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1 de 4 RESENHA: atenção psicossocial a crianças e adolescentes no SUS Cosme Rezende Laurindo1 18/04/2019 Como material disparador para a discussão sobre a atenção psicossocial a crianças e adolescentes no Sistema Único de Saúde (SUS), foi proposta a leitura do documento “Atenção psicossocial a crianças e adolescentes no SUS: tecendo redes para garantir direitos”, publicado em 2014 pelo Ministério da Saúde (MS), tendo sido um produto construído por diversos órgãos, em que cita-se: Secretaria de Atenção à Saúde (SAS) do MS; Coordenação-Geral de Saúde Mental Álcool e Outras Drogas; Coordenação-Geral de Saúde da Criança e Aleitamento Materno e Coordenação Geral de Saúde do Adolescente e do Jovem; e a Comissão de Aperfeiçoamento da Atuação do Ministério Público na Área da Infância e Juventude do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). O documento introduz a discussão a partir da contextualização histórica não só da atenção psicossocial, mas também do papel e da forma como crianças e adolescentes foram e são tratados na sociedade. Inicia pautando que é bastante presente marcas de controle e assujeitamento em uma determinada posição, por conta do Estado, bem como indica que o modelo antigo ia pela via da institucionalização como forma da garantia de direitos, sem que houvesse trabalho em território. Historicamente traz a década de 20 enquanto marco inicial de legislação sobre assistência e proteção à criança e ao adolescente, a partir do Movimento de Defesa dos direitos destes, sendo que destaca que no percurso histórico três são as legislações que devem ser levadas em consideração: Código Mello Mattos (1927); Código de Menores (1979); e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) (1990). Aponta-se que grande parte dos avanços foram pautados por forte aliança entre médicos e juristas, ainda sobre o viés institucionalizante, contudo, já com ganhos como por exemplo caracterização de situação de risco a estes sujeitos. Na década de 80, com o Movimento Nacional de Promoção e Defesa dos Direitos de Crianças e Adolescentes, os defensores desta pauta investem na entrada 1 Enfermeiro. CV: http://lattes.cnpq.br/9954590863114471. cosmelaurindo@outlook.com http://lattes.cnpq.br/9954590863114471 mailto:cosmelaurindo@outlook.com 2 de 4 e garantia dos direitos na constituição que viria a ser aprovada em 1988, apontando as crianças enquanto de necessidade de prioridade nacional, sendo respaldada esta luta a partir das constatações da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1945) e Declaração Universal dos Direitos da Criança (1959). O documento sinaliza e contextualiza ainda sobre a Convenção dos Direitos da Criança, aprovada pela Organização das Nações Unidas em 1989 e ratificada nacionalmente em 1990, bem como pontua de que maneira foi materializado no ECA, por meio da proteção integral, observada nos seguintes pontos do estatuto: a) Primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias; b) Precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública; c) Preferência na formulação e execução de políticas; d) Destinação privilegiada de recursos. Com o ECA entrando em vigor, passa-se a compreender que a lógica antes de institucionalização já não é a ideal, sendo que há priorização de medidas em meio aberto quando se trata deste público, sendo que nos casos em que demandem medidas restritivas, deve-se observar a excepcionalidade do caso, bem como buscar maior brevidade possível. Destaca-se que começa a haver uma mudança do perfil assistencialista para uma atenção integral em vias de fato. Neste contexto, em 2012, vem a Lei nº. 12.594, que institui o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE), que objetiva levantar parâmetros mais justos que possam evitar ou limitar a discricionariedade e reafirma o caráter pedagógico da medida socioeducativa. A partir de então, o foco para a lida com crianças e adolescentes deixa de ser através da institucionalização e estes sujeitos começam a ser compreendidos enquanto detentores de direitos, não sendo sujeitos completos, mas sim, como reforça o ECA, “estando por vir”, detentores sim de autonomia, mesmo que ainda não de independência. Sendo então sujeitos de direitos, um destes direitos é o direito a saúde, em que o ECA atribui ao SUS: a função de promover o direito à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais e públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, por meio do acesso universal e equânime às ações e aos serviços para a promoção, a proteção e a recuperação da saúde, voltados para o público de gestantes, parturientes, nutrizes, recém-nascidos, crianças e adolescentes até os 18 anos. 3 de 4 Descreve, de maneira resumida, que caberá enquanto ações para os primeiros anos de vida a estimulação precoce e o favorecimento do desenvolvimento emocional, cognitivo e social. Considerando a criança, na perspectiva do MS, de zero a nove anos, há então uma linha de cuidado respaldada por indicadores, desde a promoção até a recuperação em saúde, perpassando prevenção de doenças e agravos, bem como cura. O material destaca ainda que para que haja atenção integral à criança, deve- se garantir atenção integral à mãe, determinando enquanto ações para tal: atenção humanizada perinatal e aleitamento materno ao recém-nascido; desenvolvimento integral na primeira infância; prevenção de violências e promoção da cultura de paz; atenção de crianças em situações específicas e de vulnerabilidade; prevenção e atenção às doenças crônicas e aos agravos prevalentes na infância, tendo como coordenadoras do cuidado a Atenção Básica. Quanto aos adolescentes, o material traz que a atenção seja voltada aos hábitos e comportamentos, considerando o processo histórico de exclusão e discriminação destes. Frente à tantas demandas de cuidado, torna-se imprescindível que todas as ações sejam acompanhadas de articulação de rede inter e intra setorial, de maneira a não só efetivar a assistência, mas de perpetuá-la. De maneira a propiciar saúde, o material aponta que é necessário que haja saúde mental. O sujeito enquanto ser complexo detém diversas dimensões que precisam ser cuidadas de maneira integral: biopsicossocial e espiritualmente. Entendendo a produção de saúde enquanto responsabilidade do sujeito e que todo o cuidado deve ser emancipatório, verifica-se que é a partir da relação que será prestada a assistência e, compreendendo a relação enquanto troca, tornar-se imprescindível a garantia do direito à palavra e valorização da criança ou do adolescente enquanto pessoa que fala por si e não só simbólico representado e falado pelo outro (responsável legal). Para que seja construída uma política de saúde mental infanto-juvenil que considere todo o complexo dito anteriormente, existem algumas diretrizes: a) A criança e o adolescente são sujeitos e, como tal, são responsáveis por sua demanda e seu sintoma. Inviável pensar em tratamento e abordagens de forma homogênea e prescritiva; b) Acolhimento universal, garantido inclusive a partir da demanda; c) Encaminhamento implicado e corresponsável; 4 de 4 d) Construção permanente da rede e da intersetorialidade; e) Trabalho no território; f) Avaliação das demandas e construção compartilhada das necessidades de saúde mental. O material introduz então o que é a Rede de Atenção Psicossocial pensada a partir da Portaria nº. 3088/2011, elencando todos os seus pontos, bem como as atribuições principais, de maneira a contextualizar o papel frente a saúde mental infanto-juvenil e conclui apontando os temas que são relevantes para a discussão da área: a) O papel estratégico da educação: em que evidencia as potencialidades frente a formação do sujeito e trabalho da construção de cidadania; b) Proteção social integral, atenção em saúde e medidas socioeducativas:em que elabora sobre a proteção social integral, defendendo um acolhimento institucional de maneira criteriosa e crítica, e atenção em saúde, em que aponta para a importância da rede de atenção extra-hospitalar, bem como explicita os três tipos de internação possíveis (voluntária, involuntária e compulsória); c) Uso e dependência de drogas: em que traz apontamentos que esta é uma questão que deve ser avaliada a partir do contexto do sujeito e da perspectiva da redução de danos; d) Atenção às crianças e aos adolescentes e às suas famílias em situação de violência. O material é conciso, mas bastante interessante, sendo que se faz importante destacar que foi desenvolvido não enquanto aprofundamento teórico sobre o tema, mas sim para socialização de conhecimento para os profissionais que atuam no sistema de garantia de direitos de crianças e adolescentes, promotores de justiça, defensores públicos, juízes, gestores e profissionais de saúde, de maneira que não só a linguagem demanda maior acessibilidade como também assertividade da escolha do que seria tratado. Torna-se, assim, material essencial para quem está tendo um primeiro contato e precisa compreender de que maneira é possível produzir saúde, sem retomar concepções ultrapassadas de que a criança e o adolescentes nada têm a dizer ou que a melhor forma de lidar com as demandas complexas é pela via da institucionalização. REFERÊNCIAS BRASIL. Ministério da Saúde. Atenção psicossocial a crianças e adolescentes no SUS: tecendo redes para garantir direitos. Brasília: Ministério da Saúde, 2014. 60 p.
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