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RESENHA ESTUDOS SOBRE HISTERIA Estudos sobre Histeria, obra de Sigmund Freud em coautoria com Josef Breuer, foi lançada em 1895, mas o primeiro capitulo é a reprodução de um artigo publicado em 1893 escrito por ambos os autores, junto ao acréscimo de observações clínicas. A obra foi dividida em: Comunicação Preliminar (Sobre O Mecanismo Psíquico Dos Fenômenos Histéricos), Casos Clínicos – um de Breuer e o restante de Freud, Considerações Teóricas e A Psicoterapia Da Histeria. Ainda durante o prefácio a primeira edição é alertado ao leitor que poderão haver opiniões diversas, pois apesar dos dois autores concordarem com os fatos e pontos de vistas básicos da histeria, suas interpretações e suposições nem sempre coincidem. Ao decorrer do livro, vários conceitos e aspectos são apresentados. Um dos conceitos mais debatidos logo no começo é a origem do sintoma histérico. Segundo o texto, os sintomas histéricos são oriundos das memórias traumáticas, ou seja, lembranças de um trauma vivido no passado, especialmente na infância, que não foram ab-reagidas. Ou seja, em determinado momento o sujeito passa por determinada situação que exigia uma reação intensa, porém, por algum motivo não reagiu, gerando um estado de atordoamento intenso e a memória dessa situação é suprimida, no entanto, os afetos relacionados a essa memória continuam presentes, dessa forma, quando algo relacionado a situação acontece, os sintomas vêm à tona. Ao passar do tempo, os fatos relacionados ao trauma inicial são também suprimidos, gerando uma rede cada vez maior de associação. O conceito de trauma já era trabalho por Charcot, mas Freud sofistica essa noção criando a categoria de trauma psíquico, ou seja, o trauma passa do âmbito apenas corporal para o âmbito da alma também. E existe uma relação simbólica entre o trauma psíquico e o sintoma histérico, ou seja, o corpo expressa aquilo que o trauma suprime através do sintoma. Isso ocorre porque a histérica consegue bloquear o pensamento da memória traumática, mas não consegue controlar a forma do corpo expressar a energia relacionada ao trauma psíquico. Outra diferenciação entre Freud e Charcot é que Charcot acreditava haver um único trauma desencadeador de uma Grande Histeria, já Freud afirma que o trauma psíquico consiste em várias memórias traumáticas que desenvolvem uma sintomatologia própria de cada histérico, ou seja, uma “constelação traumática”. Freud sinaliza ainda que a infância é a zona de constituição das memórias traumáticas. Seguindo os pressupostos de Janet sobre a divisão da mente, ou seja, “condição segunda da consciência”, é feita então uma cisão do indivíduo entre aquilo que é consciente e aquilo que não é consciente. Segundo os autores, existem os estados hipnoides, ou seja, estado de relaxamento, no qual os conteúdos da consciência não parecem estar em associação com a restante vida mental, tendo, pois, lugar a formação de grupos de associações separados da vida mental, ou seja, associação de ideias entre si que fazem parte daquilo que não é consciente e pode ser gerado por pré-disposição genética ou por um trauma psíquico. Como as memórias são suprimidas, não é possível ter acesso as memórias traumáticas através da consciência, os autores afirmam a princípio que é preciso hipnotizar o paciente para poder acessar tais memórias. Vale ressaltar que, apesar da paciente não lembrar qual é o trauma psíquico que a afeta, este serve como um “agente estranho” em seu corpo que guia o sujeito sem que ele perceba. A terapêutica hipnótica utilizada ao decorrer do livro consiste na utilização da hipnose para trazer à tona o afeto do trauma inicial para ab-reação, ou seja, a paciente fala/expressa sobre memórias carregadas de afeto e que acordada não tem acesso para liberar o afeto através da fala, tentando elaborar, ou seja, distribuir a intensidade do afeto em diversas representações para minimizar a intensidade do afeto e não o expressar através do corpo – sintoma. O primeiro caso clínico é o de Anna O, paciente de Breuer. Ela foi tratada entre os anos de 1881 e 1882. Ela tinha sintomas muito peculiares, que eram delírios de perseguição e dores corporais e tinha também o sintoma de reviver os traumas que ocorreram nela no mesmo período (mesmo dia e mês ao decorrer dos anos). O tratamento realizado foi através do método catártico, que consistia em deixar o paciente sobre hipnose e buscar a verdade do seu sintoma, ou seja, quando foi que ele surgiu. Segundo Breuer, a histeria da paciente foi causada graças ao hábito de ficar devaneando, lendo livros e se imaginando nas histórias e um outro fator desencadeador foi a morte de seu pai, elemento muito comum entre os autores. Como Anna O apresentava seus delírios ao fim da tarde, Breuer ia sempre ouvi-la falar durante a noite, com o passar do tempo a paciente melhorou e chamou esse processo de fala/escuta de limpeza pela chaminé, o que ficou conhecido posteriormente como “The Talking Cure”, ou seja, a cura pela palavra. A medida que falamos da cura pela palavra, nos aproximamos do método catártico, ou seja, um afeto está aprisionado dentro de mim e ao falar, a fala se torna terapêutica. Já Emmy von N, foi a primeira paciente de Freud a ser tratada pelo método catártico “extensivamente”. Ela apresentava quadros conversivos, muitas dores, um “tique” na voz, tinha muitos medos. O Freud a tratou através do método catártico, com hipnose e sugestão, pressões na testa, massagens e hidroterapia. A paciente ficou bastante conhecida por pedir a Freud que não a interrompesse, que a deixasse falar livremente, o que influenciou, de certa forma, o inicio da formulação para o uso da associação livre. Os casos clínicos serviam como “laboratório” para Freud, conforme o que é dito pelo paciente vai sustentando sua tese. Emmy von N foi quem trouxe a Freud que a origem da sua doença está nas lembranças da primeira infância através dos relatos trazidos durante as sessões, ajudando-o a sustentar a ideia do autor de que a infância é a zona de constituição das memórias traumáticas. Foi ela ainda quem começou a usar a conversa com Freud para reelaborar o pensamento. Freud realiza ainda uma análise dos sintomas complexos categorizando o sintoma a sua origem transformando-os em sintomas simples. Além de Emmy von N, foram apresentados os casos de Lucy R. e Katharina, por último foi apresentado o caso clínico de Elizabeth Von R, considerado por alguns críticos como o caso que mais se assemelha a psicanalise atual. Ela sofria de conversões histéricas, Freud divide a origem da doença em dois traumas: morte do pai e a morte da irmã. Do ponto de vista técnico, foi uma paciente que não apresentou resultados com a hipnose, então Freud abandonou de vez o uso da hipnose, a sugestão havia diminuído, mas ainda utilizava a imposição das mãos na testa, o método ainda continuava sendo o catártico. Freud afirma que a paciente se apaixonou pelo cunhado e frente a morte da irmã acabou desenvolvendo uma série de problemas e sintomas por a partir de então estar “livre” para desposar o cunhado e isso ter gerado nela um conflito moral e culpa pela morte da irmã. Fica evidentemente explicito nesse caso, o impacto da sexualidade no desencadeamento da histeria. O livro traz ainda, entre outros conceitos não citados nessa resenha, o conceito de resistência. Segundo Freud, conforme você vai avançando com o tratamento, o paciente vai resistindo ao tratamento, porque quando vai chegando ao núcleo do recalcado, o sujeito tende a resistir, já que se trata de algo extremamente desconfortável para o paciente. Freud traz ainda a noção de transferência, afirmando que o paciente tende a reviver os seus traumas do passado com a sua relação com o analista e que é necessário que se interprete esta relação transferencial com paciente para que o tratamento seja eficaz. Dessa forma, o que o paciente diz sobre seus traumas, ele vive durante a transferência, possibilitando verificação e interpretação,o que não pode acontecer no método catártico, já que trata de um trauma vivido no passado. A obra já apresenta muitos conceitos que posteriormente serão atualizados e tratados por Freud, como por exemplo as questões relacionadas ao processo do trauma psíquico e a relevância da infância e da sexualidade - o trauma já é bem trabalhado ao decorrer do texto, mas a infância e a sexualidade são melhor identificadas através dos relatos dos casos clínicos, mas de maneira mais contida, uma possível explicação é o fato de ser uma obra de coautoria, então a escrita de Freud acaba sendo um tanto limitada para as questões relacionadas a sexualidade. A linguagem do livro exige concentração para ser bem entendida, mas se feita com atenção é bastante fluída e proporciona bastante conhecimento na área tratada. Apesar de ser considerada por algumas pessoas como a obra que dá início à psicanálise, mas foi utilizado durante a obra o método catártico e Freud ressalta bastante, durante seus relatos sobre seus métodos terapêuticos e teorias psicológicas que publicou após o lançamento do livro Estudos sobre a Histeria, as diferenças entre a psicanálise e o método catártico – as inovações técnicas, suas descobertas para as outras neuroses além da histérica, o estabelecimento da noção de defesa, a ênfase numa etiologia sexual. Apesar desse esforço para diferenciação entre o método catártico e a psicanálise, Freud recomenda no prefácio da segunda edição do Estudos sobre Histeria que para que haja um entendimento eficaz da transição entre a catarse e a psicanálise, os leitores iniciem sua leitura das obras freudianas pelo livro aqui tratado, salientando a importância da obra para o entendimento e construção da psicanálise.
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