulos dilatados com epitélio achatado e preenchidos por cilindros se parecem com colar tireoideano – túbulos alargados contendo material hialino. Há vários graus de inflamação crônica e fibrose do córtex e da medula renal. Vasos arqueados e interlobulares com esclerose obliterativa da camada intima das áreas de cicatriz afetam a pressão arterial sistêmica.
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