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Minha análise se inicia pelos indicadores de renda pois acredito ser o grande balizador do acesso aos demais fatores, na medida em que determina o acesso à saúde, educação e habitação, por exemplo. O primeiro indicador escolhido é o “percentual da renda apropriada pelos 20% mais pobres”. O segundo, o “percentual da renda apropriada pelos 20% mais ricos”. A comparação entre os dados dos dois indicadores nos permite inferir um dos problemas base da desigualdade social no Brasil: a concentração de renda. Entre Melgaço, Pelotas e Porto Alegre, a variação não é gritante e é também semelhante à média nacional, tanto no percentual de renda apropriada pelos mais pobres quanto pelos mais ricos. Logo, evidencia-se que, no Sul ou no Norte, a renda brasileira não é distribuída de maneira justa entre a população. Isto pode ser comprovado pelo abismo entre as médias nacionais dos 20% mais pobres e dos 20% mais ricos, sendo a segunda 2631% maior que a primeira. Além disso, o problema da concentração de renda é comprovado pela análise do terceiro indicador escolhido, o Índice de Gini. O Índice de Gini mede o grau de concentração de renda. As três regiões analisadas apresentam índices semelhantes entre si e semelhantes à média nacional, o que mais uma vez evidencia a universalidade dessa questão no âmbito nacional. No entanto, ainda no quesito renda, há grandes dessemelhanças entre as cidades analisadas, principalmente entre as cidades gaúchas e Melgaço. Ao analisarmos os indicadores “Renda per capita” e “% de extremamente pobres, % de pobres, % de vulneráveis à pobreza”, verifica-se que a concentração de renda acarreta muito mais pobreza no Norte do Brasil do que no Sul. A média nacional apresenta um valor baixo de renda per capita, o que mostra que a maior parte da população brasileira vive em condições de pobreza. Pelotas apresenta uma média relativamente próxima à média nacional. Porto Alegre está bastante acima desse valor, talvez pelas condições de metrópole que proporciona uma renda maior que a média nacional para mais pessoas. Mas ao analisarmos Melgaço fica claro o quanto a renda impacta nos indicadores sociais, fazendo dessa a cidade com os piores indicadores nacionais. Os míseros R$135,21 per capita fazem de Melgaço uma cidade com aproximadamente 5 vezes a % de pobres do Brasil, 10 vezes a % de pobres de Pelotas e 20 vezes a % de pobres de Porto Alegre. A crueldade da miséria também se traduz na “% de crianças extremamente pobres, pobres e vulneráveis à pobreza”, indicadores que são imensamente mais expressivos em Melgaço do que nas demais localidade, especialmente na categoria “% de crianças vulneráveis à pobreza”, que chega próximo de 100%. A segunda área de análise é o trabalho, que reafirma a grande característica do povo brasileiro: um povo trabalhador. Os índices da “taxa de atividade - 18 anos ou mais” não são muito diferentes entre as três cidades e a média nacional, o que indica que, em maior ou menor índice de exploração, o trabalho é alcançado por uma média semelhante de pessoas - e o desemprego é um problema comum. Com essa análise podemos desconstruir os discursos meritocrático e xenofóbico de que “aqueles que trabalham, alcançam uma vida digna” e de que “o povo do norte e nordeste do país são preguiçosos” - as médias são semelhantes e, no entanto, os indicadores demonstram um abismo social. Todavia, chama a atenção o indicador “Taxa de atividade - 10 anos ou mais” ser aproximado entre as três localidades dada a diferença de IDH - espera-se que cidades com IDH maior apresentem uma preferência maior pelo estudo, em detrimento do trabalho, entre pessoas menores menores de 18 anos. Contudo, essa é uma análise superficial pois não isola a população entre 10 e 18 anos, entre outros fatores que devem ser considerados. Ademais, com o indicador “% de empregados sem carteira - 18 anos ou mais” evidencia-se a precarização do trabalho em Melgaço, que apresenta uma taxa superior à Nacional. Enquanto isso, em um primeiro momento Porto Alegre se mostra um pouco mais avançada na proteção trabalhista - ainda que 13% signifique uma porcentagem significativa da população, que é muito maior que a de Melgaço. Para concluir o âmbito “Trabalho”, o indicador “Rendimento médio dos ocupados - 18 anos ou mais” vai ao encontro da análise da Renda per capita nas cidades em questão, sendo Melgaço o local com menor rendimento, Pelotas com um rendimento próximo à média nacional e Porto Alegre com um rendimento bastante superior à média nacional. O próximo tópico em questão é a habitação, um indicador que expressa a desigualdade de um modo mais comovente que a renda, ainda que seja uma consequência dela. A maior parte da população em Melgaço não possui água encanada e banheiro em suas residências. Em Pelotas e Porto Alegre, quase que a totalidade da população possui. A energia elétrica também falta a aproximadamente 40% da população da cidade do Pará, enquanto nas cidades do Sul falta a menos de 1% da população. A crueldade da desigualdade é extremamente clara nesses dados, demonstrando a condição de miséria a que a população de Melgaço está submetida. Em seguida, os indicadores da área de educação demonstram que a educação não se faz sem condições adequadas de moradia e de renda. A Taxa de analfabetismo em Melgaço é quase 10 vezes maior que a do Brasil. Em Pelotas e em Porto Alegre as Taxas de Analfabetismo são praticamente a metade da média nacional, o que simboliza uma política de alfabetização fortalecida. O indicador de “% de mães chefes de família sem fundamental e com filho menor” e de “% de 18 anos ou mais com fundamental completo” reafirmam a fragilidade da educação sem uma vida digna. Contudo, em Porto Alegre e em Pelotas, os números, apesar de indicarem melhores condições educacionais do que em Melgaço, também indicam que há desafios nessas localidades. Em suma, não é possível considerar os dados educacionais sem levar em conta o contexto social da cidade em questão. Os indicadores de vulnerabilidade, população e IDHM servem de base para o que foi supracitado e por isso foram incluídos na tabela. Em síntese, considero que os indicadores de renda, trabalho, moradia e educação são fatores que determinam as condições de saúde dessas diferentes populações. A saúde desses indivíduos encontra influências diferentes em Melgaço, Porto Alegre e Pelotas, mas possui em comum diversas questões de âmbito nacional que, em maior ou menor grau, afetam suas condições de vida. A partir da análise desses indicadores, os modelos de Determinantes Sociais da Saúde fizeram todo o sentido - são baseados em questões reais, expressam a materialidade da vivência do processo saúde-doença.
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