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Uma insuperável amostra essa das “descobertas” da Economia vulgar. Ela substitui uma categoria econômica por uma frase sicofanta. Voilá tout. “Quando o selvagem”, pontifica Senior, “fabrica arcos, exerce uma indústria, mas não pratica a abstinência.” Isso nos explica como e por que nas condições sociais pretéritas, “sem a abstinência” do capitalista, foram fabricados instrumentos de trabalho. “Quanto mais a sociedade progride, tanto mais abstinência ela exige”,466 a saber, por parte daqueles que exercem a indústria de se apropriar da indústria alheia e do produto desta. Todas as condições do processo de trabalho transformam-se de agora em diante em outras tantas prá- ticas de abstinência do capitalista. Que o trigo não seja apenas comido, mas também semeado, abstinência do capitalista! Que o vinho obtenha o tempo para terminar de fermentar, abstinência do capitalista!467 O capitalista rouba a seu próprio Adão, quando “empresta ao trabalhador os instrumentos de produção” (!), aliás, mediante incorporação de força de trabalho, os valoriza como capital, em vez de comer máquinas a vapor, algodão, estradas de ferro, esterco, animais de tração etc. ou, como o economista vulgar infantilmente imagina, de dissipar “seu valor” em luxos e outros meios de consumo."468 Como a classe capitalista deva cometer isso é até aqui um segredo teimosamente guardado pela Economia vulgar. Basta, o mundo vive somente da automortificação desse moderno penitente de Vixnu, o capitalista. Não apenas a acu- mulação, também a simples “manutenção de um capital exige um esforço constante para re- sistir à tentação de comê-lo”.469 É preciso pois, por simples humanidade, libertar o capitalista OS ECONOMISTAS 230 466 SENIOR. Op. cit., pp. 342-343. 467 "Nenhum ser humano (...) por exemplo, semeará seu trigo e o deixará ficar um ano embaixo da terra ou guardará seu vinho por anos na adega, em vez de consumir imediatamente essas coisas ou seus equivalentes (...) se não espera obter um valor adicional etc." (SCROPE. Polit. Econom. Ed. de A. Potter, Nova York, 1841, p. 133.) 468 "A privação que o capitalista se impõe, ao emprestar seus meios de produção ao trabalhador" (esse eufemismo é utilizado para, de acordo com a provada mania da Economia vulgar, identificar o trabalhador assalariado, explorado pelo capitalista industrial, com o mesmo capitalista industrial, que toma dinheiro emprestado ao capitalista prestamista) “em vez de dedicar seu valor ao seu próprio uso, transformando-os em objetos úteis ou agradáveis.” (MOLINARI. G. de, Op. cit., p. 36.) 469 "La conservation d’un capital exige (...) un effort (...) constant pour résister à la tentation de le consommer." (COURCELLE-SENEUIL. Traité Théorique et Pratique des Entreprises Industrielles. Paris, 1857. p. 20.)
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