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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS Faculdade de Direito Departamento de Direito Público Teoria da Constituição Professor Doutor Marcelo Andrade Cattoni de Oliveira Turma C Alunos: Daniel Antônio da Cunha Dayana Alves Guimarães Deline Fátima da Silva Edison Melo Neto Exercício de Revisão Unidades 1 e 2 Exercício de Revisão Unidade 1 1 – O que marca, desde o início, o enfoque específico da Teoria da Constituição, em face da Teoria Geral do Direito Público, das Instituições Políticas e da Teoria Geral do Estado? A Teoria da Constituição busca romper com uma abordagem unilateral, quer no sentido da Teoria Geral do Direto Público, que apresenta enfoque normativo, voltado à perspectiva interna ao próprio direito, aos princípios do Direito Público, sistematizando as normas e princípios gerais utilizados pelo Estado; quer no sentido das Instituições Políticas, com enfoque sociológico que analisa a institucionalização do poder político de modo externo, da perspectiva de um observador sociológico ou cientista político que descreveria a conformação das forças político-sociais pelo Direito Público; ou no sentido do enfoque político tradicional da Teoria do Estado, que apresenta o Estado como centro de integração social, sendo uma reflexão interna da realidade político-jurídica do Estado. [Prof. fala em enfoque normativo mais sociológico] Daniel diz> No meu caderno também está que o TGE tem um enfoque político em torno do Estado Portanto, a Teoria da Constituição encontra mais desafios do que os colocados no passado. Com o aumento da complexidade das sociedades, das relações entre o direito e a política, com o multiculturalismo e a globalização, não é mais possível compreender o Estado como a instância única de estabilização de uma identidade ética. A homogeneidade vista no Estado-Nação passou ao pluralismo social e cultural, o que obriga o Direito a fundar-se no princípio democrático em sua essência. Não há mais como recorrer à tradição republicana e compreender a sociedade em termos de um todo societário que giraria apenas em torno do Estado (povo, território e poder soberano) e não há mais como recorrer à tradição liberal e compreender a sociedade em termos meramente dualistas, Estado de um lado e sociedade civil de outro (reduzida à esfera do mercado e da família). A Teoria da Constituição, com seu enfoque crítico-reflexivo, busca problematizar as abordagens unilaterais das outras disciplinas, superando os enfoques oferecidos pelas elas, criticando as tradições e as formas que estas disciplinas têm de lidar com o fenômeno jurídico e, ademais, criticando a si mesma, seus próprios pressupostos, a fim de buscar um método adequado de estudar e compreender o fenômeno jurídico-constitucional inserido neste contexto social moderno. 1 2 – Em que sentido se afirma que a Teoria da Constituição é “chave interpretativa” do Direito Constitucional? Quais são, portanto, as dimensões atuais da Teoria da Constituição? A Teoria da Constituição funciona como sustentação teórica para o estudo do Direito Constitucional, favorecendo a compreensão do funcionamento e da dinâmica das estruturas constitucionais. Toda ciência humana envolve o conhecimento do próprio objeto da ciência, sendo afetado, informado e conformado pelo campo de estudo em que se integra. A dinâmica do Direito Constitucional pressupõe algumas visões do que seja a Constituição, paradigmas do que seja o papel do direito e do sentido deste no contexto social e histórico. O enfoque interpretativo é que possibilita compreender e construir o Direito Constitucional, sua ciência dogmático-jurídica, que pressupõe um conteúdo teórico proporcionado pela Teoria da Constituição a fim de lidar com a dinâmica e os conceitos do sistema jurídico. Nesse sentido, a Teoria da Constituição desempenha papel de suporte teórico do Direito Constitucional em 3 dimensões: (i) a Dogmática Geral do Direito Constitucional, em que se procura sistematizar conceitos e institutos próprios do campo de estudo do Direito Constitucional, assim como uma espécie de teoria da linguagem constitucional que se preocupa em mapear o uso desses conceitos e o significado que eles tiveram ao longo da prática; (ii) a Teoria das Justificações, em que se pressupõe uma concepção da legitimidade política das ordens jurídicas que apresenta como fundamento a autonomia, na qual uma ordem jurídica é legitima se os destinatários das normas se reconhecem e são reconhecidos como co-autores das normas que regem a sua conduta; (iii) e a Teoria Sócio-Política que é a relação entre os princípios normativos do constitucionalismo (a efetividade desses princípios) e a dinâmica dos processos constitucionais (realidade dos processos políticos e sociais), provando a legitimidade das ordens constitucionais. Assim, a Teoria da Constituição engloba o estudo dos conceitos, das justificações e das integrações no contexto social a fim de contribuir para o aperfeiçoamento, mobilização e construção das ordens constitucionais, funcionando, portanto, como “chave interpretativa” do Direito Constitucional. 3 – Como uma “teoria discursiva da constituição” trata a questão “normatividade/realidade”? Existe uma tensão entre o real e o ideal no fenômeno jurídico, em que as condições ideais aparecem dentro do mundo real, sendo um pressuposto para a própria realidade que exige a idealidade, interagindo-se constantemente. O ideal apresenta-se como aquilo que deveria ser, ou seja, a normatividade, normas válidas que devem ser respeitadas. Em contrapartida, o real apresenta a realidade fática, o que nem sempre corresponde ao ideal, visto que as normas apresentadas perante a sociedade não são respeitadas, pois os membros dessa sociedade não se sentem partícipes da sua construção. 2 Uma “teoria discursiva da constituição” será útil, pois preocupa-se em resgatar a função primordial do Direito moderno: a função de integração social. Assim, o esforço será para conciliar as normas positivadas à realidade social que se apresentam em tensão constante, garantindo legitimidade e, em última instância, a integração social, por meio de uma formação democrática da vontade coletiva. 4 - Quais críticas podem ser feitas à chamada “classificação ontológica das constituições”, proposta por Karl Loewenstein, do ponto de vista de uma teoria discursiva da constituição? A classificação ontológica das constituições proposta por Karl Loewenstein concentra-se refletir sobre as constituições de forma pragmática, analisando sua essência, conteúdo e concordância das normas constitucionais com a realidade do processo de poder, seguindo um enfoque interno. Segundo essa abordagem, as constituições podem ser (i) legítimas e (aprovadas por um processo legítimo) e eficazes (são cumpridas na prática), como as Constituições europeias; (ii) legítimas, mas não eficazes, como as Constituições das ex- colônias da África; (iii) e são eficazes, mas seu processo de aprovação não foi legítimo, como as aprovadas em regimes ditatoriais. Entretanto, essa classificação rígida é criticada pela teoria discursiva da constituição, pois uma Constituição legítima e plenamente eficaz é impossível de ser concebida, ou seja, permanece cega à tensão entre normatividade/realidade. O direito regula assuntos que são possíveis e necessários, algo que deve ser, mas que têm a possibilidade de serem descumpridos a qualquer momento pela sociedade constituída por seres plurais, possuindo, portanto, demandas de legitimidade diferentes. A classificação considerada pela Teoria da Constituição supera a visão estanque da de Loewenstein, pois reconhece o aumento da complexidade das sociedades, ampliando seu enfoque interno ao Direito de modo a complementá-lo por meio do diálogo com asteorias da sociedade e com as teorias políticas, a fim de que possa ultrapassar as abordagens tradicionais acerca da efetividade do Direito Constitucional. Assim, a Teoria da Constituição se tornaria uma teoria crítico-reflexiva da própria Constituição, possibilitando a real participação da sociedade na elaboração das normas constitucionais e conciliando as normas positivadas à realidade social. 3 Exercício de Revisão Unidade 2 5 – Caracterize a chamada “dupla validade do Direito moderno”. Quais são os problemas de legitimidade com que esse Direito se relaciona? [resposta Day] A dupla validade do direito moderno relaciona-se às noções de autonomia pública, em que é assegurada a participação da sociedade na produção das normas, por meio de deliberações, movimentos sociais, audiências públicas, e que por isso concorda com sua obediência, pois apresenta-se como expressão de sua própria liberdade; e autonomia privada que garante ao indivíduo o poder de escolher pela obediência da norma deliberada e imposta pelo Estado. A autonomia privada relaciona-se às leis de liberdade, enquanto que as leis de coerção relaciona-se à autonomia pública. Nesse cenário, depreende-se que democracia é tida como o respeito à autonomia privada e aos direitos fundamentais garantidos juridicamente e que a autonomia pública, representada pela soberania popular, é vivenciada por meio da utilização e garantia a esses direitos fundamentais. O grande problema de legitimidade encontrado por esse Direito é o consenso de todas essas liberdades individuais e dos grupos em leis de coerção que se apresentem como força dessa vontade geral e que possam ser obedecidas, pois são de acordo com a lei de liberdade de cada um dos membros dessa sociedade, de forma a garantir o respeito aos direitos fundamentais e o exercício da soberania popular. [resposta Edison] Procurando compreender como o direito moderno encontra-se estruturado segundo um sistema de normas positivas e obrigatórias que pretendem, ao mesmo tempo, ser legítimas, Habermas, ao reconstruir as premissas do direito racional moderno, chamou atenção para o “duplo aspecto da validade do direito” tal como se encontrava no conceito de legalidade de Kant, a saber, “normas do direito são, sob aspectos diferentes, ao mesmo tempo leis da coerção e leis da liberdade”. Ou seja, o direito deveria prestar contas tanto à positividade quanto à coerção legítima asseguradora da liberdade. A idéia central é a de que o direito positivo, mesmo sucedendo o direito natural, ainda tem a pretensão de ser racional na medida em que procura garantir a liberdade e apoiar-se, por sua vez, na legitimidade. E, neste caso, legitimidade significa um processo de criação das leis segundo uma formação democrática de vontades. Mas, para que a soberania política também seja garantida – para que os sujeitos se entendam não só como destinatários, mas também como autores das leis – é necessário aplicar o princípio do discurso. Daí ser necessária a quarta categoria de direito: direitos fundamentais à participação, em igualdade de chances, em processo de formação da opinião e da vontade, nos quais os civis exercitam sua autonomia política e através dos quais eles criam um direito legítimo. 4 A Teoria do Discurso de Habermas explica a legitimidade do direito com auxilio de processos e pressupostos de comunicação – que são institucionalizados juridicamente – os quais permitem levantar a suposição de que os processos de criação e de aplicação do direito levam a resultados racionais. Ora, para Habermas, a linguagem serve como garantia da democracia, uma vez que a própria democracia pressupõe a compreensão de interesses mútuos e o alcance de um consenso. Assim, o consenso social deriva da Ação Comunicativa. Segundo o texto1, “se normas coercitivas remontam a decisões modificáveis de um legislador político, essa circunstância liga-se à exigência de legitimação, segundo a qual, esse Direito escrito deve garantir eqüitativamente a autonomia de todos os sujeitos de direito”. E, segundo Habermas, o processo legislativo democrático deve ser suficiente para a atender a tal exigência, de legitimação. E, nesse sentido, cria-se uma relação interna entre Direito e democracia. Segundo o autor2, considera-se a validade jurídica de uma norma como “um equivalente da explicação para o fato de o Estado garantir ao mesmo tempo a efetiva imposição jurídica e a instituição legítima do direito”. Portanto, o grande problema de legitimidade com que esse Direito se relaciona refere-se aos mecanismos garantidores da chamada soberania política, que garanta a todos a participação, em igualdade de chances, no processo de formação do direito legítimo. Dupla validade do direito – o direito moderno nos permite agir de acordo com a lei, concordar com a lei pq veja nela a expressão da minha propria liberdade, pq participo da sua produção [Lei de liberdade]. Mas posso não concordar, e agir conforme o que ela dita, por medo da sanção [Lei de coação]. [as notas de rodapé vão permanecer?!] Daniel diz> tudo que foi escrito compreende o que o monitor citou na monitoria, porém, aconselho a colocar explícito no início da resposta que “a dupla validade do direito” diz respeito a como se legitima o direito; sendo por normas de coerção ( caso descumpra, sofrerá um sanção) e por normas de liberdade (através da lei será possível a realização da vontade geral). Sendo que os problemas desta dupla validade, consiste no fato de que o caráter mutável das leis atrapalha a legitimidade do direito. Já que não há mais direito natural, religião ou algo exterior para legitimar o direito coercitivo, o processo democrático constitucional é quem abrandará este problema de legitimidade. 6 – Em que sentido Direito e moralidade modernos se diferenciam e se relacionam? Por que não se pode reduzir a questão da legitimidade do Direito a uma justificação moral das normas jurídicas? 1 A relação interna entre estado de direito e democracia na teoria discursiva do direito de Jürgen Habermas 2 Marcelo Andrade Cattoni de Oliveira 5 [resposta Day] O direito moderno caracteriza um processo de alteração social que marca a passagem da pré-modernidade para a modernidade. O direito não mais se organiza sobre a base estamental em que os privilégios eram concebidos de acordo com o local do nascimento das pessoas, como ocorria no direito pré-moderno, mas os direitos são outorgados aos membros da sociedade independente do grupo social ao qual ela pertence. Há o surgimento do Estado Moderno e a ascensão da figura do monarca que tem em seu poder a centralização da produção normativa em um modelo racionalizado e marcado pela codificação. Esse direito moderno não possui um conteúdo determinado, e por isso, diferencia-se das outras instâncias normativas como a ética e moral. É uma instancia autônoma que dialoga com as outras instancias e preocupa-se predominantemente com a dimensão externa da ação, que trata, além das questões jurídicas, das questões éticas, pragmáticas e morais. A moralidade, por sua vez, cuida apenas de assuntos de foro íntimo, sendo o que importa o motivo da ação, o fim visado em si mesmo. Além disso, preocupa-se com a dimensão externa à ação, tendo assim, um conteúdo mais amplo do que o direito, mas que se restringe à análise do conteúdo moral. Entretanto, há uma relação de complementariedade entre o direito e a moral, em que um é influenciado pelo outro, visto que não dá para imaginar um direito amoral, pois teria sua característica de eficácia comprometida. Ademais, a moral é uma instancia que, ao lado do direito organiza a vida social, tendo seu grau de indeterminação reduzido, por meio das normas positivadas claramente determinando a forma de agir dos membros da sociedade. A questão da legimitimidadedas normas jurídicas não pode se reduzir a uma justificação moral, tendo em vista o caráter dialogal que o direito possui com outras instâncias além da moral, como a pragmática e a ética. Se se restringisse ao caráter moral, as normas jurídicas perderiam sua autonomia e correm o risco de virarem normas morais que possam não ser consideradas válidas, dependendo do contexto em que insiram, tendo em vista a complexidade de grupos e demandas existentes da sociedade. [resposta Edison] Direito e moralidade modernos se diferenciam no sentido de que os direitos subjetivos com os quais se constroem ordens jurídicas modernas têm o sentido de desobrigar os sujeitos de direito em relação a mandamentos morais, assim, o Direito moderno faz valer o princípio segundo o qual “tudo o que não está proibido está permitido”. Enquanto na Moral há uma simetria entre direitos e deveres, no Direito as obrigações resultam somente da restrição de liberdades subjetivas. Ademais, a abrangência de possibilidades do universo moral é praticamente ilimitada. 6 Por outro lado, Direito e Moral também se complementam. As questões jurídicas tangenciam não apenas questões morais, mas também éticas e pragmáticas. A pretensão de legitimidade das normas jurídicas apóia-se sobre vários tipos de razões, e depende de uma rede ramificada de discursos e negociações, e não somente de discursos morais. Assim, a Moral é um dos meios de legitimação do Direito. Portanto não se pode reduzir a questão da legitimidade do Direito a uma justificação apenas moral das normas jurídicas, uma vez que, como dito, a pretensão de legitimidade das normas jurídicas apóia-se sobre vários tipos de razões, e depende de uma rede ramificada de discursos e negociações, e não somente de discursos morais. Daniel diz> Moral lida com dimensão de foro íntimo ( interna do motivo, externa da ação). Já o direito lida com a dimensão externa. O direito se concentra em conteúdos organizacionais, como os conteúdos pragmáticos e também alguns conteúdos éticos. O direito reduz o indeterminismo da moral, complementando suas ações. A ação moral só existe se for uma ação autônoma. A moral lida somente com a autonomia moral. Já no direito a ação se divide em autonomia privada e autonomia pública, sendo elas co-primordiais e co-originais ( uma só existe se a outra existir). 7 – Disserte sobre os conceitos de “paradigma científico” (Thomas Kuhn) e de “paradigma jurídico” (Jürgen Habermas). Qual a importância desses conceitos para a Teoria Geral do Direito Público e para a Teoria da Constituição? [resposta Day] Para Thomas Kuhn, paradigma científico é o conjunto de pressupostos da prática científica utilizados em determinado contexto histórico pelos operadores para fazer as definições relacionadas à ciência em estudo. Para ele, o paradigma científico é mutável, se altera quando das mudanças no contexto histórico, das mudanças nos pontos de vista, não deixando de constituir-se verdades, mas apenas verdades diferentes, adequadas à época. A verdade, portanto, não é objetiva, pois depende dos pressupostos determinantes no momento histórico em estudo que condicionam a prática jurídica daquele momento respectivo. Habermas define o que seria paradigma jurídico, qual seja visão compartilhada pela sociedade do conjunto de pressupostos sobre o próprio direito, uma visão interna às práticas sociais que orientam a sociedade a fim de que o direito seja produzido para cumprir a tarefa de integração social. É ele que determina qual o papel que o direito deve desempenhar para regular, operar e lançar expectativas sobre o próprio direito. Esses conceitos são importantes para a Teoria Geral do Direito Público e para a Teoria da Constituição na medida em que ajudam a compreender a visão da ciência e a visão jurídica inserida em momentos históricos distintos e como essas visões contribuíram para a construção dos paradigmas atuais do Direito Público e do Direito Constitucional, levando- 7 se em consideração as mudanças ocorridas na sociedade advindas de sua complexidade crescente que exige adaptação dos paradigmas a serem apresentados e implementados pela sociedade de cada época. Criticar, construção de novos paradigmas, ser uma meta-teoria da constituiçao. (resposta do Monitor) Daniel diz> EU acho que o paradigma científico não condiciona a prática jurídica! O paradigma científico é diferente do paradigma jurídico justamente por condicionar somente a sua área de atuação ( ex: paradigma da física quântica para os físicos, paradigma da matemática tridimensional para os matemáticos). Já o paradigma jurídico é mais abrangente porque é a visão que toda a sociedade tem do direito ( nisto incluindo a opinião de todos) A função da Teoria da Constituição é criticar estes paradigmas. [resposta Edison] Segundo Thomas Kuhn, paradigmas científicos “são realizações científicas universalmente reconhecidas que, durante algum tempo, fornecem problemas e soluções modelares para uma comunidade de praticantes de uma ciência”. O paradigma constitui uma verdadeira ‘atividade modeladora’, anterior e não redutível inteiramente às componentes lógicas, ou seja, às várias leis, regras e teorias, que podem ser abstraídas e deduzidas delas. Segundo Jürgen Habermas, um paradigma jurídico explica, com a ajuda de um modelo da sociedade contemporânea, como devem ser entendidos e tratados os princípios do Estado de Direito e dos direitos fundamentais, para que possam cumprir, no dado contexto, as funções que normativamente lhes são atribuídas. Portanto, as compreensões jurídicas paradigmáticas de uma época, refletidas por ordens jurídicas concretas, referem-se a imagens implícitas que se tem da própria sociedade. Assim, um conhecimento de fundo da sociedade da época possibilita a realização e o estudo da referida comunidade jurídica. [Discutir!] 8 - Caracterize, em linhas gerais, o processo de modernização social do Direito, fazendo um contra-ponto entre as visões paradigmáticas do Direito pré-moderno e do Direito moderno. [resposta Day] O direito pré-moderno caracterizava-se por possuir uma base estamental, em uma os direitos, prerrogativas e privilégios concedidos aos membros da sociedades eram de acordo com o grupo ao qual esse membro pertencia, não havendo nesse direito a figura do indivíduo e sim a do estamento. Há uma descentralização da produção normativa, com várias fontes de produção do direito, sendo sua legitimidade atribuída ao passado e encontra-se amalgamado a questões éticas, morais, religiosas e jurídicas, sendo compreendido como atemporal, eterno e imutável. 8 O direito moderno caracteriza um processo de alteração social que marca a passagem da pré-modernidade para a modernidade. O direito não mais se organiza sobre a base estamental como no direito pré-moderno, mas é outorgado aos membros da sociedade independente do grupo social ao qual ela pertence. Há o surgimento do Estado Moderno e a ascensão da figura do monarca que tem em seu poder a centralização da produção normativa em um modelo racionalizado e marcado pela codificação. Esse direito moderno não possui um conteúdo determinado, e por isso, diferencia-se das outras instâncias normativas como a ética e moral. É uma instancia autônoma que dialoga com as outras instancias e preocupa-se predominantemente com a dimensão externa da ação, que trata, além das questões jurídicas, das questões éticas, pragmáticas e morais não amalgamadas. Esse processo de modernização social do direito, representado principalmente pela racionalização do direito e separação das outras fontes de normatização, foi necessário devido à complexidade crescente da sociedade e o aumento das lutas pelos alargamento dos direitos,tendo como principais causas o renascimento urbano e comercial, em que surge a burguesa e a estrutura estamental não suporta o modelo que se desenvolve; o renascimento cultural, em que novas ideias surgem e a visão teocêntrica dá lugar à visão antropocêntrica em que o conceito de indivíduo como pessoa dotada de valor em si mesmo ganha espaço; e a reforma protestante, em que a Igreja perde o monopólio da fé, desestabilizando as estruturas de força, tradição e passado. Nesse contexto, grupos sociais plurais aparecem e o que pode assegurar a integração social é somente o direito moderno que serve como categoria de mediação social. [resposta Edison] Paradigma Pré-moderno do Direito: sociedade estamental, não havendo a figura do individuo no direito, que se aplica de acordo com a tradição. A punição depende do estamento do qual a pessoal pertence. As decisões dependem, por exemplo, do local de nascimento, do conjunto de privilégios que a pessoa possui. Discursos para justificar esse direito como elemento eterno e imutável. Direito jusnaturalista, com forte fundo religioso. Direito Pré-moderno: pressupõe forma de organização social; estamental, hierarquizada, privilégios, prerrogativas são atribuídas em razão do local de nascimento, estrutura de direito devido em razão do local de nascimento. Amalgama: direito consuetudinário [costume], canônico, príncipe, reproduziu portanto, um direito natural de base teológica e um direito positivo. Paradigma Moderno do Direito: produção centralizada do direito, estado racionalizado, codificado. Sec. XI – processo mudança social – que vai produzir a modernidade. Direito Moderno: sociedade diferenciada, subsistemas sociais; positivo, posto, estabelecido, por deliberação, direito histórico, tendencialmente escrito, sistematizado, modificável, c alto nível de contingencia. [Copiar trecho caderno Gabriel] 9 Daniel diz> Paradigma pré-moderno do direito: direito com base estamental,. Direito é entendido como “coisa devida” em razão da classe social; o passado é a base da legitimidade; direito como eterno/atemporal; direito é extremamente ligado a religião, ética, moral e política; direito não positivado ( no sentido de centralização no Estado). Paradigma moderno do direito : direito se torna uma categoria de integração, se diferencia da ética, moral, política e religião mas não se separa delas ( dialoga com elas, não há mais um amálgama/coincidência com ellas). Organizado não mais como estamento, mas para os indivíduos. Quanto mais centraliza o poder, mais descentraliza a administração pública. Direito cada vez mais formalizado, direito baseado no presente que se abre para as perspectivas do futuro ( não se pretende eterno), é instável , contingente e mutável. 9 – Em que sentido os direitos fundamentais foram, mais do que alargados, redefinidos na passagem do paradigma do Estado Liberal para o paradigma do Estado Social? Em linhas gerais, reconstrua paradigmaticamente os direitos de liberdade e de igualdade no Estado Liberal e no Estado Social. [resposta Day] Os direitos fundamentais tiveram a interpretação modificada no advento da passagem do Estado Liberal para o Estado Social. Ao Estado Liberal caberia a proteção e garantia aos direitos individuais e direitos políticos específicos, não havendo espaço para os direitos sociais e econômicos. São direitos individuais em sentido negativo, em que é priorizada a esfera de autonomia privada do indivíduo, sua liberdade individual sem restrições em que o Estado se abstém de interferir na economia e na esfera individual dos cidadãos, deixando que o mercado e os indivíduos se regulem livremente, seguindo a máxima “pode-se fazer tudo o que a lei não proíbe”. A igualdade era formal em que se considerava a máxima “todos são iguais perante a lei”, sendo uma máxima geral e abstrata. No Estado Social, há uma ampliação na interpretação desses direitos. Os direitos individuais e políticos deixam de ser negativos e passam a exigir uma prestação positiva do Estado, são, portanto, revistos, reescritos, prevendo mecanismos para que possam ser exercidos. Surgem os direitos sociais e econômicos em que são garantidos direitos como educação, emprego, saúde e a economia passa a ser regulada pelo Estado. Neste contexto, os direitos não são absolutos, sofrendo restrições quanto à garantia do bem comum e o Estado abandona sua posição abstencionista e passa a atuar positivamente para garantir e fazer cumprir os direitos fundamentais. A liberdade passa a ser interpretada como a liberdade de ir e vir, de interferir na economia mas com condições que prezem pelo interesse coletivo. A igualdade passa de geral e abstrata para fática em que se analisa os fatos para se definir e restringir a igualdade de alguém. [resposta Edison] 1 No paradigma do Estado Liberal, o Estado reconhece direitos básicos. No nível da esfera privada, reconhecem-se direitos naturais, vida, liberdade e propriedade. E no nível da esfera pública, convencionam-se direitos perante o Estado e direitos à comunidade estatal: status de membro (nacionalidade), igualdade perante a lei, certeza e segurança jurídicas, tutela jurisdicial, segurança pública, direitos políticos. Com a crise da sociedade liberal, com o surgimento de um capitalismo monopolista, com o aumento de demandas sociais e políticas, além da Primeira Guerra Mundial, tem início a fase do Constitucionalismo Social. Surge um Estado que intervém na economia, através de ações diretas e indiretas; e visa garantir o capitalismo através de uma proposta de bem-estar (Welfare State) que implica uma manutenção artificial da livre concorrência e da livre iniciativa, assim como a compensação das desigualdades sociais através da prestação estatal de serviços e da concessão de direitos sociais. O cidadão-proprietário do Estado Liberal passa a ser encarado como o cliente de uma Administração Pública garante de bens e serviços. Daniel diz> Comentário na monitoria: As mudanças ocorreram tanto no sentido quantitativo, quanto no sentido qualitativo, ou seja: houve uma ampliação dos direitos e também uma mudança na forma de ver este direito. Ex> direito à educação ( antes não considerado no Estado Liberal e hoje compreendido). 10 - Em que sentido se pode compreender a mediação entre soberania popular e direitos humanos, bem como a relação entre autonomia pública e autonomia privada, da perspectiva do paradigma procedimentalista do Estado Democrático de Direito, em contra-ponto aos paradigmas anteriores, tomando como exemplo as “políticas feministas de equiparação”? [resposta Day] Diante das mazelas que o Estado Social apresentava, precisava-se de um modelo que superasse o até então existente e que abrangesse o sistema jurídico e a concepção liberal de democracia. Surge então o paradigma procedimentalista do Estado Democrático de Direito. Esse modelo não pretende romper com o Estado Social, mas radicalizar os mecanismos democráticos vigentes para que seja aberta à sociedade meios para intervir de forma democrática nas políticas públicas, de forma ampliar o exercício e a garantia aos direitos humanos, dando a oportunidade para se vivenciar a soberania popular, além da conciliação dos interesses das autonomias pública e privada. Nesse modelo procedimentalista não há conteúdo pré-determinado, absoluto do direito, em que são criados procedimentos para ultrapassar a barreira entre o Estado e a sociedade garantindo sua participação efetiva nas políticas públicas, como os orçamentos participativos e audiências públicas, por exemplo. O direito é considerado como um conteúdo aberto que depende de um processo jurídico e político em que, no caso concreto, é que se definirá oseu conteúdo, fazendo com que não se sustentasse a teoria das gerações dos direitos fundamentais até então formulada. O direito, assim, fornece um conteúdo 1 mínimo, estabelecido por um consenso mais ou menos estabelecido que possibilita a oportunidade de construção de seu conteúdo definitivo no caso concreto, conciliando-se o instituto da soberania popular com os direitos humanos. O desafio é construir o conteúdo do direito que vá garantir os direitos fundamentais a todos, tendo em vista a grande diversidade de grupos que se encontram na sociedade, como as políticas femininas de equiparação. As diferenças, bem como a autonomia pública e privada devem ser respeitadas, tem que haver a deliberação, participação da sociedade para que o direito deve se adequar às diferenças de forma a resolver os conflitos de forma mais igualitária possível, atendendo aos interesses da sociedade. Tendo em vista essa complexidade cada vez maior, o direito deve ser flexibilizado, relativizado nesse contexto em que não cabe um modelo pré-estabelecido com a pretensão de resolução de todos os conflitos. [resposta Edison] Segundo Habermas, o paradigma procedimentalista do direito procura proteger, antes de tudo, as condições do procedimento democrático. Este apego, por assim dizer, ao procedimento democrático implica que a qualquer momento um determinado tema poderá ser debatido na esfera pública política. Isto pressupõe, porém, o acatamento da opinião pública, tanto por parte de um parlamento quanto por parte da administração. Para Habermas, não é de se espantar que as teorias jusnaturalistas modernas tenham dado uma dupla resposta às questões de legitimação, por um lado, pela alusão ao princípio da soberania popular e ao reconhecimento de direitos à comunicação e à participação que asseguram a autonomia pública dos cidadãos, e, por outro, pela referência ao domínio das leis, garantido pelos direitos humanos ou direitos fundamentais clássicos que garantem a autonomia privada dos membros da sociedade civil. Assim, o Direito legitima-se como um meio para a garantia equânime da autonomia pública e da autonomia privada. A partir das políticas feministas de equiparação é possível demonstrar, segundo Habermas, que a política do Direito oscila desamparadamente entre o paradigma liberal e o social, e isso perdurará enquanto ela continuar limitada à garantia da autonomia privada e enquanto se continuar ofuscando a relação interna entre autonomia privada e autonomia pública: “Pois os sujeitos privados só podem chegar ao gozo de liberdades subjetivas, se eles mesmos, no exercício de sua autonomia de cidadãos do Estado, tiverem clareza quanto aos interesses e parâmetros justos e puserem-se de acordo quanto a aspectos relevantes sob os quais se deve tratar com igualdade o que é igual, e com desigualdade o que é desigual”. O paradigma liberal, ao garantir à mulher igualdade de chances, evidenciou o tratamento desigual que de fato se destina às mulheres. Por outro lado, o paradigma social, com a criação de diversos direitos dirigidos às mulheres (regulamentação da gravidez, da maternidade, etc), criou novas situações de discriminação e desigualdade (salários mais baixos). Segundo Habermas, a almejada compensação de danos acaba se convertendo em nova discriminação, ou seja, a garantia de liberdade converte-se em privação de liberdade. 1 “Em lugar da controvérsia sobre ser melhor assegurar a autonomia das pessoas do direito por meio de liberdades individuais para haver concorrência entre os indivíduos em particular ou então mediante reivindicações de benefícios outorgadas a clientes de um Estado de bem-estar social, surge agora uma concepção jurídica procedimentalista, segundo a qual o processo democrático precisa assegurar ao mesmo tempo a autonomia privada e a pública: os direitos subjetivos, cuja tarefa é garantir às mulheres um delineamento autônomo e privado para suas próprias vidas, não podem ser formulados de modo adequado sem que os próprios envolvidos articulem e fundamentem os aspectos relevantes para o tratamento igual ou desigual em casos típicos. Só se garante autonomia privada em igualdade de direitos quanto isso se dá em conjunto com a intensificação da autonomia civil no âmbito do Estado.” 1 BIBLIOGRAFIA (Unidades 1 e 2) CARVALHO NETTO, Menelick de. “A hermenêutica constitucional sob o paradigma do Estado Democrático de Direito” In: CATTONI, Marcelo (coord.) Jurisdição e hermenêutica constitucional no Estado Democrático de Direito. Belo Horizonte: Mandamentos, 2004, pp.25-44. CATTONI, Marcelo. Direito Constitucional. BH: Mandamentos, 2002, cap. 1 e 2, p.25-74. CATTONI, Marcelo. “Coesão interna entre Estado de Direito e democracia na Teoria Discursiva do Direito, de Jürgen Habermas” In: CATTONI, Marcelo (coord.) Jurisdição e hermenêutica constitucional no Estado Democrático de Direito. Belo Horizonte: Mandamentos, 2004, pp.171-188. CATTONI, Marcelo. “Para uma teoria do direito como teoria discursiva da constituição: Uma reconstrução da teoria do direito à luz de uma justificação pós-metafísica da filosofia do direito como filosofia do direito constitucional no marco da teoria do discurso de Jürgen Habermas” In: CATTONI, Marcelo. Direito, política e filosofia. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, pp. 136-153. 1
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