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Uma Mãe Para A Filha Do CEO Lv

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D. A. LEMOYNE
Copyright © 2020
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
D. A. LEMOYNE
dalemoynewriter@gmail.com
Copyright © 2020
Título Original: Uma Mãe Para a Filha do CEO
Primeira Edição 2020
Carolina do Norte - EUA
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação pode ser
reproduzida, distribuída ou transmitida por qualquer forma ou por qualquer
meio, incluindo fotocópia, gravação ou outros métodos eletrônicos ou
mecânicos, sem a prévia autorização por escrito da autora, exceto no caso de
breves citações incluídas em revisões críticas e alguns outros usos não-
comerciais permitidos pela lei de direitos autorais.
 
Capa: TV Design
Revisão: Dani Smith Books
Diagramação: Touch Designers
 
Esse é um trabalho de ficção. Nomes, personagens, lugares, negócios,
eventos e incidentes são ou produtos da imaginação da autora ou usados de
forma fictícia. Qualquer semelhança com pessoas reais, vivas ou mortas ou
eventos reais é mera coincidência.
 
Desde muito cedo, Guillermo Oviedo, o CEO da rede de hotelaria
Caldwell-Oviedo, acostumou-se a assumir responsabilidades.
Então, quando ele descobre um segredo de sua falecida esposa,
elabora um plano para corrigir o que considera uma injustiça.
Não é somente a bondade o que o move.
Família para Guillermo é a base de tudo e ele não medirá esforços
para reunir a filha de nove meses à sua única parente por parte de mãe.
O problema? Ele não estava preparado para o furacão Olívia Freitas
com seu um metro e cinquenta e seis de pura sede de viver.
 
Aos meus três amores: Ionara, Cris e Maria José. Vocês
sabem que têm um lugar especial em meu coração.
NOTA DA AUTORA:
Uma Mãe Para a Filha do CEO é o primeiro livro da série Irmãos
Oviedo, uma família metade espanhola, metade americana, mas cujo sangue
quente prevaleceu.
Nessa primeira história vocês terão a oportunidade de conhecer além
do irmão mais velho, o CEO Guillermo Oviedo e sua Olívia, os protagonistas
dos outros livros: Joaquín, Martina, Rafe e Gael Oviedo. Suas participações
serão rápidas porque essa é somente uma introdução aos personagens.
Apesar de ser uma série, cada livro será protagonizado por um casal
diferente e independente entre si, embora o seguinte possa conter spoilers do
anterior.
Espero que desfrute dessa linda história de amor tanto quanto eu
adorei escrevê-la.
Um beijo carinhoso e boa leitura.
D.A Lemoyne
Sumário
NOTA DA AUTORA
Guillermo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Capítulo 33
Capítulo 34
Capítulo 35
Capítulo 36
Capítulo 37
Capítulo 38
Capítulo 39
Capítulo 40
Capítulo 41
Capítulo 42
Capítulo 43
Capítulo 44
Capítulo 45
Capítulo 46
Capítulo 47
Capítulo 48
Capítulo 49
Capítulo 50
Capítulo 51
Capítulo 52
Capítulo 53
Guillermo
Olívia
Joaquín Oviedo
Parceria entre autoras
PAPO COM A AUTORA
Obras da autora
SOBRE A AUTORA
 
Guillermo
Boston - Massachusetts
Há sete meses
 
— Eu sinto muito, senhor.
Essa foi a última fala que eu consegui reter depois que o médico me
informou que minha quase ex-esposa não sobreviveu ao acidente.
Estou sentado no corredor do hospital com os cotovelos apoiados nos
joelhos e de cabeça baixa.
Geralmente, não demonstro qualquer fraqueza, porque há muitos anos
sou aquele que comanda a minha família. Sou a referência dos meus quatros
irmãos e nunca pude me dar ao luxo de fraquejar, mas até mesmo para mim,
o choque de descobrir que Layla encerrou sua curta passagem aqui na Terra é
demais.
Acontece que, não é o rosto dela que me vem à mente, mas o de
Valentina, minha Nina, a garotinha linda de apenas dois meses que nunca terá
a oportunidade de ser abraçada por sua mãe. A criança que apesar de não ter
sido planejada, é o meu universo inteiro.
Eu, Guillermo Oviedo, o cara que projeta cada passo da própria
existência e acostumado ao peso das responsabilidades, sinto como se
estivesse com o mundo sobre os meus ombros nesse exato momento.
Vejo um detetive de polícia se aproximar, mas antes que ele chegue
até onde estou, meu irmão Joaquín, que é promotor de justiça, para à minha
frente com um homem que só de olhar, eu adivinho ser um advogado.
— Você não conversará com a polícia sem um advogado. — Ele diz,
confirmando as suspeitas.
Sua mão em meu ombro me dá a certeza de que sabe as circunstâncias
da morte de minha esposa, já que Joaquín não é muito afeito a gestos de
carinho.
— Esse é Levi Goldberg. Ele é da banca dos escritórios Lambertucci
e irá representá-lo.
Apesar de saber que ele está certo, não estou preocupado, mas
também não sinto vontade de argumentar, então, após apertar a mão do outro
homem, volto a pensar em minha filhinha.
Mesmo que Layla nunca tenha desejado ser mãe ou demonstrado
qualquer amor por Nina, eu tinha esperança de que um dia mudasse de ideia e
houvesse uma aproximação entre elas. Agora, no entanto, me bate a certeza
de que seremos nós dois contra o mundo e eu mentiria se não confessasse que
estou morrendo de medo de fazer tudo errado.
Capítulo 1 
Olívia
 
Dias atuais
Boston - Massachusetts
 
”Despacito, quiero respirar tu cuello despacito,
deja que te diga cosas al oído,
para que te acuerdes si no estás conmigo.
Despacito, quiero desnudarte a besos despacito,
firmo en las paredes de tu laberinto
Y hacer de tu cuerpo todo un manuscrito - sube, sube, sube…”
 
— Quanto tempo até a performance chegar ao fim?
Quem quer que tenha falado comigo, tem um timbre tão poderoso que
poderia ter sido ouvido da plataforma lunar.
O espanador, assim como tudo o que tem na prateleira ao lado, vai ao
chão, enquanto eu me viro para ver quem foi o infeliz que quase me matou de
susto. Eu estava preparada para um cliente regular, mas não há nada de
regular nesse homem.
Não senhora. Tudo nele é no aumentativo.
Doce Senhor Jesus!
Acho que nunca vi um cara de aparência tão impressionante, mesmo
levando em conta o fato de que sou fã de carteirinha de filmes de amor,
daquele tipo em que o protagonista nos deixa com a calcinha molhada em
dois minutos.
Faço um exame completo pelo homem que, ninguém precisa me
dizer, usa um terno que custa certamente o que eu levaria dez meses de
salário para juntar.
Os sapatos sociais de couro são tão novos que eu poderia me ver
neles, como em um espelho. A calça do terno azul marinho não tem um vinco
sequer.
Enquanto subo o olhar, não fico nem um pouco envergonhada por
dissecar esse delicioso espécime masculino.
Nunca vi um homem com uma aparência dessas pessoalmente e quero
memorizar tudo bem direitinho. Estou mesmo precisando de um avatar novo
para as minhas fantasias, Giulio Berruti já estava ficando gasto em meus
sonhos eróticos.
O homem é todo grande — o que não é muito difícil, se você for levar
em conta que eu tenho somente um metro e cinquenta e seis — mas é um
grande do tipo gostoso.
Apague isso.
Gostoso não. Do tipo delícia.
O peito é largo como uma muralha e acho que nem se eu abrisse os
dois braços conseguiria medir seus ombros — é, eu sei. Tenho tendência a
exagerar. As mãos parecem uma raquete e me fazem ter certeza de que ele
poderia alcançar várias partes do meu corpo ao mesmo tempo. Até o pescoço
do cara é bonito. Dá para acreditar em algo assim?
Finalmente volto ao rosto, que até então eu só havia dado uma olhada
rápida.
O que posso dizer? Ele tem muito material a ser examinado.
Só que antes que eu consiga chegar aos olhos, a contração em seu
maxilar me mostra que ele está irritado e dou um passo para trás. Eu não sou
de me assustar facilmente, mas pelo amor de Deus, além de ser um gigante, o
cara é intimidante para caramba. Não é aquele intimidanteque nos faz sentir
fisicamente ameaçados, no entanto. É aquele tipo de pessoa que você não
quer como seu inimigo porque passa a impressão de que vai morder alguém a
qualquer momento — o que dada a sua aparência, não seria uma má ideia.
Opa, foco garota.
Ele já não pareceu estar de bom humor quando falou sobre a minha
dancinha, mas agora soa prestes a me demitir, apesar de que até onde eu sei,
ele não é o dono da cafeteria.
Como sempre acontece quando fico nervosa, disparo a falar feito uma
louca.
— Acabei, sim senhor. Eu não costumo dançar pela manhã, porque
acordo mal-humorada, mas esse dia de sol teve o poder de transformar a
minha sexta-feira. Dias ensolarados sempre me deixam animada. O senhor
prefere inverno ou verão? Ah, quase ia me esquecendo. Café puro ou com
creme?
Só depois que percebo o olhar de espanto dele é que vejo que
provavelmente está pronto para solicitar que me levem direto ao manicômio
— e eu não posso ser internada. Tenho que continuar juntando dinheiro para
poder dar andamento aos meus planos, além de quitar todas as minhas
dívidas, claro.
Puxando algumas respirações para me acalmar, limpo a garganta,
ajeito a saia do vestido e tiro uma poeira imaginária do meu uniforme de dez
dólares. Reunindo toda a dignidade de que sou capaz, ergo a cabeça, olhando-
o diretamente nos olhos, como a minha mãe me ensinou a fazer.
— Se puder me acompanhar, eu o levarei a uma mesa, senhor.
Acho que ele não está muito acostumado a seguir ordens, mas parece
que o deixei sem palavras, apesar de não ter certeza se isso foi uma coisa boa
ou ruim.
Enquanto ando, tento não derrubar mais nada, mantendo os passos
firmes, mas sinto seu olhar queimar as minhas costas.
Observo a área de alimentação da cafeteria e penso que Sua
Majestade não combina com o lugar.
Não é só pela roupa cara.
Mesmo que ele estivesse vestido como um mendigo, ainda assim
destoaria do restaurante que serve um café da manhã completo por três
dólares e noventa e cinco centavos — com direito a refil do café, claro.
Ele é o único cliente no momento e quando chegamos à mesa que eu
considero a mais agradável daqui, paro e espero que sente. Ao invés disso, no
entanto, o gigante sexy me encara como se estivesse diante de uma cobaia de
laboratório.
— Puro ou com creme? — Faço força para só perguntar isso porque a
verborragia de dois minutos atrás já fez seu caminho em me deixar com
vergonha.
— Não vai recolher as panelas que derrubou?
Como da primeira vez em que ele falou, sua voz soa dura, vinda de
alguém que não tem muita paciência e que está acostumado a dar ordens.
— Os clientes em primeiro lugar.
Deus, eu poderia ter dito algo mais clichê do que isso?
— Eu prefiro que você recolha as panelas antes.
Claro que prefere, senhor dono do mundo.
— Olha, não é a primeira vez que derrubo coisas. Sabe aqueles vídeos
em que alguém puxa um item de uma prateleira no mercado e todo o resto cai
no chão? Já fui protagonista de alguns, então o senhor pode ficar tranquilo
que assim que servi-lo, cuidarei daquilo em um instante. Acredite, se o
gerente chegar e vir um cliente sem uma xícara de café na frente, enquanto eu
calmamente guardo panelas, posso perder o meu emprego.
Ele finalmente se move e dou graças a Deus porque não sou muito
boa em argumentar.
— Puro.
— Hein?
— Você perguntou como eu queria o café. Sempre bebo puro. — Ele
diz, deixando claro que está habituado a ser servido.
Sempre bebo puro. — Repito mentalmente.
Da maneira que fez soar, parece que daqui por diante virá fazer a
primeira refeição nessa magnífica cafeteria todos os dias.
Certo.
Deixa só ele provar a água de batata que é o café que servimos e eu
aposto que irá mandar fechar o local.
Disfarço uma risada ao pensar na cena, mas a seguir, lembro que
preciso desse emprego.
Não, não, não.
Nem se atreva a mexer com o lugar em que trabalho, homem
engravatado.
— Prefere o café mais forte?
A intuição me diz que sim, mas não foi a bondade que me fez oferecer
outra opção — que nem está no cardápio, para início de conversa — mas
porque a minha cabeça doida ficou com medo de que ele fosse algum tipo de
fiscal de café, se irritasse com a água suja e em seguida mandasse mesmo
fechar o restaurante.
Você deve estar se perguntando como consigo fazer um café mais
forte, não é? É que apesar de americana, fui criada por uma brasileira, então
sei perfeitamente como se parece um café de verdade e definitivamente não é
igual ao que servimos aqui.
— Você sabe fazer café mais forte?
Seguro a vontade de revirar os olhos.
Se eu não soubesse não teria oferecido, senhor.
Mas tenho amor às minhas gorjetas, então somente respondo.
— Sim, senhor. Posso preparar o melhor café que já tomou na vida.
— Disparo, mas daí corrijo rapidamente. — De acordo com a matéria-prima
disponível, claro.
Pode ser impressão minha, mas o canto de sua boca parece se erguer
em um ensaio de sorriso. Só que acontece tão rápido que não tenho certeza se
meus olhos não estão me pregando peças.
— Certo. Surpreenda-me, Olívia.
— Como sabe…?
Antes que eu conclua a pergunta, ele aponta para o meu crachá.
Morta de vergonha pelo show bizarro que dei, começando pela
performance de Despacito, a queda das panelas, seguido do descontrole
verbal, fujo dali como se um serial killer estivesse em meu encalço.
— Já volto.
Capítulo 2
Guillermo
 
Sabe quando você está em uma estrada e se depara com um acidente
de carro?
Você sabe que não deveria diminuir a velocidade e ficar olhando, mas
ao mesmo tempo, não consegue se impedir de fazer exatamente isso. Foi
mais ou menos o que eu senti desde o momento em que entrei na cafeteria e
vi Olívia.
Toda a minha racionalidade mandou que eu virasse as costas e me
afastasse da garota que parece, ela mesma, um acidente ambulante.
Não é possível. Tem que ter havido um engano. Não pode ser ela.
Se não fossem os passos de dança na entrada da cozinha, eu teria
certeza de que sequer tem coordenação motora o suficiente para se manter de
pé.
Ela não é só estabanada. É um foguetinho.
Nunca estive perto de alguém que parecesse emanar fogos de artifício
por cada célula do corpo — e aqui você precisa considerar que sou o irmão
mais velho de Martina, uma garota que nasceu com formigas dentro da roupa.
Os olhos azuis e enormes destacam-se no rosto delicado, deixando-a
com uma aparência de boneca de louça — uma boneca de louça em
miniatura, porque o alto de sua cabeça mal chega ao meu peito.
Enquanto ela se movimenta do outro lado do balcão, observo-a, com
os braços cruzados, sentado à mesa que me indicou. Apesar de aparentemente
saber o que está fazendo, de onde estou, já a vi derrubar dois panos de prato,
uma colher e esquecer a geladeira aberta.
Estou admirado que alguém assim tenha conseguido chegar à idade
adulta viva. Na verdade, ela nem parece adulta e sim uma menina recém
saída da adolescência, apesar de eu saber que já é maior de idade.
Em pouco tempo, saberei quase tudo sobre ela também. Pelo menos,
tanto quanto o detetive consiga descobrir. O relatório completo deve estar em
minhas mãos ainda essa semana. O que havia nos papéis de Layla não foi
suficiente para que eu pudesse ter certeza sobre que tipo de ser humano a
garota é.
Olho em volta do restaurante de aparência desgastada.
A cafeteria segue o padrão de várias outras no lado pobre da cidade,
só que um pouco mais decadente. Eles se mantêm abertos vinte e quatro
horas por dia — segundo a placa lá fora — e eu me pergunto se ela trabalha
também no turno da noite.
— Olívia, quais são os seus turnos? — Pergunto de onde estou
sentado.
Ela para o que está fazendo, franze a testa como que se decidindo se
deveria responder ou não, mas depois dá de ombros.
— Todos os dias eu abro a loja e vou até as duas, mas uma vez por
semana fico também na sexta ou no sábado à noite. O gerente pediu e
concordei porque as gorjetas são boas.
— Essa região não é segura.
— Mesmo? Eu não fazia a menor ideia. — Fala, impertinente,mas
depois parece lembrar que está conversando com um cliente e muda o tom.
— Senhor.
— Não seja irônica.
— Desculpe, acho que é uma espécie de qualidade às avessas.
— Precisa tanto das gorjetas do turno da noite ao ponto de se arriscar?
Ela havia começado a abrir um armário, mas pausa novamente e me
olha.
— O senhor já me fez um monte de perguntas, então acho que tenho o
direito de fazer ao menos uma. Por que veio a um lugar como esse?
Não há como responder sem mentir, mas tento contornar a situação.
— Não tive tempo de tomar o café da manhã em casa. — Digo e de
certa forma é verdade, já que Nina não dormiu bem essa noite por causa dos
dois dentinhos superiores que estão nascendo. Quando ela finalmente
conseguiu descansar, eu cochilei também e acordei atrasado.
Há semanas tenho adiado vir ver Olívia pessoalmente e não gosto de
pensar em mim mesmo como um procrastinador. Desse modo, ainda que com
o dia cheio, resolvi checá-la de uma vez.
— E o senhor escolheu vir justo aqui?
Ela parece incrédula.
A garota não é boba.
— É a primeira vez que visito essa parte da cidade. Eu tinha negócios
a tratar na região. — Outra meia-verdade.
Para interromper as perguntas que não posso responder no momento,
viro a seta para ela.
— Você estuda?
— Em uma faculdade? Quem me dera. Já viu quanto custa um curso
universitário? Eu teria que vender um rim e sou bem apegada a todos os meus
órgãos.
Ela não parece nem um pouco revoltada quando fala aquilo. Ao
contrário, está sorrindo.
— O que você faria se pudesse estudar?
— Você é algum tipo de fiscal? Por isso perguntou se trabalho à
noite? Se for, fique tranquilo porque já tenho vinte e três anos. Não fugi de
casa e nem nada do tipo. Não se engane com a minha altura. — Ela vira a
cabeça de lado, analisando. — Acho suas roupas caras demais para ser um
funcionário do governo, mas não sou muito conhecedora de grifes. Vai ver
você comprou em uma liquidação. Nunca se sabe.
Como da primeira vez em que ela soltou várias frases ao mesmo
tempo, fico um pouco confuso com sua agitação, mas a seguir percebo que é
fruto do nervosismo que deve estar sentindo.
— Não sou fiscal.
— E suas roupas não são de liquidação?
— Não.
— Eu não faço ideia de por que está interessado, mas se eu pudesse
voltar a estudar, o que pretendo um dia, seria para me tornar uma chef
doceira, então se eu pudesse, estudaria gastronomia.
— Não dança? — Pergunto e suas bochechas viram duas bolas de
fogo, enquanto ela balança a cabeça de um lado para o outro.
Não sei por que eu quis provocá-la. Não tenho por hábito fazer piadas
e estranhando meu próprio comportamento, completo.
— Existem faculdades comunitárias. Elas são mais em conta,
presumo.
— Sim, existem, mas no momento eu preciso juntar dinheiro para
outro projeto. Não funciono muito bem ao tentar me concentrar em várias
coisas ao mesmo tempo.
Ela coloca uma caneca de café fumegante à minha frente, ao invés da
jarra que habitualmente são servidas em cafeterias.
— Prove. — Diz, como se estivesse falando com um amigo, mas
depois conserta rápido. — Senhor.
A aparência do café ao menos é melhor do que costuma ser em
restaurantes aqui nos Estados Unidos.
— Puro mesmo? — Torna a perguntar.
— Sim. Sempre.
Ergo a caneca e sinto o aroma — que não é grande coisa já que, como
ela mesma disse, não poderia fazer milagre com a matéria-prima de que
dispunha, mas quando tomo um gole, não seguro um gemido de prazer.
Não estou acostumado a me permitir emoções na frente de estranhos,
então torno a largar a caneca na mesa. No entanto, ao encará-la e notar seu
olhar de decepção, pego-a novamente dando uma golada mais longa dessa
vez.
O líquido quente e forte desce como fogo pela minha garganta e fecho
os olhos por uns segundos, para assimilar a sensação. Quando torno a abri-
los, vejo que ela está me observando atentamente e há algo naquele olhar que
me põe em alerta.
Não. De maneira alguma.
Nem mesmo pense nisso, moça. Seria complicado de muito mais
modos do que eu poderia tentar explicar.
Perceber seu interesse só torna mais difícil ignorar o quanto ela é
bonita. E eu estou tentando arduamente desde que vi sua foto pela primeira
vez.
— Bom? — Pergunta e posso ver o movimento de sua garganta ao
engolir em seco.
— Sim, você não estava mentindo.
Ela sorri, parecendo relaxada agora.
— Eu fui criada por uma mulher que preparava o melhor café do
mundo. Não é como se eu tivesse inventado a fórmula, apenas copiei.
Balanço a cabeça concordando, mas minha mente ainda está viajando
por outros lugares. Sem fazer caso do meu silêncio, ela continua a falar.
— Negócios na região, hein? Desculpe, mas o senhor não parece ser
do tipo que tem qualquer coisa para tratar por aqui a não ser que tenha vindo
comprar o bairro inteiro. — Ela diz e dá uma risada, mas acho que a seguir
lembra outra vez que sou um cliente. — Péssima piada. Prometo não abrir
mais a boca. Algo para acompanhar o café, senhor?
— Não. Apenas o café, Olívia.
Eu não quero que ela vá ainda. Tenho mais perguntas a fazer, mas
antes que consiga falar, um homem idoso entra na cafeteria.
— Olívia, minha flor da manhã. O que temos de novidade para fazer o
meu dia mais feliz?
— Abraham, pensei que não viria mais. Você está atrasado. Sente-se
que já levo o café e o especial de hoje.
— Doce? — O homem pergunta, soando esperançoso.
— Torta de maçã com canela.
Ela me pede licença, antes de seguir novamente para trás do balcão.
— Ai, meu Deus. Sei que já perguntei antes, mas tem certeza de que
não quer se casar comigo?
Ela sorri, sem parar o que está fazendo.
— Sabe, a ideia é tentadora, mas acho que prefiro continuar solteira.
Assim posso ler os meus livros em paz.
— Garota esperta.
A troca entre os dois me mostra que ele deve ser um cliente habitual,
mas também traz a certeza de que Olívia é uma garota aberta. Parece ser
simpática com todos, o que de alguma maneira, me irrita.
Sabendo que não há a menor chance de que eu vá perguntar mais nada
na frente de uma terceira pessoa, dou mais um gole no café, tiro uma nota de
cinquenta dólares da carteira e saio sem me despedir.
Capítulo 3
Guillermo
 
Depois de conferir se Nina está bem acomodada em seu berço, ligo a
babá eletrônica e vou até a sala para pensar na confusão em que se
transformou a minha vida em pouco mais de um ano, a começar por meu
envolvimento relâmpago com sua mãe.
Desde o princípio, fomos um erro.
Quando começamos a sair, além do fato dela ser linda, o que me
chamou a atenção foi sua leveza. Apesar de já ter vivido alguns
relacionamentos, nunca me aprofundei o suficiente em uma parceira para
entender certas sutilezas no comportamento dela. Assim, tarde demais me dei
conta de que a aparente leveza era superficialidade.
Layla vivia em uma busca constante de emoção e infelizmente só
descobri que tipo de estilo de vida ela gostava depois que me contou que
estava grávida.
Não quero bancar o ingênuo, mas nós sempre usamos preservativos,
então eu tomei um susto danado quando ela trouxe a novidade, segundo suas
próprias palavras.
Família é o meu pilar e eu queria que a minha criança fosse criada
perto de mim e dos meus pais e irmãos, então fiz o que considerei ser o certo
e a pedi em casamento. No princípio, ela fingiu estar feliz. Ela era boa nesse
negócio de representar. Só que não precisamos de mais do que algumas
semanas juntos para que eu percebesse que tinha entrado em um inferno.
Layla não se importava com a saúde da nossa filha. Queria continuar
saindo, bebendo todas as noites e dormindo muito pouco. Raramente
concordava em se consultar com o obstetra.
Eu tentei ser paciente por causa da nossa diferença de idade — doze
anos.
Quando começamos a nos relacionar, eu não estava pensando que
tudo descambaria em um casamento. Achei que ambos estávamos passando
um bom tempo juntos, então a idade não era um fator tão importante.
Assim mesmo, com sua juventude e amor às noitadas, eu imaginei
que em algum momento a consciênciade que havia uma vida dentro dela
finalmente a faria mudar seu comportamento, mas as coisas só pioraram.
Quando seu corpo começou a se modificar, ela surtou.
Usava roupas apertadas para comprimir a barriga que já começava a
despontar, fazia as dietas mais loucas e claro, continuava a chegar em casa de
madrugada. O auge, no entanto, foi quando ela apareceu na capa de uma
revista beijando um outro cara.
Para ser sincero, não foi o ciúme o que me fez impor a separação de
corpos, mas o desgosto por sua postura. Casamento é uma instituição que eu
respeito. Meu exemplo são meus pais que já estão juntos há quase quarenta
anos, então mesmo sabendo que nos unimos pelas circunstâncias e não por
escolha, esperava que com a convivência nos entendêssemos.
Quando decidi colocar um ponto final, não saí de casa porque apesar
de não a suportar mais, eu estava obcecado com a segurança do meu bebê.
Por diversas vezes, Layla falou sobre como era comum um aborto nos
primeiros meses de gestação e aquilo ligou um sinal de alerta em mim.
Então, eu conversei com a minha esposa na única linguagem que ela
entendia — dinheiro.
Apesar de vir de uma família rica, quando seus pais faleceram
estavam praticamente falidos e trabalhar para ganhar seu sustento nunca
sequer passou pela cabeça dela, logo tive a esperança de que se eu pudesse
garantir suas extravagâncias, ela aceitaria a minha proposta.
Assim, disse que se levasse a gravidez com todos os cuidados
necessários, eu lhe daria dez milhões de dólares após o nascimento de Nina,
desde que me concedesse um divórcio com guarda compartilhada.
Eu achei que a conhecia, mas nada me preparou para sua
contraproposta: ela falou que por quinze milhões abriria mão da guarda total.
Como uma mãe pode não querer conviver com seu bebê é algo que jamais
entenderei.
Nascido e criado em uma família em que o amor e o cuidado uns com
os outros foi desde sempre a cola que unia nossos parentes, eu não
compreendia como ela poderia abrir mão de nossa menina.
Apesar disso, minha preocupação sempre foi com o bem-estar e
segurança de Nina, então não hesitei em aceitar o que propôs e mesmo ela
dizendo que não se importava com a criança, estabeleci uma cláusula em que
ela teria direito à visitação supervisionada desde que avisasse com quarenta e
oito horas de antecedência.
Quando seu advogado mencionou esse benefício em uma das reuniões
que tivemos antes de finalizarmos o divórcio, ela riu e disse que era
totalmente desnecessário.
Uma semana após Nina nascer, saiu de casa.
Eu não fazia a menor ideia de como cuidar de um bebê e apesar de ter
contratado babá e enfermeira, praticamente me mudei de volta para morar
com os meus pais porque achava minha filha pequena demais para ficar nas
mãos de estranhos.
Layla continuou participando de festas como fez durante toda a vida.
Ela ganhou pouco peso na gravidez e seu corpo rapidamente voltou ao
normal. Era raro uma semana em que não surgisse nos jornais e revistas um
novo escândalo envolvendo seu nome.
Os papéis do divórcio já estavam prontos, quando na véspera da
minha filha completar três meses de vida, fui avisado do acidente.
Apesar do nosso casamento tumultuado e de nunca mais termos
trocado uma palavra desde que ela saiu de casa, a não ser através de nossos
representantes legais, lamentei sinceramente uma existência encerrada tão
precocemente.
Agora, meses após sua morte, descobri algo que me fez tomar uma
atitude que não é comum para mim: arriscar.
Ainda não tenho certeza do que estou fazendo, mas pelo menos
tentarei escavar mais a fundo essa história.
Mesmo com a separação, legalmente eu ainda era o único a manter
um laço com Layla, além de Valentina, já que seus pais faleceram há cerca de
dois anos. Desse modo, ficou para mim a responsabilidade de cuidar dos seus
bens — que agora serão herdados por Nina, assim como de toda a
documentação, desativação de redes sociais entre outras coisas.
Quanto às redes sociais, deixei a critério da minha secretária, mas os
e-mails eram pessoais demais para delegar a terceiros. Ainda que Layla não
tenha feito por merecer a minha lealdade, esse é quem sou.
Só que eu não fazia ideia da vida secreta que a minha esposa
mantinha não só de mim, mas do mundo inteiro e agora, com as informações
que o detetive que contratei me deu baseado nos documentos que lhe passei,
estou tentando desvendar os mistérios do seu passado.
Quando fui à cafeteria, não sabia muito bem o que esperar, mas com
certeza não era o furacão Olívia.
Deus, eu preciso pesar com calma o que fazer.
Exausto, desisto de comer.
Amanhã é sábado e quero ficar o dia inteiro com a minha Nina. A
cada vez que chego do trabalho, ela parece que cresceu um pouco mais e eu
me sinto culpado por perder partes importantes de seu desenvolvimento.
Também tenho que reorganizar em definitivo a minha própria vida.
Não é justo sobrecarregar mamãe, agora que o estado de saúde do meu pai
voltou a inspirar cuidados.
Esse segundo AVC nos pegou de surpresa, já que o primeiro ocorreu
há mais de dez anos.
Decido que ao contrário do que havia dito à minha mãe, amanhã
almoçarei com eles. Quem sabe Nina não levará um pouco de alegria para
ambos.
Deus sabe como nossa família necessita disso.
Capítulo 4 
Olívia
 
Na mesma noite
 
Cinquenta dólares para pagar um café? Definidamente o poderoso não
é um cliente regular. Essa é sem medo de errar a gorjeta mais alta que eu já
recebi durante os seis meses em que trabalho aqui.
Depois de colocar o dinheiro no caixa, anoto no caderninho onde
costumo manter o controle das minhas gorjetas.
Esse pode ser o meu primeiro emprego de verdade, mas eu aprendi
com mamãe Heloísa o suficiente sobre pessoas para ficar com meus dois pés
atrás em relação ao gerente. Por mais de uma vez, ele já tentou me enrolar em
relação à conta das gorjetas e olha que nem eram tão altas como essa.
Penso de novo no homem que esteve aqui pela manhã. Ele falou que
tinha negócios para tratar na região e eu brinquei, mas falando sério agora,
não vejo como alguém tão bem vestido possa sequer saltar do carro nesse
bairro.
Aliás, pela limpeza dos seus sapatos, duvido até mesmo que ele já
tenha caminhado em uma rua alguma vez.
O pensamento me faz rir.
Claro que ele caminha, não é sua doida? A não ser que ele seja
alguma espécie de super-herói que tem o poder de voar.
Sério, a minha imaginação fértil às vezes surpreende a mim mesma.
Lembro do que ele disse sobre eu fazer faculdade.
Como contar a um completo estranho que qualquer sonho de estudar
foi esquecido para poder cuidar da saúde da minha mãe adotiva nos últimos
três anos e meio? E de qualquer modo, mesmo sem a doença, nós não
teríamos dinheiro para uma faculdade — talvez uma comunitária, como ele
sugeriu.
Quando descobrimos o câncer, eu nem pensei duas vezes antes de
deixar tudo de lado por ela. Se não fosse por mamãe Heloísa, eu
provavelmente teria sido criada em um orfanato até me tornar adulta ou
talvez até mesmo passasse por coisas piores. Nem todos os órfãos são
abençoados com uma boa família. Eu cresci rodeada de amor e bondade e
devo tudo o que sou a ela.
O nosso seguro saúde só cobria uma parte das despesas, de modo que
as economias foram usadas para custear a medicação, além de muitos
exames.
Quando a mamãe faleceu, eu não tinha nada. Nem mesmo amigos.
Os que fiz no segundo grau, desapareceram tão logo descobriram que
eu já não era uma companhia agradável. Eu vivia cansada porque queria fazer
os últimos dias dela nesse planeta aprazíveis. Nós duas sabíamos que não
seriam tantos assim. Os médicos foram muito sinceros desde o começo.
Eu usava o tempo livre para fazer brigadeiros e fornecer para uma
mercearia local. Brigadeiro é um doce típico do Brasil e eu vendia todos os
que produzia. O dinheiro era pouco, mas ajudava nas despesas.
Mamãe era uma cozinheira de mão cheia e embora meu talento não
chegue nem perto do dela, ainda assim dava para conseguir uma graninha
extra.
Eu sempretive muito orgulho dela. Sua história de vida é um exemplo
para qualquer um. Ela juntou dinheiro durante anos, ainda muito jovem e
veio do Brasil para cá, realizando o sonho de visitar os Estados Unidos. Com
apenas dois dias no país, conheceu um americano e se apaixonou. Eles se
casaram pouco tempo depois. 
Infelizmente, ficou viúva em menos de seis anos e ao invés de voltar
ao seu país, lutou e enfrentou as adversidades sozinha. Conseguiu se formar
como assistente social e passou a trabalhar na profissão. Ela tinha trinta e
dois anos quando eu apareci em sua vida.
As informações que me deu nunca chegaram nem perto de serem
suficientes para que eu pudesse desvendar as minhas origens. Tudo o que
sabíamos é que alguém me deixou embrulhada em uma manta rosa na porta
de um orfanato — um dos que mamãe Heloísa supervisionava — em um dia
de verão.
Não havia qualquer bilhete. Nada. Por isso, eu nem sei ao certo o dia
do meu aniversário. Presumiram que fui deixada lá com cerca de um mês, o
que significa que devo ter nascido em maio. Pelo que andei pesquisando
sobre signos, tenho mais características de gêmeos, então acho que sou do
fim de maio mesmo.
Depois que cresci, tentei fazer umas pesquisas na internet para ver se
encontrava algo sobre o meu passado, mas sem recursos e logo em seguida,
sem tempo também, já que passava o dia cuidando da minha mãe, acabei por
engavetar o projeto.
Nós duas sempre fomos próximas, mas em seus últimos anos de vida,
nos tornamos inseparáveis. Quando ela não estava cansada demais ou com
muita dor, contava sobre sua vida no Brasil e fiquei tão fascinada que disse a
ela que visitaria o país tão logo conseguisse dinheiro o suficiente.
Esse é o meu maior projeto depois que quitar as dívidas, apesar de ter
vários outros, que inclui voltar a estudar.
Quero ir ao Brasil, mais precisamente a Minas Gerais visitar a família
da minha mãe. Ela disse que eles moravam no interior do estado e eram
muito humildes, por isso nunca conseguiram juntar dinheiro para virem
visitá-la.
A vida de mamãe Heloísa também não era um mar de rosas em
termos econômicos e depois que me adotou, isso ficou ainda mais
complicado, então nós também nunca fomos ao seu país natal. Desse modo,
ela perdeu completamente o contato com seus parentes, mas prometi que os
procuraria um dia.
Gostaria de levar algumas fotografias da mamãe para eles e também
conhecer os lugares dos quais ela falou. Pode parecer loucura, mas de tanto
ouvi-la contando histórias, sinto como se a cidade dela fosse um pouco minha
também.
Solto o avental e olho o relógio em meu pulso, pensando se daria
tempo de tomar um banho antes do turno da noite.
Hoje trabalharei até as duas da manhã, além dos turnos que fiz
durante o dia — um deles para cobrir Janice, uma colega que está resfriada.
Estou morta, mas essas gorjetas de sexta me ajudam muito a pagar o aluguel
do quartinho em que estou morando.
Esse já é o meu terceiro emprego nesse período — mas o primeiro
para um estabelecimento, já que os outros eram bicos — e o que melhor
pagou até agora.
Tenho pensado, no entanto, em me inscrever para trabalhar no
Starbucks porque lá os turnos são mais razoáveis e o salário pago por hora,
mais de o dobro do que ganho aqui. Por outro lado, perderei as gorjetas de
sexta e sábado à noite, então preciso pensar com cuidado no que fazer.
Decido realmente pelo banho, porque além de não gostar de ficar de
vestido quando trabalho à noite, já que há música ao vivo e venda de álcool
liberada e alguns clientes tendem a se empolgar após algumas doses,
facilitará minha vida ao fim do turno. Poderei ir embora rapidamente.
De todas as coisas que o mister delícia disse hoje cedo, a mais certa é
que essa região não é segura à noite, mas eu nunca senti medo já que fica a
apenas dois quarteirões de caminhada do meu apartamento.
Estou quase entrando no banheiro quando ouço a voz do gerente me
chamar.
— Olívia, preciso de você aqui.
Tento segurar a sensação de enjoo que me dá a cada vez que tenho
que interagir com ele. Se há algo que eu não gosto no trabalho noturno é o
fato de que preciso ficar sozinha com Thomas antes que os clientes cheguem.
Ele sempre me deixa desconfortável.
Thomas é apenas dois anos mais velho do que eu, mas no início
tentou bancar meu protetor. Quando refutei seus avanços, o aparente interesse
se transformou em antipatia imediata. Ele agora implica com qualquer coisa
que eu faça e depois de ficar de pé servindo café por oito horas, não me culpe
por não me sentir animada em ter que enfrentá-lo.
No entanto, antes que eu possa voltar para o salão principal do
restaurante, ele está de pé a minha frente. Tento encará-lo sem demonstrar
medo, mas a verdade é que seu tamanho aliado à personalidade um tanto
bizarra, sempre me causou mal-estar.
Seus avanços nunca fizeram com que eu me sentisse fisicamente
ameaçada, apesar de que precisei ser bem explícita ao afastá-lo.
Ele é ex-jogador de futebol americano do ensino médio e age como se
ainda estivesse em campo, com todas as fãs adorando-o.
Quando percebeu que eu estava imune ao seu charme, tanto porque
nunca me senti atraída mesmo quanto pelo fato de que ele tem uma esposa
muito grávida esperando por ele em casa, passou a fazer tudo ao seu alcance
para falar mal do meu trabalho.
— Quarenta e oito dólares e quinze centavos de gorjeta de um único
cliente? Você acha que sou burro? — Ele pergunta, balançando o caderninho
de registro do restaurante onde os funcionários são obrigados a anotar as
gorjetas de cada mesa.
Aqui as gorjetas não são divididas. Cada um recebe de acordo com as
mesas que atendeu.
Olho para ele pensando que se eu responder sua pergunta com
sinceridade, serei mandada embora na hora, então decido contornar a
situação.
— O valor é esse mesmo. Acredito que o senhor já tenha feito as
contas no caixa e conferido que está tudo certinho.
Optei por chamá-lo de senhor desde o começo para manter uma
distância clara entre nós.
— Já sim, mas não acredito nelas. Quero saber o que você ofereceu
além do café para receber uma gorjeta tão alta.
Sinto minhas bochechas esquentarem porque levo menos de cinco
segundos para entender o que está insinuando.
Ele vem para mais perto e invade o meu espaço pessoal. Pela primeira
vez desde que o conheço, fico com medo.
Capítulo 5
Olívia
 
— Eu vou pedir educadamente para que você dê dois passos para trás.
— É mesmo? E o que fará se eu não der?
— Você está invadindo meu espaço pessoal.
— Tanto quanto o cliente da manhã?
— Então você sabe quem foi que me deixou a gorjeta.
— Claro que sei. Eu sempre desconfiei que você era uma vadia
escondida em um disfarce de boa menina. Um homem como aquele não dá
dinheiro para uma ninguém como você sem um motivo.
Sinto o estômago embrulhar, ao mesmo tempo que tenho a
confirmação de que ele é tão desprezível quanto eu sempre desconfiei.
— Se você viu as filmagens, sabe que não aconteceu nada, a não ser o
tratamento regular que dou a todos os clientes. Agora vou pedir outra vez que
se afaste de mim. Isso viola todas as regras trabalhistas. Estou me sentindo
assediada.
Eu espero de coração que trazer para o homem de olhar insano o bom
senso e fazer com que ele se lembre de que a nossa relação é puramente de
trabalho, me dê espaço o suficiente para sair correndo, mas preciso apenas
olhar em seus olhos para entender que não funcionará.
Não quero demonstrar medo, mas a verdade é que estou apavorada.
— Eu assisti quase todas as filmagens, mas sabe perfeitamente que o
que aconteceu na entrada da cozinha eu não teria como ver. Não temos
câmeras aqui.
Eu nem me preocupo mais com suas insinuações de que me vendi por
dinheiro. O que capto imediatamente é o fato dele dizer que não temos
câmeras na entrada da cozinha, que é exatamente onde estamos agora. Se ele
fizer algo comigo, não ficará registrado.
Tentando respirar para me acalmar, olho por cima do seu ombro para
o relógio na parede e perceboque já está na hora dos primeiros clientes
chegarem, mas antes que eu possa aproveitar a sensação de alívio, ele torce
meu braço para trás. Thomas está tão perto que sinto seu hálito.
— Solte-me. Você só pode estar louco. Não faça nada que vá se
arrepender. Você vai ser pai em poucos meses.
Lembra do que eu falei sobre nervosismo? Eu falo sem parar tentando
desesperadamente argumentar para que volte à realidade, mas ele somente se
aproxima ainda mais.
— Você é daquelas que lutam? — Ele pergunta, debochando ao
mesmo tempo que agarra um dos meus seios.
— Pode apostar sua vida nisso, idiota.
Com a mão livre, pego uma panela na prateleira e com toda a força
que possuo, bato-a em seu rosto. Espero que aquilo vá desacordá-lo, mas só
faz com que solte meu braço. Ele ainda continua de pé.
Esquecida de todos os meus pertences, corro até a porta, mas ainda
nem alcancei a maçaneta e sinto sua mão agarrar meu cabelo por trás com
tanta força, que tenho certeza de que arrancou um punhado deles.
— O que está acontecendo aqui?
Quase choro de alívio quando vejo um policial, que é um dos meus
clientes da manhã entrar, mas o consolo é novamente substituído pelo pânico
quando escuto o que Thomas diz em seguida.
— Ela roubou dinheiro do caixa.
— Isso é mentira. Ajude-me. Ele estava tentando me tocar contra a
minha vontade. — Disparo nervosa para caramba.
— Não importa o que você diz que ela fez. Solte-a. — O policial
comanda e coloca a mão no coldre onde está sua arma.
Thomas hesita por um instante e a dor na minha cabeça é intensa, mas
quando por fim o obedece, praticamente me empurra, fazendo com que eu
perca o equilíbrio.
— O que aconteceu, Olívia? — O policial pergunta.
— Ele me acusou de fazer favores... huh.... sexuais a um cliente em
troca de uma gorjeta alta e a seguir tentou me agarrar.
— Sua vadia mentirosa. Eu vou acabar com a sua vida. Ela está
mentindo. Pode olhar as câmeras. Ela ficou alguns minutos pela manhã com
um cliente na porta da cozinha. Se não foram favores sexuais, provavelmente
roubou o pobre coitado.
— Ah, fique tranquilo. Eu olharei as câmeras. Principalmente essa
última parte da noite em que você perseguiu uma funcionária até a porta,
aplicando força física para tentar detê-la.
— Elas estão desligadas no momento, infelizmente. — Thomas
responde.
Ouvir aquilo me dá a certeza de que preciso sair daqui. Ele sabia o
que estava fazendo ao me confrontar e agora percebo que já tinha más
intenções desde o começo.
— Você está fora, Olívia. Pegue suas coisas e rua.
— Eu posso prestar queixa por assédio? — Pergunto ao policial,
porque de qualquer modo eu já não ficaria mesmo. Como poderia voltar a me
sentir segura com aquele louco por perto?
— Você perdeu o juízo? Se fizer isso, eu vou acusá-la de furto!
— Sim, pode. — O policial responde, ignorando-o. — Precisa que eu
a acompanhe até os fundos da loja, menina?
— Se o senhor puder vir comigo, eu agradeço sim.
Estou fazendo o meu melhor para demonstrar força, mas meu corpo
treme tanto que tenho a sensação de que vou dobrar ao meio. Quando
chegamos à entrada do banheiro dos funcionários, o policial volta a falar.
— Olívia, é a primeira vez que isso acontece?
— Sim. Dessa maneira, sim. Antes ele só fazia insinuações que me
deixavam desconfortável.
— Presumo que você não queira ir até a delegacia hoje.
Balanço a cabeça negando.
A única coisa que desejo é ir para a segurança da minha casa.
— Se decidir mesmo fazer uma ocorrência, basta me procurar. — Ele
fala, me entregando um cartão. — Eu estarei lá depois de amanhã ou se
quiser ir amanhã mesmo, deixarei uma colega minha avisada.
— Muito obrigada. Você poderia me esperar um instante enquanto
troco de roupa? Esse uniforme é do restaurante e não quero ser acusada de
roubar mais nada.
— Claro, filha. Estarei aguardando.
Cinco minutos depois, saio com meu jeans surrado e uma camiseta.
Paro em frente ao balcão, esperando o pagamento.
— Eu não vou pagar o dia de hoje.
Antes que eu possa responder, o policial intervém.
— Vai sim ou então terei que levá-lo para dormir em nosso hotel. — 
Diz com ironia.
Thomas ainda tenta mostrar arrogância, mas vejo que fica com medo.
— Aqui está, mas isso não ficará assim. Tenho certeza de que essas
contas estão erradas e vou provar isso.
Eu não respondo.
Estou com uma mistura de sentimentos tão grande dentro de mim que
tudo o que quero é ir embora.
 
 
O policial se ofereceu para caminhar comigo até onde moro, mas eu
só desejava ficar sozinha e quando finalmente entro em meu quartinho e
fecho a porta, deixo as lágrimas que segurei por quase meia hora escaparem.
Como um dia que começou tão bom pode ter se transformado nesse
pesadelo?
E agora? O que vou fazer?
Ainda tenho muitas dívidas para pagar, além de precisar comer e de
um teto sobre a cabeça.
As minhas economias são ridículas. O que não era destinado ao
aluguel, comidas ou as dívidas com os bancos, eu juntava para a minha
viagem dos sonhos — que somavam até agora exatos trinta e cinco dólares
como poupança. 
Ninguém vai conseguir me impedir de sonhar, mesmo que no fundo
eu saiba que esses planos estão a anos luz da minha realidade. Pesquisei
muito. A passagem mais em conta para o Brasil custa por volta de mil dólares
e ainda haveria todas as despesas com comida e hospedagem.
Assim, a expressão viagem dos sonhos é um nome perfeito porque se
antes o único dinheiro que guardava para ela vinha das gorjetas da noite,
agora o pobre cofrinho de sapo rapidamente será esvaziado para que eu
consiga sobreviver.
Secando os olhos, levanto-me e vou para o chuveiro.
— Desculpe, mamãe. Ainda não foi dessa vez. Teremos que adiar os
nossos planos.
Capítulo 6
Guillermo
 
No dia seguinte
 
— Meu filho, você tem certeza disso?
Estou sentado no quarto dos meus pais, mais precisamente em sua
cama, quando minha mãe, que mantém Nina no colo, faz a pergunta. Sei que
ela não está tentando se intrometer, mas só fazendo o que sempre fez:
cuidando dos seus filhos — e eu faço parte do pacote.
— Não, mas eu preciso tentar por Valentina, mamãe.
— E se a garota for como Layla?
— Não é. Eu não sei nada sobre ela, além do que o relatório
preliminar apontou e a visita rápida à cafeteria, mas ela e Layla não poderiam
ser mais diferentes no temperamento.
Penso novamente na moça sorridente e atrapalhada.
Pelo que o detetive descobriu, sua vida está longe de ser fácil, mas
ainda assim, ela irradia alegria em cada célula daquele corpo pequeno e sexy.
— Mãe, esse assunto deve ficar somente entre nós. Não quero discuti-
lo com os rapazes antes de tomar uma decisão.
— Que tipo de decisão?
— Estou pensando em trazê-la para perto. A menina está sozinha.
Eu ainda não quero contar a ela os meus planos. Foi a maneira que
imaginei, tanto de reparar uma injustiça, quanto de, dependendo de quem for
verdadeiramente Olívia Freitas, permitir que conviva com a minha Nina.
— Cuidado, filho. As aparências podem enganar. Sua avó tinha um
ditado: quando um homem se sente muito protetor em relação a uma mulher,
ele é quem precisa ser protegido.
— Por que você está tão relutante sobre isso, quando sempre deu as
boas-vindas a quem precisava de nós?
— Porque eu não quero que se decepcione achando que fará algo bom
para nossa Nina e que no fim, talvez possa ser ainda mais prejudicial.
— Eu pensei sobre isso e a princípio vou lhe oferecer um emprego na
sede. Assim poderei ficar de olho nela.
— Tudo bem. Eu tenho certeza de que você não mudará de ideia,
independente do que eu diga.
— A quem será que eu puxei, teimoso assim?
— Ao seu pai, claro.
Ela sorri quando diz isso e olha amorosamente para o marido. Eu
seguro a mão do meu pai, que no momento está fria e inerte.
Olho para o homem que junto com dona Isabel Oviedo, também
conhecida como minha mãe, é o meu alicerce. Ele está dormindo, então posso
avaliá-lo sem que perceba. Procuro agir normalmente, mas a cada vez que
vejo papai incapacitado em cima de uma cama, sinto umabola de ferro no
estômago.
Stewart Caldwell sempre foi uma pessoa ativa, cheia de vida, o dono
do mundo. Quando ele teve o primeiro AVC foi um choque para a família,
mas minha mãe trabalhou incansavelmente em sua recuperação.
Eu, por minha vez, não tive tempo para sofrer. Precisei cuidar dos
negócios. Em minha cabeça, achei que seria temporário.
Depois de dez anos, não me sobra tempo para mais nada. Eu trabalho
feito um louco e a partir do nascimento de Nina, minhas horas livres são
todas dedicadas a ela.
— Eu vou fazer um teste, mamãe.
— Mas não contará nada a ela?
— Por enquanto, não. Vou me aproximar com uma oferta de trabalho.
Dali por diante, vamos ver o que acontece.
— Uma hora você precisará dizer a verdade. Independente dela ser
uma boa pessoa ou não, a moça tem o direito de saber tudo.
— E saberá, mas primeiro preciso decidir se ela pode estar perto de
Nina ou se somente receberá uma compensação financeira. Olívia é o único
vínculo materno com a minha filha. Acho que ambas merecem uma chance.
 
 
À noite
 
— E então princesa Nina, satisfeita com o dia de hoje?
Ela me encara com aquele sorriso babado e eu sinto meu coração
aquecer como sempre acontece. Claro que eu sabia que teria filhos um dia,
mas nunca imaginei que ao nascer, minha menina roubaria meu fôlego tão
depressa.
Desde que meu pai sofreu o primeiro acidente vascular cerebral, eu
não consegui dar uma pausa no trabalho. Não só pelo fato da nossa rede
hoteleira ser enorme, mas pela responsabilidade de manter a família no
caminho.
Meus pais formam aquele tipo de casal apaixonado mesmo depois de
muitos anos juntos e mamãe ficou sem chão quando ele precisou ser
internado, além da longa recuperação que se seguiu.
Quanto a mim, tive a missão de zelar pelos meus quatro irmãos mais
novos, Joaquín, Rafe, Gael e principalmente Martina, a caçula que acabará
me deixando de cabelos brancos antes dos quarenta anos. Ela estava com
apenas onze quando meu pai adoeceu.
Não estou reclamando. Família para mim sempre veio em primeiro
lugar, mas confesso que quando soube que Layla estava grávida, após
passado o susto inicial, encarei como mais uma responsabilidade a ser
acrescentada à minha lista, que já não era pequena.
Só que já durante a gestação, quando ela claramente rejeitava o bebê
que crescia dentro do seu corpo, um vínculo foi se formando entre mim e a
minha filha. Eu sentia necessidade de protegê-la e garantir que se
desenvolvesse de maneira saudável e essa foi uma das situações mais
assustadoras pelas quais já passei.
Como proteger alguém sem ter acesso direto a ela? Como cuidar do
bem-estar da minha menina quando ela estava abrigada no corpo de outra
pessoa e que dependia de que essa mesma pessoa tivesse uma vida saudável,
comesse, dormisse direito?
Eu não fazia a menor ideia, assim, agi da única maneira que pensei ser
possível: negociei como faço com tudo em minha vida.
Se há algo que aprendi desde que me tornei CEO da Caldwell-Oviedo
há quase dez anos, é que dinheiro é um dos maiores motivadores para as
pessoas.
— Grrrrrr….
Observo minha Valentina, que nesse momento tem os olhos
vermelhos de tanto esfregar.
Essa é a pista de que está com sono. Eu aprendi a decifrar todos os
sinais.
Ela herdou os mesmos cabelos ruivos da mãe e também os olhos
azuis, mas no temperamento não nega que é uma Oviedo. Nina não gosta de
ser contrariada e também é exigente em suas vontades.
Pego-a no colo e ando para o seu quarto, mas ao invés de colocá-la no
berço, levo-a para a cama que deveria ser a da babá e começo a mexer nos
fios de seda de seus cabelos.
Percebi que ela dorme mais rápido assim do que se eu a deitar no
berço imediatamente, principalmente nesses dias em que tem andado irritada
por conta do nascimento dos dentinhos.
— Tivemos um sábado e tanto, não foi? Você gostou de rever os
doidos dos seus tios? Eu acho que não falei ainda, mas a sua tia Martina está
voltando para casa no próximo mês.
Minha irmã, que mantinha um noivado com um príncipe de um
pequeno principado próximo à Itália, acaba de romper o compromisso e
voltará aos Estados Unidos após três anos fora.
Prevejo tempestade pelo caminho, mas não há nada que possamos
fazer além de apoiá-la.
— Acho que vocês duas se darão bem, mas não se espante com seu
jeito agitado. Com o tempo se acostumará.
Martina só esteve com Nina três vezes. Primeiro em seu nascimento, a
seguir na época da morte de Layla e há cerca de dois meses, no último AVC
de papai.
Ela me dá um sorriso sonolento, segurando meu dedo.
Eu estou perdido sobre como guiar nossa vida e essa não é uma
sensação agradável para mim.
Com a piora da saúde do meu pai, mamãe precisa descansar. Ao
mesmo tempo, me preocupa deixar Nina em uma creche em tempo integral.
Por melhor recomendada que seja, não fará o mesmo trabalho que alguém da
família.
Já tentei várias babás, mas como preciso que durmam no emprego,
tenho tido muitos problemas. Elas faltam, avisando somente em cima da hora
e as últimas duas insinuaram que estariam dispostas a oferecer serviços
extras, criando uma situação incômoda e insustentável.
Não sei a razão, mas algumas mulheres acham que o fato de eu ser
viúvo me torna um alvo perfeito, sonham em se tornar a próxima senhora
Oviedo. Com as últimas duas contratadas, não tive alternativa a não ser
despedi-las por conta dessas tentativas forçadas de intimidade.
Sobre mulheres que acham que estou atrás de um compromisso, não
poderiam estar mais equivocadas. A última coisa que desejo no momento é
um relacionamento a longo prazo. Uma experiência ruim foi mais do que o
suficiente. Se isso acontecer no futuro, analisarei não mais baseado em
atração física como aconteceu com Layla, mas com a razão.
Após colocar minha filha no berço e me certificar de que a babá
eletrônica está ligada, sigo para um banho rápido. Instantes depois, deito-me
na cama pensando em como tenho levado a minha vida sexual até aqui.
Não há muitas mudanças de como era antes de eu conhecer Layla.
Saio esporadicamente para jantar e transar, mas sem criar elos. Não
quero trazer para junto da minha filha alguém que não pretendo manter como
base permanente em minha vida. Já basta a rejeição que sofreu da mãe, que
nem mesmo ajudar a escolher seu nome, quis. Não submeterei minha
garotinha à parceiras temporárias.
Sem que eu planeje, minha mente volta à Olívia.
Aliás, isso tem sido algo recorrente desde que saí da cafeteria ontem
pela manhã.
Tudo o que li no relatório que chegou em meu e-mail agora à noite, só
confirmou o que atestei ontem com os meus próprios olhos.
Ela é uma menina bondosa e cheia de calor humano, mas um tanto
ingênua.
Olívia não tem ninguém e está cheia de dívidas. Foi evasiva quando
perguntei sobre seus estudos, mas agora sei por que não pôde ingressar em
uma faculdade: ela deve muito aos bancos por conta da doença prolongada da
mãe.
Disse que se pudesse estudar seria para se tornar uma chef doceira,
que os franceses chamam de Chef Pâtissière. São os chefes de cozinha
responsáveis pelas sobremesas nos restaurantes mais sofisticados. Cada hotel
de nossa rede emprega um.
Tento imaginar aquela força da natureza comandando uma cozinha e
sorrio. Eu pagaria um bom dinheiro para assistir sua performance. Aliás,
fiquei preso a tudo o que ela fazia desde a hora em que entrei na cafeteria.
Não consegui desviar o olhar.
Quando a procurei, apesar de já ter visto uma foto de rosto, não estava
preparado para o impacto que me causaria conhecê-la. Acho que esperava por
uma versão de Layla, só que de cabelos escuros, mas eu estava
completamente equivocado.
Minha falecida esposa era mais alta e também magra. Vivia obcecada
com a opinião das revistas que vigiam as socialites para saber se ganharam
peso, se têm celulite, coisas assim. Layla guiava sua existência em função da
própria imagem. Já Olívia, tem curvas sensacionais nos lugares certos. Ela é
perfeita e natural.
Também é uma coisinha doce e inquieta.
Pequena emcomparação à média das mulheres americanas — não
acredito que chegue a um metro e sessenta de altura. Apesar de fazer o tipo
mignon, é absolutamente proporcional, a não ser pelos seios.
Tento empurrar para o fundo da mente a maneira como o uniforme se
esticava em seus seios como se um — ou todos os botões — fossem abrir a
qualquer momento, mas não consigo.
Eu tenho uma coisa por seios grandes e os dela são cheios, para uma
mulher tão pequena. Seu corpo não atende aos padrões que a sociedade
estabelece como ideal, mas para mim é deliciosa. A cintura fina, os quadris
largos e o abdômen achatado fazem um contraste irresistível com os peitos
grandes.
Eu fiquei meio hipnotizado enquanto ela se movimentava ontem e
tentei muito ignorar o quanto é atraente, mas foi em vão. O cabelo castanho e
comprido, a pele clara e os enormes olhos azuis fazem com que se torne
impossível ficar indiferente.
Ela disse que trabalhava sexta e sábado à noite. Será que está em
algum turno hoje? Aquele bairro é muito perigoso, principalmente para uma
garota tão linda e jovem.
Preciso pensar em como ajudá-la até que possa decidir sobre uma
solução final.
No futuro terei que explicar como descobri sua existência e não estou
nem um pouco ansioso para este dia, porque sei que sofrerá, ainda mais
quando eu revelar a história inteira.
Quando resolvi ir atrás de Olívia, foi em primeiro lugar por Nina,
porque gostaria que a minha filha tivesse algum parente materno por perto.
Ainda assim, hesitei e decidi vê-la pessoalmente antes mesmo que o relatório
chegasse, porque se eu percebesse que era em qualquer sentido o mesmo tipo
de mulher que Layla, nunca chegaria perto de Valentina.
Agora, no entanto, minha preocupação com a garota é real. Com sua
segurança, quero dizer. Doce daquele jeito, ela é um alvo fácil para
cafajestes.
Decido que segunda-feira voltarei ao café.
Vou propor juntá-la ao time de funcionários da sede. Assim, ela estará
sob a minha proteção e de quebra terei a oportunidade de conhecê-la melhor
— por Valentina, claro. Vi pelo relatório que o seguro-saúde de onde ela está
trabalhando é muito precário. Juntando isso às suas dívidas, talvez se tiver
um bom incentivo financeiro, desista de continuar naquele lugar assustador.
Satisfeito por conseguir colocar meus problemas em perspectiva,
finalmente fecho os olhos, tentando relaxar.
Capítulo 7
Guillermo
 
Quatro dias depois
 
Não consegui vir antes como havia planejado. Uma série de
imprevistos fez com que eu tivesse que trabalhar de casa.
Além de Nina ainda estar enjoada por conta dos dentinhos, o estado
de saúde do meu pai necessitou de mais cuidados e a babá que costuma ficar
com ela na casa da minha mãe faltou. Não é fácil encontrar alguém de
confiança ou substituir um funcionário para cuidar do meu bem mais
precioso, de modo que meus planos de tirar Olívia da espelunca em que
trabalha tiveram que esperar.
Enquanto o motorista estaciona em frente à cafeteria de aspecto
decadente, tento me convencer de que estou fazendo o que é certo, apesar de
não agir com a prudência que normalmente me guia.
Quando se cresce com a quantidade de responsabilidades como eu
cresci, você precisa calcular cada passo, já que sua família depende de suas
decisões para não correr riscos.
Era como eu pretendia levar também minha relação com Olívia. O
único problema é que não consegui parar de pensar nela tendo que voltar para
casa nesse bairro à noite. Assim, ao invés de esperar para conhecê-la um
pouco melhor antes de me aproximar tanto, resolvi tomar uma atitude. Uma
parte de mim diz que ela viveu bem até agora sem qualquer ajuda, mas a
outra, aquela acostumada a cuidar das minhas responsabilidades, berra
exigindo que eu a tire desse bairro.
— Quer que eu o espere aqui, doutor Guillermo?
— Pare com isso.
Eu não costumo pedir por um motorista porque gosto de eu mesmo
dirigir, mas quando uso, solicito Simon. Ele trabalha para a minha mãe há
trinta anos, o que significa que me conheceu com cinco anos de idade.
Eu já falei mil vezes que não quero que me chame de doutor, mas ele
não dá a mínima para o que desejo. Simon só faz o que quer e é tão formal
quanto um mordomo inglês — o que vai totalmente na contramão da minha
família.
— Eu não me sinto bem em chamá-lo pelo primeiro nome.
— Pelo amor de Deus, você me levava ao parquinho. Por que
continua insistindo em usar títulos antes do meu nome?
Ele não responde e eu tenho certeza de que quando falar comigo da
próxima vez, usará o senhor ou doutor novamente e por enquanto, desisto de
nossa pequena batalha.
— Não acho que eu vá demorar, mas pode dar uma volta se quiser.
Ligo assim que tiver concluído.
Desço do carro e suspiro, mais uma vez aborrecido por ela trabalhar
aqui.
Eu ainda não consigo acreditar que mesmo sabendo quem ela era,
Layla permitiu que a garota continuasse a levar uma vida de sacrifícios. Essa
é só mais uma comprovação do quão egoísta e autocentrada foi a minha
falecida esposa.
Percebo as pessoas me encarando enquanto caminho pela calçada e
relembro das observações de Olívia quando vim aqui na semana anterior. Ela
tem um senso de humor um tanto distorcido, mas não posso negar que
mesmo contra a minha vontade, suas tiradas me divertiram.
Quando abro a porta, uma espécie de sino meio estridente toca e uma
garçonete de cabelos vermelhos me encara. A mulher tem um aspecto
cansado, como se já conhecesse o suficiente do mundo e o que viu até aqui
não a agradasse.
— Bom dia, senhor. Pode escolher uma mesa.
Apesar do que diz, seu olhar demonstra a mesma incredulidade que vi
no de Olívia da primeira vez em que estive aqui.
Fico momentaneamente em dúvida sobre como agir, porque eu
precisei de apenas uns poucos segundos para constatar que quem eu estou
procurando não se encontra no estabelecimento.
— Eu gostaria de falar com Olívia. — Finalmente me decido.
Ela larga o pano de prato com que estava secando um copo e seus
olhos arregalam de surpresa.
— Olívia? Tem certeza?
Seguro a irritação porque preciso dela para que entregue a informação
que desejo.
— Sim. Ela não se encontra no momento, pelo que noto. É sua folga?
— Olívia não trabalha mais aqui. Ela foi mandada embora.
Como assim não trabalha mais aqui? Passaram-se apenas poucos dias
desde que conversamos.
— Onde eu poderia encontrá-la?
— Foi Thomas quem o mandou? Você é da polícia?
Seu olhar de desconfiança e as informações desencontradas me
trazem duas certezas instantaneamente: ela é protetora em relação à Olívia e
esse tal Thomas tem alguma coisa a ver com a garota ter perdido o emprego.
— Eu não sou da polícia. Apenas um cliente regular. O que
aconteceu?
Ela dá de ombros parecendo incomodada e quase que
imperceptivelmente, olha para trás. Eu sigo o mesmo caminho e noto uma
câmera do tipo comum em estabelecimentos comerciais. 
A mulher provavelmente está com medo de que alguém ouça nossa
conversa.
— Você pode me dizer.
— O gerente a despediu. — Fala, um tom mais baixo do que
anteriormente. — Faz alguns dias já.
— Por quê?
— Ele a acusou de furtar dinheiro do caixa. Eu não estava aqui, mas
escutei a conversa de alguns clientes.
— Você acha que essa acusação tem fundamento?
Minha intuição diz que não. De tudo o que sei dela até aqui, Olívia
parece uma boa menina, mas preciso ter certeza.
— De jeito nenhum. Eu não sei o que aconteceu, mas o que quer que
tenha sido, ele mentiu.
— Onde posso encontrá-la? — Repito o que já havia perguntado
anteriormente.
— Quem é você?
— Alguém que deseja ajudá-la. Se você se preocupa com ela, deveria
me dizer como posso achá-la. Talvez eu lhe consiga um novo emprego.
— Que tipo de emprego?
Ao mesmo tempo que me deixa puto ser questionado, não tenho como
não admirar a lealdade da mulher.
— Algo parecido com o que ela fazia aqui. — Respondo para
tranquilizá-la, porque ela é totalmente transparente. Posso ver em seu rosto
exatamente o que estava pensando quanto ao tipo de emprego queeu tinha a
oferecer.
Por fim, parece convencida e depois de pegar um pedaço de papel
perto da caixa registradora, tira uma caneta do bolso do avental e desenha
algo.
— Eu não sei o número do edifício, mas fica bem perto daqui. Fiz um
mapa de como poderá chegar lá.
— Obrigado.
 
 
Eu achei que o lugar em que ela trabalhava era perigoso, mas nada se
compara ao prédio em que vive. Não há qualquer coisa de arrogante em meu
julgamento, é apenas uma questão de fato.
A área deve ser tenebrosa à noite e fico imaginando aquele pingo de
gente caminhando por essas ruas escuras em plena madrugada.
Há quanto tempo mora aqui? Será que desde que a mãe faleceu?
Essas informações não constavam do relatório.
Um mal-estar enorme se espalha por mim.
Claro que eu sei sobre as diferenças sociais, mas esse lugar está um
passo além da falta de segurança. Toda a fachada do edifício é descascada e
alguns vidros das janelas estão quebrados e colados com fita silver tape. Há
um senhor que deve ter pelo menos uns duzentos anos vestido com, ao que
parece, vários casacos sobrepostos, já que a magreza do seu rosto não condiz
com o volume do corpo.
Uma panela pequena, um ursinho de pelúcia, uma lanterna e vários
outros objetos estão presos em sua roupa. É como se ele fosse um brechó
ambulante. Fuma e olha para a rua de maneira entediada, um cachorro vira-
latas magro encontra-se aos seus pés.
Está bem na entrada do prédio e quando me aproximo, me encara
apesar de ainda parecer alheio.
— Uma ajuda para um velho cansado, doutor?
— Você conhece uma garota que mora nesse edifício? Ela tem os
cabelos longos e a pele muito clara.
— O senhor está falando da Branca de Neve. Olívia. O raio de sol.
Mais uma vez comprovo o que já havia percebido rapidamente no
primeiro dia em que a vi, assim como na interação que tive com a garota:
Olívia deixa seu rastro de fãs por onde quer que passe.
— Ela mesma.
— E o que eu ganho em troca? É uma informação valiosa, a que está
me pedindo.
Mais irritado do que costumo ser normalmente, puxo a carteira,
pegando uma nota de cem dólares.
Ao invés de entregá-la, no entanto, apenas aceno com ela em frente ao
seu rosto.
— Não me enrole. — Aviso, ao mesmo tempo que coloco um pé para
começar a subir as escadas do prédio.
— Sim, senhor. — Responde, parecendo subitamente desperto. —
Mas se quer encontrar a menina, não é dentro do prédio que a achará, mas ali.
Ele aponta para uma escada entulhada de caixas, que parece levar em
direção ao porão de algum lugar e justamente onde eu havia notado as janelas
quebradas.
Tento não demonstrar choque, mas acho que falho miseravelmente,
porque depois de pegar a nota de cem dólares da minha mão, ele dá de
ombros.
— Boston é uma cidade cara.
Eu não respondo, já começando a descer as escadas.
Apesar do mau cheiro e aspecto de filme de terror, percebo que não
há um pedaço de papel sequer no chão. A limpeza do lugar faz um contraste
enorme com o odor e ar de abandono. Quando por fim chego em frente a uma
porta com lascas de madeira se soltando e tão segura quanto um cadeado de
cofrinho infantil, hesito antes de bater.
Capítulo 8
Olívia
 
Fico tão chocada quando abro a porta que não consigo falar. Tenho
certeza de que a minha boca está aberta como um túnel.
Meu novo avatar para noites quentes — para as últimas três noites
quentes, para ser bem honesta — e também o responsável involuntariamente
por minha demissão, por sua vez, me encara de volta.
Levo poucos segundos para tomar consciência do que parecemos, das
diferenças entre nós. A vida real berrando e pedindo passagem em minhas
fantasias. Observo o terno negro tão bem cortado e limpo quanto da primeira
vez em que nos encontramos. O rosto duro e pouco amistoso. Você quase
pode cheirar o poder que vem dele.
No entanto, há uma outra coisa que faz meu rosto arder e não é a
percepção daquele homem lindo a poucos centímetros do meu corpo. Ele
agora já não olha em meus olhos, mas por cima do meu ombro e não tenho
dúvida do que consegue enxergar. Em meu espaço de apenas um cômodo, ele
não demoraria mais do que um minuto para vistoriar todo o local.
A pequena cama em um canto.
Um cabideiro aberto com os únicos dois casacos que possuo.
Minha mala que também serve de cômoda, um fogão elétrico portátil,
alguns mantimentos e o único artigo realmente de luxo que possuo: minha
adorada cafeteira De'Longhi, a qual eu juntei gorjetas por mais de três meses
para comprar e me dei de presente de aniversário atrasado.
Ah, também não posso esquecer meus livros já gastos de tanto serem
relidos.
Eu queria muito comprar um Kindle para poder pegar romances
gratuitos na Amazon, porque apesar de não ter internet em casa, na cafeteria
tinha, mas esse é apenas outro projeto a ser adiado. Depois de perder o
emprego, preciso juntar cada centavo para me manter e pagar o aluguel.
— Olívia.
Sinto as bochechas esquentarem para valer agora, ao compreender
que aquilo é real. O homem com cara de político bilionário está na porta da
minha casa.
— O que o senhor está fazendo aqui?
Eu não quero ser rude, mas nesse exato momento existem tantas
coisas diferentes passando por minha cabeça que não consigo ordená-las.
Infelizmente, nenhuma delas é muito agradável de pensar.
Considero que ele tanto pode ter vindo para dizer que deixou a gorjeta
por engano e como Thomas disse, realmente se sentiu roubado ou pior, que
queira algo em troca do dinheiro, apesar de não parecer ser esse tipo de
homem.
— Você não vai me convidar para entrar?
— Não.
Sua sobrancelha se ergue e me pergunto se ele já ouviu um não
alguma vez na vida.
— Por quê?
— Desculpe se estou sendo mal-educada, mas servi-lo na cafeteria
não faz do senhor meu amigo e eu não deixo clientes entrarem em minha
casa. Eu sequer sei o seu nome.
Noto seus olhos arregalarem em surpresa, mas ele se recupera rápido.
— Você está certa. Não deve deixar qualquer pessoa entrar.
Ele fala como se estivesse dando um tapinha nas costas de uma
criança, o que me irrita.
— Meu nome é Guillermo Oviedo. Eu tenho uma proposta de
trabalho para você. — Diz, sem esticar a mão para tentar me cumprimentar.
Eu fico em choque não só pelo sobrenome, mas também pelo que ele
acaba de falar. Os Oviedo são praticamente a realeza dos Estados Unidos,
apesar de eu só conhecer o rosto de dois deles: o do jogador de golfe, Rafe
Oviedo e o do ator, Gael.
Que tipo de proposta um homem vindo de uma família como a dele
poderia ter para mim?
Volto a analisá-lo sem chegar a uma conclusão.
Eu sou sem vivência, mas não idiota. Minha mãe me ensinou muito
bem a ter cautela quando estiver sozinha com um homem.
Na cafeteria eu me sentia relaxada porque achava que ninguém
tentaria fazer algo comigo à força — o que se provou um engano, depois do
ataque de Thomas — mas aqui em casa é diferente.
Ele é um total estranho e esse, o meu território.
— Que tipo de proposta? — Pergunto, desconfiada.
— Convide-me para entrar.
— Eu não acho que seria apropriado.
— Olívia, eu vim para ajudá-la. Você pode confiar em mim.
Muito mais do que as palavras, é o que vejo em seus olhos que bate o
martelo em definitivo.
Apesar da aura de riqueza evidente e de que mesmo falando baixo ele
consegue ser completamente intimidante, eu não me sinto ameaçada pelo
homem que agora sei se chamar Guillermo. Ainda assim, não enxergo um
motivo sequer para ele vir me procurar.
— O senhor está me oferecendo um emprego?
— Eu soube que perdeu sua posição na cafeteria. — Ele começa. —
O café que você me serviu naquele dia me impressionou muito. Eu gostaria
que viesse trabalhar para mim. Seu café tem um sabor único.
— Como uma espécie de copeira?
—Não, como uma assistente. Uma faz-tudo em meu escritório e
talvez também para alguns serviços fora de lá.
— E isso inclui preparar o seu café?
 Ele acena com a cabeça, concordando.
O homem soltou todas as informações de uma vez, como se estivesse
discutindo o cardápio do próximo almoço e não falando sobreuma Zé
Ninguém como eu ser convidada para trabalhar para um Oviedo.
— Se isso for algum tipo de brincadeira de mau gosto, eu não estou
no clima. — Despejo. — Como posso ter certeza de que é quem está falando?
Parecendo irritado pela primeira vez desde que chegou, ele procura
algo no bolso interno do casaco e vejo-o retirar de dentro de uma pequena
carteira de couro negro um cartão de visitas.
Sem graça, pego-o de sua mão quando ele me oferece e confiro
rapidamente o nome.
Guillermo Caldwell-Oviedo.
— Não sei o que pensar.
— Não entendi.
— Senhor, essas coisas não acontecem na vida real.
— Podemos conversar lá dentro? — Pede pela terceira vez e
desconfio que ele fez mais isso nessa manhã do que ao longo da vida.
Guillermo parece ser o tipo de homem que as pessoas obedecem com um
simples olhar.
— Sim. — Finalmente cedo, dando um passo para o lado.
Quando fecho a porta, indico para que sente na única cadeira
disponível. Vou até a minha cama e tomo tanta distância quanto o pequeno
aposento permite, acomodando-me também.
— O que não acontece na vida real?
— Hein?
— Você disse que essas coisas não acontecem na vida real.
Torço as mãos em meu colo.
— Senhor, se está aqui, já deve saber a razão que me fez ser demitida.
Mesmo assim veio e está me oferecendo um trabalho. Fadas-madrinhas
simplesmente não batem à minha porta resolvendo os meus problemas.
Assim que acabo de pronunciar as palavras, tenho vontade de morrer.
Nada poderia ser mais distante de Guillermo do que ser chamado de
uma fada.
O homem é de uma força e masculinidade hipnotizante. Não há um
grama de suavidade em seu corpo.
Olho para cima com medo de ter falado demais.
— Eu não quis ofendê-lo.
Seu rosto, por incrível que pareça, parece mais relaxado.
— Eu não estou me sentindo ofendido, apesar de nunca ter ganho um
apelido do tipo. — Diz. — Há quanto tempo você mora aqui? — Ele muda de
assunto, me pegando de surpresa.
— Eu não vou falar nada sobre a minha vida, antes que o senhor
explique direito sobre essa proposta.
— Justo. Eu quero contratá-la. E preciso que comece a trabalhar para
mim imediatamente.
Capítulo 9
Guillermo
 
— Juro para o senhor que eu não sou lenta, mas a minha cabeça está
uma confusão.
Tento esvaziar a mente de qualquer coisa que não seja a oferta de
emprego e da vontade de testar uma aproximação entre Olívia e Nina, mas é
difícil ficar indiferente a ela. Olívia é muito mais bonita do que eu havia me
permitido admitir da primeira vez em que nos vimos.
Ela veste um tipo de calça de ginástica justa preta e um casaco de
moletom que parece da época do colégio, se eu for levar em conta o quanto
desenha o contorno dos seios generosos. O que deveria ser uma roupa casual,
nela fica sexy.
O rosto não tem maquiagem, assim como quando nos encontramos na
cafeteria, mas a pele clara faz com que os enormes olhos azuis saltem. O
cabelo castanho, está solto. Seu rosto parece uma pintura que foi feita
pedacinho por pedacinho em uma combinação harmoniosa.
Como tudo em minha vida, meu desejo também é mantido sob
controle, direcionado quando eu quero me satisfazer, mas Olívia desperta
uma vontade de tocá-la quase irrefreável. De sentir se sua pele é quente como
sua personalidade, apesar de no momento eu ter certeza de que está muito
desconfiada das razões de eu estar aqui.
A maior piada de mau gosto do mundo é que a mulher que está
enlouquecendo a minha libido é a única que eu nem deveria pensar em ter.
Ninguém precisa me dizer que esse seria um grande erro, mas o que
sei que é o certo a ser feito — manter uma distância segura — e o que desejo,
são coisas completamente diferentes.
Ela por sua vez, ainda parece arisca.
Inicialmente sua relutância me irritou, mas agora fico satisfeito que
seja cautelosa ao redor de estranhos.
Quando cheguei, o lugar em que mora já me deixou negativamente
impressionado, mas agora, depois que permitiu que eu entrasse, tenho certeza
de que não deixarei que continue aqui.
Eu não estou querendo ser esnobe, mas ela não tem sequer o básico.
A menina vive na mais absoluta pobreza. Eu acho que tudo o que
possui, até onde posso ver, exceto a cama e a cadeira em que estou sentado,
deve caber em uma mala de tamanho médio.
Lembro da maneira alegre com que ela me atendeu na cafeteria e me
pergunto como uma garota absolutamente sozinha no mundo e vivendo assim
ainda consegue encontrar motivos para sorrir.
Como deve ser morar nesse quartinho quando neva? O lugar não tem
um sistema de aquecimento e não estou sentindo calor mesmo com o terno —
e estamos no verão. Os invernos em Boston são rigorosos. A temperatura
agora está agradável, mas quando os dias frios chegarem, não há maneira de
que ela possa viver nesse porão sem pegar uma pneumonia.
— Senhor?
Vejo confusão em seu rosto e me obrigo a falar.
— Eu quero que venha trabalhar pra mim. Não sou nada nem
parecido com uma fada-madrinha. Como disse assim que cheguei, fiquei
impressionado com a maneira como preparou o café. Você falou naquele dia
que poderia fazer melhor se tivesse à disposição matéria-prima adequada.
Pois bem, eu gostaria que viesse prepará-lo com exclusividade em meu
escritório.
Agora seus olhos estão arregalados e a boca, aberta.
Ótimo.
Melhor maneira de vencer um acordo é pegar o oponente
desprevenido.
— O senhor se deu ao trabalho de vir atrás de mim por causa de um
café?
— Eu sempre busco a excelência, Olívia e nunca bebi nada nem
parecido com o café que você me ofereceu naquele dia.
Essa parte é verdade. Todo o mais, eu acabei de criar assim que
percebi o quanto ela parecia desconfiada das minhas intenções.
— Esse trabalho que está me oferecendo seria em uma base
temporária?
— Não, mas tudo dependerá do seu desempenho.
O que é verdade, de uma certa maneira. Vai depender se a companhia
dela fará bem à minha filha.
Decido que uma aproximação aos poucos com Nina, talvez seja a
melhor opção.
— Inclusive no futuro você pode ensinar os funcionários das cozinhas
dos nossos hotéis. — Completo, porque ela ainda parece incrédula. — Se eu
ficar satisfeito com os seus serviços, não a deixaria mais ir.
Opa, de onde diabos tirei essa declaração?
— O que me diz? — Pergunto porque seu rosto todo reflete dúvida.
Ela olha para as mãos em seu colo, ainda relutante.
— Desculpe-me, mas é quase bom demais para ser verdade.
De novo, concluo que foi muito bem criada. A despeito da
personalidade esfuziante e de parecer ser uma menina naturalmente feliz, há
nela uma maturidade ao tomar decisões que me agrada demais.
— Você precisará se mudar também. — Resolvo colocar todas as
cartas na mesa de uma vez só e finalmente ela levanta a cabeça para me
encarar.
— Como assim me mudar?
— O hotel onde localiza-se o meu escritório e no qual trabalhará fica
a pelo menos quarenta minutos daqui, de carro, em um trânsito razoável.
Você teria que sair de madrugada todos os dias para chegar lá a tempo.
— Qual é o nome desse hotel?
— Você ficará na sede: Caldwell-Oviedo Tower.
Seus olhos arregalam ainda mais.
— Mas eu não tenho dinheiro para pagar um aluguel naquele bairro.
— Isso não será um problema. Nós temos uma ala para funcionários
que às vezes precisam pernoitar por lá. Vou providenciar para que seja
preparado um quarto permanente para você. Não se preocupe. Terá toda a
privacidade que necessita.
Sua expressão desconfiada retorna.
— Só para o caso remoto de que esteja oferecendo mais do que o
emprego….
Antes que ela conclua a frase, eu corto-a.
— Não estou. Não há qualquer interesse além de trazê-la para a minha
equipe. — Minto duplamente.
Em parte, porque a oferta de emprego não foi o que me fez vir atrás
dela e sim o fato de ter um laço sanguíneo com a minha filha, em parte
porque se o cenário fosse outro, eu pagaria para ver onde levaria a atração
física que Olívia me desperta.
— Desculpe-me. — Diz balançando a cabeça. — Eu só queria ter
certeza. Tive um problema desse tipo em meu último emprego.
— Fale-me sobre isso.
— Por

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