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ITU FISIOLOGIA RENAL NA GRAVIDEZ - O trato urinário e os rins sofrem várias alterações fisiológicas, funcionais e anatômicas durante a gravidez. • Na gestação, o tamanho dos rins e a filtração glomerular aumentam, e ocorre relaxamento da musculatura lisa, com consequente diminuição na peristalse do sistema coletor e dos ureteres, além do aumento na capacidade vesical. O volume, o peso e o tamanho dos rins aumentam, o comprimento renal cresce em até 1,5 cm. Essa última alteração decorre provavelmente do aumento do interstício e da rede vascular renal, decorrentes do incremento da taxa de filtração glomerular e do fluxo plasmático renal. • O fluxo sanguíneo renal aumenta em 50 a 85% na gestação, especialmente na primeira metade da gestação. Essas alterações podem modificar a farmacocinética de inúmeros medicamentos. Após o parto, em poucas semanas, todos esses parâmetros normalizam. • A partir do primeiro trimestre gestacional, ocorre a dilatação da pelve renal e dos ureteres, que se torna mais evidente no terceiro trimestre. Os fatores obstrutivos e de relaxamento da musculatura lisa induzida pela progesterona também propiciam uma diminuição significativa na peristalse dos ureteres e um aumento da capacidade vesical → A hidronefrose gestacional é mais evidente à direita e está presente em graus variáveis em até 90% das gestantes, resolvendo-se espontaneamente 4 a 6 semanas após o parto. Eventualmente, a hidronefrose fisiológica da gravidez pode ser suficiente para causar dor lombar. • O aumento da taxa de filtração glomerular e do fluxo plasmático renal é responsável por inúmeras alterações nas dosagens plasmáticas de vários marcadores da função renal, como, por exemplo, uma diminuição nos valores da ureia e da creatinina plasmática. A concentração plasmática de ácido úrico decresce durante o primeiro e o segundo trimestres de gestação. Isso ocorre devido ao aumento de sua depuração secundária ao incremento do fluxo plasmático renal → Quando a concentração sérica do ácido úrico está elevada, ou mesmo no limite superior da normalidade, pode significar redução do fluxo sanguíneo renal e da filtração glomerular, situação encontrada em pacientes com pré-eclâmpsia e com insuficiências renais agudas e crônicas. • Durante a gravidez normal, o aumento médio de peso materno é de 10 a 14 quilos, constituídos de 7 a 9 litros de água corporal total, sendo 4 a 6 litros no espaço extracelular. A maior retenção de sódio e água leva ao aumento do volume plasmático e do fluido extracelular, sendo que essa última alteração é vista principalmente no último trimestre. Esse incremento no volume circulante leva também a um aumento fisiológico do débito cardíaco. Tais alterações são determinadas, em parte, pela maior secreção de hormônios, incluindo estrogênios, progestá genos, prostaglandinas, aldosterona, etc. • O aumento da filtração glomerular leva a uma maior reabsorção tubular decorrente do balanço túbulo-glomerular. Dentro da função tubular, existe uma diminuição da reabsorção de glicose, que, junto com o aumento de sua filtração glomerular, pode levar à glicosúria. INFECÇÃO URINÁRIA NA GRAVIDEZ - A infecção do trato urinário (ITU) é comum durante a gestação, estimando-se que até 10% das gestantes são acometidas por algum episódio de infecção urinária ou bacteriúria assintomática. Pode ser classificada em baixa (cistite e BA) ou alta (pielonefrite) → Na gestante, a ITU baixa representa risco importante de desenvolvimento de pielonefrite aguda (PNA), que eleva a morbidade materna e perinatal, sendo diretamente relacionada com prematuridade. - A estase urinária provocada pela ação miorrelaxante da progesterona e pela compressão mecânica do útero sobre os ureteres, as alterações físico-químicas da urina, como aumento do conteúdo de glicose, aminoácidos e vitaminas na urina favorecendo um meio propício ao crescimento bacteriano, assim como a imunidade celular diminuída na gravidez, são todos fatores que, em conjunto, tornam a gestante mais suscetível às infecções urinárias. 1. Bacteriúria assintomática: - É definida como a presença significativa de bactérias (≥ 100.000/ufc/mL) no trato urinário na ausência de sintomas. NA GESTAÇÃO - Cerca de 2 a 10% das gestantes tem BA, além disso, entre as gestantes com BA não tratadas, 30 a 40% irão desenvolver ITU sintomática e 25 a 50% poderão apresentar pielonefrite; por isso, é importante que o rastreamento seja realizado durante o pré-natal. - Fatores de risco: baixo nível socioeconômico, multiparidade, atividade sexual, diabete, hemoglobinopatias, anormalidades do trato urinário, ITU prévia à gestação e tabagismo. - Existem evidências sugerindo que pacientes com bacteriúria assintomática apresentem incidências aumentadas de anemia, hipertensão, aborto, ruptura prematura de membranas, prematuridade, crescimento intrauterino restrito e baixo peso ao nascer. - Diagnóstico: urocultura positiva coletada por jato médio em paciente sem sintomas urinários. - O tratamento da BA deve ser feito com antimicrobianos aos quais a bactéria seja sensível, já que, para o diagnóstico, é sempre necessária a presença da identificação do agente. Os antibióticos utilizados na ITU sintomática e assintomática são os mesmos → Recomenda-se a manutenção do tratamento por três dias nos casos de BA ou ITU sintomática com parada dos sintomas em até 24 horas. Na persistência dos sintomas além de 24 horas, o tratamento deverá ser continuado até sete dias. - No seguimento, deve-se realizar uma urocultura de controle uma semana após o término do tratamento, e, se negativa, a urocultura deve ser repetida mensalmente até o término da gestação. - Na ocorrência de dois ou mais episódios de ITU na gestação, deve-se prescrever profilaxia antimicrobiana, independentemente da presença ou não de fatores predisponentes → Para isso, os ATB mais utilizados são a nitrofurantoína (100 mg), a ampicilina (500 mg) ou a cefalexina (500 mg) por via oral, com uma dose à noite, até duas semanas após o parto. 2. Cistite: - É definida como a presença de bactérias associadas a sintomas urinários baixos. Está presente em até 2% das gestantes. - Sintomas comumente associados incluem disúria, urgência miccional, polaciúria, dor suprapúbica, hematúria e urina fétida. - Embora o diagnóstico de certeza só seja realizado com uma urocultura positiva, a presença de estearase leucocitária, de nitritos ou de leucocitúria associados a sintomas urinários sugere fortemente cistite, indicando um tratamento antibacteriano adequado → OBS.: Contagens menores do que 100 mil colônias por mililitro devem ser valorizadas, quando há sintomas ou quando a urina foi obtida por cateterização. - Gestantes com BA ou ITU por Streptococcus do grupo B devem receber o tratamento preferencialmente com ampicilina e, por ocasião do trabalho de parto, devem fazer profilaxia para a prevenção da esptreptococemia neonatal. - A escolha do antimicrobiano no tratamento da cistite deverá ocorrer de acordo com a bactéria isolada, a segurança gestacional da droga e o antibiograma. Quando a paciente estiver muito sintomática, não podendo esperar pelo resultado da urocultura, pode-se iniciar com uma penicilina (p. ex., ampicilina) ou nitrofurantoína, após rastreamento de infecção por meio de fita reagente. - Após o tratamento, deve-se realizar pelo menos uma urocultura de controle uma semana após o tratamento e, após, a cada dois meses, ou mais frequentemente na presença de fatores de risco. - O uso de regimes de tratamento com dose única de 3 g de fosfomicina trometamol é tão efetivo em atingir a cura da cistite quando regimes de 7 a 10 dias de trata mento com agentes tradicionais, como o sulfametoxazol/trimetoprim, a nitrofurantoína ou a ampicilina. Os da dos obtidos até o momento sugerem que ela seja uma droga segura e uma alternativa eficaz para tratamento da BA e da cistitena gestação. 3. Pielonefrite aguda: - É a infecção urinária que compromete o sistema coletor e a medula renal. Ocorre em até 2% das gestações e está associada a riscos maternos e fetais, sendo uma das principais causas de hospitalização durante a gestação. - É um dos eventos mais graves na gestante, sendo mais prevalente durante a gravidez do que fora dela por causa das alterações anatômicas e funcionais corridas durante a gestação, em especial o refluxo vesicoureteral. - Fatores de risco para PNA grave e sua recorrência: malformações do trato urinário e cálculos renais. - O agente patológico mais comum é a Eschirichia coli, mas também podem estar envolvidos outros Gram-negativos, como a Klebsiella e o Enterobacter, bem como os Gram-positivos Enterococcus faecalis e o Staphylococcus aureus. - Diagnóstico: feito por meio da suspeita clínica, devendo ser confirmado pela urocultura. Os sintomas clínicos normalmente encontrados são: hipertermia, calafrios, náuseas/vômitos, dor lombar, dor à percussão lombar, disúria, polaciúria, urgência miccional e urina turva/fétida. Além disso, são esperadas algumas alterações laboratoriais na pielonefrite aguda, tais como: leucocitúria, bacteriúria, leucocitose com desvio para a esquerda, hemocultura positiva e aumento da creatinina sérica. Observações: • As fluorquinolonas (norfloxacina e ciprofloxacina) não devem ser prescritas de rotina pelo seu custo e por efeito raro de artropatia (descrito somente em animais), sendo reservadas para casos especiais. • O sufmetoxazol-trimetoprim deve ser evitado após a 32a semana e no primeiro trimestre. O trimetoprim é antagonsita do ácido fólico e pode estar associado a defeitos do tubo neural e cardiovasculares quando utilizado no primeiro trimestre. - Na suspeita diagnóstica, deve ser iniciado tratamento com antimicrobiano intravenoso em regime de internação + hidratação com solução fisiológica para combater a hipovolemia. • A ampicilina (1-2 g, IV, 6/6 h) é ainda uma boa alternativa para o início de tratamento, pois, em geral, tem ação efetiva contra a E. Coli. Como drogas de segunda linha, encontram-se os aminoglicosídeos, atentando-se para a possível ação ototóxica para o feto. • Na ausência de resposta, devemos investigar outros fatores, como cálculo renal ou abscesso renal ou perinéfrico. • Se em 48 horas não houver melhora significativa do quadro clínico (ausência de hipertermia, diminuição significativa da dor lombar, ausência de calafrios), pode-se considerar a troca do antibiótico ou adicionar outro agente antimicrobiano. • Como as cefalosporinas de primeira geração têm sido utilizadas na profilaxia da infecção pós-cesariana, não devem ser utilizadas em tratamentos durante o pré-natal. - A escolha antimicrobiana e a duração do tratamento devem levar em conta fatores locais de resistência e seguem em discussão na literatura. Após a resolução dos sintomas, o tratamento por via oral pode ser instituído e mantido até completar 14 dias de tratamento. - A quimioprofilaxia deve ser prescrita após a ocorrência de um episódio de PNA associada ou não a fatores de risco. A droga mais prescrita para profilaxia é a nitrofurantoína (100 mg ao deitar) até duas semanas após o parto → Nas pacientes alérgicas à nitrofurantoína, pode-se utilizar a ampicilina. Uma opção à profilaxia é a realização de uroculturas mensais para identificar precocemente novo episódio de ITU, após a negativação da urocultura. - Importante é a orientação de medidas de higiene, hidratação e micção adequadas. LITÍASE URINÁRIA - A incidência de cálculo urinário é de 1/200 a 1/2.000 em gestantes e entre mulheres em idade reprodutiva, sendo uma causa importante de internação durante a gravidez. Os principais fatores relacionados com a litíase são: ITU crônica, hiperperatireoidismo, uropatia obstrutiva e história familiar de litíase. - A litíase sintomática ocorre em apenas 25% dos casos, sendo que 80 a 90% dos cálculos manifestam-se no 2o ou 3o trimestre. Entre as gestantes com litíase, até 40% têm trabalho de parto pré-termo. - O sintoma mais comum (80% das vezes) é dor abdominal aguda em cólica no flanco. A dor costuma ser menos típica do que nas pacientes não grávidas, e pode ser difícil fazer o diagnóstico diferencial com outras causas de dor abdominal, como apendicite, colecistite, diverticulite, torção ovariana, devido ao deslocamento dos órgãos abdominais pelo útero expandido. Além disso, cerca de 95% das pacientes apresentam algum grau de hematúria, que pode ser microscópica ou macroscópica. - Na gestação, a principal localização dos cálculos é nos ureteres, sendo que mais de 90% possuem cálcio na sua formação. - O exame de escolha para ser utilizado de rotina nas gestantes com suspeita clínica de cálculo renal é a ultrassonografia de vias urinárias, que, apesar da sua baixa sensibilidade (34%), tem especificidade muito boa (86%) → Com frequência, esse exame não consegue fazer o diagnóstico devido à dificuldade de visualização do ureter inteiro ou, na presença de dilatação do trato urinário, pela dúvida a respeito da dilatação ureteral ser ou não própria da gestação. Nesses casos, pode-se lançar mão do raio X simples de abdome à procura de cálculos radiopacos e, até mesmo, em casos selecionados, da urografia excretora (exposição fetal 0,2 rad). Se indicada urografia excretora, é recomendado realizar o mínimo de exposições possível. - Entre as pacientes sintomáticas, 70 a 80% têm cura espontânea com manejo conservador, utilizando-se repouso, hidratação e analgesia. Quando houver persistência de sintomas ou obstrução, a paciente deve ser avaliada por um urologista. - Na grande maioria das vezes, as intervenções cirúrgicas estão indicadas nos casos sem melhora da dor, com sepse ou com obstrução unilateral. O objetivo do tratamento deve ser aliviar a obstrução e preservar a função renal. • A nefrostomia percutâna é mais custo-efetiva e tem sucesso em até 90% dos casos. Após a sua realização, está indicado manter quimioprofilaxia com antibióticos. As principais complicações são o sangramento e o deslocamento do tubo. • A ureteroscopia pode ser realizada durante a gestação, sendo de mais fácil execução no terceiro trimestre, cujos principais riscos são perfuração do ureter e sepse. • A fluoroscopia deve ser evitada. • A colocação do duplo-J permite o tratamento da gestante e o adiamento de um tratamento mais definitivo para após o parto, sendo essa opção a mais utilizada durante a gestação. • Os procedimentos cirúrgicos abertos (nefrolitomia, pielolitotomia e ureterolitomia) são raramente indicados na gestação em casos de sepse grave, na qual os demais procedimentos foram falhos. • Na gestação, a litotripsia extracorpórea está contraindicada. - Após o término da gestação, as pacientes devem seguir acompanhamento com urologista.
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