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ANATOMIA DA PELVE FEMININA Dr. Luís Antônio Panucci 8º termo - 2021.2 Esta aula de anatomia é voltada para clínica, focando no que o médico tem que saber para realizar um bom exame físico e um bom raciocínio clínico. ● Quando examina-se uma paciente, é importante não apenas realizar um bom exame físico, mas também descrever detalhadamente este exame no prontuário, pois ele possivelmente será lido por advogados, juízes e promotores. ANATOMIA DA PELVE ● 1. Parede abdominal. ● 2. Órgãos genitais externos. ● 3. Assoalho pélvico. ● 4. Órgãos genitais internos. ● 5. Vascularização (importante). ● 6. Bacia. ● 7. Inervação. 1. PAREDE ABDOMINAL Antes de tudo, é importante nos lembrarmos dos quadrantes e regiões do abdome: ● Claro que, quando formos examinar a paciente, é muito importante descrever onde é a dor (ou a queixa) ○ Exemplo: na apendicite, a dor costuma começar no epigástrio, migrando para o mesogástrio e, por último, para a fossa ilíaca direita. ● Observação: O hipogástrio também pode ser denominado “baixo ventre”. ● Outro ponto importante de se conhecer trata-se dos músculos da parede abdominal: reto abdominal, oblíquo externo, oblíquo interno e transverso do abdome. ● Na cesárea, geralmente tentamos seguir as linhas de tensão e evitamos cortar a musculatura. Geralmente, o corte segue a direção do transverso do abdome e não é necessário cortar a musculatura (no máximo o reto abdominal, se necessário).Na cesárea, as primeiras camadas são: pele, tecido celular subcutâneo e aponeurose do reto abdominal - estas 3 camadas cortam-se na transversal, denominado incisão de Pfannenstiel. Chega-se então ao reto abdominal, que será divulsionado (afasta-se um para cada lado). Temos então o peritônio parietal e, por último, o peritônio visceral (já colado no útero). Basta então abrirmos o útero. ● Resumindo: 1. Pele; 2. Tecido celular subcutâneo; 3. Aponeurose do reto abdominal; 4. Reto abdominal (apenas divulsão); 5. Peritônio parietal; 6. Peritônio visceral; 7. Útero. 2. ÓRGÃOS GENITAIS EXTERNOS ● Estruturas básicas: monte púbico, grandes e pequenos lábios, óstio externo da uretra, óstio externo da vagina, clitóris e fúrcula vaginal. ● Próximo aos pequenos lábios, existem 4 glândulas vestibulares: ○ Duas glândulas de Skene (para-uretrais.) ○ Duas glândulas de Bartholin – quando seus ductos ficam obstruídos, pode acabar infeccionando e enchendo de pus, gerando a bartolinite (extremamente dolorosa). ● Na episiotomia, o corte mais utilizado é a média lateral direita (partindo da fúrcula) 3. MUSCULATURA DO ASSOALHO PÉLVICO ● Nesta região, os músculos relevantes que existem são: ○ Músculo bulboesponjoso. ○ Músculo bolsocavernoso (ou isquiocavernoso). ○ Músculo transverso superficial do períneo. ● Vale observar que esses músculos formam um triângulo, denominado canal de Alcock. ● Para realizar a anestesia locorregional do nervo pudendo interno direito, entra-se com a agulha nesta região: basta realizar o toque, posicional o polegar nesta região e entrar com a agulha. ● Com a mão no interior da vagina da paciente, será possível sentir a tuberosidade ciática e a agulha “raspando” no dedo. Então basta injetar o anestésico. ○ Lembrando que a episiotomia clássica é a médio lateral direita – logo, faremos o bloqueio do nervo pudendo interno do lado direito (mas, se quiser, pode fazer bloqueio de ambos os lados). ● Na episiotomia, seccionamos os músculos bulboesponjoso e o transverso superficial do períneo (além de tecido celular subcutâneo). ● Posteriormente, evidentemente suturaremos tudo em pontos separados, para evitar uma fibrose (o único local em que pode ser realizada uma sutura com pontos contínuos é na mucosa vaginal). ● Assim sendo, suturaremos: tecido celular subcutâneo, musculatura mucosa vaginal e, por último, pele. ● Existe ainda o centro tendíneo, que é o local onde ocorre a intersecção que quase todos os músculos da região, possuindo um importante papel de contenção e sustentação. ● Apesar de ser um local de contenção, também é o ponto de maior fragilidade do períneo, logo, se não nos atentarmos durante o parto, caso venha a lacerar, a laceração será nessa direção. ● Esta laceração pode acabar abrindo esfíncter externo do ânus e mucosa anal, sendo complexa a reconstrução e sutura. ● Por fim, vale ressaltar que existe o “aparelho de suspensão dos órgãos pélvicos”, composto por dois diafragmas: ○ Diafragma pélvico – músculos levantador do ânus e isquiococcígeo. ○ Diafragma urogenital – músculos bulboesponjoso, bulbocavernoso e transverso superficial do períneo. 4. ÓRGÃOS GENITAIS INTERNOS ● É importante sabermos identificar facilmente a sínfise púbica (bordo superior, durante a palpação). ● Posteriormente à sínfise púbica, existe a uretra (e acima dela a bexiga). Posteriormente à uretra, temos o canal vaginal e posteriormente à bexiga, temos o útero. ● Na maioria das mulheres, o útero é antevertido, formando um ângulo vagina-útero de praticamente 90º. Esta informação é importante para quando formos realizar uma curetagem ou colocação de DIU, devido ao risco de perfuração nesta “curva”. ● Por este motivo, durante uma curetagem ou colocação de DIU, é importante pinçar a parte posterior do colo e tracionar para baixo, para tentar retificar o máximo possível este ângulo. ● Vale ressaltar que, para piorar, em algumas pacientes, o tecido conjuntivo entre o canal vaginal e o reto e ânus é finíssimo, acentuando os riscos de perfuração. Ovários: ● Estão localizados no cavo retrouterino, atrás do ligamento largo. ● Não é recoberto por peritônio, mas sim por um tecido conjuntivo denso (Albugínea) Tubas uterinas: ● Passando para as tubas uterinas, elas possuem 4 regiões: ○ Infundíbulo – onde se localizam as fímbrias. ■ Atualmente, sabe-se que um câncer de ovário muito comum é decorrente do destacamento de células das fímbrias. ○ Ampola – onde ocorre a fecundação. ○ Istmo. ○ Intramural – onde atravessa a parede uterina. ● Quando ocorre uma gravidez ectópica, geralmente se localiza na porção da ampola ou do istmo. ● Importância: local onde acontece a fecundação do óvulo e clivagem inicial do zigoto. ● Histologia: camada muscular lisa revestida por epitélio simples cilíndrico ciliado. ● Existem basicamente dois mecanismos para fazer o zigoto chegar no útero: movimentos peristálticos da musculatura lisa e movimento ciliar do epitélio cilíndrico ciliado. ○ Problemas de um destes dois mecanismos pode gerar a gravidez ectópica, cuja principal causa é uma infecção prévia na trompa (doença inflamatória pélvica), já que pode gerar perda de função de parte da trompa. Útero: ● O útero é formado 1/3 de colo e 2/3 de cavidade uterina. ● Ele possui 3 camadas: endométrio (mais interna), miométrio (músculo liso) e perimétrio (mais externa) ● O endométrio trata-se do revestimento mucoso do útero, sendo formado por epitélio cilíndrico simples, numerosas glândulas tubulares e estroma rico em tecido conjuntivo. ● Funcionalmente, pode ser dividido em: ○ Camada funcional: que descama durante a menstruação. ○ Camada basal: que permanece e regenera nova camada funcional. ● Ele também sofre alterações do estímulo hormonal: ○ Endométrio menstrual ○ Endométrio proliferativo ○ Endométrio secretor ● Já externamente (perimétrio), existe uma camada serosa de tecido conjuntivo e mesotélio. Colo uterino: ● O colo uterino possui poucas fibras musculares e grande quantidade de tecido conjuntivo. ● O endocérvice é formado por epitélio cilíndrico simples. Já o ectocérvice é formado por epitélio pavimentoso estratificado não queratinizado. ● Existe uma área de transição entre estes epitélios, denominada junção escamo-colunar (JEC). É desta região que se origina praticamente todos os cânceres de colo, pois é uma região que está em constante proliferação de células (pois sofre muita agressão). ○ O HPV, por exemplo, pode estimular a proliferação incorreta destas células. Vagina: ● Órgão tubular fibromuscular. ● Revestido por epitélio pavimentoso estratificado não queratinizado. ● Possui umavascularização considerável. ● A sua camada mais externa é composta por musculatura lisa. 5. VASCULARIZAÇÃO: ● A aorta se bifurca em ilíacas direita e esquerda. Cada ilíaca se bifurca em ilíaca interna e externa. ○ A aorta é retroperitoneal. Já as ilíacas são acessíveis. ● As ilíacas externas irrigam os membros inferiores, enquanto as ilíacas internas irrigam a região pélvica. ● A ilíaca interna desce próximo do ureter e se ramifica em 2 troncos, anterior e posterior: ○ Anterior (parietal): a. glútea, a. sacral lateral, pudenda interna. ○ Posterior (visceral): a. uterina, vaginal, retal média, vesical inferior, umbilical. ● Destas, o importante é saber a anatomia da ilíaca interna, do tronco posterior e da artéria uterina. ● Vale ressaltar que a artéria ovariana é ramo direto da aorta: sai da aorta bem mais superior, desce retroperitoneal, entra pelo infundíbulo pélvico e vai direto ao ovário. ○ Tomar muito cuidado para não seccionar a artéria uterina. ○ Evidentemente, para remover os ovários, é muito importante realizar uma boa ligadura das artérias ovarianas (preferencialmente ligadura dupla). ● Ou seja, da parte de G, o que deve-se prestar mais atenção (principalmente durante uma cirurgia) são as artérias uterinas e o infundíbulo pélvico (que tem as artérias e veias ovarianas). ○ Vale lembrar que, no caso das veias ovarianas, a veia ovariana direita drena diretamente para a veia cava (ou seja, simétrica a artéria ovariana), porém, a veia ovariana esquerda drena para a veia renal esquerda (e não diretamente para a cava). ● Ao entrar no útero, a artéria uterina fica extremamente dilatada e tortuosa, para melhorar o suprimento sanguíneo para o feto. ● Praticamente todo o suprimento sanguíneo do feto é proveniente das artérias uterinas direita e esquerda. Até existe uma anastomose entre a artéria ovariana e a uterina, mas a contribuição da artéria ovariana é muito pequena. ● Um dos locais mais complicados de se trabalhar é no espaço entre a bexiga e o útero, que costumam ficar aderidos e o ato de separá-los acaba gerando sangramentos que demandam bastante tempo para se realizar hemostasia. ● Durante uma histerectomia, chega o momento de se retirar o colo do útero (que é onde chega a artéria uterina), sendo necessário liga-la. ● O problema é que, embutido no paramétrio, além da artéria e veia uterina, passa também o ureter. ● Assim sendo, é necessário clampear o ligamento cardinal (ou paramétrio) e seccionar a artéria e veia uterina e deixar o ureter intacto (ele passa a cerca de 1 cm do útero). ● Claro que, se for uma histerectomia subtotal (na qual o colo do útero não é removido), fica mais fácil, já que manteremos a inserção da artéria uterina no colo. ○ Mas claro que não é sempre que conseguimos manter o colo, principalmente em cirurgias para neoplasias (que geralmente não deixamos nada - histerectomia total). 6. OSSOS (BACIA): ● Uma das coisas mais complexas e importantes da obstetrícia é conhecer tridimensionalmente a bacia. ● Didaticamente, dividimos a bacia óssea em estreito superior, médio e inferior. ● Estreito superior (estreito de maior interesse) – Limites: ○ Anterior: sínfise púbica. ○ Posterior: promontório. ○ Lateral: eminência ileopectínea e linha arqueada. (-) ● O estreito médio se encontra entre as espinhas ciáticas. ○ Diâmetro anteroposterior (AP) 12 cm ○ Diâmetro transverso (T) 10,5 cm. ● Já o estreito inferior se encontra entre a borda inferior da sínfise púbica e o cóccix. ○ Diâmetro anteroposterior (AP) 9,5cm. ○ Diâmetro transverso (T) 11cm. ● Note que, no estreito superior, o diâmetro transverso é maior que o diâmetro ântero-posterior. No estreito médio, o diâmetro anteroposterior é maior que o transverso. Já no estreito inferior, o diâmetro transverso é maior que o diâmetro anteroposterior. ● É exatamente por este motivo que o bebê tem que rodar a cabeça para sair por parto normal – rotação interna. Diâmetros ântero posteriores: entre o promontório e a parte anterior da bacia, temos 3 conjugadas: ● 1. Conjugata anatômica – promontossuprapubiano - 11,0cm – entre o promontório e a borda superior da sínfise púbica (suprapúbis). ● 2. Conjugata vera (ou obstétrica) – promontoretropubiano - 10,5cm – entre o promontório e o tubérculo retropubiano (retropúbis). ● 3. Conjugata diagonalis – promontosubpubiano - 12,0cm – entre o promontório e a superfície inferior do púbis (ou subpúbis). ● Quando tocamos a paciente, vamos tentar atingir o promontório. Ao atingirmos o promontório, basta medirmos em cm e teremos o valor da conjugada diagonalis. ○ A conjugada diagonalis é a única que conseguimos medir clinicamente (através do toque). ● Além disso, se retirarmos 1,5 cm da conjugada diagonalis, temos a conjugada vera (ou obstétrica), que é a menor medida por onde o bebê tem que passar. ● A medida da conjugada vera é importante pois é um dos 3 parâmetros que o obstetra se utiliza para saber se a bacia é ou não boa para o parto. ● Parâmetros analisados para saber se a bacia é boa para o parto: ○ Ângulo subpúbico – o ideal é que tenha mais que 90º. ○ Espinhas ciáticas – o ideal é que sejam planas. ○ Promontório – o ideal é que seja o mais profundo possível (preferencialmente inatingível). ● Vale ressaltar que o estreito superior coincide com a conjugada anatômica. ● Outra consideração a ser feita é que o único estreito que é ampliável (em 1,5 cm) é o estreito inferior, devido ao possível movimento de retrovulsão do cóccix. Tipos de bacia óssea: Uma das doenças que automaticamente já nos faz pensar que a bacia da paciente é viciada é a poliomielite (incomum atualmente) e acondroplasia (tipo de nanismo). Toque: ● Através do toque, o obstetra consegue avaliar se as espinhas ciáticas são planas ou proeminentes, bem como a distância entre elas. ● Também é possível realizar o toque do cóccix, porém praticamente não é utilizado atualmente. ● Para realizar a medida da conjugada diagonalis, basta tocar o promontório com uma mão e marcar com a outra onde está a sínfise púbica. Teremos então a medida da conjugada diagonalis (foto abaixo). ● Retirando 1,5 cm, teremos então a medida da conjugada vera (ou obstétrica). 7. Inervação: ● A inervação do útero, dos ovários e do terço superior da vagina (principalmente), tem um trajeto que passa por S2, S3 e S4 (região sacral). ● Isso dificulta muito em algumas situações o diagnóstico em caso de queixa de dor, pois a mulher pode chegar referindo dor nas costas, na região sacral ou na região da bacia, sendo que a dor na verdade está sendo originada por um mioma ou um cisto de ovário, por exemplo. ● Ou seja, uma dor de origem pélvica ou abdominal pode gerar queixa de dor em outro local (como costas, por exemplo). ○ Outro exemplo: algumas mulheres com cólica menstrual têm queixa de dor na região sacral. ● Assim sendo, havendo queixas de dor na coluna (e principalmente na região sacral), devemos ao menos lembrar da possibilidade dessa dor ter origem no sistema reprodutor feminino. ● Por fim, vale ressaltar que o sistema nervoso parassimpático inerva os órgãos partindo de S2, S3 e S4, enquanto o sistema nervoso simpático inerva os vasos ilíacos e seus ramos, partindo de T10, T11, T12.
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