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DISTÚRBIOS ELETROLÍTICOS INTRODUÇÃO A eletrofisiologia cardíaca depende dos fluxos iônicos para dentro e para fora dos miócitos. Os fatores que mais influenciam este fluxo de cátions e ânions através da membrana celular são: as concentrações intra e extracelular do íon, o potencial transmembrana e a permeabilidade da membrana celular àquele íon específico. Mudanças nas concentrações de potássio e cálcio, causam esses distúrbios Tipos de alterações eletrocardiográficas: · Hipercalemia · Hipocalemia · Hipercalcemia · Hipocalcemia. DISTÚRBIOS DO POTÁSSIO Apenas 2% do potássio corporal está presente no meio extracelular, fazendo dele o principal íon do meio intracelular. Assim, seu valor sérico normal é de apenas 3,5 a 5,5 mEq/L · HiperKalemia · HipoKalemia Função do potássio: (1) repolarização de todas as células cardíacas por conta da abertura de canais que permitem o seu efluxo (saída) para o meio extracelular; (2) manutenção do potencial de repouso das células de resposta rápida HIPERKALEMIA Na hiperKalemia, essa diferença de concentração é atenuada (o meio extracelular aumenta sua concentração de potássio), de modo que, o "novo equilíbrio elétrico" consegue ser alcançado com uma menor saída de potássio, implicando em um novo potencial de repouso menos negativo (menos negativo que -90 mv). Essa alteração muda o comportamento: 1- Repolarização encurtada: fica mais fácil o potencial de ação voltar ao seu novo potencial de repouso após a despolarização, já que esse novo potencial é menos negativo · A onda T dura menos tempo – onda T mais alta e apiculada (formato de tenda) · Intervalo QT também é encurtado 2- Alteração da despolarização: quanto mais próximo de 0 estiver o potencial de repouso, menos canais de sódio estão disponíveis para desencadear uma nova despolarização, o que torna as ativações atriais e ventriculares mais lentas, bem como a propagação desses estímulos pelo tecido elétrico do coração. · Potencial menos negativo acarreta um alargamento do complexo QRS · Achatamento da onda P Considerando-se o traçado eletrocardiográfico, podemos dizer que as alterações relacionadas à hiperpotassemia geralmente progridem da direita para esquerda (onda T → complexo QRS → onda P) à medida que os níveis de potássio aumentam Hipercalemia Leve (5,5 – 7,0 mEq/L) A onda T é o primeiro componente a sofrer com a hipercalemia, já podendo se observar alguma manifestação a partir de um potássio sérico de 5,5 mEq/L e mais estreita, apesar de aumentar em amplitude: este padrão é conhecido com onda T em tenda e justifica também um encurtamento do intervalo QT Essa onda T alta e apiculada pode nos fazer lembrar do que? Lembra a isquemia Hipercalemia Moderada (7,0 – 9,0 mEq/L) Quando os níveis de potássio passam de 7,0 já começa uma lentificação da fase 0, levando a um alargamento do complexo QRS e da onda P Com valores acima de 8 mEq/L, a onda P some completamente, por causa de um comprometimento avançado da condução intra-atrial, Hipercalemia Grave (> 9,0 MEq/L) É possível observar alterações do segmento ST, principalmente o supradesnivelamento Pode ser confundido com um infarto ou pericardite. Reversão com dialise O achado mais grave: é a fusão do complexo QRS com a onda T, não havendo um segmento QT identificável – conhecido como “onda em sino” A parada cardíaca ocorre com níveis maiores do que 12 mEq/L HIPOKALEMIA O meio extracelular reduziu sua concentração de potássio, maior saída de potássio, -implicando em um novo potencial de repouso mais negativo 1- A repolarização é mais lenta: com o novo potencial de repouso mais negativo, é mais difícil para a célula retornar ao seu patamar, gastando mais tempo. · A onda T é mais larga e de menor amplitude · Intervalo QT é mais largo, o que predispõem a Torsades Pointes 2- Alteração da despolarização: quanto mais afastado de 0 estiver o potencial de repouso, mais canais de sódios disponíveis para desencadear uma nova despolarização, o que passa a acontecer com mais intensidade · Tornando as ativações atriais e ventriculares mais rápidas · Aumento da amplitude da onda P HipoKalemica abaixo de 2.8 -3 mEq/L. O sinal mais precoce: · Redução da amplitude · Aumento da duração da onda T – ganha aspecto mais achatados · Achado mais TÍPICO: AUMENTO DA ONDA U – ocorrendo pela repolarização tardia das fibras de Purkinje RESUMINDO: Macete dos Distúrbios do Potássio A onda T acompanha os níveis do potássio: se o potássio estiver alto, as ondas T tornam-se altas e apiculadas; se o potássio cair, as ondas T ficam achatadas e podem, inclusive, desaparecer! O contrário acontece com as ondas P... TRATAMENTO DA HiperKalemia Gluconato de cálcio antes de reduzir o nível sérico de potássio Medidas que reduzem a Kalemia de forma transitória: ● Glicoinsulinoterapia (10 unidades de insulina + 25 -50 g de glicose em 20 minu\tos); ● Bicarbonato de sódio (50 ml da solução a 8,4% – correr em 20 minutos), que não deve ser utilizado rotineiramente, exceto em caso de acidose metabólica associada e, mesmo assim, se realmente necessário; ● Beta-2-agonista inalatório (nebulizar com 10 gotas de fenoterol ou salbutamol), que constitui uma estratégia pouco utilizada nos dias atuais Redução definitiva: ● Resina de troca (poliestirenossulfato de cálcio, conhecido como Sorcal® – 1 envelope 8 /8 h): promove a perda fecal do potássio ao trocá-lo pelo cálcio na mucosa colônica; ● - Furosemida: diurético que aumenta a excreção renal de potássio (01 cp 40 mg/dia, via oral); ● - Diálise (em casos refratários). Tratamento da HipoKalemia Aqui, não há muito mistério... A ideia é promover a reposição de potássio, que até pode ser feita por via oral ou enteral, mas, em situações com alterações no ECG, a via venosa é a indicada. ● Xarope de KCI a 6%: 1 medida VO 8 /8 h. ● Hipocalemia grave (K < 2,8): 2 ampolas de KCI 10% - 20 ml + 480 ml de solução salina hipotônica 0,45%, correr 250 ml/h. DISTÚRBIOS DO CÁLCIO O corpo apresenta enorme reserva de cálcio. 99% encontram-se nos ossos e 1% no sangue, deste 1% metade ainda está ligada a proteínas – especialmente a albumina, cujo nível sérico interfere na calcemia. É exatamente essa fração ionizada que é rigidamente controlada pelo sistema endócrino pelo sistema endócrino: a secreção de Paratormônio (PTH) pode elevar a calcemia por seus efeitos em ossos, rins e intestino, uma vez que intensifica a reabsorção óssea, aumenta a reabsorção tubular renal de cálcio e eleva a absorção intestinal de cálcio dependente de vitamina D. Valor normal total: 8,5 a 10,5 mg/dl Forma ionizada: 4,5 a 5,5 mg/dl A influência do cálcio no potencial de ação 1- Nas células de resposta rápida, a entrada de cálcio tem grande participação na fase 2 do potencial de ação (platô ou repolarização lenta), que é o momento de inscrição do segmento ST. Vale lembrar que estre trecho no eletrocardiograma corresponde principalmente à fase de platô do potencial de ação das células do feixe de His, das fibras de Purkinje e dos miócitos ventriculares. Será exatamente no segmento ST (e, por consequência, no intervalo QT) que perceberemos adiante as mais significativas consequências das alterações calcêmicas! 2- Já nas células de resposta lenta (células automáticas), o influxo de cálcio participa das fases 0 (despolarização lenta) e 4 (repouso) * Além disso, vale lembrar que o cálcio é o grande responsável pelo processo de acoplamento entre a excitação e a contração dos miócitos cardíacos. HiperCalcemia Achados no eletro: · intervalo QT curto · Encurtamento do segmento ST Portanto, o encurtamento do intervalo QT às custas de uma redução do segmento ST é a alteração eletrocardiográfica mais característica da hipercalcemia. Em alguns casos, o segmento ST pode tornar-se tão curto que o QRS surge demasiadamente aproximado da onda T... Neste momento, podem surgir outras duas alterações: (1) supradesnível do segmento ST (isso simula um infarto, como veremos no capítulo"Isquemia I"); (2) onda J de Osborn (onda J proeminente após o QRS – apresenta-se como um entalhe na parte descendente da onda R), que muitos autores equivocadamente consideram como patognomônica de hipotermia Outros achados mais raros incluem: prolongamento do intervalo PR, alargamento do QRS e da onda T, aumento da amplitude da onda U e, em casos de hipercalcemia severa, bradicardias. ACHADOS NO ELETRO Encurtamento do intervalo QT (por redução do segmento ST) – muitas vezes o segmento ST está ausente · Supra de ST · Onda J de Osborn Tratamento HiperCalcemia 1. Hidratação venosa com solução salina: infusão de 200-300 ml/h, objetivando um débito urinário de 100-150 ml/h; 2. Calcitonina (4 U/kg IM ou SC 12/12 h): aumenta a excreção renal de cálcio e reduz a reabsorção óssea. Seu efeito tem uma duração limitada a cerca de 48h; 3. Bifosfonados (ácido zoledrônico 4 mg IV em 15 minutos ou pamidronato 60-90 mg IV em 2h): reduzem a reabsorção óssea e, em alguns casos, seu efeito perdura por duas semanas. * Alguns autores ainda defendem administração de furosemida após a hidratação venosa, mas, com o advento dessas drogas inibidoras da reabsorção óssea, tal medida não é mais considerada fundamental, devendo ser considerada apenas em casos de insuficiência renal ou cardíaca como estratégia para prevenir sobrecarga volêmica HipoCalcemia Ocorre o oposto a hiperCalcemia, ou seja: Prolongamento da Fase 2 (platô) das células de resposta rápida O prolongamento do intervalo QT às custas de um aumento do segmento ST é a alteração eletrocardiográfica mais característica da hipocalcemia. Como diferenciar o prolongamento do intervalo QT em situações de hipoKalemia e de hipoCalcemia? Basta procurar se estão presentes outras alterações clássicas da hipoKalemia, como redução da onda T e visualização da onda U, características, a princípio, ausentes na hipoCalcemia... TRATAMENTO HipoCalcemia Casos com alterações no ECG (QT longo) ou sintomáticos (tetania, espasmo carpopedal...) devem receber reposição de cálcio por via intravenosa. Recomenda-se gluconato de cálcio 1-2 g em 10-20 minutos (1-2 ampolas de 10 ml a 10%, geralmente adicionados a 50 ml de solução salina ou SG 5%). * É comum a concomitância com hipomagnesemia, de modo que, se esta estiver presente, deve ser corrigida inicialmente com 2g de sulfato de magnésio em 10-20 minutos (duas ampolas de 10ml a 10%)
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