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Josué Mallmann Centenaro Introdução Durante muito tempo, os fungos foram considerados como vegetais e, somente em 1969, passaram a ser considerados com um reino, o Fungi. Os fungos apresentam um conjunto de características que permitem sua diferenciação das plantas: não sintetizam clorofila nem qualquer pigmento fotossintético; não têm celulose na parede celular, exceto alguns fungos aquáticos; não armazenam amido como substância de reserva. Os fungos são ubíquos, encontram-se em vegetais, em animais, no homem, em detritos e em abundância no solo, participando ativamente do ciclo dos elementos na natureza. A dispersão dos fungos na natureza é feita por várias vias: animais, homens, insetos, água e, principalmente, pelo ar atmosférico, através dos ventos. Os fungos são seres vivos eucarióticos com um só núcleo, como as leveduras, ou multinucleados, como os fungos filamentosos ou bolores e os cogumelos. Estrutura celular Os fungos originam-se de uma única célula ou de um fragmento de hifa e estas unidades apresentam estruturas variadas, e algumas delas, mais especificamente a parede celular, são de grande auxílio na taxonomia destes microrganismos. Parede celular É uma estrutura rígida que protege a célula de choques osmóticos. É composta de glucanas (glicomanoproteínas), mananas (manoproteínas) e, em menor quantidade, por quitina, proteínas e lipídeos. As glucanas nas células fúngicas são normalmente polímeros de D-glicose, ligados por pentoses betaglicosídicas. As mananas, polímeros de manose, representam o material amorfo da parede, e são diferenciados em dois tipos: uma manoproteína não-enzimática, envolvida na arquitetura da parede, e uma manoproteína com características enzimáticas, relacionadas com a degradação de macromoléculas. A quitina, um polímero de glicose, é o principal componente estrutural do exoesqueleto de invertebrados e da parede celular fúngica. Nas leveduras, a quitina encontra-se em menor quantidade do que nos bolores e está restrita à área de blastoconidiação. A quitina é geralmente encontrada como microfibrilas cristalinas, dentro de uma matriz proteica. Membrana citoplasmática Atua como uma barreira semipermeável, no transporte ativo e passivo dos materiais, para dentro e para fora da célula, sendo constituída de uma porção hidrofóbica e de uma porção hidrofílica. As membranas das células fúngicas têm em sua composição química esteróis, que não são encontrados em células bacterianas. Basicamente é composta por lipídeos e proteínas. As proteínas servem como enzimas, que fornecem à membrana diferentes propriedades funcionais, enquanto os lipídeos dão à membrana sua verdadeira propriedade estrutural. Núcleo celular Contém o genoma fúngico e está agrupado em cromossomos lineares, compostos de duplas fitas de DNA arrumados em hélice. Contém também as histonas que são proteínas básicas, associadas com o DNA cromossomal. A membrana nuclear é de natureza lipídica e possui numerosos poros. Dentro do núcleo, encontra-se o nucléolo, um corpúsculo esférico contendo DNA, RNA e proteínas. Este corpúsculo é o sítio de produção do RNA ribossomal. Ribossomos São os sítios da síntese proteica, compostos por RNA e proteína e ocorrem dentro do citoplasma da célula. São formados por duas subunidades, 60S e 40S, e a partícula ribossomal completa tem 80S. Mitocôndrias Sítio de fosforilação oxidativa, composta por membranas de fosfolipídios. Possui membrana interna achatada (crista) e contém seu DNA e ribossomos próprios. Retículo endoplasmático É uma membrana em forma de rede que se encontra distribuída por toda célula fúngica. Está ligada à membrana nuclear, mas não à membrana citoplasmática. Os ribossomos 80S podem estar aderidos ao retículo endoplasmático. Aparelho de Golgi Essa estrutura é uma agregação interna de membranas, que está envolvida no armazenamento de substâncias que serão desprezadas pela célula fúngica. Os vacúolos estão relacionados com o armazenamento de substâncias de reserva para a célula, tais como glicogênio e lipídeos. Lomassomos São corpúsculos que ocorrem dentro do periplasma (espaço entre a parede celular e a membrana citoplasmática) da célula fúngica, com função ainda não conhecida. Morfologia e reprodução Os fungos se desenvolvem em meios especiais de cultivo formando colônias de dois tipos: leveduriformes e filamentosas. As colônias leveduriformes, em geral, são pastosas ou cremosas e caracterizam o grupo de leveduras. Esses microrganismos são unicelulares, em que a própria célula cumpre as funções vegetativas e reprodutivas. As estruturas mais comuns são os blastoconídios, também denominados de gêmulas, que possuem forma em geral arredondada ou ovalada. Por brotamento da célula-mãe, foram-se os brotos ou as células-filhas, que podem desprender-se da célula- mãe, ou permanecer ligados a mesma, em cadeia, formando uma estrutura denominada pseudo-hifa, cujo conjunto é pseudomicélio. As colônias filamentosas que identificam os bolores podem apresentar as mais diversas formas, esses organismos são constituídos fundamentalmente por elementos multicelulares, em forma de tubos (hifas) que podem ser contínuas, não-septadas ou cenocíticas e septadas. O conjunto de hifas dá-se o nome de micélio. O micélio que se desenvolve no interior do substrato, funcionando também como elemento de sustentação e de absorção dos nutrientes, é chamado de micélio vegetativo. O micélio que se projeta na superfície e cresce acima do meio de cultivo é o micélio aéreo. Os conídios (macroconídio) representam o modo mais comum de reprodução assexuada e cumprem importante papel na dispersão dos fungos na natureza. As células que dão origem aos conídios são denominadas conidiogênicas. Os conídios podem ser hialinos ou pigmentados, e apresentam diferentes formas, formados por uma única célula ou ter septos em um ou dois planos, apresentando-se isolados ou agrupados. Fiálide: São células conidiogênicas dos fungos que produzem conídios hialinos (Fialoconídio); As hifas especializadas que originam os conídios são chamadas de conidióforos, que podem ou não ser ramificadas. Normalmente, os conídios são formados na extremidade do conidióforo. Outras vezes nascem em qualquer parte do micélio, e são denominados conídios sésseis. Algumas estruturas são comuns às leveduras e a fungos filamentosos. Os artroconídios são formados por fragmentação de hifas em elementos retangulares. Os clamidioconídios, estruturas de resistência, são células geralmente arredondadas de volume aumentado com paredes duplas e espessas, nas quais se concentra o citoplasma e formam-se em condições ambientais adversas, como escassez de nutrientes, de água e temperaturas não-favoráveis ao desenvolvimento fúngico. Sua localização pode ser apical ou intercalar. Os propágulos assexuados de fungos filamentosos que possuem hifas não-septadas originam-se em estruturas denominadas esporângios por um processo interno de clivagem do citoplasma e são chamados esporangiosporos. Pela ruptura do esporângio, os esporos são liberados. A hifa especial que sustenta o esporângio é denominada esporângio é denominada esporangioforo. Os propágulos sexuados originam-se da fusão de estruturas diferenciadas com caráter de sexualidade. O núcleo haploide de uma célula doadora funde-se com o núcleo haploide de uma célula receptora, formando um zigoto. Posteriormente a divisão meiótica, originam-se quatro ou oito núcleos haploides, alguns dos quais se recombinarão geneticamente. Os propágulos assexuados internos são chamados de ascósporos e formam-se no interior de estruturas denominadas ascos. Os ascos podem ser simples, como algum como em algumas leveduras, oudistribuir-se em lóculos ou cavidades do micélio (ascostroma), ou ainda estar contidos em corpos de frutificação, os ascocarpos. Três tipos de ascocarpos são bem conhecidos: cleistotécio, peritécio e apotécio. A reprodução sexuada entre fungos contribui, através da recombinação genética, para variabilidade necessária ao aperfeiçoamento da espécie. Em geral, esses fungos com reprodução sexuada produzem, em determinadas fases de seu ciclo, estruturas assexuadas os conídios que asseguram a sua disseminação. Essa característica de mudança de tipo de reprodução reflete-se em características morfológicas diferentes e o mesmo fungo recebe denominações diferentes. A fase sexuada dos fungos é denominada teleomórfica ou perfeita e a fase assexuada, anamórfica ou imperfeita. A maior parte das leveduras reproduzem assexuadamente por brotamento ou gemulação e por fissão binária. No processo de brotamento, a célula- mãe origina uma gêmula, o blastoconídios, que cresce e recebe o núcleo após a divisão do núcleo da célula- mãe. Na fissão binária, a célula-mãe divide-se em duas células de tamanhos iguais. No seu ciclo evolutivo, algumas leveduras podem originar esporos sexuados, os ascósporos, após duas fases sofrerem após duas células sofrem fusão celular e nuclear, seguida de meiose. O fenômeno da parassexualidade consiste em fusão de hifas e formação de heterocário que contém núcleos haploides. Às vezes, esses núcleos fundem- se e originam núcleos diploides, heterozigóticos, cujos cromossomos homólogos sofrem recombinação durante a mitose. Apesar de estes recombinantes serem raros o ciclo parassexual é importante na evolução de alguns fungos. Nutrição, crescimento e metabolismo Fungos são microrganismos eucarióticos que se encontram amplamente distribuídos no solo, na água, em alimentos, nos vegetais, em detritos em geral, em animais e no homem, e em sua maioria são aeróbios obrigatórios, com exceção de certas leveduras fermentadoras anaeróbias facultativas, que podem desenvolver-se em ambiente com oxigênio reduzido ou mesmo na ausência deste elemento. Não possuem mecanismos químicos fotossintéticos ou autotróficos para produção de energia ou síntese de constituintes celulares. Os fungos absorvem oxigênio e desprende anidrido carbônico durante seu metabolismo oxidativo. Alguns fungos podem germinar muito lentamente em meio com pouco oxigênio. O crescimento vegetativo e a reprodução assexuada ocorrem nessas condições, enquanto a reprodução sexuada se efetua apenas em atmosfera rica em oxigênio. Devido à ausência de clorofila, os fungos, para se nutrirem, necessitam de substâncias orgânicas que eles próprios são incapazes de elaborar. Assim, são obrigados a viver em estado de saprofitismo, parasitismo ou simbiose. A nutrição da maioria dos fungos dá-se por absorção, processo no qual enzimas adequadas hidrolisam macromoléculas, tornando-as assimiláveis através de mecanismos de transporte. As principais enzimas encontradas em fungos são: lipases, invertases, lactases, amilases, proteinases, etc. Há fungos que têm a capacidade de hidrolisar substâncias orgânicas complexas como quitina, osso, couro e materiais plásticos. Para o seu desenvolvimento, os fungos exigem, de preferência, carboidrato simples como a D-glicose. Entretanto, outros açúcares como sacarose, maltose e fontes de carbono mais complexas como amido e celulose podem também ser utilizadas. Substâncias nitrogenadas inorgânicas, como sais de amônia nitratos, ou orgânicas, como as peptonas e sais minerais como sulfatos e fosfatos, também são necessárias. Micronutrientes como alguns íons também são importantes em pequenas quantidades. Alguns fungos também requerem fatores de crescimento que não conseguem sintetizar, em especial vitaminas como tiamina, biotina, riboflavina, ácido pantotênico, etc. A temperatura de crescimento abrange uma larga faixa, havendo espécies psicrófilas, mesófilas e termófilas. Os fungos de importância médica, em geral, são mesófilos, apresentando temperatura ótima entre 20 e 30ºC. Os fungos podem ter morfologia diferente, segundo condições nutricionais e a temperatura de seu desenvolvimento. O fenômeno de variação morfológica mais importante em micologia médica é o dimorfismo fúngico que se expressa por um crescimento micelial entre 22 e 28°C e leveduriforme entre 33 e 37°C. Em geral, essas formas são reversíveis. Em laboratório, é possível reduzir de morfismo mediante variações de temperatura de incubação, de tenção de O2 e meios de cultura específicos. A maioria dos fungos toleram uma ampla variação na concentração de íons hidrogênio e, de modo geral, um pH em torno de 5,6 é ótimo para o desenvolvimento dos mesmos. Os fungos filamentosos podem crescer em ampla faixa de pH variando de 1,5 a 11. As leveduras não toleram pH alcalino. A pigmentação dos cultivos, muitas vezes, está relacionada com o pH do substrato. Alguns microrganismos podem influenciar o crescimento fúngico, devido à competição que o estabelece que se estabelece no substrato de cultivo. Esse antagonismo, muitas vezes, é consequência da elaboração de substâncias tóxicas. O crescimento dos fungos é mais lento que das bactérias, e suas culturas precisam, em média, de 7 a 15 dias ou mais de incubação. Com a finalidade de impedir o crescimento bacteriano, que pode inibir ou se sobrepor ao do fungo, é necessário incorporar aos meios de cultura antibacterianos de largo espectro, como o cloranfenicol. Também se pode acrescentar ciclo-heximida para diminuir o crescimento de fungos saprófitas contaminantes dos cultivos. Taxonomia dos fungos Os fungos são atualmente enquadrados em três reinos distintos: Chromista, Fungi e Protozoa. O reino Chomista abrange microrganismos geralmente unicelulares com parede celular sem quitina e β- glucanas, mas contendo celulose. Os representantes do Reino Protozoa são predominantemente unicelulares sem verdadeira parede celular contendo cloroplastos. A maior parte das espécies não causam doenças ao homem. Os fungos patogênicos e oportunistas mais importantes estão distribuídos em três filos do reino Fungi: Zygomycota, Basidiomycota, Ascomycota e no grupo de Deuteromycetes. Filo Ascomycota Agrupa fungos de hifas septadas. Sua principal característica é o asco, estrutura em forma de bolsa ou saco, no interior do qual são produzidos os ascósporos, e esporos sexuados, com forma, número e cor variáveis para cada espécie. Conídios, propágulos assexuados também são encontrados. Compreende 80% das espécies fúngicas patogênicas e oportunistas. Três classes no filo Ascomycota possuem espécies patogênicas para o homem: Hemiascomycetes, Loculoascomycetes e Plectomycetes. Filo Basidiomycota Compreende os fungos superiores ou cogumelos comestíveis. Apresentam hifas septadas e não são caracterizados pela produção de esporos sexuados externos, os basidiósporos, típicos para cada espécie. Conídios ou propágulos assexuados podem ser encontrados. A classe Teliomycetes contém a espécie patogênica mais importante Filobasidiella neoformans. Filo Zygomycota Inclui os fungos de micélio cenocítico, ainda que septos possam separar estruturas como esporângios. A reprodução pode ser sexuada pela formação de zigosporos e assexuada com a produção de esporos, os esporangiosporos, no interior de esporângios. A classe dos Zygomycetes são fungos de interesse médico encontrados nas ordens: Mucolares e Entomophthorales. Deuteromycetes (fungos mitospóricos) Todos os fungos que não tem conexão com as Ascomycetes e Basidiomycetes são incluídos no grupo artificial dos Deuteromycetes. Outros termos como fungos imperfeitos, fungos assexuados e fungos conidiais têm sido usados para designar estes organismos. Ainda que outros fungospossuem estruturas assexuadas e, como Omycota e Zygomycota estes organismos nunca foram tratados como Deuteromycetes. A grande maioria dos fungos desse grupo tem habilidade no solo e são os principais componentes da microbiota atmosférica. Fungos patogênicos e oportunistas em sua maioria estão no grupo dos Deuteromycetes entre as classes Blastomycetes, Coelomycetes e Hyphomycetes. Filo Oomycota O filo Oomycota compreende aproximadamente 700 espécies que possuem características de parede celular com celulose e habitat próprio, geralmente a água. Nos filos Oomycota e Hyphochytriomycota, que pertence ao rei do Chromista, são reconhecidos dois agentes fúngicos, Rhinosporidium seeberi e Pythium insidiosum, de relativa importância em micologia médica.
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