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Bioenergia Fotossíntese Um esquema simplificado do processo de fotossíntese em vegetais é mostrado na Figura 1. Figura 1. Esquema simplificado do processo de fotossíntese. A produção de biomassa, como resultado da reação de fotossíntese, depende essencialmente da energia solar e da presença de água e dióxido de carbono (CO2). Isto ocorre segundo complexos ciclos biológicos em que a água e o CO2 se combinam para a formação de uma molécula de glicose e seis moléculas de oxigênio: 26126 solarluz 22 O6OHCCO6OH6 ++ → (1) Nessa reação, em termos energéticos, a formação de 1 kg de açúcar corresponde à fixação de 17,6 MJ de energia solar, equivalente a aproximadamente 0,5 L de gasolina. Pelo balanço de massa dessa reação, tem‐se que a síntese de 1 kg de glicose consome 0,6 kg de água e 1,4 kg de CO2, liberando para a atmosfera 1 kg de oxigênio. Naturalmente, essa água representa apenas a parcela utilizada na composição do açúcar, pois durante o crescimento e, especialmente, durante a fotossíntese, quando ocorre a evapotranspiração, o vegetal necessita de água em volumes centenas de vezes acima da quantidade fixada no produto vegetal. Assim, a condição fundamental para a produção de biomassa e, conseqüentemente, de bioenergia é a disponibilidade de radiação solar, de água e de CO2. Entre os fatores básicos para a produção vegetal, o CO2 é o menos problemático, pois se encontra bem distribuído na atmosfera, em concentrações suficientes para as plantas. No entanto, é relevante observar que sua concentração tem mostrado, nas últimas décadas, um preocupante crescimento, principalmente associado ao uso intensivo de combustíveis fósseis, capaz de promover o incremento do efeito estufa na atmosfera terrestre e o conseqüente aquecimento global. Nesse sentido, os biocombustíveis apresentam duas importantes vantagens: seu uso permite reduzir a emissão de carbono para a atmosfera e, além disso, a produção de biomassa é potencialmente favorecida, dentro de limites e para algumas espécies, pela crescente disponibilidade de dióxido de carbono na atmosfera. Com relação à radiação solar, é de interesse conhecer a fração que é utilizada pelas plantas e como esta está disponível no planeta. A fotossíntese se realiza com absorção de luz pela clorofila em faixas específicas do espectro solar, especialmente para os comprimentos de onda entre 400 e 700 nm, região da cor vermelha. Em fisiologia vegetal, essa faixa é chamada de radiação fotossinteticamente ativa e corresponde, aproximadamente, a 50% do total da radiação solar. Com relação à disponibilidade da radiação solar, o fator primordial é a latitude, que faz com que as regiões tropicais recebam mais energia solar comparativamente às situadas em latitudes mais altas. De acordo com o Atlas Solarimétrico Brasileiro (Figura 2), uma área de um metro quadrado, situada entre 10° e 15° de latitude sul, na Região Norte do Brasil, recebe, em média, 18,0 MJ/dia, enquanto, para uma latitude entre 20° e 25°, na Região Sul, essa mesma área recebe 16,6 MJ/dia, cerca de 8% menos energia. Figura 2. Mapa da média anual da radiação solar global diária no Brasil (MJ/m2.dia). Também associada à latitude, a temperatura ambiente é outro fator que influi diretamente na fotossíntese. Dentro de limites, maiores temperaturas favorecem a produção bioenergética, reforçando a vantagem das regiões mais quentes do planeta nesse sentido. A água constitui o fator de maior relevância dentre os essenciais para a fotossíntese. De fato, é o grande limitante a considerar para a produção vegetal. Um dos grandes entraves para o desenvolvimento de muitas nações é a reduzida disponibilidade de recursos hídricos com adequada qualidade e a distribuição heterogênea destes sobre os continentes. Extensas áreas ensolaradas nas regiões semi‐áridas pouco podem contribuir como fonte de biomassa sem que sejam irrigadas com volumes significativos de água, implicando em custos elevados e, freqüentemente, em dispêndios energéticos que inviabilizam a produção bioenergética. Regiões tropicais, principalmente na América do Sul e na África, apresentam disponibilidade pluvial significativa que, somada a uma maior incidência de energia solar e às temperaturas mais adequadas quando comparadas às de outros continentes, os tornam regiões mais favoráveis à produção de bioenergia. Além dos fatores básicos (luz, água e dióxido de carbono), outros requisitos relevantes para a produção de bioenergia são a fertilidade do solo e a topografia. Como um dos parâmetros elementares em sistemas bioenergéticos, é de extrema relevância conhecer a eficiência dos cultivos nos processos de captação e armazenamento de energia solar. Ao se compreender como ocorrem as transformações e perdas de energia, torna‐se possível determinar as condições mais favoráveis para o desempenho das plantas como coletoras de energia. Entretanto, somente recentemente é que os mecanismos bioquímicos que permitem ao vegetal sintetizar açúcares e outros produtos químicos foram elucidados. Neste contexto, foram estabelecidas as rotas de fixação do carbono e suas diferentes fases, que se desenvolvem segundo seqüências complexas de reações sucessivas, denominadas ciclos fotossintéticos. Tal conhecimento subsidia a compreensão do comportamento das plantas no que concerne à captação e uso de energia e, desta forma, permite que o homem trabalhe nas condições e fatores que irão incrementar a produtividade das espécies com potencial bioenergético. Os ciclos fotossintéticos de maior relevância no processo fotossintético são o ciclo de Calvin, ou ciclo C3, e o ciclo Hatch‐Lack, ou ciclo C4, em que a molécula do primeiro produto estável produzido apresenta, respectivamente, três carbonos (ácido fosfoglicérico) ou quatro carbonos (produtos como oxaloacetato, malato e aspartato). A maioria dos vegetais conhecidos utiliza o ciclo C3. Entretanto, em algumas gramíneas tropicais, como cana‐de‐açúcar, cevada e sorgo, foi identificado o ciclo C4. Tal distinção é relevante para o desenvolvimento de sistemas bioenergéticos, em função da grande diferença de produtividade entre tais ciclos, em favor do ciclo C4. Este apresenta elevada taxa fotossintética de saturação (absorve mais energia solar), ausência de perdas por fotorrespiração, alta eficiência na utilização da água, maior tolerância salina e responde melhor sob menores concentrações de CO2. Portanto, pode‐se afirmar que os vegetais com ciclo C4 são os mais aptos à produção bioenergética. Na Tabela 1, são apresentados alguns dos parâmetros de relevância para os ciclos fotossintéticos C3 e C4, associados aos desempenhos destes para a produção bioenergética. Tabela 1. Parâmetros de desempenho vegetal para os ciclos fotossintéticos. Característica Espécies C3 Espécies C4 Razão de transpiração (kg água evaporada por kg sintetizado) 350 ‐ 1000 150 ‐ 300 Temperatura ótima para a fotossíntese 15 ‐ 25 25 ‐ 35 Local da fotossíntese Toda a folha Parte externa da folha Resposta à luz Saturada para radiações médias Não saturada sob radiações elevadas Produtividade anual média (t/ha) ~40 60 a 80 Aptidão climática De temperado a tropical Tropical Exemplos Arroz, trigo, soja, todas as frutíferas, oleaginosas e a maioria dos vegetais conhecidos Milho, cana‐de‐ açúcar, sorgo e outras gramíneas tropicais Da radiação solar incidente sobre a Terra, de 178 mil TW (ou bilhão de quilowatts), estima‐se que cerca de 180 TW, ou 0,1%, são utilizados nos processos fotossintéticos,naturais ou promovidos pelo homem. Desse modo, em todo o planeta, são produzidos, anualmente, cerca de 114 bilhões de toneladas de biomassa, em base seca, correspondendo a aproximadamente 1,97 bilhão de TJ (ou bilhão de quilojoules), equivalentes a 314 trilhões de barris de petróleo, cerca de dez mil vezes o atual consumo mundial desse combustível fóssil. Nesse contexto, a eficiência média de assimilação da energia solar é inferior a 1%, embora vegetais que apresentam maior desempenho, como a cana‐de‐açúcar, possam atingir 2,5% em média anual. Naturalmente, esses valores servem apenas como referência para a compreensão da magnitude energética da fotossíntese, não havendo sentido em imaginar a bioenergia como substituta de todas as formas fósseis de suprimento energético, principalmente nos países de elevada demanda. Esse crescimento vegetal ocorre, como visto, sobretudo em formações nativas das regiões tropicais, estimando‐se que as atividades agrícolas correspondem a cerca de 6% desse total. É interessante observar que, dependendo do vegetal, a energia solar é fixada em diferentes substâncias e órgãos de acumulação, que determinam as rotas tecnológicas passíveis de serem adotadas para sua conversão em biocombustíveis para uso final. Na cana‐de‐açúcar, por exemplo, as reservas energéticas se localizam principalmente nos colmos, como sacarose, celulose e lignina, sendo tradicionalmente empregadas na produção de bioetanol e bagaço. Por sua vez, nas árvores e outras espécies lenhosas, o conteúdo energético está essencialmente no fuste (tronco mais galhos), na forma de celulose e lignina, sendo empregado basicamente como lenha. As raízes e tubérculos de plantas como a mandioca e a beterraba acumulam amido e sacarose, enquanto os frutos e as sementes, como o dendê e o milho, acumulam geralmente amido, açúcar e óleos vegetais, de acordo com cada espécie. Além de definirem as rotas tecnológicas mais adequadas para conversão da biomassa em biocombustíveis, esses aspectos são relevantes para a eficiência global de captação e utilização de energia solar: para a síntese de carboidratos (como celulose e sacarose), o vegetal requer cerca de 60% menos energia do que para a síntese de gorduras ou lipídios, por unidade de massa de produto final, o que, em princípio, torna as rotas associadas ao biodiesel comparativamente menos eficientes do que as rotas do bioetanol, com base na sacarose ou na celulose.
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