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Necrose Necrose significa morte celular ocorrida em organismo vivo e seguido de autólise. É a morte celular irreversível. Pode atingir células isoladas, áreas de um tecido ou órgãos inteiros. Embora não exista qualquer ponto de corte bem estabelecido no qual as adaptações celulares falhem e a lesão celular se torne irreversível, os mecanismos moleculares envolvidos na lesão celular e as alterações celulares histologicamente detectáveis associadas estão bem definidos Para haver morte celular, essas quatro vias vão estar alteradas: As quatro vias estão inter-relacionadas, então a falha em qualquer uma delas irá levar, em última análise, a falha das outras. Por exemplo, um paciente com traumatismo + hemorragia, apresentará consequentemente queda da pressão arterial, reduzindo a chegada de sangue nos órgãos. Um dos lugares afetados são os túbulos renais (redução da perfusão dos túbulos renais), havendo uma isquemia local. As células tubulares renais dependem do metabolismo oxidativo, e a isquemia afeta a produção de ATP e consequentemente o funcionamento da bomba sódio/potássio, havendo então um influxo de sódio e água para o interior das células epiteliais tubulares – edema celular. Isso pode ser reversível com a restauração rápida da perfusão e a manutenção do citoesqueleto intacto. Mas, se a isquemia continua até ocorrer perda ou dano ao núcleo, já é um sinal de lesão celular irreversível, havendo a morte celular. Macroscopicamente, a necrose tem aspecto particular conforme a sua natureza. A região de necrose isquêmica em órgãos com circulação terminal adquire coloração esbranquiçada e torna-se tumefeita, fazendo saliência na superfície do órgão ou na superfície de corte. Além disso, há a ausência de núcleos. Na necrose, com a perda da integridade da membrana, há um extravasamento dos conteúdos celulares, seja do núcleo, das organelas, etc. O lisossomo, quando tem sua membrana rompida, libera-se enzimas lisossomais, que auxiliam na degradação do tecido. Além disso, com o processo inflamatório causado, chegada de leucócitos e etc, os lisossomos dos leucócitos também são recrutados como parte da reação inflamatória às células mortas, estimulando ainda mais essa ação degradativa, culminando na dissolução das células. O extravasamento de conteúdos celulares para o ambiente tecidual dispara múltiplos sistemas de detecção de padrão molecular associado ao perigo (DAMP) – principalmente os receptores de reconhecimento de padrão (ou de patógeno). Conteúdos celulares que escapam sempre iniciam uma reação local do hospedeiro, inflamação, no intuito de eliminar as células mortas e iniciar o processo de reparo subsequente O processo de necrose é sempre patológico, não pode ser fisiológico. Necrose sempre gera um processo inflamatório Autólise: digestão de um tecido morto por suas próprias enzimas. Vale tanto para um tecido necrótico num organismo vivo como para a decomposição do organismo após a morte Necrofanerose: aparecimento das características morfológicas da necrose no tecido (ou seja, picnose nuclear, eosinofilia do citoplasma). O tempo para necrofanerose varia com o tipo de tecido, temperatura, circunstâncias metabólicas e o método de observação empregado. No microscópio óptico, o tempo para necrofanerose é tipicamente de 6 horas, enquanto no microscópio eletrônico, alterações irreversíveis (ruptura da membrana celular, degeneração das mitocôndrias), são demonstráveis já minutos após a necrose Necrose: é o evento da parada de funcionamento da célula como máquina organizada conceitos importantes Heterólise: digestão das células necróticas por enzimas derivadas dos leucócitos e a desnaturação A apoptose e a necrose podem ocorrer mutualmente. Podem interagir e se sobrepor. Por exemplo, a infecção por salmonela provoca a piroptose – a salmonela faz com que haja ativação das capazes e, também, a ocorrência de lise das membranas e resposta inflamatória. Já o vírus do HIV provoca a necroptose, o vírus ativa um receptor de morte e, além de ativá-lo, também gera ruptura das membranas. Mecanismos moleculares da necrose Um tecido onde houve uma obstrução ou cessação do fluxo sanguíneo, há isquemia, que irá alterar a síntese de ATP, diminuindo a bomba de sódio/potássio, aumentando influxo de sódio, potássio extracelular, cálcio intracelular e água, gerando um edema celular (degeneração hidrópica). Com essa entrada de água, há dilatação do retículo endoplasmático e consequentemente diminuição da síntese proteica. O aumento do cálcio intracelular gera a ativação de calpaínas, que são enzimas que, quanto ativadas, destroem as membranas dos lisossomos. E, quando a membrana do lisossomos é quebrada, há liberação de catepsinas lisossomais, que levam a lise celular. Além disso, muito cálcio irá causar a ativação de fosfolipase A2, que destroem os fosfolipídeos, que fazem parte das membranas celulares, ou seja, também leva a uma lise celular. Os níveis excessivos de cálcio também causam danos as mitocôndrias por um processo denominado transição de permeabilidade mitocondrial (membrana mitocondrial interna forma poros levando a despolarização mitocondrial, desacoplamento do transporte de elétrons, falha na produção de ATP, edema mitocondrial e lise). Isso faz com que se diminua mais ainda a produção de ATP. Por esses poros entra-se água até que a mitocôndria sofra lise. Existem células que são mais resistentes a isquemia, como, por exemplo, os miocardiócitos. Eles aguentam ficar mais tempo com a diminuição de ATP pois eles ativam a via da glicólise, que vai produzindo ATP residual, o que permite que as mitocôndrias danificadas mantenham a polarização e retornem a seu funcionamento com o reinício da perfusão. Além disso, com a glicólise há diminuição do glicogênio e aumento de lactato, que diminui o pH intracelular, e esse baixo pH estabiliza as mitocôndrias e retarda o processo denominado transição de permeabilidade mitocondrial, ou seja, também é vantajoso para as mitocôndrias. Mas, algumas dessas células resistentes podem sofrer necrose após o reinício da perfusão (lesão por reperfusão), pois as mitocôndrias continuam a acumular Ca2+ e trabalharão tanto a ponto de liberar quantidades significamente elevadas de espécies reativas de oxigênio (ROS) no citoplasma. Essas ROS danificam o DNA da célula, provocando necrose. PS1: bloqueios na cadeia respiratória (como seria esperado em mitocôndrias danificadas) podem levar ao aumento da produção de ROS) PS2: essas ROS são liberadas normalmente (em pequenas quantidades de oxigênio molecular na forma de radicais livres superóxidos, como um subproduto do transporte de elétrons), mas há um equilíbrio entre sua produção e mecanismos protetores. Uma ausência de equilíbrio entre essa produção e esses mecanismos, leva ao estresse oxidativo no interior da célula Características morfológicas da lesão celular irreversível Alterações na membrana celular: • Formação de bolhas na superfície – ocorre pelo destacamento da membrana do citoesqueleto. • Ruptura da membrana celular – enfraquecimento decorrente da redução da síntese proteica e alteração nos ácidos graxos dos fosfolipídeos – com liberação do material intracelular, formando uma massa indistinta eosinofílica homogênea, vista principalmente nas necroses de caseificação • Junções intercelulares frouxas ou desaparecem – alterações estruturais da membrana Alterações nas mitocôndrias • Condensação da matriz mitocondrial – deficiência de O2 • Tumefação mitocondrial – expansão da câmara interna leva a redução do número de cristas, que vão achatando até o desaparecimento completo – cristólise. Tumefação mitocondrial, conservando a arquitetura das cristas, é uma lesão reversível Perda das cristas e aparecimento de estruturas amorfas são indicativos de lesão irreversível Alterações citoplasmáticas • Aumento da acidofilia citoplasmática = eosinofílico – desacoplamento ribossômico (diminuição de RNA no citosol), ao aumento de ácido láctico no citosol e à desnaturação de cadeias peptídicas com incremento de cargas negativas • Granulaçãocitoplasmática – tumefação e posterior ruptura de organelas (principalmente mitocôndrias e REL) • Homogeneização citoplasmática – com a lise das organelas e coagulação das proteínas, forma-se uma massa opaca e acidófila, vista principalmente nas necroses coagulativa Alterações nucleares • Picnose – retração e adensamento do núcleo, com perda da individualidade dos grânulos de cromatina • Cariorrexe – fragmentação do núcleo picnótico (ruptura em vários fragmentos, com distribuição irregular da cromatina, acúmulo de grumos em torno da carioteca e posterior desintegração em grupos amorfos com perda dos limites nucleares) • Cariolise – coloração nuclear pálida e fraca (dissolução da cromatina & Perda da coloração do núcleo, que desaparece completamente) Tipos de necrose – padrões morfológicos Necrose coagulativa É o tipo mais comum de necrose podendo ser chamada de Necrose Isquêmica. Ocorre quando a digestão/liquefação enzimática do tecido por autólise é retardada e a coagulação (desnaturação proteica) predomina. Ex: Infarto à necrose que se instala após interrupção do fluxo sanguíneo. PS: ocorrem em tecidos mais sólidos, pobre em lípides. Existem dois tipos de infartos: Infarto branco ou anêmico ou isquêmico • área de necrose de coagulação (isquêmica) ocasionada por hipóxia letal local, em território com circulação do tipo terminal • causa é sempre arterial (oclusão tromboembólica, compressiva) • órgãos mais comumente lesados são os rins, o baço, o coração • obstrução arterial em órgãos sólidos com circulação terminal PS: halo hiperêmico é uma borda avermelhada em torno da lesão; já o halo branco acinzentado leucocitário é uma borda arroxeada encontrada internamente ao hiperêmico Infarto vermelho ou hemorrágico • área de necrose edematosa e hemorrágica • ocasionada por hipóxia letal local, em território com circulação preferencialmente do tipo dupla ou colateral (pulmão / fígado) • órgãos frouxos ou com irrigação dupla ou com rica circulação colateral • necrose de coagulação na presença de circulação residual (a partir de uma fonte alternativa), suficiente para demonstrar hemorragia tecidual maciça • tanto a oclusão arterial como a venosa podem causar infartos vermelhos De certa forma, a única coisa que diferencia o infarto branco do infarto vermelho é que no vermelho haverá área hemorrágica em concomitância com a área de necrose Além da maioria dos infartos, outros exemplos de necrose coagulativa são: tumores de crescimento muito rápido, superando a capacidade de suprimento pelos vasos do próprio tumor; lesões por agentes físicos (como queimaduras graves) ou químicos (como ácidos de bases fortes); necrose caseosa, presente na tuberculose; gangrena; e esteatonecrose Necrose caseosa A necrose caseosa é um tipo especial de necrose coagulativa. Se instala no meio da reação inflamatória provocada por certas doenças, principalmente a tuberculose. É uma ação de degradação progressiva e irreversível feita por enzimas em tecidos lesionados. O paciente aspira o micobacterium, que vai parar no pulmão. Se ele não conseguir ser destruído pela primeira linha de defesa (macrófagos) que temos (o macrófago fagocita, mas não consegue destruir) irá começar a ocorrer uma reação chama de granulomatosa. Os macrófagos começam a secretar interleucina 2, que estimula os linfócitos T a produzirem IFN gama, que são capazes de fazer com que aqueles macrófagos que estão com o micobacterium se tornam ativados. Ativados, eles começam a secretam TNF alta e quimiocinas que atraíram células inflamatórias para a região. As IFN alfa, transformam os macrófagos em células epitelioides, que vão se aglomerando e formam as células gigantes multinucleadas, que consegue fagocitar mais micobacterium para combater a infecção. O granuloma é formado pelas células epitelioides e pelas células gigantes multinucleadas. O micobacterium tem uma massa amorfa constituída de proteínas e lipídeos, quando ele morre macroscopicamente observa-se uma estrutura semelhante a ‘caseum” (queijo branco e fresco) (dai vem o nome necrose caseosa). As áreas de caseificação apresentam-se macroscopicamente como massas circunscritas, amarelas, secas e friáveis. O que é lipídeo liquefaz e o que é proteína coagula. Na lâmina, observa-se um aspecto róseo, amorfo, finamente granuloso. Há o centro do granuloma com um halo mais roxo ao em torno (processo inflamatório) Gangrena É outra forma especial de necrose isquêmica (coagulativa). Nela, o tecido necrótico sofre modificação por agentes externos como ar ou bactérias (bactérias geralmente anaeróbicas levando a putrefação – “apodrecimento” - do tecido necrótico) Tem como exemplos: cordão umbilical após o nascimento (fica negro e seco); nas extremidades inferiores como: obstrução vascular por aterosclerose, especialmente em diabéticos; traumatismos com lesão de vasos; moldes de gesso excessivamente justos ; congelamento; e em órgãos internos, quando houver a combinação de necrose com infecção por agentes bacteriano A gangrena seca é quando a área necrótica perde água para o ambiente, ficando seca, retraída, com aspecto mumificado e negra, por alteração da hemoglobina. É localizada em extremidades como nariz, orelha e membros. Não apresenta o fator “dor”. Apresenta macroscopicamente linha demarcatória entre a área normal e o tecido necrosado. A cor pode variar de amarelo esverdeado ao pardo enegrecido, em decorrência da decomposição da hemoglobina. Etiologia: causa isquêmica causada através do congelamento ou vasoconstrição ou por doenças obstrutivas dos vasos periféricos; diabetes tipo I e II; gesso e bandagens muito apertadas; fisiológicas, como no cordão umbilical. A gangrena úmida é quando o tecido necrótico se contamina com bactérias saprófitas, que digerem o tecido, amolecendo-o. Geralmente são bactérias anaeróbicas e produzem enzimas proteolíticas e fosfolipase. Ocorre preferencialmente nos plumões (pneumonias agudas por aspiração de corpos estranhos); intestino (evolução de apendicites e colecistites graves); glândula mamária (mastite aguda por coliformes e/ou estafilococos); pele (após contaminação de ferimentos, úlceras, queimaduras ou contaminação de tecidos profundos). Etilogia: isquemia e liquefação (pela proliferação de micro-organismos); pode se espalhar muito mais rápido que a gangrena seca; pode levar a complicações potencialmente fatais, como o choque séptico; há bolhas pretas e pus fétido abaixo da pele diluída na área. A gangrena gasosa ocorre quando a necrose é contaminada pelas bactérias pertencentes ao gênero Clostridium. Pode haver produção de gases, daí gangrena gasosa, mas também pode ser chamada de gangrena enfisematosa; gangrena crepitantes ou gangrena bolhosa. Então, possui como características a ação de bactérias anaeróbias gasógenas sobre o tecido necrosado. Etiologia: é causada por bactérias anaeróbicas produtoras de gás (H2; CO2; CH4; NH3; SH2), ácido acético, ácido butírico (de onde vem o odor característico de manteiga rançosa) Esteatonecrose É outro tipo especial de necrose coagulativa do tecido adiposo. A gordura é desdobrada pela ação de enzimas lipolíticas 9lipases) pancreáticas, sendo que lesões traumáticas, isquêmicas ou químicas podem levar à ruptura de células adiposas. É mais comum na pele (hipoderme); mama e retroperitônio. O exemplo mais observado desse tipo de necrose é a pancreatite aguda: os ácinos precisam enviar enzimas pancreáticas para o intestino, indo pelo ducto pancreático; esse ducto encontra com o ducto colédono, e nessa área de encontro dos ductos pode existir cálculos, fazendo com que as enzimas não consigam sair do pâncreas, havendo acúmulo dessas enzimas, afetando a célula. Com isso, os ácinos podem se romper e liberarem as enzimas enzimáticas no próprio pâncreas. Uma dessas, é a lipase pancreática, que ao entrar em contato com adipócito, fará com que ele libere ácidos graxos, que reagirá com o cálcio dos líquidos intersticiais, formando sabões insolúveis de cálcio, que têm aspecto semelhante a cera de vela macroscopicamente (reação de saponificação).Necrose liquefativa É um tipo de necrose causada pela interrupção vascular/infecção bacteriana. Ocorre em tecidos ricos em lipídeos e pobres em albuminas coaguláveis (suprarrenal, sistema nervoso) e em abcessos (áreas de infecção bacteriana purulenta que produzem uma nova cavidade no tecido. Resulta de uma necrose liquefativa por ação de enzimas proteolíticas das próprias bactérias e dos neutrófilos atraídos para combatê-las). Na liquefação enzimática do tecido necrótico o tecido morto se encontra liquefeito por ação de enzimas hidrolíticas, a dissolução enzimática é rápida e total do tecido morto; ele sofre lise por ação de bactérias ou por ação de proteases de leucócitos e a zona de necrose adquire consistência mole, semifluida ou mesma liquefeita. Célula grânulo-adiposa é um macrófago que fagocita célula necrótica muito rica em lípides, ficando com uma característica espumosa