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1 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 Espondiloartrites INTRODUÇÃO • Características gerais: o Espondiloartrite é um grupo de doenças, antigamente chamado de artropatias soronegativas (porque têm o fator reumatoide negativo) o Têm como critério característico o acometimento de enteses (local onde o músculo/tendão/ligamento vai se inserir próximo a uma articulação / cápsula articular) o Existem 5 tipos (espondilite anquilosante, artrite psoriásica, artrite reativa, artropatia enteropática e espondiloartrite indiferenciada) ▪ Existe, também, uma entidade relacionada à parte juvenil, que é a artrite relacionada à entesite (AIJ – Artrite Idiopática Juvenil) o Normalmente acometem pacientes com menos de 45 anos o Têm o acometimento do esqueleto axial → Articulações sacroilíacas e coluna vertebral são acometidas e geralmente de uma forma ascendente ▪ Existem também as artrites periféricas, que pode ser oligoartrite (poucas articulações acometidas) e geralmente é de uma forma assimétrica o Como característica, teremos a entesite (acometimento das enteses) o Existe uma história familiar importante o A presença do HLA-B27 é um marcador genético importante nessas doenças o O fator reumatoide geralmente é negativo o Pode ter a presença de manifestações extra-articulares ESPONDILITE ANQUILOSANTE (EA) É a espondiloartrite mais clássica. O fenótipo clássico do paciente de espondilite anquilosante é de uma pessoa bem encurvada, na posição do esquiador (retificação da lordose e acentuação da cifose). • Conceito: o É uma doença inflamatória crônica o Mais frequente em homens, geralmente antes dos 45 anos o Acomete as articulações preferencialmente do esqueleto axial, com envolvimento da articulação sacroilíaca e da coluna vertebral de forma ascendente o Pode evoluir com fusão vertebral e anquilose em sacroilíaca • Epidemiologia: o Prevalência de 0,3 a 1,9% o Incidência de 0,5 a 14/100000 pessoas o 80% dos pacientes vão fazer o diagnóstico antes dos 30 anos, raramente após os 45 anos PROFA. KETTY MACHADO 2 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 o Ocorre muito em populações de caucasianos e dos países nórdicos o Mais frequente em homens (2-3:1) o O HLA-B27 pode estar presente em 90-95% dos pacientes → Mas, nem sempre ter o HLA-B27 indica espondilite anquilosante (só 2%) o Se o paciente tem um parente de 1º grau com o diagnóstico e tem um HLA-B27 positivo, a chance de ter a espondilite anquilosante é de 10 a 20% • Etiopatogenia: o A etiologia é desconhecida o Existe uma importância da interação genética ▪ História familiar de 7 a 36% ▪ Presença do HLA-B27 (90-95%) ❖ Em gêmeos → Monozigóticos 63% e dizigóticos 12-23% ❖ Subtipos mais relacionados → HLA-B2705, B2704 e B2702 ▪ Há associação com o IL-23R e com o ERAP-1 o Existem também fatores ambientais envolvidos ▪ Estresse mecânico na entese ▪ Esclerostina reduzida (↑ via Wnt) o Existe também um fator infeccioso → Toll-like receptor x Bactérias entéricas (disbiose intestinal ativando toll- like receptors) o Todos esses fatores levam a uma estimulação da citocina IL-23, que por sua vez estimula células T, as quais estimulam a produção de IL-22 e IL-17, que também têm ação sobre o TNF Prevalência de HLA-B27 em populações indígenas no mundo (percentagem) – Percebemos que nos países mais próximos ao polo Norte temos uma presença mais frequente da EA, já países tropicais quase não apresentam prevalência dessa doença 3 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 ▪ Com isso, levam à inflamação, à presença de erosão (perda óssea) e à osteoproliferação (formação de sindesmófitos, anquilose e fusão óssea) o Existem diversos genes envolvidos que aumentam a susceptibilidade dos indivíduos desenvolverem a EA, além da relação com bactérias entéricas ▪ Sendo susceptível, o paciente, por meio de outros estímulos, pode desenvolver a doença propriamente dita 4 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 • Diagnóstico: o Baseado na história clínica o A parte laboratorial vai ajudar ▪ Presença do HLA-B27 ▪ Fator reumatoide negativo ▪ VHS e PCR elevados o RX em estados mais avançados pode mostrar sindesmófitos ou sinais iniciais de sacroileíte o O ultrassom vai mostrar uma entesopatia o A RM pode mostrar alterações precoces, edema ósseo, capsulite, sinovite, derrame articular etc. QUADRO CLÍNICO • Lombalgia inflamatória: o Dor lombar crônica (> 3 meses) o História de dor alternante em nádegas → Torna-se persistente e bilateral o Rigidez matinal de longa duração (> 30 minutos até 60 ou +) o Melhora com exercício e piora com repouso o Pode ter dor noturna o Normalmente tem uma boa resposta ao uso de AINEs (resposta em 48h, sensibilidade 75%) • Entesites: Diferenças de uma dor lombar inflamatória para uma dor lombar mecânica – Inflamatória é o caso da espondilite anquilosante 5 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 o Paciente pode ter dor nas enteses o Normalmente acomete junção costocondral, articulação manubrioesternal, esternoclavicular, tuberosidade tibial, inserção do tendão do Aquileu e fáscia plantar • Artrite periférica: o Pode acometer 30% dos pacientes o É mais comum em mulheres o Geralmente é uma oligoartrite assimétrica o Principalmente em membros inferiores o Pode acometer também grandes articulações (quadril, ombros, joelhos e tornozelos) MANIFESTAÇÕES EXTRA-ARTICULARES • Manifestações extra-articulares: o 42% dos pacientes vão ter uma manifestação extra-articular (número cada vez maior) o Entre as extra-articulares, a mais comum é a uveíte, normalmente anterior o O paciente também pode apresentar psoríase, doença inflamatória intestinal ou uma combinação de mais de uma das manifestações • Uveíte: o Acomete 30-40% dos casos o Uveíte normalmente anterior o Início agudo 6 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 o Unilateral o Pode ser recorrente o Geralmente tem um prognóstico bom o Normalmente tem relação com a presença do HLA-B27 (90%) o Quadro clínico → Olho vermelho, dor, visão turva, moscas volantes, fotofobia e miose • Manifestações gastrointestinais: o 50% dos pacientes podem ter o Inflamação macro ou microscópica em íleo e ceco o A maioria tem quadro assintomático o 10% desenvolvem quadro de doença inflamatória intestinal (DII) o Fatores de risco para DII: ▪ Lesões intestinais inflamatórias crônicas ▪ Prova de atividade inflamatória (PAI) elevada ▪ Ausência de HLA-B27 na presença de sacroileíte • Manifestações cardiovasculares: o Distúrbios de condução (3-9%) o Aortite o Insuficiência aórtica (2-10%) o Risco aumentado de insuficiência cardíaca, doença vascular periférica e doença arterial coronariana (pelo processo inflamatório que a doença leva) • Manifestações cutâneas: o Psoríase o Eritema nodoso o Pioderma gangrenoso • Manifestações pulmonares: o Fibrose apical lateral • Manifestações renais: o Amiloidose o Nefropatia por IgA • Manifestações esqueléticas: o Osteoporose o Espondilodiscite (lesão de Anderson) o Fraturas vertebrais o Estenose de canal medular 7 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 EXAME FÍSICO • Posição de esquiador: o Paciente perde a lordose fisiológica e aumenta a cifose o Há uma retificação da coluna • Testes: o Teste de Patrick / FABER ▪ Flexão do quadril, abdução e rotação externa (como se fosse fazer o 4) ▪ Mão do médico na sacroilíaca e no joelho tentando fazer uma abertura/abdução ▪ Num teste positivo, o paciente vai sentir dor na articulação sacroilíaca o Teste de Gaenslen (não tão usado) o Compressão das sacroilíacas o Testes para limitação de mobilidadeda coluna ▪ Teste de Schober modificado → Fazemos uma medida em nível de L5 (pontos de vênus) e traçamos uma linha de 10 cm para cima e pedimos para o paciente fazer flexão lombar ❖ É esperado que essa linha aumente para 15 cm ▪ Medida da expansibilidade torácica → Pede para o paciente fazer inspiração e expiração máximas para ver se teve uma variação maior que 5 cm (normal) o Distância occipito-parede ou tragus-parede → Se tiver > 15 cm é alterado Teste de Patrick / FABER x Teste de Gaenslen 8 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 Compressão das sacroilíacas Teste de Schober modificado 9 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 EXAMES LABORATORIAIS • Provas de atividade inflamatória: o PCR e VHS o Aumentadas em75% dos pacientes → Geralmente indicam pior prognóstico o A PCR também indica progressão radiográfica • FAN e FR: o Geralmente negativos • HLA-B27: o A presença do HLA-B27 está relacionada com: Medida de expansibilidade torácica Distância occipito-parede x Distância tragus-parede 10 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 ▪ Maior gravidade ▪ Manifestações extra-articulares (ocular*, cardíaca e pulmonar) EXAMES RADIOLÓGICOS • Exames radiológicos: o O RX terá alterações mais crônicas o A RM vai mostrar alterações agudas mais precoces • Graduação de sacroileíte radiológica (1996): o Classifica as alterações radiológicas de grau 0 a grau 4 (ver abaixo) ▪ 0 é normal e 4 é anquilose total Sacroileíte grau 0 x Sacroileíte grau 1 (esquerda) e 2 (direita) – Na grau 2 já podemos ver presença de esclerose Sacroileíte grau 2 11 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 • Tomografia computadorizada: o Na TC podemos ver esclerose, presença de pequenas erosões, redução do espaço articular etc. Sacroileíte grau 3 x Sacroileíte grau 4 – Na grau 3 já conseguimos ver um pouco de anquilose e na grau 4 há anquilose total da articulação sacroilíaca 12 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 • Ressonância magnética: o Importância diagnóstica e prognóstica o Geralmente alterações mais precoces (não vistas no RX) o É interessante no diagnóstico de espondiloartrite axial não radiográfica o Paciente com sacroileíte intensa na RM e HLA-B27 positivo tem chance de desenvolver espondiloartrite em 8 anos (sensibilidade de 62% e especificidade de 92%) → Paciente que é preciso acompanhar o Pode mostrar lesões inflamatórias aguda (STIR/T1 pós-gadolínio) → Hoje, tem se usado menos o contraste ▪ Edema da medula óssea (osteíte), capsulite, sinovite e entesite RM de EA - Mostrando um edema medular ósseo subcondral periarticular. Paciente com sacroileíte aguda, predominantemente no lado esquerdo 13 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 • Coluna: o O processo inflamatório vai levando a alterações das enteses o Com o tempo, isso vai fazendo a formação de sindesmófitos/pontes na coluna, formando uma coluna em formato de bambu RM de EA – Na imagem da esquerda podemos ver no STIR como se acentua edema medular ósseo. Na imagem da direita vemos como o edema medular ósseo pode estar associado com alterações estruturais como erosões RM de EA – Presença de sinovite (líquido dentro do espaço articular) Sacroileíte inflamatória ativa sem alterações ósseas x Sacroileíte com alterações ósseas (grau II) 14 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 o Ocorre uma retificação dos corpos vertebrais (chamamos de quadratura) o Pode ter lesão de Romanus (lesões nos ângulos brilhantes das articulações) Normal x Espondilite anquilosante inicial x Espondilite anquilosante avançada Alterações radiológicas típicas da coluna lombar Evidências de alterações axiais crônicas 15 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 Coluna retificada - Paciente perdeu a lordose, ficou com a coluna bem retifica, ele não consegue fazer uma flexão lombar adequada, lembrando um bambu 16 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 Diferenciação entre sindesmófitos e espondilófito – O sindesmófito é mais vertical e o espondilófito geralmente é mais horizontal Hiperostose esquelética idiopática difusa (DISH) / Doença de Forestier – Forma espondilófitos com pontes grosseiras, geralmente pegando 4 ou + vértebras, muito comum nas torácicas, mas na EA veremos começando mais na lombar 17 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 Sequências usadas para EA na RM – Quadro mostrando a diferença dos sinais, não precisa gravar RM axial nas espondiloartrites – Edema medular ósseo em múltiplos sítios Entesite – Podemos ver pelo RX ou RM 18 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 DIAGNÓSTICO • Critérios modificados de Nova York para EA (1984): o Critérios clínicos: ▪ Lombalgia > 3 meses de duração que melhora com realização de exercício e não alivia em repouso ▪ Limitação da coluna lombar nos planos frontal e sagital ▪ Expansibilidade torácica diminuída o Critérios radiográficos: ▪ Sacroileíte bilateral, grau 2, 3 ou 4 ▪ Sacroileíte unilateral, grau 3 ou 4 o Para o diagnóstico deveria ter 1 critério clínico + 1 critério radiográfico o Foi visto que para o paciente preencher esses critérios, já era um estágio mais avançado, porque existe um estágio não radiológico, em que o paciente não seria classificado por esses critérios ▪ Por isso, o grupo ASAS criou um novo critério • Critérios classificatórios do grupo ASAS: o Critério de espondiloartrite axial ▪ Leva em consideração pacientes com dor lombar + de 3 meses e idade de início < 45 anos ▪ Nesse caso, se o paciente não tiver alteração na imagem, mas tiver um HLA-B27, com mais outras 2 de outras características listadas é possível fazer o diagnóstico o Existe também a classificação do paciente com espondiloartrite periférica 19 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 TRATAMENTO • Objetivos do tratamento: o Controle de sinais e sintomas o Prevenção de danos estruturais progressivos o Preservação da participação social e funcional o Otimizar a qualidade de vida o Considerar a opinião do paciente • Recomendações da ASAS/EULAR: o De uma forma geral, vamos fazer AINEs, principalmente na fase axial o Para os pacientes com doença periférica, podemos tentar a sulfassalazina e o metotrexato ▪ Corticoides apenas em situações + locais ▪ Se não der certo, temos a opção dos bloqueadores de TNF e outros inibidores (como os de IL-17) o Devemos sempre orientar a educação, exercício, fisioterapia e reabilitação o Cirurgia será necessário para alguns casos • Tratamento não farmacológico: o Educação do paciente → Orientar que é uma doença autoimune, que tem tratamento e que deve ser tratada de forma adequada para evitar que seja deformante ▪ Nem todos os pacientes que a gente trata vamos conseguir impedir essa progressão de forma adequada, eles vão evoluir independente do tratamento ▪ Mas, sabemos que o tratamento consegue diminuir essa progressão radiográfica e piora da mobilidade o Atividade física o Fisioterapia e reabilitação ▪ Precoces e contínuos ▪ Exercícios de mobilidade e flexibilidade da coluna ▪ Exercícios de expansibilidade torácica ▪ Alongamento de musculatura flexora ▪ Fortalecimento de musculatura extensora • Tratamento medicamentoso: o Anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs) ▪ Uso contínuo → Reduz progressão radiológica ▪ Todos têm eficácia semelhante em dose efetiva ❖ Mas, os inibidores deCOX-2 vão ter menos efeitos gastrointestinais 20 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 ▪ Boa resposta → Sinal diagnóstico ▪ Não resposta → Pior prognóstico ▪ Exemplos: ❖ Indometacina 150 mg/dia ❖ Naproxeno 1000 mg/dia ❖ Cetoprofeno 200 mg/dia ❖ Ibuprofeno 2400 mg/dia ❖ Meloxican 15 mg/dia ❖ Celecoxibe 400 mg/dia o Corticoides ▪ Pode ser feito de forma intra-articular (triancinolona) se apropriado ▪ O sistêmico não tem evidência ❖ A não ser em caso de uveíte anterior aguda (responde bem a glicocorticoides tópicos, sistêmicos dependendo da gravidade) o Drogas modificadoras de doença ▪ Sulfassalazina ❖ Usada na artrite periférica ❖ Reduz recidiva da uveíte ❖ 30-50 mg/kg/d → 2 a 3 g/dia ▪ Metotrexato ❖ Usado na artrite periférica ❖ Dose 15-25 mg/sem + ácido fólico ▪ Seguimento com hemograma, função hepática e renal o Bloqueadores de TNFα ▪ Para seguir com esse tratamento, é necessário seguir as recomendações da ASAS primeiro passando pelos outros tipos de medicamentos ❖ Se o paciente não responder a essas opções e o índice de atividade (BASDAI) seguir alto (≥4), é possível progredir com o tratamento ▪ 5 classes disponíveis (infliximabe, etanercepte, adalimumabe, golimumabe e certrolizumabe) ▪ Não existe evidência sobre a diferença de eficácia e segurança entre os anti-TNF ▪ Sempre avaliar resposta no mínimo em 12 semanas ▪ A falha acontece em 30% dos casos (pode ser falta de eficácia, perda de resposta ou efeitos adversos) o Novas opções ▪ Secukinumabe – Cosentyx (anti-IL17) 21 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 Recomendações da ASAS para o tratamento com bloqueadores TNFα Índice de atividade de doença (BASDAI) – Se ≥ 4 significa atividade 22 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 ARTRITE REATIVA (ARe) • Conceito: o Não é tão comum quanto a EA, mas às vezes é até subdiagnosticada o É um tipo de espondiloartrite o Geralmente tem um componente mais periférico → Oligoartrite assimétrica o Tem uma história de infecção prévia (1-4 semanas) geralmente gastrointestinal ou geniturinária o Antigamente era chamada de Síndrome de Reiter, que era caracterizada pela tríade artrite assimétrica + conjuntivite (fugaz) + uretrite (geralmente assintomática) ▪ Não se usa mais esse epônimo • Epidemiologia: o Idade normalmente entre 20 e 40 anos o Sexo ▪ Pós-infecção urogenital → Mais frequente em homens ▪ Pós-infecção entérica → Igual entre os sexos o HLA-B27 → Pode ser positivo, principalmente nos brancos (80% dos brancos e 60% dos negros) • Etiologia: o A forma pós-entérica tem relação com as bactérias Shigella, Salmonella, Campylobacter e Yersinia Doses de bloqueador TNFα em EA, AP e DII 23 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 o A forma urogenitam tem associação com Chlamydia trachomatis, Ureaplasma urealyctium e Mycoplasma o Geralmente a artrite reativa ocorre após 1 a 4 semanas da infecção • Fisiopatologia: o A presença do HLA-B27 (60-80%) pode indicar gravidade, cronicidade e manifestações extra-articulares o Há uma relação com a parede bacteriana ativando os toll-like receptors (2 e 4) e, com isso, levando à ARe o Mimetismo molecular → Existe a hipótese de que os antígenos bacterianos mimetizam antígenos das articulações levando a uma resposta cruzada (autoimunade) QUADRO CLÍNICO • Características do quadro clínico: o Após 1 a 4 semanas do episódio infeccioso o A duração da ARe geralmente é de 3 a 6 meses ▪ 20% dos pacientes podem ter uma evolução mais crônica (superior a 12 meses) o Sintomas constitucionais podem estar presentes o Pode ter um quadro de artrite migratória assimétrica o Podem ter manifestações extra-articulares ▪ Lesões mucocutâneas → Balanite, uretrite, cervicite, conjuntivite, aftas, diarreia, queratodermia, lesões psoriasiformes, hiperqueratose ungueal e de couro cabeludo ▪ Uveíte anterior • Oligoartrite assimétrica: o Mais comum nos MMII → Joelho, tornozelo e calcâneo ▪ Raramente acomete articulações de MMSS o Dor lombar e em glúteos é comum (50%) o Pode ter surtos com duração de semanas a meses o 10 a 20% evoluem para espondilite anquilosante (geralmente no casos recorrentes) • Dactilite (“dedo em salsicha”): o Artrite de interfalangianas associada a tenossinovite o Diagnóstico diferencial → ARe, artrite psoriásica, gota e sarcoidose • Entesite: o Geralmente com dor nas inserções o Assimétrica o Geralmente acomete o tendão do Aquileu e outros tendões dos tornozelos MANIFESTAÇÕES EXTRA-ARTICULARES • Lesões mucocutâneas: o Balanite circinada → Associada mais à Chlamydia 24 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 o Úlceras orais indolores o Ceratoderma blenorrágico → É indistinguível da psoríase pustular e não ocorre na forma pós-entérica o Distrofia ungueal → Pode simular artrite psoriásica o Eritema nodoso (Yersinia) • Ocular: o Pode fazer um quadro de uveíte unilateral anterior não granulomatosa (20% dos casos) o Também pode ter conjuntivite, bulbar ou subtarsal → Em alguns casos, pode evoluir para episclerite e ceratite • Manifestações mais raras: o Alterações do ritmo cardíaco o Insuficiência aórtica o Nefropatia por IgA o Fibrose pulmonar o Neuropatia periférica DIAGNÓSTICO • Diagnóstico: o Clínico o Fase aguda: Ceratoderma blenorrágico x Balanite circinada 25 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 ▪ PCR, VHS e hemograma ▪ Sorologia para agentes infecciosos (Anti-Clamysua, Yersinia) ▪ Cultura e bacterioscópico de secreções, urina e fezes ▪ Pesquisa de DNA na secreção uretral → DNA da Chlamydia e Mycoplasma em urina ou secreção o Artrocentese (diagnóstico diferencial) o HLA-B27 o Imagem (quando houver manifestações) • Imagem: o Sacroileíte (25%) → Normalmente assimétrica e unilateral (diferente da EA, que é simétrica e bilateral) o Espondilite é assimétrica e os sindesmófitos não são marginais como na EA 26 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 TRATAMENTO • Curso da doença: o A artrite inicial geralmente é autolimitada (6 a 12 meses) → 35% não recorrem o Outros 35% podem fazer artrite recorrente → Forma de artrite, entesite ou manifestação extra-articular o 20% podem evoluir com artrite crônica destrutiva grave • Tratamento não farmacológico: o Fase aguda → Repouso e compressa de gelo o Após → Exercícios de fortalecimento passivo e de amplitude de movimento + ativo (evitar imobilizações dar articulações) • Tratamento farmacológico: o No início, vamos usar analgésicos e AINEs (sintomáticos) o Depois, vamos tentar o uso de corticoides ▪ Intra-articular para casos refratários ▪ Tópico para lesões mucocutâneas e oculares o Em relação ao tratamento com antibiótico, tem alguns trabalhos que falam que se o paciente tiver ainda com quadro infeccioso (artrite reativa aguda) devemos tratar com antibioticoterapia ▪ Se diarreia → Ciprofloxacina ▪ Se uretrite por Chlamydia (documentada) → Macrolídeo ❖ Azitromicina 1 g dose única ou Doxiciclina 100 mg 12/12 horas por 7 dias ❖ Tratar o parceiro também ▪ Infecções sinoviais por Chalmydia → Doxicilina associada a rifampicina por 6 meses reduziu a taxa de cronicidade da doença o Para casos recorrentes e crônicos: ▪ Sulfassalazina 2-3 g/dia ▪ Metotrexato (menos evidência) ▪ Anti-TNF → Casos refratários ARTRITE PSORIÁSICA • Conceito: o Faz muito diagnóstico diferencial com artrite reumatoide e osteoartrite → Muito importante diferenciar o Acomete 7 a 42% dos pacientes com psoríase o Maioria dos casos desenvolve o quadro articular após o cutâneo → Mas, existe uma porcentagem que pode aparecer junto ou até antes do quadro cutâneo (maisdifícil diagnosticar) o Pode ter acometimento axial e sacroileíte → Geralmente relacionado com HLA-B27 o Dactilite, entesite e tenossinovite são comuns o A onicopatia (alteração da unha) é encontrada em até 80% dos casos com artrite psoriásica 27 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 • Epidemiologia: o A psoríase acomete de 2 a 3% da população → Em torno de 1/3 pode aparecer artrite psoriásica (7-42%) o A prevalência é semelhante entre os sexos, mas a forma axial acomete mais homens (3:1) o Acomete geralmente indivíduos de 30 a 55 anos o 40% dos casos têm história familiar de psoríase o Início da artrite psoriásica: ▪ 75% após quadro cutâneo ▪ 15% precedem quadro cutâneo ▪ 10% são simultâneos • Fisiopatologia: o Fatores genéticos → Relação com o gene do HLA ▪ HLA-Cw6 (psoríase + grave) ▪ HLA-B38 e HLA-B39 (artrite periférica) ▪ HLA-B27 (sacroileíte e espondilite) ▪ HLA-DR*04 (progressão radiológica) o Infecção/mimetismo → Faringite antecedendo psoríase gutata o Trauma → Fenômeno de Koebner profundo (artrite pós-trauma) o Obesidade QUADRO CLÍNICO Lesões de psoríase 28 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 • Artrite periférica: o Inicialmente tende a ser oligoarticular assimétrica, mas pode se tornar poliarticular (maioria dos casos) o Há relação variável entre as manifestações cutâneas e o acometimento articular na artrite psoriásica o A onicopatia é encontrada em 80% dos casos com artrite o 95% têm entesite, dactilite ou tenossinovite o 40% podem ter artrite axial • Artrite axial: o Apenas 5% vão desenvolver o quadro axial o Lembra um pouco a artrite reativa, mais assimétrica e unilateral o Sacroilíacas → Assimétrica, unilateral ou bilateral com diferentes graus de acometimento o Coluna → Assimétrica e com lesões salteadas o Oligossintomática o O acometimento espondilítico associa-se com uveíte anterior e insuficiência aórtica CLASSIFICAÇÃO • Quadro articular: o Oligoartrite assimétrica → 70-80% dos casos o Poliartrite simétrica → 5-20% dos casos o Distal (interfalangianas distais) → 10% dos casos (muita associação com onicopatia) o Axial espondilítica → 5-20% dos casos o Artrite mutilante → Mais rara (< 5 % dos casos) • Oligoarticular: o < 5 articulações Lesões de psoríase 29 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 o É a apresentação mais comum → Alguns livros falam que a poliarticular é mais comum o Semelhante à artrite reativa o Artrite assimétrica o Comum em joelhos, interfalangianas de mãos e pés o Pode ter dactilite associada (tenossinovite difusa do dedo afetado) • Poliartrite simétrica: o Lembra o acometimento da artrite reumatoide, mas terá alguns achados mais típicos da psoriásica (como o acometimento de IFD) o Em metade dos casos tem características assimétricas e geralmente acomete IFD • Artrite distal: o Acometimento exclusivo das IFD o Associado ao acometimento ungueal e dactilite “Pencil-in-cup” – Alteração radiográfica clássica, ocorre como se fosse uma reabsorção da falange intermédia e achados como se fosse uma osteoproliferação justarticular 30 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 • Artrite mutilante: o Pelo menos uma articulação totalmente destruída o Destruições ósseas graves (osteólise) → Reabsorção das falanges, anquilose e deformidades (dedo em “telescópio”) o Acomete IFD e IFP • Artrite axial (espondilítica): o Sacroileíte geralmente assimétrica ▪ Bilateral é associada com HLA-B27 ▪ Assintomática em 1/3 dos casos o Espondilite ▪ Sindesmófito não marginal em forma de “alça de jarra” ▪ Curso mais benigno que a EA, devido às lesões salteadas e ao menos acometimento das articulações zigoapofisárias ▪ Semelhante à artrite reativa 31 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 OUTRAS CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS • Outras manifestações: o Dactilite pode estar presente em 30 a 40% dos casos → Erosão o Entesite (35-40%) → Fáscia plantar, tendão de Aquiles, tendões dos joelhos e ombros e ossos pélvicos o Alterações cutâneas o Alterações ungueais • Laboratório: o PCR e VHS podem estar aumentados → Forma poliarticular e prognóstico o FR geralmente é negativo (positivo em 5-9% dos casos) o FAN pode ser positivo (10-15%) o Associação com síndrome metabólica → Glicemia, ácido úrico, colesterol total e frações • Diagnóstico: o Artrite + 3 pontos dos critérios classificatórios de artrite psoriásica (ver tabela) TRATAMENTO • Tratamento farmacológico: o Analgésicos e AINEs (sintomáticos) o Corticoides ▪ Intra-articular ▪ Evitar sistêmico por causa da exacerbação do quadro cutâneo no desmame o Para a artrite periférica: ▪ Metotrexato (cutâneo/articular) ▪ Sulfassalazina (articular) ▪ Leflunomida → Reservada para casos que não responderam ao metotrexato 32 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 ▪ Ciclosporina A → Eficácia bem documentada na psoríase, na artrite psoriásica não tanto ❖ Alguns estudos mostraram que houve melhora quando associada ao MTX após falência deste ❖ Controle → Função renal e PA o Anti-TNF ▪ Usado na artrite psoriásica ativa moderada a grave > 6 meses e com lesões cutâneas psoriásicas / história de psoríase ou quando há resposta inadequada / intolerância a AINE / DMARDS por 3 meses ▪ Podem ser usados em monoterapia ou com metotrexato ▪ Etanercept, infliximabe, adalimumabe, golimumabe e certolizumabe o Outras opções: ▪ Anti-IL17 → Secuquinumbae e ixequizumabe ▪ Anti-IL12/23 → Ustequinumabe ARTROPATIA ENTEROPÁTICA • Conceito: o Artropatias associadas a doenças dos intestinos delgado ou grosso → DII (Retocolite e Crohn), Whipple, doença celíaca e “bypass” cirúrgico o Podem ter tanto um quadro de artrite periférica quanto um quadro de sacroileíte • Artrite periférica: o Relação com atividade de doença (tipo 1) → Se o paciente piora o quadro intestinal pode piorar a artrite periférica o Quadro intestinal mais grave o RCUI (5-10%) e DC (10-15%) • Sacroileíte: o Independente da doença intestinal → Não tem relação com atividade da doença o RCUI (5-15%) e DC (10-15%) o DC → 30% com sacroileíte assintomática o Associação com HLA-B27 (50-70%) o Quadro articular pode preceder o quadro intestinal CLÍNICA • Artrite periférica: o Prevalência igual entre homens e mulheres o Geralmente é uma oligoartrite assimétrica o Autolimitada o Recorrente com atividade de doença 33 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 o Comum em membros inferiores (joelhos e tornozelos) o Pode ter entesites, principalmente do Aquileu e plantar • Sacroileíte: o É mais frequente nos homens (3:1) o Simétrica e bilateral (bem semelhante à EA) o Sintomas e curso clínico são independentes da evolução da doença intestinal • Manifestações extraintestinais: o Estomatite aftosa (< 10%) o Eritema nodoso (10-15%) → Tende a ocorrer nos períodos de atividade do quadro intestinal o Pioderma gangrenosos (2-5%) → Ulcerações profundas e dolorosas na pele o Uveíte anterior aguda (5-15%) → Geralmente unilateral e transitório ▪ DC pode estar associada à uveíte granulomatosa, que tende a cronificar (diferente das outras espondiloartrites, em que a uveíte não é granulomatosa) • Laboratório: o Marcadores da DII ▪ p-ANCA → Positivo na RCUI ▪ ASCA → Positivo na DC o HLA-B27 pode estar presente na forma axial • Imagem: o Radiografias → A imagem das sacroilíacas e de coluna são similares à EA, mas pode ocorrer de forma assimétrica Pioderma gangrenoso x Eritema nodoso 34 REUMATOLOGIA RAUL BICALHO – MEDUFES 103 • Tratamento: o AINEs → Evitamos porque podempiorar o quadro intestinal o Corticoide → Evitamos, utilizando mais intra-articular o Sulfassalazina ▪ Acaba sendo tratamento também para RCUI / DC ▪ Melhor para quadro periférico o MTX e azatioprina → Em casos refratários o Biológicos → Inflixamabe e Adalimumabe o Colectomia → É curativa na RCUI e sem efeito na DC ESPONDILOARTTRITE INDIFERENCIADA • Características gerais: o Geralmente o paciente vai ter alterações clínicas e radiográficas sugestivas de espondiloartrite, mas que não podem ser classificadas dentro de uma das enfermidades o Pode representar: ▪ Estágio precoce de uma doença do grupo ▪ Forma frustra/leve de uma espondiloartrite definida ▪ Síndrome de sobreposição o Tratamento: ▪ Semelhante espondilite anquilosante ▪ Em casos refratários, associar metotrexato e sulfassalazina
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