220 pág.

Pré-visualização | Página 34 de 50
do depósito para recurso voluntário em segunda instância administrativa. Até poucas décadas atrás, tal impugnação só era possível mediante depósito do montante integral, disposição essa rechaçada pela jurisprudência por entendê-la, na realidade, como antecipação de penhora. Essa condicionante de procedibilidade não pode ser refutada com base no duplo grau de jurisdição. A garantia não provém de disposição constitucional, mas sim legal. Não há litígio jurisdicional instalado, mas tão-somente discussão perante a autoridade tributária. Porém, o legislador do CTN conferiu o duplo grau para o sujeito passivo, não obstante poder determinar condicionantes para tal. Mas o depósito de todo montante fere a razoabilidade e a proporcionalidade. Segundo o STF, tal quantitativo financeiro pode obstar o acesso ao recurso voluntário administrativo, inviabilizando a continuidade do PAF. Dentro dessa idéia, a jurisprudência tem entendido que um valor razoável seria de 30% sobre o total do débito. Os advogados dos contribuintes passaram a postular que essa proporção é relativa, uma vez que pode haver valores em jogo muito altos. Dessa feita, o Excelso Pretório, em recente decisão, considerou o depósito recursal como inconstitucional, posição 108 Súmulas 346 do STF: “A administração pública pode declarar a nulidade dos seus próprios atos”. Súmula 473 do STF: “A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial”. 83 corroborada pelo STJ109. Na esteira, eles também começaram a questionar o arrolamentos de bens a final, em eventual execução futura, caso em que a penhora poderia incidir sobre bens indicados pelo devedor110. Dentro desse contexto, o art. 33, § 2º, D. 70235/72, que regula o processo administrativo fiscal, alterado pela Lei 10522/02, permitiu a indicação de bens para a subida do recurso administrativo para segunda instância. “In verbis”: Art. 33. (...). § 2º. Em qualquer caso, o recurso voluntário somente terá seguimento se o recorrente arrolar bens e direitos de valor equivalente a 30% (trinta por cento) da exigência fiscal definida na decisão, limitado o arrolamento, sem prejuízo do seguimento do recurso, ao total do ativo permanente se pessoa jurídica ou ao patrimônio se pessoa física. (...). Esse dispositivo não se aplica os débitos previdenciários, segundo entendimento estipulado pelo STJ, porque as leis previdenciárias são especiais em relação às disposições genéricas do D. 70235/72. Devido à recente mudança de composição do STF, o percentual de 30% foi novamente contestado, tendo sido declarado como inconstitucional111. Segundo a corrente, o depósito recursal impede o prosseguimento do PAF, infringindo o contraditório, a ampla defesa e a garantia ao devido processo legal, frustrando o direito à revisão do processo administrativo na primeira instância. Foi exatamente o que decidiu recentemente o Excelso Pretório em sede de controle difuso de constitucionalidade112. Depósito do montante integral – geralmente se atrela a uma ação de depósito combinada com ação anulatória de débito fiscal. Doutrinariamente, a natureza jurídica é híbrida, porquanto representa uma garantia em favor do cidadão e do credor simultaneamente. É vantajoso para o devedor porque inibe ação de execução e livra o contribuinte dos encargos moratórios. Em contrapartida, para a Administração Tributária, há certeza de que, sendo improcedente o feito, o montante será apto a tornar a solvência do devedor perfeita, eliminando o custo da execução judicial e da eventual hasta pública. É entendido como montante integral corresponde ao total cobrado pela Fazenda, sob pena do depósito não ser idôneo à suspensão de exigibilidade. Isso significa que o depósito a menor, valor entendido pelo contribuinte, não obsta a execução, tendo o ato efeito de consignação em pagamento. A presunção se 109 STF, RE 311.023-3/RJ, DJU 26/10/2001; ADIn 1.976-7-DF, DJU 5/6/2007; AC 1.566-MG, DJU 27/4/2007. STJ, 1ª T., REsp 943.116-SP, rel. Min. José Delgado, j. 19/6/2007, Informativo do STJ n° 324; AgRg no RMS 14.030-RJ, DJU 9/9/2002; 2ª T., AgRg no Ag 829.932-SP, rel. Min. João Otávio de Noronha, j. 20/9/2007, Informativo do STJ n° 332. 110 Nos termos do art. 64, “caput”, Lei 9432/97, a autoridade fiscal poderá realizar descrição minuciosa de todo o patrimônio do devedor, quando o crédito tributário for superior a 30% do seu total, com piso de R$ 500.000,00 (art. 64, § 7º, Lei 9432/97). Nesse caso, o arrolado não poderá alienar, transferir ou gravar seus bens sem prévio conhecimento da autoridade fiscal (art. 64, § 3º, Lei 9432/97). A infringência dessa norma pode ensejar a medida cautelar fiscal (art. 64, § 4º, Lei 9432/97), prevista nas hipóteses do art. 2º, I a IX, Lei 8.937/92. 111 STF, ADIn 1976/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, Informativo do STF nº 461, no qual o relator afirmou que a substituição do depósito por arrolamento de bens não descaracteriza o gravame intransponível para o contribuinte-recorrente, na medida em que ambas as medidas importam em bloqueio de patrimônio. 112 STF, RE 388.359, rel. Min. Marco Aurélio, j. 9.4.2007. 84 encontra em favor do credor, já que pende ato administrativo vinculado do agente público. O ônus da prova se defere ao contribuinte. Na consignação, como lembra Chimenti (2002, p. 207), a subordinação, imposta pelo fisco, no sentido de condicionar o pagamento de um tributo ao recebimento de outro, é lícita, porquanto se trata de autêntica imputação (art. 163, II, CTN). A Súmula 112 do STJ113 preceitua que o depósito deve ser em dinheiro, não cabendo indicação de bens. Como já fora mencionado, a suspensão da exigibilidade do crédito tem autêntica natureza de “embargos antecipados”. Nos embargos à execução, é possível indicar bens à penhora ou constituir fiança bancária (art. 9º, II a IV, LEF). Conseguintemente, seria possível outra espécie de garantia da referida suspensão. É nesse sentido que a doutrina critica o entendimento do STJ, por haver um contra-senso para com o sistema de execução fiscal positivado. O levantamento do depósito antes do trânsito em julgado da ação judicial não é permitido ao depositante, pois passa a ser “res in judicia”. A titularidade do bem não pertence mais ao autor da demanda, ficando sob a guarda da Justiça até a decisão final. Em contrário, estaria sendo frustrada totalmente a “ratio essendi” do instituto previsto no art. 151, II, CTN, esvaziando-o. Dessa forma, o depósito de montante integral deve ser a última saída para o contribuinte. A priori, por uma questão de lógica, o fisco também não poderia fazer o levantamento antecipado do depósito. Destarte, a Lei 9703/98 veio a autorizar que a União utilize o dinheiro, a ser administrado pela CEF através da Conta Única do Tesouro Nacional. Uma vez que o autor da demanda seja vencedor, o juiz expede o alvará de levantamento para que, em 24 horas, a CEF pague o primeiro. O legislador acolheu a presunção de legitimidade da exigibilidade do crédito tributário lançado. Ademais, visou à manutenção do Estado com o numerário em depósito, sob pena de impossibilidade da realização do bem comum pela Administração, afetando sobremaneira a governabilidade. Esse óbice ao exercício da atividade estatal é chamado pela doutrina de “periculum in mora” inverso (Ricardo Lobo Torres). Sob os auspícios do Direito Financeiro, o levantamento antecipado do depósito integral constitui autêntica entrada temporária, não consubstanciando receita em sentido estrito. No plano orçamentário, a verba será incluída no Anexo