Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Direito Constitucional PODER CONSTITUINTE NOÇÕES GERAIS É o poder que cria a norma constitucional (estrutura do Estado, Divisão dos Poderes e outros), tornando-a exigível. Em regra, ele se manifesta em momentos de crise (não necessariamente violenta), quando há o rompimento da Ordem Constitucional e se instaura uma Nova Ordem Constitucional (crises jurídica, econômica, social e política). Ele é que legitima o poder do Estado. Inicialmente, pensava-se que a nação era a titular do Poder Constituinte, mas, depois, evolui-se para considerar o povo como o seu legítimo titular. TEORIA DO PODER CONSTITUINTE A Teoria do Poder Constituinte é algo distinto do Poder Constituinte. Ela veio explicar o surgimento do Poder Constituinte. O marco foi a Teoria de Sieyès, com a obra O que é o Terceiro Estado? (A Constituinte Burguesa). Para ele a manifestação deve ser feita pelos representantes do povo, dentro do exercício da soberania popular. Seria a materialização do Poder, a partir do conceito de representatividade. Ele distinguiu: a) Poder Constituinte (poder de elaborar a estrutura do Estado e dividir os Poderes); b) Poder Constituído (poderes reconhecidos pela Constituição – Legislativo, Executivo e Judiciário). Curiosidade histórica: desde o primórdio da organização das sociedades humanas, já há algo cunhado como Constituição, sendo identificado o poder constituinte. A existência do poder constituinte não coincide com o marco histórico de seu surgimento. A Revolução Francesa (1789) é o marco do surgimento do poder constituinte, com a obra de SIEYÈS. Nessa obra, pela primeira vez, alguém racionalmente tratou do poder constituinte. No século XVIII, a França vivia uma enorme crise política, econômica, social e orçamentária. Foram convocados os Estados-Gerais, que se apresentavam como a assembleia consultiva do Rei. Eles foram criados por Felipe IV (em 1303) e eram formados por três classes que compunham a sociedade burguesa: • O primeiro Estado (clero). • O segundo Estado (nobreza). • O terceiro Estado (comuns, posteriormente, chamados de burguesia). Os Estados tinham a seguinte forma de deliberação: cada Estado tinha um voto. Ocorre que, em todas as questões, a nobreza e o clero votavam unidos, e a burguesia (que pagava a conta) sempre perdia. Assim, quando Luís XVI convoca os Estados-Gerais, surge a proposta de que a representação em cada Estado seja proporcional à quantidade de franceses que representavam. Dessa forma, ao terceiro estado caberia a maior representatividade. Depois, propõe-se ainda que o voto fosse por cabeça e não por Estado, assim, cada integrante teria um voto, e não o Estado todo somente um voto exclusivo. O objetivo era acabar com os privilégios tributários da nobreza e do clero. Para justificar essa mudança, afirmava-se que o Estado está submetido a certas regras, entretanto, a nação tem o poder de modificar essas normas, por meio do seu Poder Constituinte, por meio de seus Poderes Constituídos (Executivo, Legislativo e Judiciário). As leis constitucionais não podem ser independentes da vontade da nação. Quem pode mudar a Constituição não é a própria Assembleia (Estados-Gerais, no caso), mas a Constituinte. Por óbvio, os Estados-Gerais não aceitaram a votação por cabeça. Com isso, eclodiu a rebelião da assembleia do terceiro Estado que se autoproclamou em Poder Constituinte. Todavia, o rei não aceitou a rebeldia, e eles afirmam que quem mandava era povo, surgindo aí a concepção moderna da Teoria do Poder Constituinte. NATUREZA DO PODER CONSTITUINTE A natureza do Poder Constituinte é jurídica ou extrajurídica? Para os JUSPOSITIVAS Direito Constitucional (Kelsen), o Poder Constituinte: a) inaugura toda a normatização jurídica; b) ele é um fato, não deriva de outro direito superior; c) é o poder político que antecede à norma; d) é a posição adotada no Brasil. Para os JUSNATURALISTAS (Tomás de Aquino): a) o fundamento de validade do Poder Constituinte estaria no direito natural; b) logo, ele estaria hierarquicamente abaixo do direito natural; c) assim, sua natureza seria extrajurídica. TITULARIDADE DO PODER CONSTITUINTE De início, Sieyès defendia que seria a nação (que é a identidade de língua, cultura e raça). Depois, passou a defender que seria o POVO (parte da nação que habita determinado território – mesma nacionalidade). Como não há possibilidade de reunir o povo no mesmo lugar para decidir sobre as normas constitucionais, é preciso que o poder seja exercido por meio de representantes do povo. Democracia direta X democracia indireta. PREÂMBULO Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituirum Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos deuma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida,na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Art. 1º [...] Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição. PODER CONSTITUINTE ORIGINÁRIO NOÇÕES GERAIS É aquele que cria uma Nova Ordem Constitucional, via nova Constituição. Tem a natureza jurídica política (pré-jurídico). A sua manifestação ocorre em um momento de ruptura da sociedade, quando uma nova ordem constitucional precisa ser escrita. Essa ruptura pode ser: a) revolução, que pressupõe o uso da força (a qual se legitima pelas injustiças da ordem anterior) visando à tomada do Poder por quem não está no Poder; b) golpe de Estado é a tomada de Poder por quem já está em exercício de uma parcela de Poder; c) transição constitucional quando: 1. uma Colônia tem a sua independência preparada pelo colonizador (Grã-Bretanha fez a CF do Canadá, África do Sul e Austrália); 2. há a ruptura social com a ordem anterior (transição por amadurecimento político-social, como ocorreu no Brasil). O procedimento constituinte é imposto pela própria Assembleia Constituinte, mas, se na hora de julgar não obedecer a alguns procedimentos, não faz diferença, pois não está obrigada a uma ordem superior. A violação aos procedimentos não é jurídica, assim, a sua autolimitação pode ser revista a qualquer momento. PARTICULARIDADES RELEVANTES DO PODER CONSTITUINTE DA CF/1988 Críticas ao Poder Constituinte da CF/1988: a) Foi convocado por uma Emenda Constitucional, o que impediria reconhecer como sendo uma ruptura com a ordem anterior; Direito Constitucional b) Seria produto de um Congresso Constituinte (após o encerramento dos trabalhos voltou a legislar infraconstitucionalmente), e não de uma Assembleia Nacional Constituinte (eleita especialmente para editar a nova Carta Política). Contrapontos: a) Não importa a forma pela qual a Assembleia se reuniu, o que interessa é que ela não sofreu limitação pela ordem constitucional anterior; b) No momento da eleição dos congressistas, já sabiam que teriam a missão de elaborar a nova CF. CARACTERÍSTICAS DO PODER CONSTITUINTE ORIGINÁRIO: Seguindo a corrente juspositivista, o Poder Constituinte Originário é: a) Inicial (desencadeia toda a nova normatividade jurídica); b) Autônomo (não existe nenhum poder de fato e nem direito acima dele); c) Incondicionado (não se sujeita a nenhuma condição ou termo); d) Ilimitado (não precisa respeitar nenhum limite jurídico imposto pela ordem constitucional anterior). Por ser ilimitado, o Poder Constituinte Originário não precisa respeitar ato jurídico perfeito, coisa julgada ou direito adquirido estabelecidos na ordem constitucional anterior. Mas, para relativizarou desconstituir os institutos do ato jurídico perfeito, a coisa julgada e o direito adquirido, a nova Constituição deve ser expressa. Em nome da segurança jurídica, a nova Constituição deve assegurar dois fenômenos: a) a recepção de toda a legislação que não a contrarie materialmente (questões formais são irrelevantes); b) a recepção de todo ato jurídico perfeito, coisa julgada ou direito adquirido que não a contrarie. Embora não haja limites jurídicos, a Assembleia Nacional Constituinte tem limites metajurídicos (sociologia, história, cultura etc.). A positivação da Constituição pode ser por: a) Outorga (ato de força do poder totalitário); b) Promulgação (último ato da Assembleia Constituinte); c) Referendo (aprovação posterior pelo povo). A Constituição promulgada é mais legítima que a Constituição que foi outorgada. Será mais legítima, quanto mais atender aos procedimentos da Assembleia Constituinte. Legitimidade é diferente de legalidade. O ato revolucionário é ILEGAL (por sua natureza), mas NÃO é ilegítimo. LEGAL E ILEGÍTIMO (poder conquistado segundo as regras vigentes, mas desvirtuado por aquele que o exerce) X ILEGAL E LEGÍTIMO (movimentos revolucionários que traduzam os anseios populares). A participação do povo legitima a Constituição, quanto maior a participação, maior a legitimidade. A Constituição pode começar legítima e depois deixar de ser, quando passe a ser instrumento de exercício de poder da classe dominante (e pode ocorrer o contrário também). PODER CONSTITUINTE DERIVADO OU SECUNDÁRIO: CF/1988 Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: I – de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal; II – do Presidente da República; III – de mais da metade das Assembleias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros. § 1º A Constituição não poderá ser emendada na vigência de intervenção federal, de estado de defesa ou de estado de sítio. § 2º A proposta será discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros. § 3º A emenda à Constituição será promulgada pelas Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, com o respectivo número de ordem. § 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I – a forma federativa de Estado; II – o voto direto, secreto, universal e periódico; III – a separação dos Poderes; Direito Constitucional IV – os direitos e garantias individuais. § 5º A matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa. A emenda serve como garantia de maior durabilidade de uma CF (possibilidade de atualização evita a necessidade de ruptura). Princípio da imutabilidade relativa (não são eternas, mas, por outro lado, não podem ser modificadas de forma contumaz). As alterações podem ser: a) Formais: via emenda (revisão pontual), revisão (revisão total) e tratados equivalentes à emenda (EC/45); b) Informais: via interpretação evolutiva, jurisprudência, doutrina e aplicação de conceitos jurídicos indeterminados (modificam a CF sem alterar o seu texto); (ex. compreensão do conceito de família) Essas alterações informais são chamadas de mutação constitucional ou “Poder Constituinte Difuso”. O Poder Constituinte DERIVADO tem como características o fato de ser: a) Derivado (decorre do Poder Constituinte Originário e da Constituição); b) Subordinado (está hierarquicamente em plano inferior ao Poder Constituinte Originário); c) Condicionado ou Limitado (além das limitações metajurídicas, também precisa respeitar as limitações jurídicas impostas no texto constitucional). São espécies do Poder Constituinte DERIVADO: a) Reformador ou de Revisão (altera a própria Constituição); revisão foi estabelecido de forma temporal, 5 anos da promulgação 1993 deixou de existir poder revisor b) Decorrente (estabelece uma nova Constituição em um segundo nível – Estadual). ADCT Art. 11. Cada Assembleia Legislativa, com poderes constituintes, elaborará a Constituição do Estado, no prazo de um ano, contado da promulgação da Constituição Federal, obedecidos os princípios desta. Parágrafo único. Promulgada a Constituição do Estado, caberá à Câmara Municipal, no prazo de seis meses, votar a Lei Orgânica respectiva, em dois turnos de discussão e votação, respeitado o disposto na Constituição Federal e na Constituição Estadual. **lei orgânica municipal – é uma espécie de poder decorrente? Divergência doutrinária. As normas derivadas do poder decorrente podem ser normas próprias (são as imaginadas e discutidas pelo Poder Decorrente dentro de sua competência) ou normas repetidas (há correspondente na Constituição Federal). As normas repetidas dividem-se em: a) Normas de repetição obrigatória (integram o ordenamento jurídico dos Estados-membros independente de repetição dessas normas na Constituição dos Estados-membros, cabendo ao Poder Constituinte Decorrente apenas complementar a obra do Constituinte Federal); b) Normas de repetição facultativa (o legislador estadual ou municipal pode repetir ou não, mas, se repetir deve obedecer à simetria – ex.: estabelecimento de medida provisória). A distinção entre norma de repetição obrigatória e facultativa desperta interesse em sede de controle de constitucionalidade de leis estaduais. Se a norma impugnada em sede de ADI Estadual for de repetição obrigatória há a possibilidade de interposição de recurso extraordinário para o STF. Seria uma espécie de transformação de controle concreto para abstrato, que é a regra em sede de ADI (à exceção de ADI interventiva, onde se constata um controle concentrado e concreto). LIMITES DO PODER CONSTITUINTE REFORMADOR (ART. 60 DA CF/1988): a) Temporal (a CF/1988 não estipulou prazo, como existia na CF do Império); b) Circunstancial (estado de defesa, estado de sítio e intervenção federal – Sistema Constitucional de Crises – § 1º); c) Material: 1. Expressos (cláusulas de intangibilidade ou cláusulas pétreas – § 4º); 2. Implícitos (decorrem do próprio sistema de proteção – tentativa de redução das cláusulas pétreas, mudança da titularidade do Poder Constituinte, impedir ou alterar o processo de emenda etc.); Direito Constitucional d) Formal (apresentação da proposta, quóruns, votações etc.); Desrespeito aos limites pode ensejar o excepcional controle preventivo de constitucionalidade via MS (impetrado por parlamentar perante o STF). O voto obrigatório não constitui cláusula pétrea (logo, pode ser abandonado por emenda). Existem cláusulas pétreas fora do art. 5º da CF/1988 (caso da anterioridade do IPMF). Os DIREITOS FUNDAMENTAIS são cláusulas pétreas, sejam individuais, coletivos, difusos ou sociais. Prevalece o entendimento de que hoje não seria possível impor uma nova revisão como a de 1993 (quórum e regras diferenciadas de votação). Também é forte a corrente que defende o entendimento de que, por força do resultado do plebiscito, em tese, teríamos uma limitação implícita impedindo a mudança da forma de Estado (República) e sistema de governo (Presidencialismo). FENÔMENO DO DIREITO CONSTITUCIONAL INTERTEMPORAL: RECEPÇÃO: Utopicamente, o ideal era que todo o ordenamento jurídico fosse refeito, mas, pragmaticamente, isso NÃO é possível. A nova Constituição recebe a legislação inferior, que não lhe é materialmente ofensiva (matéria). Do ponto de vista formal, não há que se indagar se a lei anterior é ou não conforme a nova Constituição (procedimento legislativo). Em termos formais, importa confrontar o procedimento com as regras constitucionais vigentes na época da sua edição (a CF/1988 não admitiu os decretos-lei, mas, eles foram recepcionados,desde que materialmente compatíveis). A legislação anterior incompatível é tida como NÃO RECEPCIONADA (para muitos, REVOGADA). Lembrando que a lei anterior não pode ser objeto de ADIN (apenas de ADPF, desde que o confronto seja com a CF/1988 – se for com CF anterior, apenas resta o controle difuso). REPRESTINAÇÃO: Espécie de “renascimento” de lei revogada. Só é válida quando expressa. Repristinação Imprópria ocorre quando há a declaração de inconstitucionalidade da lei revogadora – volta a vigorar a lei anterior. DESCONSTITUCIONALIZAÇÃO: Norma constitucional anterior sendo rebaixada para norma infraconstitucional. Como regra, não é aceito no Brasil.
Compartilhar