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CASO 4 
 
OBJETIVO 1) 
TRANSTORNOS CONVERSIVOS E 
DISSOCIATIVOS 
São caracterizados por perda parcial ou 
completa das funções normais de integração 
das lembranças, da consciência, da identidade, 
das sensações imediatas ou do controle dos 
movimentos corporais. Têm início geralmente 
súbito, e a investigação revela relação temporal 
estreita com “estresse” psicológico sofrido pela 
pessoa. Vale pontuar que: 
 
• Tendem a se repetir por algum evento 
desencadeador, durando semanas ou meses; o 
curso é mais breve quando se identifica e se 
aborda o acontecimento traumático. 
• Problemas ou dificuldades interpessoais 
persistentes e sem resolução podem cursar 
com evolução crônica do conjunto sintomático 
(a exemplo do que ocorre nos quadros de 
paralisias e anestesias). 
 
Os quadros descritos adiante muitas vezes 
resultam em investigações demoradas pelas 
equipes de saúde, principalmente os casos 
neurologia-like. Para o médico concluir pela 
implicação psíquica do sofrimento físico de seu 
paciente, ser-lhe-á exigida competência na 
semiologia e na clínica. A belle indiference 
(indiferença afetiva) pode ser observada, 
quando o doente fala ou ouve falar de si com 
um afeto distante ou superficial: “nada está 
acontecendo comigo, apesar de tudo o que 
você está vendo ou estão dizendo, doutor”. 
Porém, seu reconhecimento per si, como todo 
sinal isoladamente, não deve direcionar um 
diagnóstico. 
 
Muitas vezes é difícil para o clínico alcançar que 
os sintomas dissociativos traduzem 
frequentemente a ideia (simbólica) de que a 
pessoa tem uma doença física. Esses 
fenômenos em intimidade com os conversivos 
foram estudados por Freud e denominados 
histeria de conversão. No que diz respeito ao 
transtorno conversivo, o DSM-5 considera uma 
nova nomenclatura, o transtorno de sintomas 
neurológicos funcionais, estando nele incluídos 
os transtornos que na CID-10 vão de F44.4 a 
F44.7. 
 
Conversão: transposição de um conflito 
psíquico em sintomas somáticos, presentes 
basicamente nos sistemas neuromuscular 
voluntário (paralisias) ou sensório-perceptivo 
(anestesias). Possuem um significado 
simbólico e denunciam falhas do mecanismo de 
defesa psíquica. 
 
 
AMNÉSIA DISSOCIATIVA 
Os critérios diagnósticos do DSM-5 para a 
amnésia dissociativa es- tão listados na Tabela 
12-1. A principal característica dessa amnésia é 
uma incapacidade de lembrar de informações 
pessoais importantes, normalmente de 
natureza traumática ou estressante, que é 
extensa demais para ser explicada por 
esquecimento habitual. E, como já mencionado, 
o transtorno não é resultado dos efeitos 
fisiológicos diretos de uma substância ou de 
uma condição médica neurológica ou geral. Os 
diferentes tipos de amnésia dissociativa estão 
listados na Tabela 12-2. 
Etiologia 
Em muitos casos de amnésia dissociativa 
aguda, o ambiente psicossocial no qual a 
amnésia se desenvolve apresenta intenso 
conflito, com o paciente sentindo variações 
intoleráveis de vergonha, culpa, desespero, 
raiva e depressão. Esses sentimentos 
normalmente resultam de conflitos por impulsos 
ou necessidades inaceitáveis, como 
compulsões sexuais, suicidas ou violentas de 
grande intensidade. Experiências traumáticas, 
como abuso físico ou sexual, podem induzir o 
transtorno. Em alguns casos, o trauma é 
causado pela traição de um ente querido e de 
confiança (trauma de traição). Acredita-se que 
essa traição influencie a forma como o evento é 
processado e lembrado. 
Diagnóstico e características clínicas 
Apresentação clássica. O transtorno clássico 
é uma perturbação aberta, florida e dramática 
que frequentemente resulta no paciente sendo 
logo encaminhado à atenção médica, 
sobretudo por sinto- mas relacionados ao 
transtorno dissociativo. Costuma ser 
encontrado naqueles que sofreram trauma 
agudo extremo. No entanto, também é comum 
se desenvolver no contexto de estresse 
emocional ou conflito intrapsíquico profundo. 
Os pacientes podem apresentar sintomas 
somatoformes ou de conversão intercorrentes, 
alterações de consciência, depersonalização, 
desrealização, estados de transe, regressão 
espontânea de idade e até amnésia dissociativa 
anterógrada contínua. Depressão e ideação 
suicida são relatadas em muitos casos. Não há 
perfil de personalidade ou história de 
antecedentes consistentemente relatados 
nesses pacientes, apesar de uma história 
pessoal ou familiar de sintomas dissociativos ou 
somatoformes apresentar predisposição 
individual a desenvolver amnésia aguda 
durante circunstâncias traumáticas. Muitos 
deles têm histórias anteriores de abuso ou 
trauma adulto ou infantil. Em casos de guerra, 
bem como em outras formas de transtorno de 
estresse pós-traumático relacionado a 
combate, a variável mais importante no 
desenvolvimento de sintomas dissociativos 
parece ser a intensidade do combate. A Tabela 
12-3 apresenta a avaliação de estado mental da 
amnésia dissociativa. 
 
Apresentação não clássica. Esses indivíduos 
frequentemente procuram tratamento para 
diversos sintomas, tais como depressão ou 
mudanças de humor, abuso de substâncias, 
perturbação do sono, sintomas somatoformes, 
ansiedade e pânico, impulsos e atos suicidas e 
automutilatórios, estouros violentos, problemas 
de alimentação e problemas interpessoais. O 
comportamento automutilatório e violento 
nesses pacientes também pode vir 
acompanhado de amnésia. A amnésia também 
pode ocorrer para flashbacks ou episódios de 
reexperiência comportamental relacionados a 
trauma. 
Diagnóstico diferencial 
O diagnóstico diferencial da amnésia 
dissociativa está listado na Tabela 12-4. 
 
Esquecimento comum e amnésia não 
patológica. O esquecimento comum é um 
fenômeno benigno e não relacionado a eventos 
estressantes. Na amnésia dissociativa, a perda 
de memória é mais extensiva do que na não 
patológica. Outras formas não patológicas de 
amnésia foram descritas, tais como amnésia 
infantil, amnésia para sono e sonhos e amnésia 
hipnótica. 
Demência, delirium e transtornos 
amnésticos devidos a condições médicas. 
Em pacientes com demência, delirium e 
transtornos amnésticos devidos a condições 
médicas, a perda de memória de informações 
pessoais é incorporada em um conjunto mais 
extenso de problemas cognitivos, linguísticos, 
comportamentais e de memória. Perda de 
memória sobre a identidade pessoal não 
costuma ser encontrada sem evidência de uma 
perturbação marcante em muitos domínios da 
função cognitiva. As causas dos transtornos 
amnésticos orgânicos incluem psicose de 
Korsakoff, acidente vascular cerebral (AVC), 
amnésia pós-operatória, amnésia pós-
infecciosa, amnésia anóxica e amnésia global 
transitória. A eletroconvulsoterapia (ECT) 
também pode causar uma amnésia temporária 
marcante, assim como problemas persistentes 
de memória, em alguns casos. Aqui, contudo, a 
per- da de memória para experiências 
autobiográficas não tem relação com 
experiências traumáticas ou graves e parece 
envolver muitos tipos de experiências pessoais, 
especialmente aquelas que ocorrem pouco 
antes ou durante os tratamentos de ECT. 
Amnésia pós-traumática. Na amnésia pós-
traumática causa- da por lesão cerebral, uma 
história clara de trauma físico, um período de 
inconsciência ou amnésia, ou ambos, 
costumam ser vistos, e há evidências clínicas 
objetivas de lesão cerebral. 
Transtornos convulsivos. 
Na maioria dos casos de convulsão, a 
apresentação clínica difere significativamente 
da amnésia dissociativa, com eventos e 
sequelas claros. Pacientes com episódios 
convulsivos pseudoepilépticos também podem 
ter sintomas dissociativos, tais como amnésia, 
e uma história antecedente de trauma 
psicológico. Raramente, pacientes com 
convulsões parciais complexas recorrentes 
apresentam comportamento estranho, 
problemas de memória, irritabilidade ou 
violência contínuos, o que gera um quebra-
cabeças de diagnóstico diferencial. Em alguns 
desses casos, o diagnóstico pode ser 
esclarecido apenas por telemetriaou 
monitoramento ambulatorial 
eletrencefalográfico (EEG). 
Amnésia relacionada a substâncias. 
Diversas substâncias e intoxicantes foram 
implicados na produção de amnésia. 
Amnésia global transitória. A amnésia global 
transitória pode ser confundida com a 
dissociativa, sobretudo porque eventos 
estressantes podem preceder o transtorno. Na 
amnésia global transitória, contudo, há o início 
súbito da amnésia anterógrada completa e de 
habilidades de aprendizagem; amnésia 
retrógrada pronunciada; preservação da 
memória de identidade pessoal; consciência 
ansiosa da perda de memória com 
questionamento repetido e com frequência 
perseverante; comportamento geral normal; 
falta de anormalidades neurológicas gritantes 
na maioria dos casos; e rápido retorno à função 
cognitiva-base, com amnésia retrógrada curta 
persistente. O paciente costuma ter mais de 50 
anos e apresenta fatores de risco para doença 
cerebrovascular, apesar de epilepsia e 
enxaqueca terem sido etiologicamente 
implicadas em alguns casos. 
Transtornos dissociativos de identidade. 
Indivíduos com transtorno dissociativo de 
identidade podem apresentar formas agudas de 
amnésia e episódios de fuga. Esses pacientes, 
contudo, são caracterizados por diversos 
sintomas, sendo apenas alguns encontra- dos 
em pacientes com amnésia dissociativa. Em 
relação à amnésia, a maioria das pessoas com 
transtorno dissociativo de identidade e com 
transtorno dissociativo não especificado com 
características de transtorno dissociativo de 
identidade relata múltiplas formas de amnésia 
complexa, incluindo blecautes recorrentes, 
fugas, posses inexplicadas e flutuações de 
habilidades, hábitos e conhecimento. 
Transtorno de estresse agudo, transtorno de 
estresse pós-traumático e transtorno de 
sintomas somáticos. As formas de amnésia 
dissociativa, em sua maioria, são mais bem 
conceitualizadas como parte de um grupo de 
transtornos de espectro traumático que inclui os 
transtornos de estresse agudo, de estresse 
pós-traumático (TEPT) e de sintomas 
somáticos. Muitos pacientes com amnésia 
dissociativa cumprem todos ou parte dos 
critérios diagnósticos para transtornos de 
estresse agudo ou uma combinação dos três. A 
amnésia é um sintoma-critério de cada um 
desses últimos transtornos. 
Simulação e amnésia factícia. Não existe 
maneira absoluta de diferenciar a amnésia 
dissociativa da amnésia factícia ou da 
simulação. Simuladores já se mostraram 
capazes de continuar seu fingimento mesmo 
durante entrevistas facilitadas por hipnose ou 
barbitúricos. Um paciente que chega à atenção 
médica buscando recuperar memórias 
reprimidas como principal reclamação 
provavelmente tenha um transtorno factício ou 
esteve sujeito a influências sugestivas. A maior 
parte desses indivíduos, na verdade, não 
descreve amnésia legítima quando 
cuidadosamente questionados, mas com 
frequência insistem terem sido abusados 
quando crianças para explicar sua infelicidade 
ou disfunção atual. 
Curso e prognóstico 
Pouco se sabe sobre o curso clínico da amnésia 
dissociativa. A amnésia dissociativa aguda 
costuma se resolver de maneira espontânea 
quando a pessoa é afastada com segurança 
das circunstâncias traumáticas. No outro 
extremo, alguns pacientes desenvolvem formas 
crônicas de amnésia localizada generalizada, 
contínua ou grave, sendo profundamente 
deficientes e exigindo altos níveis de apoio 
social, tais como monitoramento em uma casa 
de repouso ou cuidado familiar intenso. Os 
médicos devem tentar lhes restaurar as 
memórias perdidas à consciência assim que 
possível; do contrário, a memória reprimida 
pode formar um núcleo na mente inconsciente, 
levando a episódios amnésicos futuros. 
Tratamento 
Terapia cognitiva. 
A terapia cognitiva pode ter benefícios 
específicos para indivíduos com transtornos 
traumáticos. Identificar as distorções cognitivas 
específicas que se baseiam no trauma pode 
proporcionar uma entrada na memória 
autobiográfica para a qual o paciente sofre a 
amnésia. Conforme ele se torna apto a corrigir 
distorções cognitivas, particularmente sobre o 
significado de traumas anteriores, memórias 
mais detalhadas dos eventos traumáticos 
podem surgir. 
Hipnose. A hipnose pode ser utilizada de 
diversas maneiras diferentes no tratamento da 
amnésia dissociativa. De modo específico, as 
intervenções hipnóticas podem ser usadas para 
conter, modular e titular a intensidade dos 
sintomas; facilitar a lembrança controlada de 
memórias dissociadas; proporcionar apoio e 
fortalecer o ego do paciente; e, por fim, 
promover o trabalho e a integração do material 
dissociado. 
Além disso, o indivíduo pode aprender a auto-
hipnose para aplicar técnicas de contenção e de 
tranquilização em sua vida cotidiana. O uso 
bem-sucedido de técnicas de contenção, sejam 
elas facilitadas por hipnose ou não, também 
aumenta a noção do paciente de que pode 
exercer maior controle sobre a alternância entre 
sinto- mas intrusivos e amnésia. 
Terapias somáticas. Não há farmacoterapia 
conhecida para amnésia dissociativa além das 
entrevistas facilitadas por fármacos. Diversos 
agentes foram usados para esse propósito, 
incluindo amobarbital sódico, tiopental, 
benzodiazepínicos orais e anfetaminas. 
Entrevistas facilitadas por fármacos com uso de 
amobarbital ou diazepam intravenosos são 
utilizadas sobretudo em amnésias agudas e 
reações de conversão, entre outras indicações, 
em geral em serviços hospitalares médicos e 
psiquiátricos. Esse procedimento também é 
ocasionalmente útil em casos refratários de 
amnésia crônica dissociativa quando os 
pacientes não respondem a outras 
intervenções. O material descoberto em uma 
entrevista facilitada por fármacos precisa ser 
processado pelo paciente em seu estado 
consciente habitual. 
Psicoterapia em grupo. As psicoterapias em 
grupo por tempo limitado ou por longos 
períodos já se mostraram úteis para veteranos 
de guerra com TEPT e para sobreviventes de 
abuso infantil. Durante as sessões em grupo, os 
pacientes podem recuperar memórias para as 
quais têm amnésia. Intervenções de apoio 
pelos membros do grupo ou pelo terapeuta (ou 
por ambos) podem facilitar a integração e o 
domínio do material dissociado. 
FUGA DISSOCIATIVA 
A fuga dissociativa foi suprimida como uma das 
principais categorias diagnósticas do DSM-5 e 
agora é diagnosticada como um subtipo 
(especificador) da amnésia dissociativa. Ela 
pode ser vista em pacientes tanto com amnésia 
dissociativa quanto com transtorno dissociativo 
de identidade. O transtorno continua sendo um 
diagnóstico distinto na 10a edição da 
Classificação internacional de doenças e 
problemas relacionados à saúde, (CID-10) e é 
discutido como uma entidade à parte no 
Compêndio devido a sua relevância clínica. 
A fuga dissociativa é descrita como uma viagem 
súbita e repentina para longe de casa ou do seu 
lugar de vivência costumeiro, com incapacidade 
de lembrar de parte ou de todo o passado. Isso 
vem acompanhado de confusão sobre a própria 
personalidade ou até da apropriação de uma 
nova identidade. O episódio não se deve aos 
efeitos fisiológicos diretos de uma substância 
ou de uma condição médica geral. Os sintomas 
devem causar sofrimento clinicamente 
significativo ou prejuízo no funcionamento 
social, profissional ou em outras áreas 
importantes do funcionamento. 
Etiologia 
Circunstâncias traumáticas (i.e., estupro, 
combate, abuso sexual infantil recorrente, 
deslocamentos sociais massivos, desastres 
naturais), que levam a um estado de 
consciência alterado dominado por um desejo 
de fuga são as causas subjacentes da maioria 
dos episódios de fuga. Em alguns casos, vê-se 
uma história de antecedentes semelhante, 
apesar de um trauma psicológico não estar 
presente no início do episódio de fuga. Nesses 
casos, em vez de (ou além de) perigos ou 
traumas externos, os pacientes costumam estar 
lutando contra emoções ou impulsos extremos 
(i.e., medo, culpa,vergonha ou impulsos 
sexuais, suicidas ou violentos de grande 
intensidade) que estão em conflito com os 
ideais de sua consciência ou seu ego. 
Diagnóstico e características clínicas 
A fuga dissociativa é descrita como um 
transtorno capaz de durar de minutos a meses. 
Alguns pacientes relatam múltiplas fugas. Na 
maioria dos casos em que isso foi descrito, um 
transtorno dissociativo mais crônico, como um 
transtorno dissociativo de identidade, não foi 
excluído. 
Em alguns casos extremos de TEPT, os 
pesadelos podem acabar com uma fuga real, 
em que o paciente corre para outra parte da 
casa ou foge para fora. Crianças ou 
adolescentes podem ser mais limitados do que 
adultos em sua habilidade de fuga. Portanto, as 
fugas nessa população podem ser breves e 
envolver apenas distâncias menores. 
Após o término da fuga, o paciente pode sofrer 
de perplexidade, confusão, transe, 
despersonalização, desrealização e sintomas 
de conversão, além de amnésia. Alguns podem 
terminar a fuga com um episódio de amnésia 
dissociativa generalizada. 
Conforme começa a ficar menos dissociado, o 
indivíduo com fuga dissociativa pode exibir 
sintomas de transtorno do humor, ideias 
intensas de suicídio e sintomas de TEPT ou de 
transtorno de ansiedade. Nos casos clássicos, 
uma outra identidade é criada sob cujos 
auspícios o paciente vive por um período de 
tempo. Muitos desses casos anteriores são 
mais bem classificados como transtorno 
dissociativo de identidade ou, usando o DSM-5, 
como outro transtorno dissociativo especificado 
com características de transtorno dissociativo 
de identidade. 
Diagnóstico diferencial 
Indivíduos com amnésia dissociativa podem 
vagar confusos durante um episódio de 
amnésia. Na fuga dissociativa, contudo, há uma 
fuga propositada do lar ou do local de vivência 
costumeiro do indivíduo, normalmente 
preocupado com uma única ideia que vem 
acompanhada de um desejo de fugir. 
Pacientes com transtorno dissociativo de 
identidade podem apresentar sintomas de fuga 
dissociativa, que costumam ser recorrentes ao 
longo de suas vidas. Esses pacientes 
apresentam múltiplas formas de amnésias 
complexas e, em geral, múltiplas outras 
identidades que se desenvolvem, começando 
na infância. 
Em convulsões parciais complexas, pacientes 
já exibiram comportamentos de fuga 
perambulatória ou semiproposital, ou ambos, 
durante convulsões em estados pós-ictais, para 
os quais ocorre amnésia subsequente. 
Contudo, os pacientes convulsivos em uma 
fuga epiléptica frequentemente exibem 
comportamento anormal, incluindo confusão, 
perseverança e movimentos anormais ou 
repetitivos. Outras características das 
convulsões costumam ser relatadas na história 
clínica, tais como uma aura, anormalidades 
motoras, comportamento estereotipado, 
alterações de percepção, incontinência e 
estado pós-ictal. EEGs seriais ou telemétricos, 
ou ambos, costumam mostrar as 
anormalidades associadas com pato- logia 
comportamental. 
O comportamento divagante durante diversas 
condições médicas, transtornos tóxicos e 
relacionados a substâncias, delirium, demência 
e síndromes amnésicas orgânicas poderia ser 
confundido, teoricamente, com fuga 
dissociativa. Na maioria dos casos, contudo, os 
transtornos somáticos, tóxicos, neurológicos ou 
relacionados a substâncias podem ser incluídos 
pela história, exame físico, testes de laboratório 
ou rastreamento toxicológico. O uso de álcool 
ou de substâncias pode estar envolvido na 
precipitação de um episódio de fuga 
dissociativa. 
As fugas divagantes e propositais podem 
ocorrer durante a fase maníaca do transtorno 
bipolar ou esquizoafetivo. Pacientes que são 
maníacos podem não se lembrar de 
comportamentos que ocorreram no estado 
eutímico ou deprimido, e vice-versa. Na fuga 
proposital devida a mania, porém, o indivíduo 
costuma estar preocupado com ideias 
grandiosas e chamar atenção para si mesmo 
em razão de seu comportamento inadequado. 
Não ocorre apropriação de uma identidade 
alternativa. 
De maneira semelhante, o comportamento 
peripatético pode ocorrer em alguns pacientes 
com esquizofrenia. As memórias dos eventos 
durante episódios divagantes nesses pacientes 
podem ser difíceis de verificar devido a seu 
transtorno de pensamento. Pacientes com fuga 
dissociativa, entretanto, não demonstram um 
transtorno de pensamento psicótico ou outros 
sintomas de psicose. 
A simulação da fuga dissociativa pode ocorrer 
em indivíduos que estão tentando fugir de uma 
situação envolvendo dificuldades legais, 
financeiras ou pessoais, bem como em 
soldados que estão tentando evitar combate ou 
outros deveres militares desagradáveis. Não há 
teste, bateria de testes ou conjunto de 
experimentos que sejam capazes de distinguir 
invariavelmente os sintomas dissociativos da 
simulação. A simulação de sintomas 
dissociativos, tais como relatos de amnésia 
para fuga proposital durante um episódio de 
com- portamento antissocial, pode ser mantida 
mesmo durante entrevistas facilitadas por 
hipnose ou por fármacos. Muitos indivíduos que 
simulam confessam de forma espontânea ou 
quando confrontados. No contexto forense, o 
examinador deve sempre considerar 
cuidadosa- mente o diagnóstico de simulação 
quando se alega fuga. 
Curso e prognóstico 
A maioria das fugas é relativamente breve, 
durando de horas a dias. A maior parte dos 
indivíduos parece se recuperar, apesar de 
amnésia dissociativa refratária poder persistir 
em casos raros. Alguns estudos descreveram 
fugas recorrentes na maioria dos indivíduos que 
apresentam um episódio de fuga dissociativa. 
Não há dados sistemáticos modernos que 
tentem diferenciar essa fuga do transtorno 
dissociativo de identidade com fugas 
recorrentes. 
Tratamento 
A fuga dissociativa costuma ser tratada com 
uma psicoterapia eclética, orientada 
psicodinamicamente, que se concentra em 
ajudar o paciente a recuperar a memória da 
identidade e da experiência recente. A 
hipnoterapia e as entrevistas facilitadas por 
fármacos são técnicas adjuntas 
frequentemente necessárias para auxiliar a 
recuperação de memória. Os pacientes podem 
precisar de tratamento médico para lesões 
sofridas durante a fuga, assim como de 
alimento e descanso. 
Os médicos devem estar preparados para a 
emergência de ideias e impulsos suicidas ou 
autodestrutivos, conforme as circunstâncias 
traumáticas ou estressantes pré-fuga forem 
reveladas. A hospitalização psiquiátrica pode 
ser indicada se o paciente for ambulatorial. 
Os problemas familiares, sexuais, ocupacionais 
ou legais que faziam parte da matriz original 
que gerou o episódio de fuga podem ser 
substancialmente exacerbados quando a 
identidade original do paciente e sua situação 
de vida forem revelados. Assim, tratamento 
familiar e intervenções de serviços sociais 
podem ser necessários para ajudar a resolver 
essas dificuldades complexas. 
Quando a fuga dissociativa envolve a 
apropriação de uma nova identidade, é útil 
conceitualizar essa identidade como algo 
psicologicamente vital para a proteção da 
pessoa. Experiências traumáticas, memórias, 
cognições, identificações, emoções, ambições, 
autopercepções, ou uma combinação destas, 
tornaram-se tão conflituosas e, ainda assim, tão 
definitivas que a pessoa só consegue resolvê-
las incorporando-as em uma outra identidade. 
O objetivo terapêutico, nesses casos, não é 
nem a supressão da nova identidade, nem uma 
explicação fascinada de todos os seus 
atributos. Assim como no transtorno 
dissociativo de identidade, o clínico deve 
apreciar a importância da informação 
psicodinâmica contida na outra personalidade e 
a intensidade das forças psicológicas que 
necessitaram de sua criação. Nesses casos, o 
desfecho terapêutico mais desejável é a fusão 
das identidades, com a pessoa trabalhando por 
meio das memórias das experiências que 
precipitaram a fuga e integrando-as. 
ESTUPOR DISSOCIATIVO 
O estupor pode ser definido como diminuição 
importante ou mesmo ausência de movimentos 
voluntáriose da reatividade normal a estímulos 
externos, como luz, ruído ou tato, sem que 
exames clínicos e complementares 
demonstrem evidências de causa física. A 
anamnese cuidadosa revela frequentemente 
início súbito e fatores a favor de uma origem 
psicogênica, como eventos ou problemas 
estressantes recentes. O raciocínio clínico deve 
considerar a exclusão de estupores de causa 
orgânica, depressiva, bipolar e catatônica. 
TRANSTORNO DISSOCIATIVO DE TRANSE 
O transtorno dissociativo de transe manifesta-
se por uma alteração temporária e marcante no 
estado de consciência ou pela perda do senso 
costumeiro de identidade pessoal sem ser 
substituído por um senso alternado de 
identidade. Uma variação disso, o transe de 
possessão, envolve alternâncias únicas ou 
episódicas no estado de consciência, 
caracterizadas pela troca da identidade 
costumeira da pessoa por uma nova identidade, 
em geral atribuída a um espírito, poder divino, 
divindade ou outra pessoa. Nesse estado 
possuído, o indivíduo exibe comportamentos 
estereotipados e culturalmente determinados 
ou sente que está sendo controlado pela 
entidade possuidora. Deve haver amnésia 
parcial ou total para o evento. O estado de 
transe ou possessão não deve ser parte de uma 
prática cultural ou religiosamente aceita, 
devendo causar sofrimento ou prejuízo 
funcional em um ou mais domínios habituais. 
Por fim, o estado dissociativo de transe não 
deve ocorrer apenas durante o curso de um 
transtorno psicótico nem ser o resultado do uso 
de qualquer substância ou de uma condição 
médica geral. 
Devem ser diferenciados também dos transes 
psicóticos agudos e transitórios, 
esquizofrênicos e provocados por substâncias 
psicoativas. 
TRANSTORNOS DISSOCIATIVOS DO 
MOVIMENTO 
Nesse caso há perda da capacidade de mover 
parte ou a totalidade do membro ou dos 
membros. As alterações motoras apresentadas 
se assemelham a ataxia 
(ausência/incoordenação dos movimentos), 
apraxia (falta ou inabilidade de execução de 
movimentos/gestos), acinesia 
(ausência/lentificação dos movimentos), afonia 
ou disfonia, disartria, discinesia ou paralisias de 
ordem neurológica, mas que são descartadas 
ao exame físico minucioso. Desse modo, o 
psiquiatra – e não somente o neurologista – 
deve conhecer o conjunto de características 
clínicas de cada alteração motora neurológica. 
Nesses casos, inicialmente é acionada a ajuda 
do neurologista, que identifica a falta de 
consistência clínica dos sintomas. 
CONVULSÕES DISSOCIATIVAS 
Charcot descreveu o grande ataque das 
histéricas (histeroepiléptico) e muitas vezes 
acrescentou sintomas provocados por sua 
própria sugestão. Em virtude da capacidade 
patoplástica desses quadros, há uma 
diversidade clínica que se assemelha às 
convulsões epilépticas. As convulsões 
dissociativas “imitam” uma crise tônica, tônico-
clônica, ou podem ser bizarras. A pessoa 
mostra resistência voluntária à abertura ocular, 
observando-se também sugestionabilidade e 
possibilidade de indução da crise pelo médico. 
Muitos pacientes com convulsões dissociativas 
convivem ou já conviveram com epilépticos ou, 
nos casos mais graves, apresentam epilepsia e 
pseudocrise concomitantemente. 
Na convulsão dissociativa observa-se que a 
mordedura de língua, os ferimentos por queda 
e a incontinência de urina são raros, mas 
podem existir. A duração do ataque dissociativo 
é caracteristicamente bem maior que a de uma 
convulsão epiléptica –15 minutos ou mais. 
Quanto à consciência, observa-se que pode 
estar alterada (estreitamento do campo da 
consciência) por um estado de estupor ou 
transe ou mesmo manter-se preservada 
durante os ataques. 
ANESTESIA E PERDA SENSORIAL 
DISSOCIATIVAS 
A anestesia e a perda sensorial dissociativas 
são caracterizadas pela perda ou ausência de 
sensibilidade (anestesia) que não corresponde, 
no exame neurológico, a uma lesão conhecida. 
O aspecto conversivo dos sintomas nos casos 
de anestesia e perda sensorial é evidente, 
apesar de a nomenclatura sugerir dissociação. 
Aqui, como em qualquer estado conversivo, a 
área anestesiada não guarda relação 
neurológica e corresponde a registros 
simbólicos da pessoa. 
Pode haver igualmente a perda de um tipo de 
sensibilidade com a conservação de outras 
sensibilidades esperadas para determinado tipo 
de lesão neurológica. A anestesia também pode 
estar acompanhada de sensações de 
formigamento (parestesias). A perda sensorial 
pode ser da visão (amaurose psicogênica: com 
a visão tubular e diplopia monocular) ou da 
audição (surdez psicogência), que devem ter 
causas orgânicas excluídas por um bom exame 
físico e/ou na interconsulta com a oftalmologia 
e a otorrinolaringologia. 
TRANSTORNO DISSOCIATIVO DE 
IDENTIDADE 
O transtorno dissociativo de identidade, 
anteriormente chamado de transtorno de 
múltiplas personalidades, tem sido o transtorno 
dissociativo mais pesquisado de todos. Ele se 
caracteriza pela presença de duas ou mais 
identidades distintas ou estados de 
personalidade. As identidades ou os estados de 
personalidade, às vezes chamados de alters, 
autoestados, alter identidade ou partes, entre 
outros termos, diferem uns dos outros na forma 
como cada um se apresenta com um padrão 
próprio de percepção, relacionamento e 
pensamento so- bre o ambiente e o eu; em 
suma, sua própria personalidade. Trata-se da 
psicopatologia dissociativa paradigmática, já 
que os sintomas de todos os outros transtornos 
dissociativos são em geral encontrados em 
pacientes com transtorno dissociativo de 
identidade: amnésia, fuga, despersonalização, 
desrealização e sintomas semelhantes. 
Etiologia 
O transtorno dissociativo de identidade é 
fortemente ligado a experiências graves de 
trauma infantil, via de regra maus-tratos. Os 
índices de trauma infantil grave para pacientes 
crianças e adultos com transtorno dissociativo 
de identidade variam de 85 a 97% dos casos. 
Abuso físico e sexual são relatados com maior 
frequência como fontes de trauma infantil. A 
contribuição de fatores genéticos só está sendo 
sistematicamente avaliada agora, mas estudos 
preliminares não encontraram evidências de 
contribuição genética significativa. 
Diagnóstico e características clínicas 
A característica principal no diagnóstico deste 
transtorno é a presença de dois ou mais 
estados distintos de personalidade. No entanto, 
há muitos outros sinais e sintomas que definem 
o transtorno, e, em razão da grande 
diversidade, isso torna o diagnóstico difícil. Eles 
es- tão listados na Tabela 12-6, que descreve 
os muitos outros sintomas associados 
comumente encontrados em pacientes com 
transtorno dissociativo de identidade. 
 
Exame do estado mental. Um exame do 
estado mental cui- dadoso e detalhado é 
essencial para realizar o diagnóstico. É fácil 
confundir pacientes que apresentam esse 
transtorno com pessoas sofrendo de 
esquizofrenia, transtorno da personalidade 
borderline ou simplesmente simulando. A 
Tabela 12-7 lista as perguntas que os clínicos 
devem formular para realizar o diagnóstico. 
 
 
Memória e sintomas de amnésia. 
Perturbações dissociativas de memória se 
manifestam de várias maneiras básicas e são 
com frequência observadas em ambientes 
clínicos. Como parte do exame do estado 
mental geral, os médicos devem rotineiramente 
perguntar sobre experiências de perda do 
tempo, períodos de apagão e grandes falhas de 
continuidade na memória de informações 
pessoais. Experiências de perda do tempo 
dissociativas são muito extensas para serem 
explicadas pelo esquecimento normal e em 
geral têm um início e um fim bem demarcados. 
Pacientes com transtorno dissociativo 
costumam relatar falhas significativas na 
memória autobiográfica, especialmente para 
eventos da infância. Essas falhas costumam ser 
bem demarcadas e não se enquadram no 
declínio normal na memória autobiográfica para 
idades mais jovens. 
Alterações dissociativas de identidade. 
Alterações dissociativas clínicas na identidade 
podem começar a se manifestarpor estranhas 
referências a si mesmo em primeira pessoa do 
plural ou terceira pessoa. Além disso, os 
pacientes podem se referir a si mesmos usando 
seu primeiro nome ou fazendo autorreferências 
despersonalizadas, tais como “o corpo”, ao se 
descreverem e falarem de outros. Eles 
frequentemente descrevem um profundo senso 
de divisão interna concretizada ou de conflitos 
internos personalizados entre partes de si. Em 
algumas instâncias, essas partes podem ter 
nomes próprios ou podem ser designadas por 
seu efeito ou sua função predominante, por 
exemplo, “o furioso” ou “a esposa”. Os 
pacientes podem mudar de repente a forma 
como se referem aos outros, por exemplo, “o 
filho” em vez de “meu filho”. 
Outros sintomas associados. A maioria dos 
pacientes com transtorno dissociativo de 
identidade se enquadra nos critérios 
diagnósticos para um transtorno do humor, em 
geral um dos transtornos do espectro 
depressivo. Alterações rápidas e frequentes de 
humor são comuns, mas elas costumam ser 
causadas por fenômenos dissociativos de 
estresse pós-traumático, e não por um 
verdadeiro transtorno cíclico do humor. Pode 
haver sobreposição considerável entre 
sintomas de ansiedade do TEPT, sono 
perturbado e sintomas de transtorno do humor 
e disforia. 
Traços de personalidade obsessivo-
compulsivos são comuns no transtorno 
dissociativo de identidade, e sintomas do 
transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) 
intercorrentes são frequentemente encontrados 
em pacientes com transtorno dissociativo de 
identidade, com um subgrupo manifestando 
sintomas graves de TOC. Os sinto- mas do 
TOC costumam ter uma qualidade pós-
traumática: verificar várias vezes para se 
certificar de que ninguém possa entrar na casa 
ou no quarto, lavar-se compulsivamente para 
aliviar a sensação de sujeira devido a abuso e 
contar ou cantar mentalmente repetidas vezes 
para se distrair da ansiedade de sofrer abuso, 
por exemplo. 
Apresentações em crianças e em 
adolescentes. As crianças e os adolescentes 
manifestam os mesmos sintomas dissociativos 
principais e fenômenos clínicos secundários 
que os adultos. As diferenças relacionadas à 
idade em autonomia e estilo de vida, contudo, 
podem influenciar significativamente a 
expressão dos sintomas dissociativos nos 
jovens. As crianças pequenas, em especial, têm 
uma noção de tempo menos linear e menos 
contínua e com frequência não são capazes de 
autoidentificar descontinuidades dissociativas 
em seu comportamento. Muitas vezes, 
informantes adicionais, como professores e 
parentes, estão disponíveis para ajudar a 
documentar comportamentos dissociativos. 
Diversos fenômenos normais da infância, como 
um companheiro imaginário e devaneios 
elaborados, devem ser diferenciados da 
dissociação patológica nas crianças menores. A 
apresentação clínica pode ser a de um 
companheiro imaginário elaborado ou 
autônomo, que assume o controle do 
comportamento da criança, frequentemente 
vivenciado por meio de experiências de 
influência passiva ou pseudoalucinações 
auditivas, ou ambas, que comandam o 
comportamento da criança de certas formas. 
Diagnóstico diferencial 
A Tabela 12-8 lista os transtornos mais comuns 
que devem ser diferenciados do transtorno 
dissociativo de identidade. 
 
Transtorno dissociativo de identidade 
factício, imitativo e simulado. Relata-se que 
os indicadores de transtorno dissociativo de 
identidade falsificado ou imitativo incluem 
indicadores típicos de outras apresentações 
factícias ou simuladas. Estes incluem exagero 
de sintomas, mentiras, uso de sintomas para 
isentar-se de comportamento antissocial (p. ex., 
amnésia apenas para mau comportamento), 
amplificação de sintomas quando sob 
observação, recusa em permitir contatos 
colaterais, problemas legais e mitomania. Os 
pacientes com transtorno dissociativo de 
identidade genuíno costumam se sentir 
confusos, conflituosos, envergonha- dos e 
preocupados com seus sintomas e história de 
trauma. Aqueles sem o transtorno genuíno em 
geral apresentam pouca disforia quanto a esse 
transtorno. 
Curso e prognóstico 
Pouco se sabe sobre o histórico natural do 
transtorno dissociativo de identidade não 
tratado. Acredita-se que alguns indivíduos 
nessa situação continuem a se envolver em 
relacionamentos abusivos ou subculturas 
violentas, ou ambos, que possam resultar no 
trauma de seus filhos, com o potencial de 
transmissão adicional do transtorno à família. 
Muitos autores acreditam que uma 
porcentagem dos pacientes com transtorno 
dissociativo de identidade não tratado ou não 
diagnosticado morra por suicídio ou como 
resultado de seus comportamentos de alto 
risco. 
O prognóstico é pior em pacientes com 
transtornos mentais orgânicos comórbidos, 
transtornos psicóticos (transtorno não 
dissociativo de identidade, pseudopsicose) e 
doenças clínicas graves. Abuso refratário de 
substâncias e transtornos alimentares também 
sugerem um prognóstico mais pobre. Outros 
fatores que normal- mente indicam um 
desfecho mais pobre incluem características 
significativas de personalidade antissocial, 
atividade criminosa atual, abuso contínuo e 
vitimização atual, com a recusa de deixar 
relacionamentos abusivos. Traumas adultos 
repetidos com episódios recentes de transtorno 
de estresse agudo podem complicar o curso 
clínico. 
Tratamento 
Psicoterapia. Para ter sucesso com o paciente 
que apresenta transtorno dissociativo de 
identidade, a psicoterapia requer que o médico 
se sinta confortável com diversas intervenções 
psicoterapêuticas e esteja disposto a trabalhar 
ativamente para estruturar o tratamento. Essas 
modalidades incluem psicoterapia psicanalítica, 
terapia cognitiva, terapia comportamental, 
hipnoterapia e uma familiaridade com 
psicoterapia e com o manejo 
psicofarmacológico do paciente traumatizado. 
Conforto com tratamento familiar e teoria de 
sistemas é útil ao trabalhar com um paciente 
que sente subjetivamente que é um sistema 
complexo de identidades, com alianças, 
relacionamentos familiares e conflitos 
intragrupo. Fundamentos em trabalho com 
indivíduos que apresentam transtornos de 
sintomas somáticos também podem ajudar a 
compreender os diversos sintomas somáticos 
com os quais essas pessoas em geral se 
apresentam. 
Terapia cognitiva. Muitas distorções 
cognitivas associadas com transtornos 
dissociativos de identidade respondem 
lentamente a técnicas de terapia cognitiva, e 
intervenções bem-sucedidas podem levar a 
disforia adicional. Um subgrupo de pacientes 
com transtorno dissociativo de identidade não 
progride além de um tratamento de apoio a 
longo prazo inteiramente direcionado à 
estabilização de suas múltiplas dificuldades 
multiaxiais. Uma vez que possam ser tratados, 
esses pacientes requerem um tratamento a 
longo prazo com foco na contenção dos 
sintomas e na administração de sua disfunção 
geral de vida, como seria o caso com qualquer 
outro paciente psiquiátrico com doença grave e 
persistente. 
Hipnose. As intervenções hipnoterapêuticas 
frequentemente podem aliviar impulsos 
autodestrutivos ou reduzir sintomas, tais como 
flashbacks, alucinações dissociativas e 
experiências de influência passiva. Ensinar 
auto-hipnose ao paciente pode ajudar com 
crises fora das sessões. A hipnose pode ser útil 
para acessar estados de al- ter personalidades 
específicos e seus afetos e memórias. Ela 
também é empregada para criar estados de 
relaxamento mental, nos quais eventos 
negativos podem ser examinados sem grande 
ansiedade. Os médicos que utilizam a hipnose 
devem ser treinados em seu uso em 
populações com trauma. Eles devem estar 
cientes das controvérsias atuais sobre o 
impacto da hipnose no relato preciso das 
memórias e devem usar consentimento 
informado adequado para tal. 
Intervenções psicofarmacológicas. Os 
medicamentos antidepressivos costumam ser 
importantes na redução da depressão e na 
estabilização do humor. Diversos sintomas deTEPT, sobretudo os intrusivos e de 
excitabilidade aumentada, são parcialmente 
responsivos aos medicamentos. Os médicos 
relatam algum sucesso com ISRSs, 
antidepressivos tricíclicos e inaladores 
monoaminoxidase, β-bloqueadores, clonidina, 
anticonvulsivantes e benzodiazepínicos na 
redução de sintomas intrusivos, excitabilidade 
aumentada e ansiedade em pacientes com 
transtorno dissociativo de identidade. 
Pesquisas recentes apontam que o α1-
adrenérgico antagonista prazosina possa ser 
útil para pesadelos de TEPT. Relatos de caso 
indicam que a agressividade pode responder a 
carbamazepina em alguns indivíduos se 
anormalidades no EEG estiverem presentes. 
Pacientes com sintomas obsessivo-
compulsivos podem responder a 
antidepressivos com eficácia antiobsessiva. 
Estudos abertos relatam que a naltrexona pode 
ajudar a melhorar os comportamentos 
recorrentes de um subconjunto de pacientes 
traumatizados. 
Os neurolépticos atípicos, tais como 
risperidona, quetiapina, ziprasidona e 
olanzapina, podem ser mais efetivos e mais 
bem tolerados do que os neurolépticos típicos 
para ansiedade extrema e sintomas intrusivos 
de TEPT em pacientes com transtorno 
dissociativo de identidade. Algumas vezes, um 
paciente extremamente desorganizado, 
arrasado e cronicamente doente com transtorno 
dissociativo de identidade que não respondeu 
aos testes de outros neurolépticos responde de 
maneira favorável a um teste de clozapina. 
Eletroconvulsoterapia. Para alguns 
pacientes, a ECT ajuda a melhorar transtornos 
refratários do humor sem piorar problemas 
dissociativos de memória. A experiência clínica 
em cuidados terciários para pacientes 
gravemente doentes com transtorno 
dissociativo de identidade sugere que um 
quadro clínico de depressão maior com 
características melancólicas refratárias e 
persistentes ao longo de todos os estados 
alterados prediz uma resposta positiva à ECT. 
No entanto, essa resposta costuma ser apenas 
parcial, como é típico da maioria dos 
tratamentos somáticos de sucesso na 
população com esse transtorno. Sintomas-alvo 
e tratamentos somáticos para transtorno 
dissociativo de identidade estão listados na 
Tabela 12-9. 
 
Tratamentos adjuntos 
Terapia em grupo. Em grupos de terapia que 
incluem pacientes de psiquiatria geral, o 
surgimento de alter personalidades pode 
atrapalhar o processo do grupo ao gerar 
fascínio excessivo ou assustar outros 
pacientes. Relata-se que os grupos de terapia 
compostos apenas de pacientes com transtorno 
dissociativo de identidade são mais bem-
sucedidos, embora os grupos devam ser 
cuidadosamente estruturados, ter limites firmes 
e se focar, de maneira geral, nas questões mais 
imediatas sobre como lidar e se adaptar à 
situação. 
Terapia de família. Terapias de famílias ou de 
casais costumam ser mais importantes para a 
estabilização a longo prazo e para tratar 
processos familiares e conjugais patológicos 
que são comuns em pacientes com transtorno 
dissociativo de identidade e seus familiares. A 
educação da família e demais interessados 
sobre esse transtorno e seu tratamento pode 
ajudar os membros da família a lidarem de 
modo mais efetivo com o transtorno e com os 
sintomas de TEPT em seus entes queridos. 
Intervenções em grupo para educar ou apoiar 
familiares também oferecem benefício. A 
terapia sexual pode ser uma parte importante 
do tratamento dos casais, porque indivíduos 
com o transtorno podem ficar intensamente 
fóbicos de manter contato íntimo por períodos 
de tempo, e os cônjuges podem não ter muita 
ideia de como lidar com isso de maneira 
produtiva. 
Grupos de mútua ajuda. Pacientes com 
transtorno dissociativo de identidade em geral 
apresentam desfecho negativo para grupos de 
mútua ajuda ou grupos de 12 passos para 
sobreviventes de incesto. Diversas questões 
problemáticas podem surgir, incluindo 
intensificação dos sintomas de TEPT devido à 
discussão do material traumático sem 
salvaguardas clínicas, exploração do paciente 
com transtorno dissociativo de identidade por 
membros predatórios, contaminação da 
memória do paciente por discussões do trauma 
pelo grupo e um sentimento de alienação até 
dos outros pacientes que sofreram trauma e 
dissociação. 
Terapias expressivas e ocupacionais. 
Terapias expressivas e ocupacionais, como a 
arte terapia e a terapia de movimento, provaram 
ser particularmente úteis no tratamento de 
pacientes com transtorno dissociativo de 
identidade. A arte terapia pode ser usada para 
ajudar a conter e estruturar o transtorno 
dissociativo de identidade grave e sintomas de 
TEPT, assim como para permitir a esses 
indivíduos maneiras mais seguras de expressar 
seus pensamentos, sentimentos, imagens 
mentais e conflitos, os quais podem ter 
dificuldades de verba- lizar. A terapia de 
movimento pode facilitar a normalização das 
sensações corporais e da imagem corporal para 
esses pacientes gravemente traumatizados. A 
terapia ocupacional pode auxiliar o paciente 
com atividades focadas e estruturadas que 
podem ser completadas com sucesso, bem 
como ajudar no foco e na administração dos 
sintomas. 
Dessensibilização e reprocessamento por 
movimentos oculares (EMDR). A EMDR foi 
recentemente proposta como tratamento 
adjunto de TEPT. Há discordâncias na literatura 
quanto à utilidade e à eficácia dessa 
modalidade de tratamento, e estudos 
publicados sobre sua eficácia são discrepantes. 
Não foram realizados estudos sistemáticos em 
pessoas com transtorno dissociativo de 
identidade usando EMDR. Relatos de caso 
sugerem que algumas pessoas com esse 
transtorno podem ser desestabilizadas por 
procedimentos de EMDR, em especial aquelas 
com TEPT agudo e com sintomas dissociativos. 
Algumas autoridades acreditam que a EMDR 
possa ser usada como um adjunto útil para 
fases posteriores de tratamento em pacientes 
ambulatoriais com essa condição bem 
estabilizados. As diretrizes para o tratamento 
dessa condição, da In- ternational Society for 
the Study of Trauma and Dissociation 
preconizam que a EMDR só pode ser usada 
nessa população por médicos que realizaram 
treinamento avançado de EMDR, têm 
conhecimento e habilidade no tratamento fásico 
de trauma para transtornos dissociativos e 
receberam supervisão no uso de EMDR em 
transtorno dissociativo de identidade. 
SÍNDROME DE GANSER 
A síndrome de Ganser é uma condição mal 
compreendida caracterizada pelo fornecimento 
de respostas aproximadas (paralogia) junto 
com um enevoamento da consciência com 
frequência acompanhado de alucinações e 
outros sintomas dissociativos, somatoformes 
ou de conversão. 
Epidemiologia. Foram relatados casos em 
diversas culturas, mas a frequência geral de tais 
relatos caiu com o tempo. Os homens superam 
as mulheres em aproximadamente 2 para 1. 
Três dos pri- meiros quatro casos de Ganser 
acometeram prisioneiros, levando alguns 
autores a considerá-la um transtorno das 
populações penais e, portanto, um indicador de 
simulação em potencial. 
Etiologia. Alguns casos relatados identificam 
estressores precipitantes, tais como conflitos 
pessoais e revezes financeiros, enquanto 
outros notam síndromes cerebrais orgânicas, 
lesões encefálicas, convulsões ou doenças 
psiquiátricas. Explicações psicodinâmicas são 
comuns na literatura mais antiga, mas etiologias 
orgânicas são enfatizadas em estudos de caso 
mais recentes. Especula-se que os insultos 
orgânicos possam agir como estressores 
agudos, precipitando a síndrome em indivíduos 
vulneráveis. Alguns pacientes relataram 
histórias significativas de maus-tratos infantis e 
adversidade. 
Diagnóstico e características clínicas. O 
sintoma de passar pela (vorbeigehen) resposta 
correta devido a uma resposta rela- cionada, 
mas incorreta, é a marca da síndrome de 
Ganser. As respostas aproximadas costumam 
estar erradas por pouco, mas apresentam uma 
relação evidente com a pergunta, indicando que 
elafoi compreendida. Quando perguntaram a 
uma mulher de 25 anos quantos anos tinha, ela 
respondeu: “Eu não tenho 5”. Se lhe pedissem 
para realizar contas simples (p. ex., 2 + 2 = 5); 
para fornecer informações gerais (a capital dos 
Estados Unidos é Nova York); para identificar 
objetos simples (um lápis é uma chave); ou para 
nomear as cores (verde é cinza), o paciente 
com síndrome de Ganser daria respostas 
errôneas, mas compreensíveis. 
Um enevoamento da consciência também 
ocorre, normalmente manifesto por 
desorientação, amnésia, perda de informações 
pessoais e algum prejuízo da noção de 
realidade. Alucinações visuais e auditivas 
ocorrem em cerca de metade dos casos. 
Exames neurológicos podem revelar o que 
Ganser chamava de stigmata histérica, por 
exemplo, uma analgesia não neurológica ou 
hiperalgesia alternante. A síndrome deve ser 
acompanhada de outros sintomas 
dissociativos, como amnésias, sintomas de 
conversão ou comportamentos do tipo transe. 
Diagnóstico diferencial. Dada a história 
frequente de síndromes cerebrais orgânicas, 
convulsões, traumas encefálicos e psicose na 
síndrome de Ganser, indica-se uma avaliação 
neurológica e clínica completa. Diagnósticos 
diferenciais incluem demência orgânica, 
pseudodêmencia depressiva, a confabulação 
da síndrome de Korsakoff, disfasias orgânicas 
e psicoses reativas. Pacientes com transtorno 
dissociativo de identidade ocasionalmente 
também podem exibir sintomas do tipo Ganser. 
Tratamento. Não foram conduzidos estudos de 
tratamentos sistemáticos, dada a raridade 
dessa condição. Na maioria dos relatos de 
caso, o paciente foi hospitalizado e recebeu um 
ambiente protetor e solidário. Em alguns casos, 
foi verificado que baixas doses de 
medicamentos antipsicóticos foram benéficas. 
Confrontação ou interpretações das respostas 
aproximadas dos pacientes não são produtivas, 
mas explorações de possíveis estressores 
podem ajudar. Hipnose e narcossíntese de 
amobarbital também foram usadas com 
sucesso para ajudar pacientes a revelar os 
estressores subjacentes que prece- deram o 
desenvolvimento da síndrome, com cessação 
concomitante dos sintomas de Ganser. Em 
geral, um retorno relativamente rápido ao 
funcionamento ocorre no período de dias, 
apesar de alguns casos necessitarem de um 
mês ou mais para serem resolvidos. O indivíduo 
costuma ficar amnésico para o período da 
síndrome. 
 
TRANSTORNO DE DESPERSONALIZAÇÃO/ 
DESREALIZAÇÃO 
A despersonalização é definida como o 
sentimento persistente ou recorrente de 
desapego ou de estranhamento do próprio eu. 
O indivíduo pode relatar se sentir como um 
autômato ou como se estivesse se assistindo 
em um filme. A desrealização tem alguma 
relação e se refere a sentimentos de irrealidade 
ou de afastamento do próprio ambiente. O 
paciente pode descrever sua percepção do 
mundo exterior como um ambiente no qual falta 
lucidez ou emoção, como se estivesse em um 
sonho ou morto. 
A definição atual do DSM-5 do transtorno de 
despersonalização pode ser vista na Tabela 12-
5. 
 
Etiologia 
Psicodinâmica. As formulações 
psicodinâmicas tradicionais enfatizavam a 
desintegração do ego ou viam a 
despersonalização como uma resposta afetiva 
em defesa do ego. Essas explicações destacam 
o papel de experiências extremamente 
dolorosas ou de impulsos conflitivos como 
eventos provocadores. 
Estresse traumático. Uma proporção 
substancial, via de regra de um terço a metade, 
dos pacientes em casos de despersonalização 
clínica relata histórias de trauma significativo. 
Diversos estudos de vítimas de acidentes 
verificaram que até 60% dos que sofreram 
experiências potencialmente fatais relataram ao 
menos despersonalização transitória durante o 
evento ou logo depois. Estudos do treinamento 
militar relataram que sintomas de 
despersonalização e desrealização costumam 
ser evocados por estresse e fadiga, e que estão 
inversamente relacionados ao desempenho. 
Teorias neurobiológicas. A associação da 
despersonalização com enxaquecas e 
maconha, sua resposta em geral favorável aos 
inibidores seletivos da recaptação de 
serotonina (ISRSs) e o aumento nos sintomas 
de despersonalização visto com a depleção de 
L-triptofano, um precursor de serotonina, 
apontam para um grande envolvimento da 
serotonina. A despersonalização é o sintoma 
dissociativo primário elicitado pelos estudos de 
questionamento de fármacos descritos na 
seção sobre teorias neurobiológicas da 
dissociação. Esses estudos implicam 
fortemente o subtipo do receptor de glutamato 
N-metil-D-aspartato (NMDA) como central para 
a origem dos sintomas de despersonalização. 
Diagnóstico e características clínicas 
Diversos componentes distintos compõem a 
experiência da despersonalização, incluindo 
um senso de (1) alterações corporais, (2) 
dualidade do eu como observador e ator, (3) 
distanciamento dos outros e (4) distanciamento 
das próprias emoções. Os pacientes que 
vivenciam a despersonalização com frequência 
têm grandes dificuldades para expressar o que 
estão sentindo. Tentando expressar seu 
sofrimento subjetivo com frases banais, tais 
como “Eu me sinto morto”, “Nada parece real” 
ou “Estou fora de mim”, os pacientes 
despersonalizados podem não transmitir de 
forma adequada o sofri- mento que passam. 
Enquanto reclamam amargamente sobre como 
isso arruína suas vidas, eles ainda assim 
podem parecer bastante tranquilos. 
Diagnóstico diferencial 
A diversidade de condições associadas com a 
despersonalização complica o diagnóstico 
diferencial desse transtorno. A 
despersonalização pode resultar de uma 
condição médica ou neurológica, da intoxicação 
ou da abstinência de drogas ilícitas, como efeito 
colateral de medicamentos, ou pode estar 
associada com ataques de pânico, fobias, 
TEPT ou transtorno de estresse agudo, 
esquizofrenia ou outro transtorno dissociativo. 
Uma avaliação médica e neurológica completa 
é essencial, incluindo estudos de laboratório, 
um EEG e qualquer exame de drogas indicado. 
A despersonalização relacionada a drogas 
costuma ser transitória, mas a 
despersonalização persistente pode 
acompanhar um episódio de intoxicação com 
diversas substâncias, entre elas maconha, 
cocaína e outros psicoestimulantes. Diversas 
condições neurológicas, incluindo transtornos 
convulsivos, tumores cerebrais, síndrome pós-
concussiva, anormalidades metabólicas, 
enxaqueca, vertigem e doença de Ménière, 
foram relatadas como causas. A 
despersonalização causada por condições 
orgânicas tende a ser principalmente sensorial, 
sem as descrições elaboradas e sentidos 
personalizados comuns a etiologias 
psiquiátricas. 
Curso e prognóstico 
A despersonalização após experiências 
traumáticas ou intoxicação costuma entrar em 
remissão de maneira espontânea após a 
remoção das circunstâncias traumáticas ou o 
fim do episódio de intoxicação. Aquela que 
acompanha transtornos do humor, psicóticos ou 
outros transtornos de ansiedade 
frequentemente entra em remissão com o 
tratamento definitivo dessas condições. 
O transtorno de despersonalização em si pode 
ter um curso episódico, de relapso e de 
remissão, ou crônico. Muitos pacientes com 
despersonalização crônica podem ter um curso 
caracterizado por grave prejuízo no 
funcionamento ocupacional, social e pessoal. A 
idade média de início costuma ser no fim da 
adolescência ou no início da vida adulta, na 
maioria dos casos. 
Tratamento 
Os médicos que trabalham com pacientes que 
apresentam transtorno de 
despersonalização/desrealização com 
frequência os consideram um grupo 
particularmente refratário ao tratamento. 
Algumas evidências sistemáticas indicam que 
os antidepressivos ISRSs, como a fluoxetina, 
podem ajudar esses pacientes. No entanto, dois 
estudos duplos-cegos recentes, controlados 
para placebo, não encontraram eficácia para a 
fluvoxamina e a lamotrigina, nessa ordem, para 
o tratamento de despersonalização. Alguns 
indivíduos respondem, na melhor das 
hipóteses, esporádicae parcialmente aos 
grupos habituais de fármacos, isolados ou 
combinados: antidepressivos, estabilizadores 
do humor, neurolépticos típicos e atípicos, 
anticonvulsivantes, e assim por diante. 
Muitos tipos diferentes de psicoterapia foram 
usados para tratar o transtorno de 
despersonalização: psicodinâmica, cognitiva, 
cognitivo-comportamental, hipnoterapêutica e 
de apoio. Muitos desses pacientes não têm uma 
resposta robusta a esses tipos específicos de 
psicoterapia-padrão. Estratégias de 
administração do estresse, técnicas de 
distração, redução de estímulos sensoriais, 
treino de relaxamento e exercícios físicos 
também podem ajudar alguns indivíduos. 
TRATAMENTO GERAL 
Psicoterapia e psicoeducação 
Pessoas com transtornos 
dissociativos/conversivos podem obter a 
resolução ou a estabilização dos sintomas 
quando a indicação de psicoterapia se dá de 
maneira precoce e oportuna. O tipo de 
abordagem, se psicodinâmica ou cognitivo-
comportamental, vai depender do caso, do 
profissional envolvido e da disponibilidade de 
recursos na rede de saúde. Há evidências 
clínicas de que as práticas psicoterapêuticas 
são superiores ao manejo da somatização 
unicamente pelos MFC. A psicoeducação 
envolve o indivíduo como protagonista de seu 
tratamento, retirando-o da passividade e 
envolvendo-o no conhecimento de que o que 
lhe acontece também se passa com outras 
pessoas. Pode ocorrer mediante a formação de 
grupos e palestras, envolvendo a partilha de 
experiências. 
Terapias integrativas e complementares em 
saúde 
Ioga, acupuntura, homeopatia, técnicas de 
relaxamento, massagens e outras podem se 
mostrar úteis. Cada situação deve ser 
manejada de maneira singular. 
 
Manejo medicamentoso 
Não há evidência quanto às vantagens do uso 
de psicofármacos específicos nesses casos. A 
principal conduta consiste em evitar o uso 
desnecessário de medicação, uma vez que as 
evidências apontam para a hipersensibilidade 
medicamentosa em pessoas com os 
transtornos aqui abordados. Os abusos e as 
dependências medicamentosas, principalmente 
a benzodiazepínicos, devem ser prevenidos, 
identificados e tratados. Por outro lado, o 
médico deve reconhecer a concomitância de 
sintomas depressivos ou ansiosos e ponderar 
sobre a necessidade de antidepressivos nessas 
situações. Os quadros 
conversivos/dissociativos muitas vezes 
culminam na administração, off label, de 
antipsicóticos para o tratamento dos sintomas 
de agitação, mas seu uso deve ser evitado, haja 
vista que o paciente não deve ser exposto 
desnecessariamente a efeitos colaterais, 
embotamento afetivo e risco de síndrome 
neuroléptica maligna. 
 
Objetivo 2) Diferenciar transtornos 
conversivos/ factícios e simulação. 
Os transtornos dissociativos devem ser 
diferenciados dos factícios e dos casos de 
simulação. Na simulação, a pessoa inventa ou 
produz conscientemente seus sintomas e tem 
uma motivação de fundo: ganho financeiro, 
aposentadoria, uma causa com a justiça ou 
outra qualquer. Nesse caso, quer convencer o 
médico ou o perito da realidade dos sintomas, 
sendo norteadores: comportamento exagerado, 
atitude incomun, vontade de convencer o 
médico sobre algum sintoma e falta de 
coerência na apresentação dos sintomas que 
não se agrupam em quadros clínicos 
conhecidos (verifica-se algo atípico ou sem 
lógica clínica). 
No transtorno factício (TF), a produção dos 
sintomas é intencional (consciente) e a 
motivação, inconsciente. São contadas 
histórias bem elaboradas e “fabricadas” queixas 
que levam a hospitalizações repetidas e 
procedimentos desnecessários, como os 
cirúrgicos (por exemplo, laparotomia branca em 
queixa de dor abdominal malcaracterizada). 
Essas pessoas simulam sinais até mesmo por 
mecanismos autoinfligidos (uma paciente 
cortava a gengiva para simular hemorragia 
digestiva) ou modificam exames (querendo 
provar sua diabetes, uma paciente trazia falsas 
aferições de hiperglicemia). Na maioria das 
vezes, são casos esclarecidos em pacientes 
internados em clínicas diversas que são vistos 
em interconsulta hospitalar. Podem estar 
também na atenção primária ou em 
ambulatórios, buscando o cuidado do médico 
repetidamente. 
Ainda no que se refere ao TF, os indivíduos 
buscam assumir o papel de enfermos e fazem 
do hospital ou serviço de saúde sua segunda ou 
mesmo a principal morada. Não há motivação 
de algum ganho externo como na simulação. 
No TF por procuração (ou imposto a outro), 
mães provocam doenças em suas crianças. 
Esta síndrome se constitui em maus-tratos à 
criança com risco de mortalidade infantil e deve 
ser notificada compulsoriamente ao Conselho 
Tutelar da região em que reside a família. 
 
Objetivo 3) Discutir a conduta ideal do 
médico com o paciente. 
Além de seu potencial e da dedicação ao 
conhecimento e à técnica, o médico precisa ter 
preocupações humanas. Todos são 
interdependentes – humanismo, conhecimento 
científico e técnica – e se alimentam 
mutuamente. 
A especialização em psiquiatria ou saúde 
mental deveria habilitar o profissional para lidar 
de maneira mais humanizada com os doentes. 
Entretanto, nem sempre essa é a realidade. 
Entrar em contato com a “loucura”, mesmo que 
“loucuras brandas” ou “transtornos mentais 
menores” ou “comuns”, pode causar 
desconcerto, desgaste e ser muito impactante 
para qualquer um. Ao lidar com pessoas, 
portanto, ninguém dispõe de um manual 100% 
seguro ou GPS que lhe dê todas as 
coordenadas para não se perder. Por isso, é 
importante que o profissional de saúde conheça 
tanto de si como de quem vai tratar e entenda 
que esse auto ou heteroconhecimento é um 
aspecto dinâmico, aberto e que nunca termina. 
Da entrevista inicial ao acompanhamento 
subsequente será construída uma relação entre 
o médico/equipe e o paciente (pessoa). Nessa 
entrevista, aspectos transferenciais estão 
postos antes ou depois do primeiro contato. Diz-
se antes porque a pessoa que vem à consulta 
traz consigo sua história de vida e como lida 
com ela. O mesmo acontece com o profisisonal 
de saúde. Conhecer a transferência irá ajudar 
aquele que trata, evitando julgamentos ou 
preconceitos, na medida em que toma 
consciência do que é a transferência e de como 
ela acontece. Independentemente da 
abordagem preferida pelo médico ou pela 
equipe, a transferência estará ali. 
 
Alguns aspectos negativos que precisam ser 
reconhecidos no processo de transferência: 
pessoa e família tomam muito tempo do 
médico/equipe; sentimentos de irritabilidade ou 
falta de paciência vividos pelo médico/equipe; 
somatizadores podem ter um discurso 
monótono, rígido ou enfadonho; a pessoa 
assume o papel de doente, tornando-se 
resistente ao tratamento. 
Além do aspecto transferencial, o profissional 
de saúde deve levar em conta os seguintes 
princípios básicos do atendimento no contato 
inicial e nas consultas subsequentes: 
• Ambiente estruturado: bom espaço físico e 
ambiente tranquilo. 
• Acolhimento: receber a pessoa ouvindo sua 
queixa e permitindo que ela expresse suas 
preocupações e angústias, colocando os limites 
necessários. 
• Vínculo: processo de ligação entre a pessoa e 
seu cuidador, que acontece a partir do encontro 
e do convívio entre eles. 
• Responsabilização: ao acolher, responder 
pelas ações tomadas em relação ao outro. 
Compreendidos a transferência e os princípios 
básicos do atendimento em saúde, resumem-se 
aqui alguns elementos da abordagem e 
acompanhamento a pacientes somatizadores 
agudos ou crônicos (Quadros 9.6 e 9.7). 
 
Local de tratamento 
Preferencialmente, o tratamento deve ser 
oferecido na atenção primária por aqueles a 
quem os pacientes primeiro procuram: os 
médicos de família e da comunidade (MFC). As 
equipes de saúde da família são orientadas a 
tratá-los e podem discutir os casos nas ações 
de matriciamento com a equipe de saúde 
mental. 
Casos que necessitem de assistência 
especializada podem ser encaminhados para 
acompanhamento psiquiátrico ou psicológico. 
Em casos de dissociações/conversões, o 
manejo poderáocorrer em setor de emergência 
psiquiátrica, centro de atenção psicossocial 
(CAPS) ou ambulatório especializado. 
 
Referências: Compêndio de Psiquiatria, 
Psiquiatria Clínica de Cantilino

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