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1 Beatriz Almeida – Medicina UFCG Turma 78 Hemorragia Subaracnoide Ocorre quando o espaço subaracnoide, localizado entre a pia máter e a aracnoide é inundado por sangue. A causa mais comum é a ruptura espontânea de um aneurisma sacular, geralmente localizado em artérias do polígono de Willis (> 35 anos de idade). Aneurismas saculares são dilatações segmentares de uma artéria intracraniana. A maioria se localiza no polígono de Willis ou na origem das artérias cerebelares. O risco de rotura é proporcional ao tamanho: baixo risco < 10mm e alto risco > 10mm 70% dos casos de HSA se devem a aneurismas pequenos (< 7 mm), já que estes são bem mais frequente A 2ª causa é a ruptura de uma malformação vascular arteriovenosa (10-30 anos de idade). o Fatores de risco: tabagismo, alcoolismo, HAS, HF +, uso de simpaticomimético (cocaína), síndromes genéticas (Ehler-Danlos, Rins policísticos) o Localizações mais comuns dos aneurismas na HSA: 1. Comunicante anterior (principal) 2. Comunicante posterior na junção com a carótida interna 3. Bifurcação da ACM Quadro clínico: o Cefaleia súbita de forte intensidade, vômitos, síncope (50% dos casos), rigidez de nuca (após algumas horas do evento – 12-24h). Tríade clássica: cefaleia súbita intensa + síncope + rigidez de nuca Frequentemente, o episódio é precipitado por esforço físico ou ato sexual. Na maioria das vezes, a rotura do aneurisma vem “sem aviso” Outras vezes, pequenas roturas tamponadas causam pequenas HSA, manifestadas como cefaleias súbitas (“cefaleias sentinelas”), menos intensas que a cefaleia da rotura maior. Pode evoluir com rebaixamento da consciência e coma, devido à Hipertensão Intracraniana (HIC) Fundoscopia de olho: revela hemorragia sub-hialoide (sangue entre o vítreo e a retina, extravasando da papila óptica) → Síndrome de Terson → mal prognóstico Na maioria das vezes, o déficit focal se instala tardiamente, entre o 3º e o 14º dia, devido ao vasoespasmo cerebral Porém existem casos que se apresentam já com déficit focal: 1. Rotura de aneurisma da comunicante posterior (junção com a carótida interna): o nervo oculomotor (IIIº par) passa adjacente a este aneurisma → geralmente se apresenta com a síndrome do IIIº par (ptose, midríase paralítica, estrabismo divergente e diplopia) do mesmo lado do aneurisma roto. 2. Rotura de aneurisma na comunicante anterior: pode ocorrer hemiparesia e abulia (mutismo acinético) quando o jato de sangue forma um grande hematoma parenquimatoso no lobo frontal medial Diagnóstico: 1. TC de crânio não contrastada: S 95% até 72h do evento, caindo para 60% no 5º dia. Demonstra presença de sangue no espaço subaracnoide. 2. Punção lombar (padrão-ouro): indicada no caso de alta suspeita clínica com TC de crânio negativa. Líquor + para HSA: > 100.000 hemácias/mm3 + aspecto xantocrômico (cor amarela) do sobrenadante (pode ser visto nas primeiras 12h, permanecendo até 1-4 semanas) 2 Beatriz Almeida – Medicina UFCG Turma 78 TC de crânio sem contraste: imagem hiperdensa nas cisternas mesencefálicas, na fissura inter- hemisférica e na fissura de Sylvius (frontoparietal) → sangue no espaço liquórico → subaracnoide Identificar o aneurisma: 1. Angiografia convencional de 4 vasos (2 carótidas e 2 vertebrais): padrão-ouro 2. Angio-TC (pode ser realizada logo após a TC) e Angio-RM: segundas opções Prognóstico: Cerca de 45% morrem no 1º mês - sendo 10% na 1ª hora, antes de chegar ao hospital Dos sobreviventes, 50% apresentam sequela neurológica irreversível. Sistema de graduação de Hunt-Hess: principal determinante de prognóstico 1. Grau 1: lúcido, assintomático ou leve cefaleia, rigidez de nuca 2. Grau 2: lúcido, cefaleia moderada a intensa, rigidez de nuca, pode haver paralisia de par craniano 3. Grau 3: sonolência, confusão mental, leve déficit focal 4. Grau 4: torpor, déficit focal significativo 5. Grau 5: coma, postura de descerebração World Federation of Neurosurgical Societies (WFNS): 1. Grau 1: Glasgow 15, sem deficit motor 2. Grau 2: Glasgow 13-14, sem deficit motor 3. Grau 3: Glasgow 13-14, com deficit motor 4. Grau 4: Glasgow 7-12, com ou sem deficit motor 5. Grau 5: Glasgow 3-6, com ou sem deficit motor Escala de Fisher: indica o risco de vasoespasmo 1. Grau I: sem sangue, diagnóstico pela punção lombar 2. Grau II: lâminas verticais < 1 mm 3. Grau III: coleções de sangue > 3 mm ou lâminas > 1 mm 4. Grau IV: hemoventrículo Complicações: 1. Ressangramento (rerruptura): 20% dos pacientes nos primeiros 7 dias (maioria: primeiras 24h). 3-4% nas primeiras 24h 1-2% ao dia no primeiro mês após a HSA Após a fase aguda 3% ao ano PA > 160 mmHg está associada a maior risco de ressangramento Mortalidade de 60% Nos pacientes que por algum motivo não podem ter o aneurisma clipado ou tratado via endovascular, o uso de ácido tranexâmico ou aminocaproico (antifibrinolíticos) nas primeiras 72h pode reduzir o risco de ressangramento (controverso, por não diminuir mortalidade) 2. Vasoespasmo: 20-30% dos casos, entre 3-14 dias do evento (média: 7 dias). Provoca isquemia e infarto cerebral (AVCi): déficit focal permanente ou flutuante (hemiplegia, hemianestesia, afasia) + rebaixamento da consciência. O diagnóstico é confirmado pelo Doppler transcraniano (deve ser realizado diariamente no período de risco para vasoespasmo) Pode deixar graves sequelas, sendo o grande responsável pelo mau prognóstico neurológico. Com o aneurisma clipado ou embolizado, é permitida a terapia do triplo “H” (hipertensão, 3 Beatriz Almeida – Medicina UFCG Turma 78 hipervolemia, hemodiluição), se for ineficaz, indicar medidas alternativas (angioplastia percutânea, papaverina intra-arterial, nitroprussiato intratecal) 3. Hidrocefalia: ocorre em 15% dos casos a) Hidrocefalia aguda hiperbárica: complicação aguda Ocorre devido à obstrução pelo sangue do fluxo de líquor intraventricular (hidrocefalia obstrutiva) ou das granulações aracnoides de drenagem liquórica (hidrocefalia não obstrutiva) HIC, agravamento do quadro neurológico, não reverte em 24h → indicação de derivação ventricular externa (DVE) b) Hidrocefalia crônica normobárica (Síndrome de Rakin-Adams): sequela tardia da HSA Hidrocefalia não obstrutiva Tríade: demência + apraxia da marcha + descontrole esfincteriano → indicação de derivação ventriculoperitoneal (DVP) 4. Hiponatremia (VR 135-145 m Eq/L): comum nas primeiras 2 semanas. Decorrente de duas síndromes: 1. SIAD (euvolêmico): aumento excessivo do ADH e retenção de água livre 2. Cerebropatia perdedora de sal (hipovolêmico): liberação de peptídeos natriuréticos (BNP, ANP) Suplementação de sal oral, soro fisiológico ou salina hipertônica (evitar a restrição hídrica pelo risco de vasoespasmo) É importante solicitar dosagem de eletrólitos pelo menos uma vez ao dia durante o período de maior risco, pois a hiponatremia pode se manifestar subitamente e levar ao rebaixamento do nível de consciência... Hiponatremia = hipo-osmolaridade → edema cerebral → piora da hipertensão intracraniana → rebaixamento da consciência Outras complicações: convulsões, febre, hiperglicemia, anemia e fenômenos tromboembólicos. Tratamento: Internar na UTI Monitorizar PAM (cateter radial) e PIC (ventriculostomia) Intervenção precoce sobre o aneurisma (de preferência nos primeiros 3 dias), através de neurocirurgia (clipagem do aneurisma) ou terapia endovascular (embolização com coil), após a realização de angiografia (arteriografia) cerebral – a Angio-TC e a Angio-RM são boas opções, embora com menor sensibilidade para aneurismas pequenos. 1. Cirurgia de clipagem do aneurisma: neurocirurgia de alta complexidade, que requer craniotomia e retração cerebral e pode complicar com edema cerebral e déficitneurológico focal isquêmico (infarto cerebral) por pinçamento arterial. É colocado um clip metálico para ocluir a cúpula do aneurisma (o paciente nunca mais poderá ser submetido à ressonância magnética.). Em mãos experientes, o risco de complicações graves reduz muito. 2. Terapia endovascular: por angiografia, a artéria com o aneurisma é cateterizada e é colocado um coil (mola) no lúmen do aneurisma (“embolização”), estimulando a sua obliteração por trombose. Não é isento de riscos Diversos estudos compararam a terapia endovascular com a cirurgia, demonstrando semelhança de resultados. O estudo ISAT foi favorável à terapia endovascular, que reduziu em 25% a chance de óbito e sequela neurológica grave em relação à cirurgia. Uma outra vantagem da terapia endovascular é a sua relativa segurança em pacientes Hunt-Hess graus IV e V (torporosos ou comatosos), nos quais o edema cerebral dificulta a cirurgia. Além disso, a terapia endovascular permite o início imediato de heparina profilática para redução do risco de TVP e TEP, enquanto os pacientes submetidos à cirurgia têm que aguardar alguns dias. Terapia clínica adjuvante: repouso absoluto, analgesia para cefaleia, hidratação com cristaloides, Controle pressórico principalmente antes da cirurgia: labe PAS > 220 mmHg: considerar reduzir PA com infusão IV contínua e monitorização PAS entre 150-220: considerar alvo PAS < 180 mmHg Nimodipina 60mg VO ou EV a cada 4h (não diminui a ocorrência de vasoespasmo, mas reduz a sequela dele – cuidado com a hipotensão arterial) Em pacientes com nível de consciência preservado, a tendência é controlar melhor a PA para prevenção de ressangramento, nesses casos geralmente objetivamos uma PA sistólica < 4 Beatriz Almeida – Medicina UFCG Turma 78 140-160 mmHg até a cirurgia (após a intervenção, podemos deixar a PA elevar mais um pouco) Tratar a HIC nos pacientes com rebaixamento da consciência Anticonvulsivante profilático (uso controverso). Importante: a anticoagulação, mesmo profilática, está contraindicada nestes pacientes Suspender qualquer anti-hemostático: AAS, heparina (antídoto protamina), varfarina (antídoto vit K, plasma fresco, complexo protrombínico) Aneurisma assintomático: Até 5% da população normal possui aneurismas saculares intracranianos. Os aneurismas saculares íntegros e assintomáticos têm um risco de rotura entre 0,1%/ano (aneurismas < 1 cm) e 1%/ano (aneurismas ≥ 1 cm) → ou seja, a imensa maioria dos aneurismas não se rompe A morbidade cirúrgica excede essas porcentagens Talvez o único benefício da intervenção em indivíduos assintomáticos seja em jovens com aneurismas ≥ 1 cm, considerando o maior tempo de exposição ao risco de rotura. HSA em pacientes mais jovens – MAV: Anomalia vascular congênita caracterizada por um shunt arteriovenoso focal, formado por vasos estruturalmente defeituosos (paredes finas). A lesão pode ser encontrada no córtex cerebral, na substância branca cerebral, no tronco encefálico, no cerebelo e até mesmo na medula espinhal. É uma importante causa de HSA na faixa etária entre 10-30 anos (fora da faixa da rotura dos aneurismas saculares) → apresentação clínica mais comum da MAV. Menos comumente, manifesta-se com hemorragia intraparenquimatosa, com ou sem HSA ou hemoventrículo associado. Outras manifestações possíveis da MAV são a epilepsia (focal ou focal com generalização secundária) e a cefaleia unilateral progressiva. Apresentações mais raras são déficit neurológico progressivo (simulando um tumor) e hidrocefalia (hipertensão venosa pela alta drenagem para a veia cerebral magna – veia de Galeno). TC contrastada dá o diagnóstico em 90-95% dos casos, por vezes apresentando calcificações. As MAV são de tamanhos variados (mm – cm) A RM tem acurácia um pouco melhor que a TC A Angiografia convencional pode ser necessária para a confirmação diagnóstica mais precisa. Grandes MAV nutridas pela circulação carotídea podem cursar com sopro sistodiastólico na fronte ou região cervical, além de pulsos carotídeos amplos e visíveis. O tratamento recomendado é a terapia intervencionista combinada: obliteração endovascular seguida de cirurgia de ressecção. As MAV com < 3 cm podem ser tratadas alternativamente com radioterapia estereotáxica, com involução da MAV ao longo de 1-2 anos. As MAV assintomáticas (achado de neuroimagem) também devem ser eliminadas, pelo risco de 2% ao ano de hemorragia, com letalidade de 15%. Outras anormalidades vasculares encefálicas: 1. Angioma cavernoso: anomalia vascular adquirida, formada por tufos de capilares, com áreas calcificadas e glicose circunjacente. A lesão é bem semelhante a um tumor na neuroimagem. Localizações mais comuns: hemisférica supratentorial e no tronco encefálico. Manifesta-se entre 20-40 anos com déficit neurológico focal progressivo, flutuante (a lesão provoca pequenos episódios de hemorragia de evolução autolimitada) ou epilepsia focal. TC revela imagem arredondada hiperdensa, mas a Ressonância é o padrão-ouro (“lesão em pipoca”). Angiografia costuma não identificar o angiocavernoma. A terapia é a ressecção cirúrgica, quando factível, sempre que houver sintomas. A radioterapia estereotáxica tem mostrado alguns resultados nas lesões tecnicamente irressecáveis. 2. Anomalia venosa: são veias anatomicamente alteradas, porém com drenagem fisiológica. Não costumam causar maiores problemas (são achados de neuroimagem). Raramente provocam hemorragia ou epilepsia. 3. Fístula arteriovenosa dural: são shunts entre artérias da dura-máter e um seio venoso dural. Provocam o aparecimento de sopro no escalpo, zumbido pulsátil e cefaleia. Podem complicar com hipertensão venosa sinusal e uma clínica semelhante à trombose do seio sagital superior (cefaleia, rebaixamento da consciência, paraparesia, hemorragias frontoparietais).
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