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MICROBIOLOGIA E IMUNOLOGIA BARBARA MILLANI FROES THIAGO ROJAS CONVERSO Microbiologia e Imunologia Barbara Millani Froes 2022 Thiago Rojas Converso PRESIDENTE Frei Thiago Alexandre Hayakawa, OFM DIRETOR GERAL Jorge Apóstolos Siarcos REITOR Frei Gilberto Gonçalves Garcia, OFM VICE-REITOR Frei Thiago Alexandre Hayakawa, OFM PRÓ-REITOR DE ADMINISTRAÇÃO E PLANEJAMENTO Adriel de Moura Cabral PRÓ-REITOR DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO Dilnei Giseli Lorenzi COORDENADOR DO NÚCLEO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA - NEAD Renato Adriano Pezenti GESTOR DO CENTRO DE SOLUÇÕES EDUCACIONAIS - CSE Franklin Portela Correia REVISÃO TÉCNICA Michelle Darrieux Sampaio Bertoncini PROJETO GRÁFICO Centro de Soluções Educacionais - CSE DIAGRAMADORES Regilene Moraes Honorato CAPA Regilene Moraes Honorato © 2021 Universidade São Francisco Avenida São Francisco de Assis, 218 CEP 12916-900 – Bragança Paulista/SP CASA NOSSA SENHORA DA PAZ – AÇÃO SOCIAL FRANCISCANA, PROVÍNCIA FRANCISCANA DA IMACULADA CONCEIÇÃO DO BRASIL – ORDEM DOS FRADES MENORES O AUTOR BÁRBARA MILANI FRÓES Bárbara Milani Fróes, é formada em Farmácia pela Fundação de Ensino e Pesquisa- MG, Mestre em Ciências da Saúde- Universidade São Francisco, Auditora de Qualida- de PALC- SBPC e Graduação Lato Sensu em Análises Clínicas e Microbiologia. Possui experiência em laboratório de análises clinicas, microbiologia e imunologia. Desde 2020 é docente da Universidade São Francisco ministrando os componentes curricu- lares microbiologia, imunologia, biossegurança, bioquímica laboratorial e controle de qualidade microbiológico. THIAGO ROJAS CONVERSO Thiago Rojas Converso, é formado em biotecnologia pela Universidade Federal de Alfe- nas – MG. Possui doutorado em Ciências pela Universidade de São Paulo e Pós-dou- torado em Imunologia pela Universidade de Lund, Suécia. Desde 2019 é professor na Universidade São Francisco ministrando as disciplinas microbiologia e imunologia em diversos cursos da área da saúde. Integra o Laboratório de Microbiologia Molecular e Clínica onde pesquisa fatores de virulência bacterianos como antígenos vacinais e suas influências na colonização e formação de biofilme pelas bactérias. Como pesquisador, já publicou 14 trabalhos em revistas científicas internacionais de alto impacto e possuí colaboração com grupos de pesquisa internacionais. O REVISOR TÉCNICO MICHELLE DARRIEUX SAMPAIO BERTONCINI Possui graduação em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de São Car- los (2001), doutorado em Biotecnologia pela Universidade de São Paulo (2007) e pós-doutorado pela Universidade de Lund, na Suécia (2018). Tem experiência nas áreas de Biologia Molecular e Imunologia, com ênfase no desenvolvimento de novas estratégias vacinais contra patógenos humanos e investigação dos mecanismos de interação patógeno-hospedeiro. Sua expertise técnica inclui clonagem e expressão de genes em sistemas heterólogos, produção e purificação de proteínas recombinantes; técnicas de análise de respostas imunológicas e modelos animais de infecção. Atua principalmente nos seguintes temas: Vacinas; Streptococcus pneumoniae; proteínas quiméricas; peptídeos antimicrobianos; sistema complemento. É docente do Progra- ma de Pós-graduação em Ciências da saúde desde 2009. Foi coordenadora do mes- mo Programa entre 2014 e 2016, presidente do Comitê de ética em pesquisas envol- vendo animais de experimentação e membro do comitê de ética em pesquisa envolvendo voluntários humanos (2011-2019). Atualmente é docente do Programa de Pós-graduação em Ciências da Saúde da Universidade São Francisco, onde desenvolve projetos na área de desenvolvimento de novas formulações vacinais contra patógenos humanos e análise da interação patógeno-hospedeiro, com foco em componentes da imunidade inata (peptí- deos antimicrobianos e moléculas do sistema complemento). Também é membro do comitê de ética em pesquisas envolvendo animais de experimentação. SUMÁRIO UNIDADE 01: CARACTERÍSTICAS GERAIS DOS MICRORGANISMOS: BACTÉRIAS, FUNGOS E VÍRUS .....................................................................................................13 1. Microbiologia ......................................................................................................13 2. Bactérias ............................................................................................................15 3. Vírus ...................................................................................................................20 UNIDADE 02: MORFOLOGIA, ASPECTOS DA MICROSCOPIA E COLORAÇÕES USADAS EM MICROBIOLOGIA ..............................................................................28 1. Morfologia E Arranjo Bacteriano ..........................................................................28 2. Colorações Usadas Em Microbiologia ................................................................30 3. Técnicas Em Microscopia....................................................................................33 UNIDADE 03: METABOLISMO E CULTIVO MICROBIANO .................................41 1. Metabolismo Microbiano .....................................................................................41 UNIDADE 04: METABOLISMO E ANTIMICROBIANOS: MECANISMO DE AÇÃO .53 1. Antimicrobianos ...................................................................................................53 2. Mecanismo De Ação Dos Antibióticos .................................................................54 3. Mecanismo De Ação Dos Antifúngicos ................................................................56 4. Mecanismo De Ação Dos Antivirais .....................................................................57 UNIDADE 05: RESISTÊNCIA BACTERIANA E ANTIBIOGRAMA ........................63 1. Mecanismo De Resistência Dos Antibióticos ......................................................63 2. Antibiograma .......................................................................................................66 UNIDADE 06: CONTROLE DE CRESCIMENTO DOS MICRORGANISMOS: AÇÃO DE AGENTES FÍSICOS E QUÍMICOS ...................................................................75 1. Conceitos Do Controle De Crescimento Microbiano ..........................................75 2. Métodos De Controle Do Crescimento Microbiano .............................................76 3. Métodos Físicos ..................................................................................................77 4. Métodos Químicos .............................................................................................81 UNIDADE 07: ETAPAS DO PROCESSO INFECCIOSO, PATOGENICIDADE E VIRU- LÊNCIA MICROBIANA ...............................................................................................86 1. Mecanismos De Patogenicidade ........................................................................86 2. Fatores De Virulência ..........................................................................................89 UNIDADE 08: ESTRUTURA E ORGANIZAÇÃO DO SISTEMA IMUNE ..............95 1. Sistema Imunológico ...........................................................................................95 2. Células Do Sistema Imune ..................................................................................95 3. Órgãos Do Sistema Imunológico .........................................................................101 UNIDADE 09: IMUNIDADE INATA: CÉLULAS, RECEPTORES, MECANISMOS EFETORES E INFLAMAÇÃO ..................................................................................108 1. Imunidade Inata: Células, Receptores, Mecanismos Efetores E Inflamação ...... 108 2. Componentes Da Resposta Imunológica Inata ...................................................108 3. Receptores E Células Da Imunidade Inata .........................................................112 4. Inflamação ..........................................................................................................117A forma principal de divisão celular das bactérias é denominada fissão binária; neste processo, ocorre a duplicação dos componentes celulares e, em seguida, a divisão em duas células filhas. A Figura 4 apresenta um diagrama das etapas da divisão celular de bactérias. As leveduras e alguns tipos específicos de bactérias dividem sua célula por meio de brotamento – um processo no qual uma célula jovem, denominada broto, de- senvolve-se a partir de uma célula já existente e em seguida se separa da célula mãe. Figura 04. Diagrama da sequência da divisão celular de bactérias Fonte: adaptada de Tortora et al. (2017, p. 164). 2.1 FASES DE CRESCIMENTO MICROBIANO Diferentes fatores afetam o crescimento microbiano, tais como pH, temperatura, pre- sença de oxigênio, umidade, pressão osmótica, luz e nutrientes. Os nutrientes podem ser fornecidos através de um meio de cultura, que possui substâncias utilizadas pelos microrganismos para realizar seu metabolismo e multiplicar-se. Em condições ideias de nutrientes, temperatura, pH, etc., os microrganismos apresentam um padrão de cresci- mento característico, denominado curva padrão de crescimento microbiano, dividida em quatro fases: 47 Microbiologia e Imunologia U3 Metabolismo E Cultivo Microbiano 01. Fase lag: fase de adaptação; nesta etapa ainda não ocorre divisão celular, mas o meta- bolismo está ativo. Ocorre uma adaptação ao meio, as células crescem em tamanho, produ- zem enzimas e grandes quantidades de energia na forma de ATP. 02. Fase log (exponencial): etapa em que ocorre a divisão celular (multiplicação) em velo- cidade constate e máxima, em um intervalo regular e geneticamente determinado, denomi- nado tempo de geração. O tempo de geração corresponde à quantidade de tempo neces- sária para que uma célula bacteriana origine duas células filhas. Assim, considerando-se, por exemplo, uma cultura contendo 1000 organismos por mL com um tempo de geração de 20 minutos, haverá cerca de 2000 organismos por mL após esse período, e após mais 20 minu- tos, 4000 organismos por mL, crescendo de forma exponencial ou logarítmica. O tempo de geração varia de acordo com as características do microrganismo e as condições ambientais, de minutos a horas. 03. Fase estacionária: ocorre a diminuição da velocidade de multiplicação devido à limita- ção de nutrientes; além disso, podem ser produzidas substâncias tóxicas derivadas de meta- bólitos, e um suprimento de oxigênio insuficiente. Nesta etapa, a multiplicação bacteriana se equipara, em números absolutos, à morte celular. 04. Fase de declínio: as condições do meio tornam-se cada vez mais desfavoráveis ao crescimento, e assim muitas células morrem. Esse processo de morte celular se intensifica pela ativação de enzimas autolíticas. A Figura 5 apresenta a curva padrão de crescimento e suas respectivas fases. Figura 05. Curva padrão de crescimento Fonte: adaptada de Black (2021, p. 144). U3 48Microbiologia e Imunologia Metabolismo E Cultivo Microbiano Acesse o acervo digital e conheça com mais detalhes os fatores que influenciam o crescimento microbiano: Capítulo 7- Crescimento e Cultura. Fonte: BLACK, Jacqueline G. Microbiologia - Fundamentos e Perspectivas. Rio de Janeiro: Grupo GEN, 2021. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/ books/9788527737326/. SA IB A M A IS 3. Meio de cultura No meio ambiente, os microrganismos são encontrados em diversos locais, como oce- anos, rios, lagos, solo, em matéria orgânica viva ou morta, que podem ser considerados meios de cultura naturais. Em um laboratório de microbiologia, é necessário trabalhar com microrganismos fora do seu ambiente natural; desta forma, fica o questionamento: como é possível cultivar bactérias e fungos fora do seu meio natural? Os meios de cultura apresentam uma mistura de nutrientes necessária para o meta- bolismo e consequentemente, para o crescimento de bactérias e fungos. A formulação do meio deve levar em consideração, entre outros fatores, a fonte energética do micror- ganismo, o substrato doador de elétrons e fonte de carbono. Conhecer as necessida- des nutricionais de cada microrganismo é fundamental para fornecer as substâncias adequadas ao seu crescimento. Diferentes espécies de microrganismos apresentam necessidades nutricionais diversas. Fungos, por exemplo, em geral se desenvolvem melhor em pH mais baixo do que bactérias. Nem todos os microrganismos são cultiváveis em laboratório; há espécies, como as bactérias que causam a sífilis e a hanseníase, por exemplo, que não crescem em meios de cultura sintéticos. Porém, para um grande número de microrganismos, já se conhece as necessidades nutricionais, tornando possível seu cultivo em laboratório. Os meios de culturas podem ser encontrados na forma líquida (caldo), sendo cons- tituídos por uma solução aquosa com nutrientes, ou na forma sólida, onde além dos nutrientes, é adicionado um polissacarídeo (ágar), que confere uma textura gelatinosa. Os meios sólidos permitem a visualização de colônias microbianas isoladas. Com relação ao conteúdo nutricional, existem maios de cultivo sintéticos, ou quimica- mente definidos, onde todos os ingredientes da formulação e suas concentrações são conhecidos, e meios complexos, que apresentam, em sua formulação, ingredientes como extrato de carne, cuja composição química exata não é estabelecida. Além da classificação em termos de composição, os meios de cultura podem ser clas- sificados de acordo com o crescimento de microrganismos: Meios seletivos são utilizados para isolar um grupo específico de microrganismo, ou seja, tem a capacidade de selecionar, adicionando à formulação do meio nutrientes que inibem o crescimento de determinado grupo de microrganismos e permitem o cresci- mento de outros específicos. A inibição pode ser obtida pela adição de diferentes subs- tâncias, como por exemplo, antibióticos. 49 Microbiologia e Imunologia U3 Metabolismo E Cultivo Microbiano Meios diferenciais permitem evidenciar uma característica fisiológica ou bioquímica do microrganismo de interesse, possibilitando a diferenciação de colônias de microrganis- mos diferentes. Alguns meios de cultura podem ter objetivos combinados, ou seja, serem seletivos e diferenciais; um exemplo é meio de cultura MacConkey, utilizado para isolar microrga- nismos da família das enterobactérias (Gram-negativos). Este meio contém nutrientes que inibem o crescimento de bactérias Gram-positivas e permite diferenciar caracterís- ticas da família das enterobactérias, dos demais grupos. A Figura 6 apresenta o meio MacConkey com crescimento de Escherichia coli (1) e Proteus mirabilis. Figura 06. Ágar MacConkey, com colônias isoladas de E. coli (1) e Proteus mirabilis (2) Fonte: adaptada de Vermelho (2019, p. 92). Meios enriquecidos apresentam nutrientes que permitem o crescimento de diferen- tes grupos de microrganismos, sendo muito utilizados na microbiologia médica. Um exemplo é o ágar-sangue, que apresenta sangue de carneiro em sua composição e permite o crescimento de diferentes grupos de bactérias patogênicas de preocupação médica; além disso, contém nutrientes que permitem o crescimento de microrganismos considerados fastidiosos (que apresentam elevadas exigências nutricionais e de culti- vo). A Figura 7 apresenta uma imagem de uma placa de ágar-sangue com colônias de Streptococcus. U3 50Microbiologia e Imunologia Metabolismo E Cultivo Microbiano Figura 07. Ágar-sangue, com colônias de Streptococcus Fonte: adaptada de Vermelho (2019, p. 93). Acesse o acervo digital e conheça quais são as formas de isolamento de microrganis- mos em cultura- Capítulo 5- Técnicas de isolamento e contagem de microrganismos. Fonte: VERMELHO, Alane B. Práticas de Microbiologia. Rio de janeiro: Gru- po GEN, 2019. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/ books/9788527735575/.SA IB A M A IS Assista ao vídeo: Principais Meios de Cultura https://www.youtube.com/watch?v=y-Kq161PbY8&t=13s.Acesso em: 28 abr. 2022. SA IB A M A IS 51 Microbiologia e Imunologia U3 Metabolismo E Cultivo Microbiano 5. ATIVIDADE PRÁTICA Elaborar um mapa conceitual Um mapa conceitual é uma arquitetura gráfica que tem como objetivo organizar as ideias e os principais conceitos e a partir disso esquematizar as informações. A partir do conhecimento adquirido sobre o que é meio de cultura e os principais tipos, utilize a criatividade e crie um mapa conceitual sobre tema, abordando os principais tipos, as dife- renças entre eles e citando exemplo. Utilize o acervo digital para se aprofundar sobre o assunto. Atividade 1. REFERÊNCIAS CARVALHO, Hernandes F.; RECCO-PIMENTEL, Shirlei M. A Célula. 4. ed. Barueri: MANOLE, 2019. TORTORA, Gerard J.; FUNKE, Berdell R.; CASE, Christine L. Microbiologia. Porto Alegre - RS: ARTMED, 2017. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788582713549/. Acesso em: 22 mar. 2022. TORTORA, Gerard J.; FUNKE, Berdell R.; CASE, Christine L. Microbiologia. Porto Alegre - RS: ARTMED, 2012. TRABULSI, Luiz R.; ALTERTHUM. Microbiologia. 6. ed. São Paulo: Atheneu, 2015. VERMELHO, Alane B. Práticas de Microbiologia. Rio de janeiro: Grupo GEN, 2019. Disponível em: https:// integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788527735575/. Acesso em: 28 abr. 2022 EDUCANDO PARA A PAZ 53 UNIDADE 4 METABOLISMO E ANTIMICROBIANOS: MECANISMO DE AÇÃO 1. ANTIMICROBIANOS Quando a defesa natural do organismo não é capaz de eliminar um patógeno, drogas anti- microbianas podem ser usadas a fim de eliminá-lo ou mesmo interferir no seu crescimento. As drogas antimicrobianas que matam o microrganismo são denominadas microbicidas, enquanto as que inibem a sua multiplicação são chamadas de microbiostáticas. Os antimicrobianos podem ser desenvolvidos a partir de substâncias químicas naturais (produzidas por fungos e bactérias) ou sintéticas, e precisam agir dentro do organismo do hospedeiro sem causar dano a ele. Esse é o princípio da toxicidade seletiva. Nesse sentido, é mais fácil o desenvolvimento de drogas que tenham como alvo uma célula procariótica e que não afete as células eucarióticas dos animais, pois esses dois tipos celulares se diferenciam basicamente pela presença ou ausência da parede celular e ribossomos. Entretanto, há maiores dificuldades para o desenvolvimento de drogas que tenham como alvo microrganismos cujas células se assemelham às células animais, tais como fungos. É importante compreender que o termo “antimicrobiano” é uma expressão ampla uti- lizada para a ação das drogas sobre diferentes organismos, e que cada organismo é inibido ou eliminado por substâncias específicas. Assim, antibióticos atuam nas bacté- rias, antifúngicos, nos fungos e antivirais, nos vírus. Logo, não se deve usar antibió- ticos para o tratamento de infecções virais, uma vez que estes não têm qualquer efeito sobre os vírus. Existem diversas classificações para os antimicrobianos, sendo uma delas baseada no seu espectro de ação. Algumas drogas podem ter um espectro restrito de atividade, funcionando apenas até um determinado alcance. Esse é o caso de alguns antibióticos que afetam bactérias Gram-positivas, mas têm pouco ou nenhum efeito sobre as Gram- -negativas. Por outro lado, existem drogas que possuem amplo espectro, ou seja, al- cançam um grupo maior de microrganismos; um exemplo são os antibióticos que atuam tanto em bactérias Gram-positivas quanto em Gram-negativas. Reconhecer estratégias de controle de crescimento microbiano com base nos meca- nismos de ação e resistência. C O M PE TÊ N C IA S U4 54Microbiologia e Imunologia Antimicrobianos: Mecanismo De Ação O espectro está relacionado com uma outra classificação para os antimicrobianos: o mecanismo de ação, ou seja, a forma e local de atuação. Alguns antibióticos podem, por exemplo, atuar na parede celular, enquanto outros podem ter como alvo a membra- na plasmática das bactérias. Sobre isso, é importante refletir: uma droga que tem como alvo a membrana plasmática bacteriana, encontrará mais dificuldade em atravessar a parede celular das bactérias Gram-positivas ou das bactérias Gram-negativas? Certa- mente, haverá um obstáculo maior em atravessar a extensa camada de peptideoglicano da parede celular das bactérias Gram-positivas. Este exemplo ressalta a importância de se compreender a estrutura dos microrganismos. 2. MECANISMO DE AÇÃO DOS ANTIBIÓTICOS Os antibióticos podem atuar de cinco modos nas bactérias: Inibição da síntese da pa- rede celular, inibição da síntese de proteínas; inibição da síntese de ácidos nucleicos, dano à membrana plasmática ou inibição da síntese de metabólitos essenciais, como se observa na Figura 1. Figura 01. Mecanismo de ação dos antibióticos 3. Inibição da replicação de ácidos nucleicos e da transcrição: quinolonas, rifampina. Atividade enzimática, síntese de metabólitos essenciais TraduçãoTranscrição Replicação DNA mRNA Proteína 1. Inibição da síntese de parede celular: penicilinas, cefalosporianas, bacitracina, vancomicina 2. Inibição da síntese de proteínas: cloranfenicol, eritromicina tetraciclinas, estreptomicina. 4. Danos à membrana plasmática: polimixina B. 5. Inibição da síntese de metabólitos essenciais: sulfanilamida, trimetoprim. Fonte: Tortora et al. (2012, p. 556). 2.1 INIBIÇÃO DA SÍNTESE DA PAREDE CELULAR Os antibióticos da classe dos ꞵ-lactâmicos, tais como as penicilinas, cefalosporinas, vancomicinas e carbapenens, interferem na síntese do peptideoglicano, um compo- nente encontrado exclusivamente na parede celular de bactérias. Esses antibióticos penetram na bactéria por meio de porinas (poros presentes na membrana plasmática) e 55 Microbiologia e Imunologia U4 Antimicrobianos: Mecanismo De Ação ligam-se às proteínas ligadoras de penicilinas (PBPs), que são responsáveis pela etapa final da síntese da parede celular; dessa forma, causam desequilíbrio na síntese de peptideoglicano e consequente lise da bactéria. 2.2 INIBIÇÃO DA SÍNTESE DE PROTEÍNAS Todas as células, sejam procarióticas ou eucarióticas, têm a capacidade de sintetizar proteínas. Assim, todas as células possuem estruturas com função de sintetizar pro- teínas, denominadas ribossomos. Em razão das diferenças entre os ribossomos de células procarióticas e eucarióticas, alguns antibióticos, como cloranfenicol, eritromici- na, tetraciclina e estreptomicina, foram desenvolvidos para atravessarem os canais de porina da membrana plasmática e se ligarem aos ribossomos das bactérias, inibindo a síntese de proteínas. 2.3 INIBIÇÃO DA SÍNTESE DE ÁCIDOS NUCLEICOS Durante a divisão celular, uma enzima, denominada Topoisomerase, aumenta ou di- minui o grau de enovelamento do DNA. Essa etapa é essencial para que ocorram os processos de síntese e transcrição do DNA. Antibióticos das classes quinolonas e ri- famicinas ligam-se em genes que são responsáveis pela codificação dessas enzimas, afetando seu funcionamento. Apesar de serem eficazes, antibióticos com esse mecanismo de ação podem apresen- tar utilidade limitada, uma vez que também interferem no metabolismo de DNA e RNA dos animais. 2.4 DANO À MEMBRANA PLASMÁTICA Alguns antibióticos, como a polimixina B e a colistina, provocam mudanças na perme- abilidade da membrana plasmática das bactérias. Essas drogas são carregadas posi- tivamente e interagem com as moléculas de lipopolissacarídeos (LPS) da membrana externa das bactérias Gram-negativas, que são carregadas negativamente, gerando um aumento de permeabilidade de membrana, seguida pela perda de conteúdo celular e morte da bactéria. 2.5 INIBIÇÃO DA SÍNTESE DE METABÓLITOS ESSENCIAIS As bactérias necessitam sintetizar alguns metabólitos, tais como o ácido fólico, para a sobrevivência celular. Uma das moléculas que compõem o ácido fólico é o ácido para-aminobenzóico (PABA). As drogas denominadas sulfonamidas compe- tem diretamente com o PABA, ligando-se aos receptores celulares do PABA.Logo, o ácido fólico não é sintetizado. A ausência de ácido fólico interfere na síntese dos precursores de DNA e RNA e consequentemente, a bactéria não proliferasse multiplica. Dessa forma, as sulfonamidas possuem uma ação microbiostática, ou, como se trata de antibiótico, bacteriostática. O Quadro 1 apresenta as classes de antibióticos e seus mecanismos de ação. U4 56Microbiologia e Imunologia Antimicrobianos: Mecanismo De Ação CLASSE MECANISMO DE AÇÃO B-lactâmicos Inibição da síntese da parede celular Tetraciclinas Inibição da síntese de proteínasAminoglicosídeos Macrolídeos Quinolonas Inibição da síntese de ácidos nucléicos Rifampicinas Polimixinas Dano à membrana plasmática Sulfonamidas Inibição da síntese de metabólitos Quadro 01. Classes de antibióticos e mecanismo de ação Fonte: elaborado pelo autor. 3. MECANISMO DE AÇÃO DOS ANTIFÚNGICOS Os antimicrobianos que atuam nos fungos são denominados antifúngicos. Os antifún- gicos podem atuar de três maneiras nos fungos: causando danos à membrana plasmá- tica, interferindo na síntese de ácidos nucleicos e inibindo a síntese da parede celular, como se observa na Figura 2. Figura 02. Mecanismo de ação dos antifúngicos Dano à Membrana Plasmática Polienos se ligam ao ergosterol e afetam a integridade da membrana Inibição da Síntese da Parede Celular Polioxinas inibem a síntese da quitina Equinocandidas inibem a síntese de glucano Inibição da Síntese Ácidos Nucleicos Flucitosina interfere na síntese de ácidos nucleicos. Fonte: elaborado pelo autor. 3.1 DANO À MEMBRANA PLASMÁTICA Quanto maior a semelhança entre o microrganismo alvo e as células animais, maior é a dificuldade de desenvolvimento de um antimicrobiano. Assim, a descoberta de que o esterol presente na membrana plasmática dos fungos é o ergosterol, e não o colesterol 57 Microbiologia e Imunologia U4 Antimicrobianos: Mecanismo De Ação como nos mamíferos, proporcionou um grande avanço na terapia contra as infecções fúngicas (micoses), com o desenvolvimento de antifúngicos que atuam em várias eta- pas da síntese do ergosterol. Ademais, quando a síntese de ergosterol é bloqueada, a membrana se torna permeável, levando à morte do fungo. Antifúngicos denominados polienos, tais como Anfotericina B e Nistatina, atuam sobre o ergosterol. 3.2 INIBIÇÃO DA SÍNTESE DE ÁCIDOS NUCLEICOS O antifúngico flucitosina interfere na síntese de ácidos nucleicos da célula fúngica. Uma enzima presente na célula fúngica converte a flucitosina em 5-fluorouracil, e este é in- corporado no RNA, levando, consequentemente, à inibição da síntese proteica. Como as células dos mamíferos não possuem a enzima que realiza a conversão da droga, o antifúngico acaba realizando uma toxicidade seletiva, ou seja, tem como alvo apenas as células fúngicas. No entanto, por ser tóxico aos rins, possui prescrição limitada. 3.3 INIBIÇÃO DA SÍNTESE DA PAREDE CELULAR Diferente das células eucarióticas animais, as células eucarióticas fúngicas possuem uma parede celular, composta basicamente por quitina, glucano e manoproteínas, que se localiza externamente à membrana plasmática e que, entre outras funções, determi- na a forma da célula. Alguns antifúngicos, como as polioxinas, inibem a síntese de qui- tina; outros como as equinocandidas, inibem a síntese de glucano. A falta de qualquer um desses componentes causa o desequilíbrio da parede celular e consequentemente, lise da célula. 4. MECANISMO DE AÇÃO DOS ANTIVIRAIS É difícil atingir os vírus sem atingir a célula hospedeira, uma vez que os vírus são parasitas intracelulares obrigatórios. No entanto, as drogas precisam ser mais tóxicas para o vírus do que para as células hospedeiras. A chave para o desenvolvimento dos antivirais foi a identificação de enzimas codificadas pelos vírus. Para compreender melhor este conceito, é importante relembrar as etapas do ciclo in- feccioso do vírus, que consistem em: adsorção, penetração, desnudamento, biossínte- se (que inclui transcrição, replicação de ácidos nucléicos e síntese de proteínas virais), maturação e lise. Logo, qualquer estágio do ciclo de replicação viral pode ser alvo de terapia antiviral, como observa-se na Figura 3. U4 58Microbiologia e Imunologia Antimicrobianos: Mecanismo De Ação Figura 03. Ciclo de replicação viral e o alvo de terapia antiviral 15 4 2 3 Inibidores de exocitose DNA Capsídeo Núcleo Citoplasma Proteínas do capsídeo Inibidores do protease Inibidores de adsorção e penetração viral Inibidores de desnudamento viral Dna viral Proteína dos capsídeo mRNA Inibição da transcrição e replicação de ácidos nucleicos Célula hospedeira Fonte: adaptada de Tortora et al. (2012, p. 375). 4.1 INIBIÇÃO DA ADSORÇÃO E PENETRAÇÃO VIRAL Quando um antiviral tem a capacidade de inibir a adsorção do vírus, ele previne todos os passos seguintes da replicação viral e permite que os vírus sejam removidos pelo sistema de defesa do hospedeiro. Drogas como o efuvirtide se ligam ao vírion e evitam a ligação do vírus na célula. Outras drogas ligam-se ao capsídeo viral e impedem a ligação do vírus aos receptores da célula, impedindo a penetração. 4.2 INIBIÇÃO DO DESNUDAMENTO VIRAL O desnudamento viral se refere à ruptura da estrutura do vírus resultando na libe- ração do genoma viral no interior da célula hospedeira. Para que isso ocorra, são necessárias condições ideais que podem ser, como no caso do vírus Influenza A, a diminuição do pH. Drogas como amantadina podem inibir a diminuição de pH evitan- do, portanto, o desnudamento viral durante a endocitose, processo pelo qual o vírus, intencionalmente, é absorvido pela membrana celular do hospedeiro. 4.3 Inibição da transcrição e replicação de ácidos nucléicos O objetivo de todo vírus é invadir uma célula hospedeira e fazer cópias de si mesmo. Para isso, ele precisa traduzir proteínas a partir de sua molécula de RNA ou DNA utilizando a maquinaria do hospedeiro. Nesse sentido, a maioria das drogas antivirais podem agir inibindo, de forma direta, a ação da enzima DNA polimerase viral ou agir, de forma indireta, incorporando compostos análogos, ou seja, de função semelhante, às bases nitrogenadas do DNA do vírus, levando a formação de proteínas defeituo- sas. A ribavirina e o aciclovir são exemplos de drogas que podem inibir a replicação dos ácidos nucleicos. 59 Microbiologia e Imunologia U4 Antimicrobianos: Mecanismo De Ação O surgimento da quimioterapia moderna é creditado aos esforços de Paul Ehrlich, na Alemanha, durante a primeira parte do século XX. Enquanto tentava corar bactérias sem corar os tecidos circundantes, ele especulava sobre alguma “bala mágica” que encon- traria e destruiria patógenos de forma seletiva, mas sem afetar o hospedeiro. Essa ideia forneceu a base para a toxicidade seletiva e para a quimioterapia, termo que ele próprio cunhou (TORTORA et al., 2012). Alguns fármacos são classificados de baixo espectro (espectro restrito) e outros são classifi- cados de amplo espectro, o que isso significa? Existem diversas classificações para os antimicrobianos, sendo uma delas o seu espectro de ação. Algumas drogas podem ter um espectro restrito de atividade, funcionando apenas até um determinado alcance. Esse é o caso de alguns antibióticos que afetam bactérias Gram- -positivas, mas poucas ou nenhuma Gram-negativa. Por outro lado, existem drogas que pos- suem amplo espectro, ou seja, alcançam um grupo maior de microrganismos, um exemplo são os antibióticos que afetam tanto bactérias Gram-positivas quanto Gram-negativas. Exercício 1. Resposta: 4.4 INIBIÇÃO DA PROTEASE Para o vírus se tornar infeccioso, é essencial que as novas proteínas virais sejam cli- vadas e estruturadas corretamente pelas proteases, enzimas que quebram ligações peptídicas entre os aminoácidos das proteínas. O bloqueio das proteases, por drogas como zanamivir e oseltamivir, impede os novos vírus de amadurecerem e infectarem outras células, tornando a partícula viral não infecciosa. Entretanto, écomum que os ví- rus desenvolvam resistência à monoterapia; para evitar que isso ocorra, estes antivirais devem ser usados em combinação com outras drogas. 4.5 INIBIÇÃO DA EXOCITOSE Após a infecção da célula hospedeira, os vírus manipulam a maquinaria celular para se replicar. Após concluírem o processo de replicação, os vírus precisam sair e buscar outras células para recomeçar o processo. Quando os vírus saem das células hospe- deiras, eles permanecem ligados à superfície da célula porque uma proteína do vírus (hemaglutinina) fica aprisionada ao receptor celular (ácido siálico). Uma enzima deno- minada neuraminidase cliva a molécula do receptor da célula, liberando assim o vírus para infectar outras células no organismo hospedeiro. Antivirais como oseltamivir e za- namivir, inibem a ação da neuraminidase e dessa forma o vírus não consegue se liberar da célula e continuar 5. EXERCÍCIO COMENTADO U4 60Microbiologia e Imunologia Antimicrobianos: Mecanismo De Ação 6. ATIVIDADES PRÁTICAS É importante compreender que o termo “antimicrobiano” é uma expressão ampla utilizada para a ação das drogas sobre diferentes organismos, e que cada organismo é inibido ou eli- minado p substâncias específicas. Baseado nesta informação um antibiótico tem ação contra: a. Fungos. b. Bactérias. c. Fungos e Bactérias. d. Bactérias Gram-positivas. e. Bactérias Gram-Negativas. Atividade 1. Os antibióticos podem agir sobre diferentes estruturas da célula bacteriana. Estas estruturas incluem (Escolha uma ou mais): a. Parede celular. b. Lisossomos. c. Ribossomos. d. Retículo endoplasmático. e. Ácido nucléico. f. Membrana plasmática. g. Mitocôndiras Atividade 2. REFERÊNCIAS BLACK, Jaqueline G.; Microbiologia: fundamentos e perspectivas. 10. ed. Rio de Janeiro: GUANABARA KOOGAN, 2021. TORTORA, Gerard J.; FUNKE, Berdell R.; CASE, Christine L. Microbiologia. Porto Alegre - RS: ARTMED, 2017. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788582713549/. Acesso em: 22 mar. 2022. TORTORA, Gerard J.; FUNKE, Berdell R.; CASE, Christine L. Microbiologia. Porto Alegre - RS: ARTMED, 2012. TRABULSI, Luiz R.; ALTERTHUM. Microbiologia. 6. ed. São Paulo: Atheneu, 2015. 61 Microbiologia e Imunologia U4 Antimicrobianos: Mecanismo De Ação REFERÊNCIAS BLACK, Jaqueline G.; Microbiologia: fundamentos e perspectivas. 10. ed. Rio de Janeiro: GUANABARA KOOGAN, 2021. TORTORA, Gerard J.; FUNKE, Berdell R.; CASE, Christine L. Microbiologia. Porto Alegre - RS: ARTMED, 2017. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788582713549/. Acesso em: 22 mar. 2022. TORTORA, Gerard J.; FUNKE, Berdell R.; CASE, Christine L. Microbiologia. Porto Alegre - RS: ARTMED, 2012. TRABULSI, Luiz R.; ALTERTHUM. Microbiologia. 6. ed. São Paulo: Atheneu, 2015. EDUCANDO PARA A PAZ 63 UNIDADE 5 RESISTÊNCIA BACTERIANA E ANTIBIOGRAMA 1. MECANISMO DE RESISTÊNCIA DOS ANTIBIÓTICOS Os antibióticos são drogas capazes de eliminar ou impedir a multiplicação de bactérias; por essa razão, são usados no tratamento de infecções bacterianas. Para que seu mecanismo de ação seja eficiente, é necessário que os antibióticos atinjam o local da infecção em concentrações ideais, atravessem, de forma passiva ou ativa, a parede celular bacteriana, apresentem afinidade pelo sítio de ligação no interior da bactéria e permaneçam íntegros por tempo suficiente para que exerçam sua atividade. As bactérias podem ser classificadas como sensíveis ou resistentes aos antimicrobia- nos. De modo geral, as bactérias sensíveis são aquelas que não crescem com a ação de um antibiótico. Em contrapartida, quando o antibiótico não exerce qualquer efeito sobre a bactéria, esta é considerada resistente. A resistência aos antibióticos pode ser natural ou adquirida. Quando naturalmente resistente, todas as linhagens de uma determinada espécie não sofrem com a ação da droga. Por outro lado, na resistência adquirida, apenas algumas linhagens de uma mesma espécie resistem à ação da droga. É importante mencionar que o antibiótico não induz a resistência, mas seleciona as bactérias mais resistentes em uma população. Assim, uma bactéria sensível que se torna resistente a um determinado antibiótico sempre adquire essa resistência por meio de uma alteração genética que pode acontecer por meio de mutações cromossômicas ou pela aquisição de plasmídeos (extra cromossomais). A resistência cromossômica é em geral simples, e normalmente atinge apenas um antibacteriano. Em contrapartida, uma bactéria que adquire a resistência por meio de plasmídeos, tende a apresentar resistência a vários antibióticos. Esse último perfil de resistência é muito estudado e está relacionado ao intenso uso de antimicrobianos nos hospitais, levando às Infecções Relacionadas à Assistência à Saúde (IRAS), tradicional- mente chamadas de Infecções Hospitalares. A resistência das bactérias aos antibióticos é expressa bioquimicamente de várias for- mas, dependendo diretamente do mecanismo de ação de cada droga, como pode ser observado no Quadro 1. Reconhecer estratégias de controle de crescimento microbiano com base nos meca- nismos de ação e resistência. C O M PE ÊN C IA S U5 64Microbiologia e Imunologia Resistência Bacteriana e Antibiograma MECANISMO DE AÇÃO MECANISMO DE RESISTÊNCIA Interação com a parede celular bacteriana Alteração da parede celular com redução da interação Ligação em genes específicos Mutações nos genes específicos, impedindo a ligação Ligação com ribossomo bacteriano Mutações nos sítios de ligação, impedindo a interação Antibióticos que precisam penetrar na célula bacteriana Extrusão do antibiótico para o meio extracelular Independente do mecanismo Produção de enzimas que degradam o antimicrobiano Quadro 01. Mecanismo de ação e mecanismo de resistência a antibióticos Fonte: elaborado pelos autores. 1.1 RESISTÊNCIA AOS ANTIBIÓTICOS QUE ATUAM NA PAREDE CELULAR As bactérias geralmente se tornam resistentes aos ꞵ-lactâmicos por meio da produção de enzimas denominadas ꞵ-lactamases. Essas enzimas degradam o anel ꞵ-lactâmico dessa classe de antibióticos, tornando-os inativos. O termo ꞵ-Lactamase de Espectro Estendido (ESBL) refere-se às ꞵ-lactamases produzidas principalmente por bactérias que são resistentes as classes dos ꞵ-lactâmicos que apresentam amplo espectro de ação com efeito sobre enterobactérias. Um desses antimicrobianos é o Carbapenem, antibiótico utilizado especialmente no ambiente hospitalar em infecções sistêmicas. O grande problema da resistência aos carbapenêmicos é que o gene responsável pela enzima está localizado em plasmídeos. Dessa forma, as bactérias podem facilmente compartilhar com outras linhagens a resistência a diversos antibióticos, pela aquisição de plasmídeos contendo genes de resistência. Além do citado, outros dois mecanismos de resistência aos ꞵ-lactâmicos já foram descritos: i) modificação de porinas, diminuindo a permeabilidade da membrana bac- teriana e evitando que a droga se ligue às proteínas de ligação à penicilina (PBPs, do inglês penicillin-binding protein); ii) modificação estrutural das PBPs, impedindo a ligação do antibiótico. 1.2 RESISTÊNCIA AOS ANTIBIÓTICOS QUE ATUAM NA SÍNTESE DE PROTEÍNA São três os mecanismos químicos da resistência aos antibióticos que afetam a síntese proteica: I. alterações ne permeabilidade da membrana, II. modificações ribossômicas e III. produção de enzimas inativadoras. 65 Microbiologia e Imunologia U5 Resistência Bacteriana e Antibiograma Como os antibióticos precisam entrar na célula por canais de porina para se ligar ao ri- bossomo, mutações que alteram a permeabilidade da membrana dificultando a entrada da droga, favorecem a resistência. Caso o antibiótico penetre na célula, este pode ter sua ação inibida por mutações no sítio do ribossomo, local onde os antibióticos se ligam para impedir a síntese proteica. Por fim, algumas bactérias produzem enzimas que mo- dificam a molécula do antibiótico,reduzindo sua capacidade de ligação aos ribossomos. 1.3 RESISTÊNCIA AOS ANTIBIÓTICOS QUE ATUAM NA SÍNTESE DE ÁCIDOS NUCLEICOS Mutações que alteram as enzimas DNA girase e topoisomerase IV impedem a ligação do antibiótico a essas enzimas, tornando as bactérias resistentes. Alteração na perme- abilidade das membranas através de mutação nas porinas impede a droga de entrar na célula e, como consequência, inibe a ação do antibiótico. Caso a droga consiga passar pelos canais de porina, há ainda a existência de uma estrutura transmembrana denominada bomba de efluxo, que bombeia o antimicrobiano do meio intracelular para o extracelular, promovendo resistência bacteriana. 1.4 RESISTÊNCIA AOS ANTIBIÓTICOS QUE ATUAM NA MEMBRANA PLASMÁTICA As polimixinas não têm qualquer ação contra bactérias Gram-positivas, pois são incapa- zes de penetrar na espessa parede celular desse grupo de bactérias para desestabilizar a membrana plasmática. Além disso, algumas bactérias Gram-negativas, como Proteus spp. Burkholderia spp., Serratia spp., e Providencia spp., apresentam resistência in- trínseca a essa classe de antimicrobiano. Os demais Gram-negativos podem adquirir resistência por meio da aquisição de genes compartilhados por plasmídeos. 1.5 RESISTÊNCIA AOS ANTIBIÓTICOS QUE ATUAM NA INIBIÇÃO DA SÍNTESE DE METABÓLITOS ESSENCIAIS A resistência à Sulfonamida pode ocorrer pela diminuição da permeabilidade da mem- brana bacteriana, como consequência de alterações dos canais de porinas. Algumas bactérias podem ainda usar uma via alternativa para sintetizar o metabólito essencial, como é o caso do ácido fólico. Devido a mutações, essas bactérias são capazes de au- mentar a produção do ácido para-aminobenzóico (PABA) ou a síntese de diidropteróico sintetase, que apresentam pouca afinidade pelo antimicrobiano e favorecem a síntese de ácido fólico. É possível observar na Figura 1, os mecanismos de resistência descritos. U5 66Microbiologia e Imunologia Resistência Bacteriana e Antibiograma Figura 01. Mecanismos de resistência bacteriana aos antibióticos Fonte: elaborada pelos autores. 2. ANTIBIOGRAMA O Antibiograma, ou Teste de Sensibilidade aos Antimicrobianos (TSA), é uma técnica laboratorial que tem como objetivo verificar a sensibilidade de um microrganismo a di- ferentes tipos de antimicrobianos. O procedimento pode ser realizado com bactérias ou fungos, testando a sensibilidade desses microrganismos a antibióticos ou antifúngicos, respectivamente. Há várias técnicas de antibiograma, sendo o método de difusão em disco, ou Kirby Bauer, a mais utilizada. O método consiste em inocular a bactéria a ser testada em uma placa contendo meio de cultivo adequado, adicionar discos impregnados com antibióti- cos à placa e incubar durante 24 horas em estufa a 37 ºC para posteriormente analisar a formação do halo de inibição. Para realizar a técnica, é necessário diluir as colônias bacterianas, semeadas previa- mente, em um tubo contendo solução salina até obter uma densidade padronizada de microrganismos. Para chegar nesse valor, o inóculo (salina + bactérias), deve ser comparado com um valor padrão na escala de Mc Farland. Esta escala consiste em um conjunto de padrões de turvação (de 0,5 a 10) utilizados nos laboratórios de micro- biologia, que correspondem a diferentes contagens bacterianas. Assim, o tubo nº 0,5 corresponde a aproximadamente 150 milhões de bactérias por mL de meio, e o tubo nº 5, aproximadamente 1.5 bilhões de bactérias por mL de meio. Após se obter o inóculo, este deverá ser semeado, com o auxílio de um swab, na su- perfície do meio de cultura ágar Mueller Hinton. A semeadura deverá ser realizada em 67 Microbiologia e Imunologia U5 Resistência Bacteriana e Antibiograma toda a superfície do ágar. Em seguida, os discos contendo os antibióticos a serem tes- tados, devem ser adicionados ao meio contendo o inóculo, com auxílio de uma pinça. As placas precisarão ser incubadas a 37 °C por 24 horas para serem analisadas poste- riormente. Todo o procedimento deve ser realizado de forma estéril, com auxílio de um bico de Bunsen ou em capela de segurança microbiológica. É necessário observar um crescimento confluente do microrganismo na placa. A leitura do resultado é realizada medindo-se o diâmetro do halo de inibição formado após o período de incubação. A Figura 2 resume as etapas da técnica. Figura 02. Etapas do antibiograma Suspensão bacteriana (0,5 Mc Farland) Semeadura em Tapete Análise dos resultados após incubação Disposição dos discos impregnados com antibióticos Tempo para o ágar absorver o inóculo Fonte: elaborada pelos autores. 2.1 INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS DE ANTIBIOGRAMA Para realizar a leitura do antibiograma é necessário medir o diâmetros dos halos for- mados em tordo do disco do antimicrobiano, a medida deve ser realizada com auxílio de uma régua e o valor reportado em milímetros. Após obter a medida, é necessário consultar uma tabela, padronizada pelos comitês Clinical and Laboratory Standards Institute (CLSI) e Brazilian Commitee on Antimicrobial Susceptibility Testing (BrCAST), que apontará os valores referência (em mm) para cada classe de antibiótico e a clas- sificação em três categorias, sensível, intermediário e resistente conforme os critérios estipulados por comitês que revisam e padronizam anualmente os valores de ponto de corte para diâmetro do halo (mm) para cada droga. Um microrganismo é definido como: ` Sensível: Quando há uma elevada probabilidade de sucesso terapêutico com determina- do antimicrobiano. U5 68Microbiologia e Imunologia Resistência Bacteriana e Antibiograma ` Intermediário: Quando há um certo grau de incerteza na eficácia terapêutica. ` Resistente: Quando determinado antimicrobiano oferece uma elevada probabilidade de falha terapêutica. Observe a Figura 3. No modelo é possível observar que o halo formado para o anti- biótico, podemos chamá-lo de Ampicilina, que está sendo mensurado, possui 12 mm. Assim, de acordo com a tabela, pode-se observar que o microrganismo é sensível à Ampicilina, pois o halo de inibição formado ao redor do disco foi maior que o ponto de corte para que a bactéria seja considerada sensível (≥11, conforme a Figura 3). Figura 03. Interpretação do Antibiograma Fonte: elaborada pelos autores. Acesse o site do BrCAST (Brazilian Commitee on Antimicrobial Susceptibility Testing) para conhecer as tabelas de pontos de corte clínicos efetivas. http://brcast.org.br/documentos/. Acesso em: 18 mai. 2022. SA IB A M A IS 69 Microbiologia e Imunologia U5 Resistência Bacteriana e Antibiograma 3. EXERCÍCIO COMENTADO Segundo (SCARPATE; COSSATIS, 2019, [n. p.]) Klebsiella pneumoniae é a espécie de bactéria em que se descreve produção de ESBL com maior frequência, sendo que 2 a 5% das infecções hospitalares, principalmente respiratórias e urinárias, estão associadas a esta espécie. Segundo dados de programas internacionais de vigilância no Brasil, a prevalência de isolamento de Klebsiella pneumoniae produtoras de ESBL é de aproximadamente 50%. Esta espécie é um importante patógeno hospitalar, com potencial para causar morbidade severa e mortalidade em pacientes pediátricos. É parte da flora intestinal normal, e sua virulência está associada à presença de uma cápsula polissa- carídica, sistema de captação de ferro, fenótipo mucóide e lipopolissacarídeo tóxico. Podem sobreviver por muito tempo na pele e em ambientes secos, como superfícies hospitalares, além de adquirir plasmídeos conjugativos com certa facilidade, os quais podem carregar também genes para outros tipos de resistência. O que significa o termo ESBL? Qual classe de antibiótico as bactérias produtoras de ESBL podem degradar? Qual a importância da resistência a essa classe de antibióticos estar em plasmídeos? Exercício 1. Passo a passo 01. Esterilizar a alça bacteriológica no bico de Bunsen; 02. Selecionar de 3 a 4 colônias bacterianas com a mesma morfologia; 03. Diluir as colônias em tubo contendode 3 a 4 mL de solução fisiológica 0,9 % deixando-a na escala 0,5 de Mc Farland (1,5 x 108 UFC); 04. Introduzir um swab estéril no tubo contendo a diluição comprimindo-o na pare- de do tubo para remover o excesso do inóculo; 05. Semear o inóculo na superfície do ágar Mueller Hinton (semeadura em tapete); 06. Deixar a placa fechada e secando em temperatura ambiente por 5 minutos; 07. Com o auxílio de uma pinça flambada, adicionar os discos de antibiótico no meio ágar pressionando-os levemente para fixar na superfície do ágar; 08. Inverter as placas e incubá-las na estufa a 37 °C por 24 horas 09. Fazer a leitura do antibiograma. U5 70Microbiologia e Imunologia Resistência Bacteriana e Antibiograma O termo ESBL quer dizer ꞵ-Lactamase de Espectro Estendido. Bactérias Gram-negativas, especialmente, produzem enzimas, denominadas ꞵ-lactamase, com capacidade de hidrolisar o anel benzênico de antibióticos ꞵ-lactâmicos de amplo espectro. Por meio da conjugação, podem adquirir plasmídeos de resistência a vários antibióticos. Resolução: Passo a Passo 4. ATIVIDADES PRÁTICAS As Polimixinas são opções de tratamento para bactérias classificas como multirresistente, especialmente Pseudomonas aeruginosa, Acinetobacter baumannii e Enterobactérias, apre- senta como mecanismos de ação comprometer a integridade da membrana de bactérias Gram-positivas e Gram-negativas. Cocos Gram-positivos apresentam resistência intrínseca às polimixinas. Isso acontece porque: a. Esses microrganismos utilizam os flagelos para se mover para longe dos antibióticos. b. Esses microrganismos apresentam uma resistência natural relacionada à incapacidade da droga de penetrar na parede celular. c. Esses microrganismos usam as fímbrias para se aderir às células hospedeiras e se pro- teger dos antibióticos. d. Cocos Gram-positivos apresentam uma camada espessa de LPS. e. Cocos Gram-positivos não apresentam uma camada densa de peptideoglicano e isso dificulta a ação desse antimicrobiano. Atividade 1. A técnica de difusão em disco é bastante utilizada em exames de antibiograma. A inter- pretação dos resultados deste tipo de exame é feita com base em manuais padroniza- dos, como o BRCast. Após a realização de um antibiograma de uma bactéria obtida de um paciente com uma infecção na cavidade oral, foram obtidos os seguintes resultados com dois antibióticos diferentes: Antibiótico A=halo de inibição de 32 mm; Antibiótico B=halo de inibição de 14 mm Considere o quadro abaixo, com os valores de referência para os antibióticos A e B. Qual o tratamento mais indicado para o paciente? Atividade 2. 71 Microbiologia e Imunologia U5 Resistência Bacteriana e Antibiograma Para a realização do antibiograma pelo método de difusão em disco, é necessário realizar a suspensão da colônia em solução salina, deixando-a em uma escala padrão. Qual das alternativas abaixo corresponde à escala padrão correta? a) 0.2 de McFarland. b) 2.0 de McFarland. c) 1.0 de McFarland. d) 0.5 de McFarland. e) 2.5 de McFarland. Atividade 3. RESISTENTE INTERMEDIÁRIO SENSÍVEL Antibiótico ADesinfecção; Antissepsia; Esterilização; Saneante. A definição desses termos é apresentada no Quadro 1. TERMINOLOGIA DEFINIÇÃO Limpeza Remoção mecânica da sujeira: Pó, terra, matéria inorgânica e orgânica e microrganismos. Não garante descontaminação ou esterilidade. Descontaminação Utiliza-se agentes físicos ou químicos objetivando a remoção dos agentes contaminantes. Não garante esterilidade. Sanitização Utiliza-se agentes químicos que reduzem a quantidade de microrga- nismos patogênicos para níveis seguros para consumo. Utilizado, por exemplo, em alimentos consumidos crus. Não garante esterilidade. Desinfecção É a eliminação parcial dos microrganismos presentes em um material inanimado ou superfície. Utiliza-se agentes químicos e métodos físicos. Antissepsia É a eliminação parcial dos microrganismos de tecidos vivos. Saneantes Substâncias ou preparações destinadas para a aplicação em objetos, tecidos, superfícies e ambientes. Esterilização É a eliminação total de microrganismos e esporos. Quadro 01. Terminologia associada ao controle de crescimento microbiano Fonte: elaborado pelos autores. Existem diferentes tratamentos que são utilizados para garantir a efetividade de uma descontaminação, sanitização, desinfecção, antissepsia e/ou esterilização. Os trata- mentos que causam morte direta dos microrganismos apresentam o nome com o su- fixo-cida (que significa morte). Assim, um fungicida apresenta capacidade lítica sobre fungos, enquanto um virucida destrói vírus. Existem também opções de tratamentos com capacidade de inibição do crescimento microbiano sem causar sua morte. Neste caso, o nome apresenta o sufixo -stático, como agentes bacteriostáticos, que atuam inibindo o crescimento de bactérias. Conhecer os diferentes métodos de controle micro- biano é fundamental para definir qual é a melhor opção para cada aplicação. 2. MÉTODOS DE CONTROLE DO CRESCIMENTO MICROBIANO Existem diferentes opções de métodos de controle de crescimento microbiano, que apesentam mecanismos de ação distintos, podendo atuar sobre: ` Parede celular: Seres procariotos, como as bactérias, apresentam em sua parede celular peptideoglicano, que promove proteção contra lise osmótica. Alguns agentes antimicro- bianos atuam sobre os peptideoglicanos da parede celular, causando a morte do micror- ganismo. ` Membrana citoplasmática: Muitos agentes antimicrobianos atuam sobre essa estrutura, causando dano à bicamada lipídica da membrana e a perda da sua integridade. 77 Microbiologia e Imunologia U6 Controle De Crescimento Dos Microrganismos: Ação De Agentes Físicos E Químicos ` Enzimas e proteínas: Alguns agentes atuam nessas moléculas promovendo rompimento das pontes de hidrogênio, das ligações dissulfeto ou covalentes, causando a desnaturação de enzimas e proteínas e consequentemente a perda de suas funções na célula. ` DNA e RNA: Agentes que danificam ácidos nucleicos levam à morte celular, pois impe- dem a replicação e a síntese de diversas estruturas essenciais. Os métodos de controle microbiano podem ser classificados em métodos químicos e físicos. Os métodos químicos usam desinfetantes e antissépticos para promover o efei- to antimicrobiano; os métodos físicos podem utilizar temperatura, radiação, filtração, remoção de oxigênio e Vibração ultrassônica. 3. MÉTODOS FÍSICOS Os métodos físicos podem promover a descontaminação, desinfecção e a esterilização e para atingir seu objetivo usam calor, radiação e ou filtração. O calor é o método mais utilizado para controlar e/ou eliminar os microrganismos com segurança. Trata-se de um método seguro, de custo baixo e pouca toxicidade. O prin- cipal mecanismo de ação de métodos que empregam o calor é a desnaturação de proteínas estruturais e enzimas, que resulta em comprometimento da integridade da membrana e das funções celulares, levando à morte do microrganismo. O calor também causa morte dos microrganismos por meio de processos oxidativos. A Figura 1 apresen- ta o efeito do calor sobre as proteínas. Figura 01. Efeito do calor sobre as proteínas Fonte: elaborada pelos autores. 3.1 MÉTODOS DE CONTROLE QUE EMPREGAM O CALOR ÚMIDO O calor úmido tem maior poder de penetração e apresenta a capacidade de eliminar as formas vegetativas e esporos de bactérias, vírus e fungos. Exemplos de métodos que utilizam o calor úmido incluem: Autoclave: Esse equipamento combina umidade, pressão e temperatura; emprega o vapor d’água sob pressão a uma temperatura mínima de 121º C. A combinação de temperatura elevada, umidade e pressão promove a desnaturação de proteínas. Este método apresenta a capacidade de destruição das formas vegetativas e esporuladas de bactérias e fungos e garante a esterilidade. A recomendação para atingir o objetivo proposto é utilizar calor úmido durante 20 minutos à temperatura de 133°C e pressão de 3 bars (1 bar = 14 psi). U6 78Microbiologia e Imunologia Controle De Crescimento Dos Microrganismos: Ação De Agentes Físicos E Químicos A técnica de autoclavagem é muito utilizada em laboratórios, hospitais, clínicas de odontologia e estética. A Figura 2 apresenta uma autoclave. Figura 02. Autoclave Fonte: adaptada de Vermelho (2019, p. 30). Pasteurização: A indústria de alimentos utiliza muito esta técnica, pois apesar de usar o calor, apresenta condições controladas de tal formar que não ocorre a desnaturação dos nutrientes, mantendo as características dos alimentos. O procedimento garante a diminuição dos microrganismos pela exposição breve a uma temperatura elevada. Porém, não promove esterilização, pois não elimina formas resistentes, como esporos. Há três tipos principais de pasteurização: i) Ultra-alta temperatura (UHT, do inglês ultra- -high temperature), onde o produto é submetido a uma temperatura de 141°C durante 2 segundos; ii) Alta temperatura (HTST, do inglês high temperature, short time), onde o produto é aquecido a 72°C por 15 segundos; iii) Baixa temperatura (LTH, do inglês low temperature heating), que consiste no aquecimento do produto a 63°C por 30 minutos. O leite e a cerveja são exemplos de alimentos que são submetidos à pasteurização. A Figura 3 apresenta um pasteurizador para alimentos. 79 Microbiologia e Imunologia U6 Controle De Crescimento Dos Microrganismos: Ação De Agentes Físicos E Químicos Figura 03. Pasteurizador para alimentos Fonte: adaptada de Vermelho (2019, p. 32). Água em ebulição: Utilizar o vapor d’água livre a 100º C por 20 minutos é um outro exemplo de método que emprega o calor úmido. Apresenta a capacidade de destruir alguns endósporos e as formas vegetativas, porém não garante esterilidade. 3.2 MÉTODOS DE CONTROLE QUE EMPREGAM O CALOR SECO Estufas e fornos: Utilizam temperaturas elevadas e um tempo de exposição maior. A ausência de umidade reduz a eficiência do processo, por possuir menor poder de pe- netração quando comparado com os métodos de calor úmido. Há diferentes tempos e valores de temperaturas indicados para garantir a esterilidade dependendo do material utilizado. O Quadro 2 apresenta a relação do tempo e temperatura para estufas de acor- do com material para garantir esterilização. MATERIAIS TEMPERATURA (ºC) TEMPO (MINUTOS) Aço inoxidável 160- 170 60- 120 Vaselina líquida 160 120 Pós 160 120 Quadro 02. Tempo e temperatura para esterilização de diferentes materiais Fonte: adaptada de Vermelho (2019, p. 33). U6 80Microbiologia e Imunologia Controle De Crescimento Dos Microrganismos: Ação De Agentes Físicos E Químicos Flambagem: Está técnica promove o aquecimento direto em chama de alças e agulhas bacteriológicas; para que o processo seja bem-sucedido, deve-se aquecer o material até que atinja o rubor. O bico de Bunsen é um equipamento amplamente utilizado em laboratórios de microbiologia para flambagem, conforme mostrado na Figura 4. Figura 04. Processo de flambagem de alça em bico de Bunsen Fonte: adaptada de Vermelho (2019, p. 34). 3.3 MÉTODOS DE CONTROLES QUE EMPREGAM BAIXAS TEMPERATURAS Temperaturasbaixas apresentam a capacidade de diminuir o crescimento e atividade enzimática de microrganismos, mas não causam morte celular. A maioria dos microrga- nismos são classificados como mesofílicos; isso significa que não crescem em tempe- raturas inferiores a 5ºC. Refrigeração: A temperatura ideal para inibir o crescimento microbiano é de 2 a 7ºC, pois garante a redução da taxa metabólica dos microrganismos. O efeito da refrigeração é bacteriostático, sendo aplicado para conservar alimentos e amostras biológicas. Congelamento: O congelamento rápido tem efeito bacteriostático, deixando os micror- ganismos dormentes; utiliza-se esse procedimento para preservar alimentos e amostra biológicas por maior tempo do que a refrigeração. 81 Microbiologia e Imunologia U6 Controle De Crescimento Dos Microrganismos: Ação De Agentes Físicos E Químicos 3.4 MÉTODOS DE CONTROLES QUE EMPREGAM RADIAÇÃO Utilizar a radiação para redução e/ou eliminação de microrganismos é uma opção efi- ciente para controle microbiano em superfícies. Existem diversos tipos de radiações, sendo a ultravioleta a mais utilizada em laboratórios de pesquisa microbiológica. Radiação ultravioleta: Apresenta atividade microbicida em uma faixa de comprimento de onda de 240 a 280 nm, sendo este o mais efetivo para causar morte de microrga- nismos como bactérias e vírus e promover o efeito esterilizante. Esse tipo de radiação é mutagênica; atua promovendo danos ao DNA e RNA e causando a morte do micror- ganismo. Apresenta baixa penetração em líquidos e sólidos, por isso é aplicada em superfícies e também pode ser combinada a outras técnicas para controle microbiano de alimentos e outros produtos. A luz UV é utilizado com frequência em laboratórios de pesquisas, setor de microbiologia e salas cirúrgicas. A figura 5 apresenta uma Capela de fluxo laminar com a luz ultravioleta realizando a desinfecção de superfície. Figura 05. Capela de fluxo laminar com luz ultravioleta Fonte: adaptada de Vermelho (2019, p. 35). 4. MÉTODOS QUÍMICOS Métodos químicos de controle microbiano incluem um conjunto de substâncias que apresentam ação microbicida ou microbiostática. Utiliza-se substâncias químicas para diferentes finalidades: descontaminação, desinfecção, antissepsia ou esterilização. Os agentes químicos com efeito antimicrobiano apresentam diversidade na sua ação devi- da a fatores como concentração da substância, tempo de contato, pH e tipo de micror- ganismo. Os Desinfetantes apresentam efeitos microbicidas e microbiostáticos, sendo indicados para superfícies e objetos, enquanto os antissépticos são agentes químicos indicados para o uso tópico, ou seja, em tecidos vivos. U6 82Microbiologia e Imunologia Controle De Crescimento Dos Microrganismos: Ação De Agentes Físicos E Químicos Os agentes químicos são diversos e dividem-se em categorias; alguns apresentam fun- ção desinfetante, outros atuam como antissépticos e alguns possuem as duas finali- dades. O Quadro 3 apresenta exemplos de agentes químicos de controle microbiano, classificados por categoria, mecanismo de ação e aplicação. CATEGORIA MECANISMO DE AÇÃO AGENTE QUÍMICO APLICAÇÃO Agentes alquilantes Rompem os ácidos nucleicos Glutaraldeído Desinfetante Fenóis Desnaturam proteínas Derivado com cloro: hexa- clorofeno Antisséptico Biguanidas Danificam membrana citoplasmática Clorexidina Antisséptico Halogênios Inativam ácidos nucleicos Iodo Antisséptico Halogênios Inativam ácidos nucleicos Cloro e compostos clorados Desinfetante Peroxigênios Ação na membrana citoplasmática, no DNA e em outros componen- tes celulares Peróxido de hidrogênio Desinfetante; Esterili- zante e Antisséptico. Alcoóis Desnaturação de proteinase, desorgani- zação dos lipídios de membrana Álcoois etílico e isopropílico Desinfetante; Antisséptico. Quadro 03. Agentes químicos de controle do crescimento microbiano e aplicação Fonte: elaborado pelos autores. Faça a leitura do artigo: Eficácia da desinfecção com álcool 70% (p/v) de superfícies contaminadas sem limpeza prévia Link: https://www.scielo.br/j/rlae/a/CfZMMxxqFn6mgd74MK8m8Sh/?lang=en. Acesso em: 25 mai. 2022SA IB A M A IS Alguns microrganismos podem apresentar resistência intrínseca a determinada subs- tância química, reduzindo a eficácia daquele método de controle. Outro fator que pode afetar a ação de um agente químico antimicrobiano é a hidratação. Um exemplo é o uso do etanol a 70% para desinfecção e antissepsia. A água é necessária para a inte- ração com a membrana plasmática do microrganismo, levando à sua desidratação pelo álcool. Além disso, a água contribui para diminuir a volatilidade do etanol, retardando a evaporação e aumentando o tempo de contato com a superfície ou tecido. Por essa razão, o etanol a 70% é mais eficaz no controle microbiano do que a versão concentra- da a 100%. 83 Microbiologia e Imunologia U6 Controle De Crescimento Dos Microrganismos: Ação De Agentes Físicos E Químicos A contaminação microbiana das superfícies, onde as mãos dos profissionais de saúde tocam, deve ser eliminada por métodos seguros, uma vez que a higienização das mãos pode ser negligenciada para quebrar o ciclo de transmissão dos microrganismos de um reservatório até o hospedeiro susceptível – o paciente – podendo causar infecção cruzada, relacionada a procedimentos assistenciais. A recomendação clássica e consensual dos métodos seguros para descontaminação das tais superfícies consiste na limpeza prévia do local, seguida de desinfecção com um agente microbicida, por exemplo, o álcool a 70% (p/v). (GRAZIANO, 2013, p. 2) Fonte: GRAZIANO, Maurício Uchikawa; GRAZIANO, Kazuko Uchikawa; PINTO, Flávia Mo- rais Gomes; BRUNA, Camila Quartim de Moraes; SOUZA, Rafael Queiroz de; LASCALA, Ce- sar Angelo. Effectiveness of disinfection with alcohol 70% (w/v) of contaminated surfaces not previously cleaned. Revista Latino-Americana de Enfermagem. São Paulo, vol. 21, n. 2, mar./ abr. 2013. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rlae/a/CfZMMxxqFn6mgd74MK8m8Sh/?lan- g=pt&%3bformat=pdf. Acesso em: 25 mai. 2022. A utilização do etanol 70% para assepsia das mãos vem sendo amplamente difundida após a declaração, pela OMS, da pandemia de COVID-19. A utilização do etanol 100% não deveria ser mais eficiente do que a versão diluída (etanol 70%)? a. Não, o etanol 70% deve ser utilizado pois os outros 30% correspondem aos compostos químicos que realmente proporcionam a morte do micro-organismo. As bactérias são con- sideradas sensíveis se não forem capazes de crescer na placa onde foi adicionado o disco com o antibiótico. b. Não, o etanol a 70% possui concentração ótima para o efeito bactericida, porque a desna- turação das proteínas do microrganismo faz-se mais eficientemente na presença da água, pois esta facilita a entrada do álcool na bactéria e também retarda a volatilização do álcool, permitindo maior tempo de contato. c. Não, o etanol 70% sempre é o mais indicado pois tem o poder de eliminar qualquer vírus, já que possui em sua composição o etanol. As bactérias sensíveis ao antibiótico testado formam um halo de inibição menor do que as bactérias resistentes, levando em conta pontos-de-corte estabelecidos pelo laboratório. d. Sim, o etanol 100%, por ser mais concentrado, consegue destruir os microrganismos mais facilmente do que sua versão diluída, porém, por ser de venda controlada é aconselhável o uso do etanol 70%. e. Sim, sempre que possível devemos utilizar o etanol 100%. Porém, com a pandemia de COVID-19, com a finalidade de racionar o uso do etanol, o governo optou pela venda da sua versão diluída (o etanol 70%). Exercício 1. Em resumo, métodos de controle microbiano incluem diferentes técnicas com apli- cações na indústria farmacêutica e de alimentos, em laboratórios e hospitais. In- cluem métodos químicos e/ou físicos com mecanismos de ação distintos, capazes de promover efeito microbicida ou microbistático e de evitar propagação de micror- ganismos e doenças. U6 84Microbiologiae Imunologia Controle De Crescimento Dos Microrganismos: Ação De Agentes Físicos E Químicos Elaborar um panfleto informativo que deverá abordar métodos de controle de crescimento microbiano. O panfleto deve apresentar informações de forma didática sobre determinado assunto, com intuito de estimular a leitura sobre o tema abordado. Tema do panfleto: Métodos de controle de crescimento microbiano (2 métodos). Assunto que deverá ser abordado: Conceitos, mecanismo de ação, finalidade e aplicação. Exercício 2. REFERÊNCIAS BLACK, Jaqueline G.; Microbiologia: fundamentos e perspectivas. 10. ed. Rio de Janeiro: GUANABARA KOOGAN, 2021. TORTORA, Gerard J.; FUNKE, Berdell R.; CASE, Christine L. Microbiologia. Porto Alegre - RS: ARTMED, 2017. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788582713549/. Acesso em: 22 mar. 2022. TORTORA, Gerard J.; FUNKE, Berdell R.; CASE, Christine L. Microbiologia. Porto Alegre - RS: ARTMED, 2012. VERMELHO, Alane B. Práticas de Microbiologia. São Paulo: Grupo GEN, 2019. Disponível em: https://inte- grada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788527735575/. Acesso e m: 17 mai. 2022. EDUCANDO PARA A PAZ 86 UNIDADE 7 ETAPAS DO PROCESSO INFECCIOSO, PATOGENICIDADE E VIRULÊNCIA MICROBIANA 1. MECANISMOS DE PATOGENICIDADE Microrganismos classificados como patogênicos são aqueles que apresentam a capa- cidade de causar doença. As terminologias doença e infecção na maioria das vezes são utilizadas como sinônimos, mas apresentam diferenças. A infecção ocorre quando um microrganismo patogênico invade e/ou coloniza algum tecido; a doença aconte- ce quando o processo infeccioso resulta em alguma modificação do estado de saúde, em que o organismo se torna incapaz de efetuar suas funções normais. É importante ressaltar que uma infecção pode acontecer sem que seja detectada uma doença; um exemplo é a infecção pelo vírus HIV, que pode permanecer no organismo durante me- ses ou anos. AIDS é a doença causada pela evolução da infecção viral, que leva à destruição de células imunes e causa imunodeficiência. A presença de determinado microrganismo em um sítio corpóreo é chamada de colonização. Os microrganismos patogênicos apresentam propriedades que contribuem para sua capacidade de causar doença. Estas propriedades, conhecidas como fatores de viru- lência, e permitem que o microrganismo invada tecidos do hospedeiro e/ou escape das defesas imunológicas. Assim, virulência é definida como grau de patogenicidade de um microrganismo. Os microrganismos podem ser classificados em patógenos verda- deiros – cujo encontro com o hospedeiro normalmente resulta em doença; e patógenos oportunistas – capazes de causar doença em pessoas imunossuprimidas. O processo de patogênese apresenta diferentes etapas: 01. Acesso do patógeno ao hospedeiro; 02. Adesão do patógeno aos tecidos; 03. Penetração/invasão dos tecidos; 04. Escape das defesas imunológicas; 05. Destruição tecidual e/ou perda de função. Etapas do processo infeccioso, patogenicidade e virulência microbiana C O M PE TÊ N C IA S U7 87Microbiologia e Imunologia Etapas Do Processo Infeccioso, Patogenicidade E Virulência Microbiana A etapa inicial da infecção envolve a exposição do hospedeiro ao agente patogêni- co, que pode ser através do contato com pessoas infectadas, de alimentos ou água contaminados, do meio ambiente, da própria microbiota ou do ambiente hospitalar. A transmissão do patógeno de um indivíduo para outro pode ocorrer de forma direta – através do contato sexual, por exemplo, ou indireta, por meio de aerossóis ou amostras biológicas contaminadas. Após o contato com o patógeno, este deve aderir à pele ou mucosas por meio de estruturas presentes em sua superfície, como pili e flagelos em bactérias, proteínas e lipídeos presentes em vírus e fungos. Em seguida, ocorre a invasão tecidual pelo microrganismo, que leva à colonização e crescimento em diferentes nichos (lo- cais) no hospedeiro. Nesta etapa, o hospedeiro passa a manifestar os sintomas da doença, decorrentes da invasividade do microrganismo e destruição tecidual, além da produção de toxinas, que podem ter efeitos locais ou sistêmicos. Em muitos casos, a resposta inflamatória desencadeada pela patógeno também contribui com o dano aos tecidos do hospedeiro. O tempo compreendido entre o contato do hospedeiro com um patógeno e o início dos sintomas é chamado de período de incubação. Nesta etapa, embora o hospedeiro não manifeste sintomas da doença, pode ocorrer transmissão do microrganismo para outras pessoas. O período de incubação varia dependendo do tipo de patógeno e de aspectos do hospedeiro.SA IB A M A IS A penetração do patógeno no hospedeiro pode ocorrer por diferentes vias que são de- nominadas portas de entrada; estas incluem as mucosas (tratos respiratório, gastroin- testinal e urogenital), a pele ou pela via parenteral (através de inoculação). A pele atua como barreira na defesa para o hospedeiro, dificultando a penetração de patógenos, porém, lesões na pele, como queimaduras ou cortes, comprometem a inte- gridade da barreira, favorecendo o acesso de patógenos. O trato respiratório é a principal porta de entrada de diferentes microrganismos que penetram através de gotículas de umidade e partículas de pó. O trato gastrointestinal corresponde à porta de entrada de patógenos transmitidos pela água e alimentos contaminados. Muitos patógenos são destruídos pela acidez es- tomacal, ou por enzimas presentes na saliva, estômago, bile e intestino, porém, alguns microrganismos são adaptados a sobreviver nessas condições, causando doença. O trato urogenital é a porta de entrada de patógenos sexualmente transmissíveis, como as bactérias causadoras da sífilis e gonorreia, e os vírus HIV, HPV e herpes, entre outros. 88 Microbiologia e Imunologia U7 Etapas Do Processo Infeccioso, Patogenicidade E Virulência Microbiana Vetores são organismos responsáveis pela transmissão de patógenos. Em geral, são insetos ou artrópodes que carregam o microrganismo em seus corpos e o transmitem, por exemplo, ao se alimentar de sangue do hospedeiro. Veículos são sistemas inertes que carregam patógenos para o hospedeiro. Por exem- plo, uma verdura mal lavada ou água contaminada. SA IB A M A IS A via parenteral é utilizada pelos microrganismos transmitidos por vetores, como inse- tos ou carrapatos. Os vírus da dengue, chikungunya e febre amarela são exemplos de patógenos transmitidos pela picada de mosquitos, enquanto carrapatos podem transmi- tir doenças como a borreliose. A via parenteral também inclui a aquisição de microrga- nismos por perfurações, injeções, mordidas, cortes, ferimentos e processos cirúrgicos. Alguns patógenos apresentam portas de entrada preferenciais, e isso é fator principal para sua capacidade em causar uma doença infecciosa; caso entre por outra via, a chance de causar doença é reduzida. O quadro 1 apresenta a porta de entrada mais comum para diferentes patógenos, e as doenças que causam. PORTA DE ENTRADA PATÓGENO DOENÇA Trato respiratório Streptococcus pneumoniae Pneumonia pneumocócica; bacteremia, meningite Mycobacterium tuberculosis Tuberculose Morbillivirus Sarampo Histoplasma capsulatum Histoplasma capsulatum Trato gastrintestinal Shigella spp. Shigelose Vibrio cholerae Cólera Salmonella entérica Salmonelose Rubulavirus Caxumba Trato urogenital Neisseria gonorrhoeae Gonorreia Treponema pallidum Sífilis Vírus da imunodeficiência huma- na (HIV) Aids Candida albicans Candidíase Pele Clostridium perfringens Gangrena gasosa Clostridium tetani Tétano Lyssavirus Raiva Quadro 01. Portas de entrada de alguns patógenos e doença resultante Fonte: elaborado pelos autores. U7 89Microbiologia e Imunologia Etapas Do Processo Infeccioso, Patogenicidade E Virulência Microbiana O risco de aquisição de uma doença infecciosa depende de diversos fatores, como a carga microbiana no momento da exposição, o sistema imune do hospedeiro, a presençade outras doenças (comorbidades), etc. 2. FATORES DE VIRULÊNCIA Os fatores de virulência são estruturas, moléculas e mecanismos que contribuem para a invasão do hospedeiro pelos patógenos e/ou escape do sistema imune. As bactérias apresentam diversos fatores de virulência, que incluem adesinas, cápsu- la, enzimas, toxinas, sistemas de secreção, sideróforos e biofilmes. As adesinas são moléculas utilizadas pelas bactérias para se ligarem firmemente aos tecidos do hospedeiro, dificultando sua eliminação. Algumas bactérias apresentam cáp- sula que recobre a parede celular e protege o microrganismo contra a fagocitose e ação de antimicrobianos. As enzimas extracelulares contribuem para a virulência bacteriana de diferentes formas conforme mostrado no quadro 2. As coagulases apresentam capacidade de induzir a formação de coágulos, que protegem o patógeno contra fagocitose; são produzidas por algumas espécies de Staphylococcus, por exemplo. As quinases são um grupo de enzimas que apresenta efeito oposto ao das coagulases; promovem a quebra de coá- gulos de fibrina, favorecendo a disseminação da bactéria. Outra enzima produzida por bactérias que dificulta a sua eliminação é a hialuronidase, que hidrolisa o ácido hialurô- nico, favorecendo a necrose tecidual. O quadro abaixo apresenta exemplos de enzimas produzidas por bactérias e sua ação. PRODUÇÃO DE ENZIMAS Coagulases Enzimas que coagulam o fibrinogênio do sangue; Os coágulos de fibrina protegem a bactéria contra fagocitose. Quinases Degradam os coágulos de fibrina formados pelo organismo para isolar uma infecção; Facilitam a disseminação da infecção pelo organismo. Hialuronidases Hidrolisa o ácido hialurônico, que tem função de unir células nos tecidos do corpo humano; A hidrólise leva a necrose nos ferimentos infectados. Colagenases Quebra a proteína colágeno, que forma os tecidos conectivos dos músculos e de outros órgãos e tecidos. Proteases IgA São enzimas que degradam os anticorpos do tipo IgA, produzidos pelo sistema imunológico do hospedeiro. Quadro 02. Enzimas produzidas por bactérias como forma de resistência Fonte Além de enzimas, as bactérias podem produzir toxinas, essa capacidade é denominada toxigenicidade. As toxinas (ativamente secretadas – exotoxinas, ou liberadas após a lise da bactéria – endotoxinas) podem ser transportadas pelo sangue e linfa, e causar efeitos graves e diversos, incluindo febre, distúrbios cardiovasculares, diarreia e choque 90 Microbiologia e Imunologia U7 Etapas Do Processo Infeccioso, Patogenicidade E Virulência Microbiana Figura 01. Exotoxinas e Endotoxinas. Fonte: adaptada de Tortora et al. (2017, p. 425). As exotoxinas são produzidas principalmente por bactérias Gram-positivas, como as do gênero Clostridium, em geral são proteínas compostas de duas subunidades (A-B), com capacidade de causar doenças como gangrena gasosa, tétano e botulismo. O quadro 3 apresenta exemplos de exotoxinas bacterianas e seu mecanismo de ação. DOENÇA BACTÉRIA MECANISMO Botulismo Clostridium botulinum A neurotoxina impede a trans- missão de impulsos nervosos, resultando em paralisia flácida. Tétano Clostridium tetani A neurotoxina bloqueia os impul- sos nervosos da via de relaxa- mento muscular, resultando em contrações descontroladas dos músculos. Difteria Corynebacterium diphtheriae A citotoxina inibe a síntese pro- teica, principalmente em células nervosas, cardíacas e renais. Cólera Vibrio cholerae A enterotoxina causa a secre- ção de grandes quantidades de fluidos e eletrólitos, resultando em diarreia. Quadro 03. | Doenças causadas por exotoxinas bacterianas e seu mecanismo de ação no hospedeiro Fonte: adaptada de Tortora et al. (2017, p. 427). U7 91Microbiologia e Imunologia Etapas Do Processo Infeccioso, Patogenicidade E Virulência Microbiana As endotoxinas são produzidas por bactérias Gram-negativas, que apresentam o lipo- polissacarídeo (LPS) em sua membrana externa. A porção lipídica do LPS (lipídeo A) é liberada durante a lise da bactéria ou pela divisão celular e causa diversos sintomas como febre, fraqueza, dores e choque. Sistemas de secreção são estruturas compostas por várias moléculas, que se orga- nizam formando canais de transporte de substâncias através das células. Contribuem para a virulência promovendo a expulsão e moléculas antimicrobianas ou a secreção de enzimas e toxinas. Sideróforos são componentes bacterianos responsáveis por capturar ferro do hospe- deiro. O ferro é um nutriente essencial para o crescimento microbiano, e a capacidade de sequestrar ferro é um importante mecanismo e virulência bacteriana. Diversas espécies de bactérias possuem a capacidade de formar biofilmes – comu- nidades organizadas de microrganismos envoltos por uma matriz polissacarídica. Os biofilmes apresentam resistência elevada a componentes do sistema de defesa e anti- microbianos, além de atuarem como reservatórios para disseminação de bactérias no organismo hospedeiro. O processo de formação de biofilmes se inicia com a fixação das bactérias a uma super- fície – que pode ser um tecido vivo ou uma superfície abiótica, como um cateter hospita- lar. Em seguida, as bactérias aderidas passam a secretar a matriz extracelular e novos microrganismos (da mesma espécie ou de espécies diferentes) se unem à estrutura, formando os biofilmes maduros. Biofilmes bacterianos são encontrados, por exemplo na cavidade oral, onde provocam doenças como a cárie. A formação de biofilmes em dispositivos médicos – como cateteres urinários e tubos endotraqueais – representa um grave problema, pois contribui para a disseminação de microrganismos patogênicos entre pacientes, uma vez que biofilmes são muito resistentes à eliminação mecânica ou por desinfetantes. C U R IO SI D A D E Os plasmídeos – pequenas moléculas de DNA extracromossômico circular que se re- plicam de forma independente e são passados de uma bactéria para outra – contribuem para a transmissão de fatores de virulência. O fator R (R de resistência), por exemplo, é um tipo de plasmídeo responsável pela resistência de bactérias aos antibióticos. Em relação aos fungos, observa-se que os fatores de virulência não são muito bem es- tabelecidos. Sabe-se que esses organismos produzem metabólitos que são tóxicos ao hospedeiro, mas nesta situação a toxina liberada é causa indireta da doença. Por exem- plo, Tricotecenos são toxinas produzidas por fungos como Fusarium e Stachybotrys, com capacidade de inibição da síntese de proteínas em células eucarióticas. A toxina pode ser ingerida de forma acidental e causar cefaleia, calafrios, náusea, vômito e distúrbios visuais. Fungos como Candida albicans e Trichophyton secretam proteases – enzimas responsáveis por promover a modificação da membrana celular do hospedeiro, facilitando 92 Microbiologia e Imunologia U7 Etapas Do Processo Infeccioso, Patogenicidade E Virulência Microbiana Os microrganismos podem infectar o hospedeiro por meio de diferentes vias denominadas portas de entrada, quais são essas vias e quais são as conhecidas como preferenciais. A via específica pela qual um patógeno em particular tem acesso ao corpo é chamada de por- ta de entrada. Muitos microrganismos podem penetrar as membranas mucosas da conjuntiva e dos tratos respiratório, gastrintestinal e urogenital. A maioria dos micróbios não podem pe- netrar a pele intacta, eles penetram através de folículos pilosos e ductos sudoríparos. Alguns microrganismos têm acesso aos tecidos por inoculação na pele e nas membranas mucosas via picadas de insetos, injeções e outros ferimentos. Essa via de penetração é chamada de via parenteral. Muitos microrganismos podem causar doença somente quando entram no corpo através de suas portas de entrada específicas, conhecidas como portas de entrada preferenciais. Dentro desse contexto, um exemplo é a bactéria Salmonella typhi, em que é o agente causador da febre tifoide, que só observa-se sinais e sintomas da doença quando a bactériaUNIDADE 10: IMUNIDADE ADAPTATIVA: ATIVAÇÃO DE LINFÓCITOS T E SEUS MECANISMOS EFETORES ....................................................................................121 1. Imunidade Adaptativa: Resposta Celular ............................................................121 2. Linfócito T E Apresentação De Antígenos ...........................................................122 3. Ativação Do Linfócito T ........................................................................................125 4. Função Efetora Dos Linfócitos T .........................................................................126 UNIDADE 11: ANTÍGENOS E IMUNOGLOBULINAS: REAÇÃO ANTÍGENO E ANTICORPO .............................................................................................................134 1. Antígenos E Imunoglobulinas ..............................................................................134 2. Estrutura Dos Anticorpos .....................................................................................134 3. Função Dos Anticorpos ......................................................................................138 4. Interações Antígeno-Anticorpo ............................................................................143 5. Diagnósticos E Tratamentos Baseados Na Interação Antígeno/ Anticorpo .........143 UNIDADE 12: IMUNIDADE ADAPTATIVA: ATIVAÇÃO DE LINFÓCITOS B E PRO- DUÇÃO DE ANTICORPOS ......................................................................................150 1. Imunidade Adaptativa: Linfócito B ......................................................................150 2. Ativação De Linfócito B ......................................................................................150 3. Produção De Anticorpos .....................................................................................153 4. Resposta T Dependente E T Independente ........................................................157 UNIDADE 13: IMUNOPROFILAXIA E IMUNOTERAPIA .......................................162 1. Histórico Da Vacinação .......................................................................................162 2. Respostas Imunes Induzidas Pela Vacinação.....................................................164 3. Tipos De Vacinas .................................................................................................166 4. Imunoterapias ......................................................................................................169 UNIDADE 14: HIPERSENSIBILIDADES E IMUNODEFICIÊNCIAS ....................174 1. Hipersensibilidades E Imunodeficiências ...........................................................174 2. Hipersensibilidade Tipos 1-4 ...............................................................................174 3. Imunodeficiências Congênitas E Adquiridas .......................................................184 2 50% EAD 50% Presencial O ENSINO DINÂMICO NA UNIVERSIDADE SÃO FRANCISCO - USF A USF, em seus 45 anos de história, sempre propôs modelos pedagógicos inovadores e agora apresenta o “Ensino Dinâmico”, que oferece uma experiência significativa de aprendizagem, reunindo o melhor dos universos do ensino à distância e presencial, com uma matriz curricular que flexibiliza o tempo e o espaço escolar, respeita seu ritmo de aprendizagem e permite o acompanhamento do seu aprendizado. O “Ensino Dinâmico” apresenta diferentes espaços de aprendizagem, todos acessados através do USF Connect. A matriz curricular dos cursos é constituída por Componentes Curriculares (disciplinas) com cargas horárias distribuídas no ensino à distância e/ou pre- sencial, conforme descrito abaixo: 100% da carga horária ofertada na modalidade à distância, com atividades desenvolvidas no Ambiente Virtual de Aprendizagem, a partir do modelo pedagógico e organização didática apresentada na Sala Virtual. 50% da carga horária ofertada na modalidade à distância e 50% da mo- dalidade presencial, com atividades desenvolvidas tanto em Ambiente Virtual de Aprendizagem quanto presencialmente. Para garantir o diá- logo entre esses espaços de aprendizagem temos a “Trilha de Aprendi- zagem Dinâmica”. 100% da carga horária ofertada na modalidade presencial, com ativida- des desenvolvidas em sala de aula ou em modernos laboratórios. 1 100% EAD 3 100% Presencial Importante lembrar que, durante a pandemia da COVID-19, as atividades presenciais po- dem acontecer em ambiente remoto, no mesmo horário das aulas presenciais seguindo a metodologia de aulas supervisionadas remotas da USF, ou presencialmente, em horários previamente informados pelo professor, seguindo as normas sanitárias vigentes. Desenvolver O encontro síncrono com o professor e seus colegas de turma acon- tece na sequência, no movimento do DESENVOLVER. O professor aprofundará as discussões, com atividades teóricas e/ou práticas. Por meio da utilização de metodologias dinâmicas (ativas), é valori- zado seu protagonismo e autonomia e são desenvolvidas as compe- tências necessárias para atuar no mercado e na sociedade. Praticar Para encerrar o ciclo de aprendizagem da semana letiva, você realiza as atividades da Prática de Competências no movimento PRATICAR, que também acontece na Sala Virtual, seguindo o prazo estipulado pelo pro- fessor. Você será desafiado a buscar soluções inovadoras para proble- mas reais, integrando teoria e prática. A partir do feedback do professor, você poderá acompanhar seu desempenho. CICLO CDP Conectar Para iniciar seus estudos, em cada semana letiva, você re- aliza a atividade do CONECTAR, através da leitura do texto da unidade de aprendizagem da respectiva semana letiva e participa de atividade organizada e mediada pelo seu pro- fessor. Tudo acontece dentro da Sala Virtual, antecedendo o encontro com seu professor. Este componente curricular tem 50% de sua carga horária ofertada na modalidade à distância e 50% da modalidade presencial e, portanto, será desenvolvido segundo a “Trilha de Aprendizagem Dinâmica”, com atividades relacionadas aos movimentos do CONECTAR (C), DESENVOLVER (D) e PRATICAR (P), que chamamos de CICLO CDP. Suas te- máticas serão desenvolvidas durante este semestre e estão organizadas em semanas letivas e, para cada uma delas, você percorrerá um “Ciclo CDP”. A seguir apresentamos detalhadamente os movimentos deste ciclo de aprendizagem. SAIBA MAIS Visite os links para saber mais sobre: O Ensino Dinâmico na USF: https://www.youtube.com/watch?v=W-B7HTU1_y8. Como ter acesso ilimitado aos recursos tecnológicos de aprendizagem: https://www. youtube.com/watch?v=-7SuzbS4CYA. Quais são as Ferramentas do USF Connect: https://www.youtube.com/watch?- v=1kI4MaZ9QIQ. Como funciona a Metodologia de Aulas Remotas da USF: https://www.youtube.com/ watch?v=0eGZNh4N0eM. Quais são as normas que regem a “Prática de Competências”: https://www.usf.edu.br/ galeria/getImage/410/1720366361479788.pdf. O Plano de Contingência para enfrentamento da COVID-19: https://www3.usf.edu.br/ galeria/getImage/252/2717033432743751.pdf. Dinâmico é quando o ensino se adapta a sua história! E só uma Universidade com muita história pode oferecer o ensino dinâmico que você precisa. BONS ESTUDOS! CICLO CDP INTRODUÇÃO A microbiologia envolve o estudo dos microrganismos, como vírus, bactérias e fungos. Trata-se de um grupo heterogêneo de seres com amplas variações em seu metabo- lismo, crescimento e aplicações biotecnológicas. Os microrganismos são essenciais para vida; contribuem para o equilíbrio dos ecossistemas, por meio de seu papel como decompositores de matéria orgânica. Algumas espécies de fungos são comestíveis, enquanto outras atuam, juntamente com certas bactérias, na produção de alimentos e bebidas por processos fermentativos. O estudo da microbiologia também permitiu a descoberta dos agentes causadores de diversas doenças infecciosas e sua forma de transmissão, além de métodos para o tratamento e profilaxia, como osentra pela via oral. Exercício 1. Resposta: 4. ATIVIDADES PRÁTICAS Uma bactéria que apresenta cápsula é considerada virulenta porque essa estrutura é capaz de: a. Aumentar a resistência à fagocitose. b. Produzir uma endotoxina. c. Destruir os tecidos do hospedeiro. d. Destruir as células do hospedeiro. e. A cápsula não contribui para a virulência. Atividade 1. a aderência. A criptococose é uma micose sistêmica causada por Cryptococcus neofor- mans, que apresenta cápsula que impede a ação do sistema imune. Os vírus também utilizam mecanismos para escapar das defesas do hospedeiro e invadir o organismo. O vírus HIV, por exemplo, atua destruindo células de defesa do organismo, além de causar efeitos citopáticos, como bloqueio da mitose, lise, formação de corpúsculo de inclu- são, mudança antigênica e cromossômica além de transformação celular. Os microrganismos patogênicos desenvolveram diversas estratégias que permitem sua transmissão e colonização do hospedeiro, causando doenças. Em contrapartida, o sis- tema imune possui inúmeros mecanismos para prevenir e eliminar patógenos invaso- res. Um desequilíbrio entre os mecanismos de virulência do microrganismo e o sistema de defesa, favorecendo o primeiro, resulta em doença. U7 93Microbiologia e Imunologia Etapas Do Processo Infeccioso, Patogenicidade E Virulência Microbiana A febre amarela é uma doença viral transmitida pela picada do mosquito Aedes aegypti. Além dos seres humanos, certas espécies de macacos também podem contrair o vírus. Na afirmativa acima, o agente causador e o vetor da febre amarela são: a. agente causador: vírus; vetor: macaco b. agente causador: vírus; vetor: mosquito c. agente causador: mosquito; vetor: vírus d. agente causador: macaco; vetor: mosquito e. agente causador: macaco; vetor: vírus Atividade 2. As bactérias podem produzir toxinas, que são transportadas pelo sangue e linfa causando efeitos graves e potencialmente fatais. As toxinas são divididas em duas classes principais: a. Endotoxinas (Bactérias Gram-positivas) e Exotoxinas (LPS de bactérias Gram negativas). b. Endotoxinas (LPS de bactérias Gram-negativas) e Exotoxinas (Bactérias Gram-positivas). c. Aflotoxina (LPS de bactérias Gram-negativas) e Exotoxinas (Bactérias Gram-positivas). d. Endotoxinas (peptidoglicano) e Exotoxinas (LPS). e. Peptidoglicano e Lipopolissacarídeo. Atividade 3. EDUCANDO PARA A PAZ 95 UNIDADE 8 ESTRUTURA E ORGANIZAÇÃO DO SISTEMA IMUNE 1. SISTEMA IMUNOLÓGICO O sistema imunológico compreende um conjunto de células, moléculas, tecidos e ór- gãos especializados, que atuam de forma organizada para defender o organismo contra infecções e tumores. Diariamente, o organismo é exposto a uma grande quantidade de agentes com potencial para causar doenças, como vírus, bactérias, fungos e parasitos. Estes patógenos podem penetrar a pele ou as mucosas e ganhar acesso a diferentes nichos no hospedeiro, onde se multiplicam e produzem toxinas, levando à destruição te- cidual. Para atuar de forma eficiente, o sistema imunológico deve reconhecer os agen- tes invasores e destruí-los ou impedir que atinjam as células-alvo no hospedeiro. Essa capacidade de distinguir os patógenos invasores das células próprias permite que o sistema imunológico proteja o organismo de doenças sem afetar os tecidos saudáveis. Falhas no sistema imunológico podem resultar em doenças graves e potencialmente fatais, ressaltando a importância deste sistema para a homeostase do organismo. Esta unidade irá abordar os componentes do sistema imunológico e seu papel no con- trole das infecções. 2. CÉLULAS DO SISTEMA IMUNE O sistema imunológico inclui diversos tipos de células, que podem estar localizadas no sangue ou nos tecidos. Estas células desempenham diferentes funções no reconheci- mento e eliminação dos antígenos. Um antígeno é qualquer molécula capaz de ser reconhecida e promover a ativação do sistema imunológico. IM PO R TA N TE Compreender os mecanismos de virulência dos patógenos e de defesa do hospedeiro. C O M PE TÊ N C IA S U8 96Microbiologia e Imunologia Estrutura E Organização Do Sistema Imune As células que compõem o nosso sistema imunológico são também conhecidas como leucócitos (ou células brancas). Você já deve ter realizado, alguma vez na sua vida, um leucograma; esse exame serve para determinar a quantidade de cada leucócito do sangue, além de identificar possíveis alterações estruturais nessas células. A Tabela 1 mostra a concentração dos leucócitos presentes no sangue de um adulto saudável. TABELA FAIXA NORMAL. Leucócitos totais 4.500 -11.000 / mm³ de sangue Neutrófilos 40-60% Eosinófilos 1-4% BasófilosU8 Estrutura E Organização Do Sistema Imune Os macrófagos são encontrados por todo o corpo e assumem formas diferen- tes dependendo de onde se localizam. Por exemplo: macrófagos do fígado são conhecidos como células de Kupffer, macrófagos do pulmão são conhecidos como alveolares, macrófagos do cérebro são conhecidos como micróglia. IM PO R TA N TE 2.4 MASTÓCITOS Os mastócitos são células presentes nos tecidos subjacentes à pele e às mucosas; quando ativados, liberam aminas vasoativas e mediadores inflamatórios que conferem defesa contra infecções por parasitos e estão envolvidos nas respostas alérgicas. Nor- malmente, os mastócitos maduros estão presentes nos tecidos, e residem nas regiões adjacentes a pequenos vasos sanguíneos e nervos. No citoplasma são encontrados grânulos repletos de mediadores inflamatórios compostos principalmente de histamina. Uma vez ativados, os mastócitos liberaram os conteúdos dos grânulos citoplasmáticos no espaço extracelular, os quais promovem alterações nos vasos sanguíneos, na mus- culatura lisa e causam inflamação. Os mastócitos apresentam em sua membrana plasmática receptores que se ligam a anticorpos da classe IgE. Quando os anticorpos presentes na superfície do mastócito se ligam ao antígeno, a célula se torna ativada, liberando os grânulos citoplasmáticos. 2.5 BASÓFILOS Os basófilos são células sanguíneas que apresentam muitas similaridades estruturais e funcionais com os mastócitos. São granulócitos, contendo diversos grânulos citoplas- máticos com afinidade para corantes básicos, como o azul de metileno. Dessa forma, apresentam intensa coloração azul quando analisados ao microscópio. Os basófilos derivam de precursores na medula óssea, e depois de maduros passam para o sangue. Menos de 1% de todos os leucócitos sanguíneos são basófilos. E embora normal- mente estejam ausentes nos tecidos, os basófilos são recrutados por mediadores inflamató- rios para tecidos onde tem como principal função produzir moléculas inflamatórias. 2.6 EOSINÓFILOS Os eosinófilos apresentam grânulos citoplasmáticos contendo enzimas capazes de da- nificar o tegumento de parasitos multicelulares, como os vermes helmintos, por isso são importantes na defesa contra estes patógenos. Assim como os mastócitos, os eosinófilos possuem receptores que se ligam a anticorpos da classe IgE e são ativados durante processos alérgicos. Os eosinófilos circulam no sangue e podem ser recrutados para os tecidos onde irão agir promovendo a inflamação. U8 100Microbiologia e Imunologia Estrutura E Organização Do Sistema Imune Os grânulos dos eosinófilos contêm principalmente proteínas que se ligam a corantes ácidos, como a eosina, e, por isso, são facilmente reconhecidos pela cor avermelhada em lâminas de esfregaços sanguíneos. 2.7 CÉLULAS DENDRÍTICAS (DCS) As células dendríticas residem nos tecidos, onde detectam a presença de micror- ganismos invasores e os capturam. No interior da DC, os patógenos capturados são processados, e fragmentos proteicos destes patógenos são apresentados aos linfócitos T, promovendo a sua ativação. Este processo dá início à resposta imune adaptativa mediada por células. Para apresentar os antígenos aos linfócitos T, as células dendríticas devem migrar dos tecidos até os órgãos linfóides secun- dários, onde os linfócitos estão localizados. As DCs possuem receptores que reconhecem moléculas microbianas, e respondem aos microrganismos secretando citocinas que recrutam e ativam outras células para os sítios de infecção. As DCs também são excelentes fagócitos, promovendo a diges- tão intracelular de microrganismos capturados. As DCs possuem uma morfologia característica, com prolongamentos em sua membra- na que conferem um aspecto de “pequenos dedos”, de onde deriva seu nome “dendrus”. As células dendríticas são conhecidas como células apresentadoras de antígenos (APCs) profissionais, pois são as principais responsáveis por apresentar antígenos para os linfócitos T. IM PO R TA N TE 2.8 LINFÓCITOS A linhagem dos linfócitos dá origem a três células distintas: linfócito T, linfócito B e a célula natural killer (célula NK), como pode ser visto na Figura 1. ` Célula Natural Killer A célula NK pertence ao sistema imune inato e tem como principal função reconhecer células do hospedeiro que foram invadidas por antígenos intracelulares ou células tu- morais e eliminar essas células. Por este motivo, são células conhecidas como citotó- xicas. As células NK também produzem citocinas como o interferon-gama (IFN-γ), que ativam respostas inflamatórias. ` Linfócitos T O linfócito T é uma das células que compõem a imunidade adaptativa, atuando como mediadores da imunidade celular. São caracterizados pela expressão de receptores 101 Microbiologia e Imunologia U8 Estrutura E Organização Do Sistema Imune antigênicos chamados receptores de célula T (TCRs), que reconhecem os antígenos de forma específica. Os linfócitos T apresentam duas populações distintas: as células T auxiliares CD4+ (Th) secretam citocinas que modulam as respostas imunológicas; os linfócitos T citotóxicos CD8+ (Tc) apresentam um mecanismo de resposta similar às células NK, sendo capazes de reconhecer e matar células infectadas por microrga- nismos intracelulares, e células tumorais. ` Linfócito B O linfócito B é a célula responsável pela produção de anticorpos, e compõe a resposta humoral da imunidade adaptativa. Os linfócitos B apresentam receptores antigênicos em sua superfície denominados receptores de célula B (BCRs) que reconhecem antí- genos de forma específica nos órgãos linfoides secundários. Os anticorpos produzidos pelos linfócitos B exercem diversas funções importantes na defesa imunológica, devido a sua capacidade de interagir com diferentes células e moléculas do sistema imune. 3. ÓRGÃOS DO SISTEMA IMUNOLÓGICO Os órgãos do sistema imunológico estão envolvidos na produção, maturação e ativa- ção das células de defesa. São classificados de acordo com sua função em órgãos lin- foides primários ou centrais e órgãos linfoides secundários ou periféricos (Figura 2). Figura 02. Órgãos do sistema imunológico Fonte: Coico e Sunshine (2010, p. 21). U8 102Microbiologia e Imunologia Estrutura E Organização Do Sistema Imune 3.1 ÓRGÃOS LINFOIDES PRIMÁRIOS OU CENTRAIS Os órgãos linfoides primários ou centrais são a medula óssea e o timo. São os locais onde os leucócitos são gerados e/ou amadurecem, se tornando imunocompetentes. São também órgãos importantes para as células da imunidade adaptativa. A medula óssea e o timo são os órgãos de maturação das células B e T, respectivamente. Os linfócitos B amadurecem parcialmente na medula óssea, entram na circulação, migram para o baço (completando a sua maturação) e então migram para os órgãos linfoides secundários. Os linfócitos T são gerados na medula óssea, migram para o timo, onde amadurecem, e então entram na circulação e migram para os órgãos linfoides periféricos. ` Medula Óssea Como citado anteriormente, a medula óssea é responsável pela produção das células sanguíneas, incluindo as células de defesa. Nela estão localizadas as células tronco hematopoiéticas pluripotentes, que dão origem a todas as células que compõem o sis- tema imunológico. A medula óssea se localiza no interior dos ossos do corpo, sendo encontrada em maior quantidade nos ossos longos, como o fêmur e a bacia. ` Timo O timo é um órgão bilobado situado no mediastino anterior, que diminuí de volume após a puberdade até se tornar atrofiado na idade adulta. Possuí 2 lóbulos, onde cada um é composto por um córtex na região externa e uma medula na região interna. Os linfóci- tos T imaturos migram para o timo através da circulação sanguínea. No timo, migram do córtex para a medula e, durante esse processo, interagem com as células epiteliais do timo que produzem IL-7, uma citocina necessária para a maturação da célula T. É na região da medula, que são encontradas células epiteliais tímicas, que recebem o nomede células epiteliais medulares tímicas, essas células tem a função de apresentar antígenos próprios para as células T em desenvolvimento, e em caso de forte ligação, eliminar o linfócito T que reconheça esses antígenos, por meio de um mecanismo co- nhecido como tolerância imunológica. 3. 2. ÓRGÃOS LINFOIDES SECUNDÁRIOS OU PERIFÉRICOS Os órgãos linfoides secundários (ou periféricos), incluem os linfonodos, o baço e te- cidos imunes associados à mucosa. São os locais onde as respostas adaptativas a antígenos estranhos são iniciadas e desenvolvidas. Esses órgãos são distribuídos em diferentes locais do organismo, de forma a otimizar as respostas imunológicas. ` Linfonodos Existem aproximadamente 500 linfonodos no corpo humano, que são distribuídos de modo a facilitar o acesso dos antígenos que penetram pela pele ou pelas mucosas e são drenados pelos vasos linfáticos. Os linfonodos são repletos de linfócitos, macrófa- gos, DCs e outros tipos celulares. Possuem uma região chamada de folículo, onde se concentram os linfócitos B, além da região conhecida como zona de célula T ou para- córtex, com alta concentração de linfócitos T. É neste local que ocorre a apresentação de antígenos aos linfócitos (Figura 3). 103 Microbiologia e Imunologia U8 Estrutura E Organização Do Sistema Imune Figura 03. Esquema de um linfonodo Fonte: Coico e Sunshine (2010, p. 23). ` Baço O baço é um órgão localizado na região esquerda do peito, tem como principais fun- ções: a remoção de células sanguíneas envelhecidas e/ou danificadas, e de partículas (como complexos imunes e antígenos opsonizados), outra função importante desem- penhada pelo baço é a apresentação de antígenos para as células da imunidade adap- tativa. O baço é dividido em duas partes; a polpa vermelha, altamente vascularizada e rica em macrófagos, e polpa branca rica em linfócitos e possui estruturas similares as encontradas no baço. Opsonização é o processo de fixação de moléculas (anticorpos, por exemplo) na su- perfície de um antígeno, facilitando o processo de fagocitose. G LO SS Á R IO U8 104Microbiologia e Imunologia Estrutura E Organização Do Sistema Imune Figura 04. Esquema do baço Fonte: adaptada de Kuby et al. (2002, p. 53). É possível sobreviver sem o baço, porém esses indivíduos são mais suscetíveis a in- fecções causadas por bactérias encapsuladas. Isso pode ser devido, principalmen- te, ao fato de esses microrganismos normalmente serem eliminados por fagocitose, função reduzida nesses indivíduos. IM PO R TA N TE ` Componentes Do Sistema Imune De Mucosa Todas as principais barreiras do corpo (epiteliais e de mucosa), o que incluí a pele, mu- cosa gastrintestinal e a mucosa da orofaringe, possuem um sistema de linfonodos pró- prio, essas estruturas linfoides são repletas de células imunes, que fornecem respostas imunes especializadas contra os antígenos que atravessam essas barreiras. O sistema imune associado à pele, por exemplo, responde a uma ampla variedade de microrga- nismos ambientais. Os componentes dos sistemas imunes associados às mucosas gas- trintestinal e bronquial são chamados tecidos linfoides associados à mucosa e estão envolvidos nas respostas imunes a antígenos e microrganismos ingeridos e inalados. 105 Microbiologia e Imunologia U8 Estrutura E Organização Do Sistema Imune Atividade Relacionada (Praticar) Aproveite os jogos disponibilizados abaixo para fixar o conteúdo que você acabou de estudar. Jogo de memória células do sistema imunológico https://www.bookwidgets.com/play/RYR4RC?teacher_id=6613644434472960 Jogo de memória órgãos do sistema imunológico https://www.bookwidgets.com/play/GYPKGH?teacher_id=6613644434472960 Forca Células fagocíticas: https://www.bookwidgets.com/play/BYR5B7?teacher_id=6613644434472960 Forca Órgãos do Sistema Imune: https://www.bookwidgets.com/play/VYQMVL?teacher_id=6613644434472960 Cruzadinha https://www.bookwidgets.com/play/EYLQEK?teacher_id=6613644434472960 Caça palavras https://criadordecruzadinhas.com.br/wordsearch/62388983fe6a360053d12efa 4. OBJETO DE APRENDIZAGEM Uma característica importante desses tecidos linfoides é o fato de serem coloni- zados por microrganismos comensais, que compõem a nossa microbiota. Nesses tecidos, o sistema imune evoluiu para não eliminar os microrganismos da microbiota. IM PO R TA N TE U8 106Microbiologia e Imunologia Estrutura E Organização Do Sistema Imune CONCLUSÃO Nesta unidade, você foi apresentado aos componentes celulares que norteiam e regem a resposta imunológica. De onde as células se originam e qual a função de cada uma das células do sistema imunológico, você também poderá identificar essas células de acordo com as suas características morfológicas quando analisadas em microscópio. Outro ponto abordado foram os órgãos que compõem o sistema imunológico, que po- dem ser diferenciados em órgãos primários ou centrais: aqueles onde todas as cé- lulas imunes são geradas e/ou amadurecem que são a medula óssea e o timo; e os órgãos linfoides secundários ou periféricos: locais onde ocorre a apresentação de antígenos e o local de início da resposta imune adaptativa que são os linfonodos, o baço e os componentes linfoides associados às mucosas. REFERÊNCIAS ABBAS, Abul K.; LICHTMAN, Andrew H.; PILLAI, Shiv. Imunologia celular e molecular. 9. ed. Rio de Janei- ro: Elsevier, 2019. COICO, Richard; SUNSHINE, Geoffrey. Imunologia. 6. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2010. Reim- pressão 2019. GOLDSBY, Richard A.; KINDT, Thomas J.; KUBY, Janis. OSBORNE; Barbara A. Immunology 5. ed. [S. I.]: W. H. Freeman. 2002. EDUCANDO PARA A PAZ 108 UNIDADE 9 IMUNIDADE INATA: CÉLULAS, RECEPTORES, MECANISMOS EFETORES E INFLAMAÇÃO Analisar as respostas imunes inata e adaptativa e a relação antígenos e anticorpos. C O M PE TÊ N C IA S 1. IMUNIDADE INATA: CÉLULAS, RECEPTORES, MECANISMOS EFETORES E INFLAMAÇÃO Iniciamos o estudo da imunologia pela primeira linha de defesa do organismo. A imuni- dade inata, é representada pela resposta imediata, aquela que é ativada nos primeiros minutos a partir do contato do antígeno com o sistema imunológico, vários são os com- ponentes dessa resposta, abaixo é possível observar cada um destes mecanismos. 2. COMPONENTES DA RESPOSTA IMUNOLÓGICA INATA A resposta imunológica inata ou natural, é a primeira linha de defesa do organismo frente aos invasores. Ela é composta por barreiras, moléculas solúveis e células. Nesta unidade, serão discutidos os componentes da imunidade inata e suas prin- cipais funções efetoras. 2.1 BARREIRAS Qualquer microrganismo ou substância estranha que tente invadir o organismo terá que penetrar alguma das barreiras que separam o ambiente externo do interior do corpo. Há 3 tipos de barreiras: i) barreiras físicas, ii) barreiras químicas e iii) microbiota. As barreiras físicas são compostas pela pele e as superfícies mucosas, que graças à presença de uma camada contínua de células firmemente aderidas, impedem a entrada dos antígenos no organismo. As barreiras químicas são compostas por secreções que inibem a adesão e invasão de microrganismos, como os ácidos graxos da pele, o pH ácido da mucosa vaginal e do estômago, a lisozima encontrada nas lágrimas, e outras moléculas que possuem efeito antimicrobiano. A microbiota é um conjunto de microrganismos comensais que ocupam diferentes locais (nichos) do organismo, como a cavidade oral, intestinos, pele e vagina. Estes microrganismos auxiliam diversos processos no corpo (a digestão, por exemplo) e com- U5 109Microbiologia e Imunologia Imunidade Inata: Células, Receptores, Mecanismos Efetores E Inflamação petem com os patógenos por nutrientes e ‘espaço’, dificultando o estabelecimento de microrganismos causadores de doenças. Este processo é conhecido como antago- nismo microbiano e desempenha um papel fundamental na saúde. Desequilíbrios na microbiota estão associados a várias doenças. 2.2 MOLÉCULAS EFETORAS SOLÚVEIS Diversas moléculas que atuam no sistemaimunológico inato são encontradas de forma solúvel no sangue ou nos fluidos extracelulares, onde podem atuar de diferentes formas para impedir ou mesmo destruir os antígenos invasores. As citocinas são produzidas por diversos tipos de células e atuam como mensageiros do sistema imunológico, con- trolando diferentes mecanismos de defesa. Exemplos de citocinas incluem o fator de necrose tumoral alfa (TNF-α), um importante ativador da inflamação, e os interferons tipo 1 (IFN-1), que protegem as células contra infecção por vírus. Um segundo conjunto de moléculas da imunidade inata é o Sistema Complemento, um grupo de proteínas produzidas principalmente pelo fígado, e secretadas na forma precursora inativa. O sistema é composto por ativadores, efetores e reguladores. Sua ativação ocorre em forma de cascata, isto é, a ativação dos componentes iniciais gera enzimas que atuam na clivagem dos componentes seguintes. A ativação do sistema complemento pode ocorrer de três formas distintas, chamadas de via clássica, via alternativa e via das lectinas (Figura 1). Figura 01. Vias de ativação do Sistema Complemento 110 Microbiologia e Imunologia U5 Imunidade Inata: Células, Receptores, Mecanismos Efetores E Inflamação Fonte: Abbas et al. (2019, p. 282). A via clássica foi a primeira a ser documentada e é iniciada pela ligação do com- ponente C1q a moléculas de anticorpo na superfície ativadora (como um patóge- no, por exemplo). A via alternativa é ativada por alguma molécula estranha, como os lipopolissacarídeos da parede celular de bactérias Gram-negativas, a parede celular de algumas leveduras, ou a proteína presente no veneno de cobra (do inglês cobra venom fator), não havendo a participação de moléculas de anticorpos. A via das lectinas foi a última ser descrita e sua ativação se dá através da ligação de lectinas, moléculas solúveis encontradas no sangue e em alguns tecidos, à manose, um açúcar comumente encontrado na membrana externa de muitos microrganismos. Moléculas ativadoras do Sistema Complemento, como manose e LPS, não estão pre- sentes em células de mamíferos, permitindo que o sistema atue contra microrganis- mos, mas não contra os tecidos do hospedeiro. C U R IO SI D A D E A ativação de qualquer via do sistema complemento gera três resultados: a opsoni- zação e fagocitose do antígeno, a formação do complexo de ataque à membrana (MAC) e a estimulação da inflamação com o recrutamento de células para o local da ativação (Figura 2). U5 111Microbiologia e Imunologia Imunidade Inata: Células, Receptores, Mecanismos Efetores E Inflamação Figura 02. Mecanismos efetores do Sistema Complemento ativado Fonte: Abbas et al. (2019, p. 294). Opsonização e fagocitose Produtos do sistema complemento ativado, como C3b, se depositam na superfície do microrganismo, facilitando seu reconhecimento e destruição por fagócitos. Estes pro- dutos são chamados de opsoninas, por sua capacidade de favorecer a destruição do agente invasor por fagocitose (Figura 2a). Estimulação da inflamação As moléculas C3 e C5, quando clivadas durante seu processo de ativação, produzem fragmentos chamados de anaflatoxinas. Estes componentes promovem a migração de células da imunidade inata, principalmente macrófagos e neutrófilos, induzindo uma 112 Microbiologia e Imunologia U5 Imunidade Inata: Células, Receptores, Mecanismos Efetores E Inflamação resposta inflamatória, que auxiliará na eliminação do antígeno. As principais anaflatoxi- nas são C3a e C5a (Figura 2b). Formação do complexo do ataque a membrana (MAC) Os componentes finais da ativação do sistema complemento se organizam na super- fície ativadora, formando poros que desestabilizam a membrana celular e causam a morte do microrganismo por lise osmótica. Este mecanismo é eficaz contra bactérias Gram-negativas, contribuindo com a eliminação da infecção (Figura 2c). 3. RECEPTORES E CÉLULAS DA IMUNIDADE INATA Todas as respostas imunológicas são iniciadas quando um antígeno é reconhecido por receptores no organismo hospedeiro. Uma característica importante da imunidade ina- ta é a sua rápida ativação em resposta a agentes invasores. Isso ocorre porque as células da imunidade inata, como os fagócitos e células dendríticas, possuem recepto- res de reconhecimento de padrão (do inglês patter recognition receptors, ou PRRs), que reconhecem moléculas compartilhadas por vários microrganismos, chamadas de Padrões Moleculares Associados a Patógenos (PAMPs). Os PAMPs podem ser dife- rentes tipos de moléculas produzidas por grupos distintos de microrganismos, mas não por células humanas. O Quadro 1 contém exemplos de PAMPs que são reconhecidos pelas células da imunidade inata. PADRÃO MOLECULAR ASSOCIADO AOS PATÓGENOS MICRORGANISMOS Ácidos nucleicos ssRNA dsRNA CpG Vírus Vírus Vírus, bactérias Proteínas Pilina Flagelina Bactérias Bactérias Lipídeos da parede celular Lipopolissacarídeo (LPS) Ácido teicóico Bactérias Gram negativas Bactérias Gram positivas Carboidratos Manana Glucanas Fungos, bactérias Fungos Quadro 01. Exemplos de Padrões Moleculares Associados ao Patógeno (PAMPs) Fonte: adaptado de Abbas et al. (2019, p. 60). U5 113Microbiologia e Imunologia Imunidade Inata: Células, Receptores, Mecanismos Efetores E Inflamação Existem diferentes tipos de PRR, sendo os mais estudados os receptores do tipo Toll (TLR, do inglês Toll-like receptors) que estão presentes, principalmente, na superfície dos fagócitos. Os TLR são uma família de receptores que se localizam na membrana plasmática ou no endossomo das células e reconhecem vários PAMPs diferentes (Figura 3). Figura 03. Estrutura, localização e especificidade dos TLRs de mamíferos Fonte: Abbas et al. (2019, p. 63). Além de moléculas microbianas, os TLRs também estão envolvidos nas respostas a moléculas endógenas do hospedeiro, cuja expressão ou localização indica dano 114 Microbiologia e Imunologia U5 Imunidade Inata: Células, Receptores, Mecanismos Efetores E Inflamação celular. São exemplos de moléculas do hospedeiro que são reconhecidas pelos TLRs, as proteínas de choque térmico (HSPs, do inglês, heat shock proteins), que são mo- léculas induzidas em resposta a vários tipos estresses celulares, e a proteína de alta mobilidade do grupo box 1 (HMGB1, do inglês, high-mobility group Box 1), uma proteína envolvida na transcrição e no reparo do DNA. Ambas, HSPs e HMGB1, são normal- mente intracelulares, mas podem ser liberadas a partir de células lesadas ou que estão morrendo. Dessa forma, os receptores TLR podem reconhecer células danificadas e ativar sua eliminação. A ligação dos TLRs aos seus respectivos ligantes promove uma sequência de reações químicas na célula de defesa conhecida como cascata de sinalização, que induz a ati- vação de fatores de transcrição, como o NFκB, uma molécula que atravessa o núcleo da célula e ativa genes relacionados com respostas inflamatórias e antivirais (Figura 4). Figura 04. Vias de sinalização e funções de TLRs Fonte: Abbas et al. (2019, p. 65). U5 115Microbiologia e Imunologia Imunidade Inata: Células, Receptores, Mecanismos Efetores E Inflamação Uma das consequências da ativação das células da imunidade inata é a destruição dos microrganismos através de dois mecanismos distintos: a endocitose e a fagocitose. A endocitose consiste na ingestão, realizada pelas células, de moléculas grandes pre- sentes no líquido extracelular. O processo pode ocorrer por pinocitose, que envolve a invaginação da membrana plasmática, ou por endocitose mediada por receptor, um processo que envolve a ligação seletiva de moléculas a receptores específicos na membrana da célula. Nos dois casos, a ingestão de moléculas estranhas estimula a formação de vesículas de endocitose onde o material estranho fica confinado; essas vesículas se fundem com compartimentos ácidos denominados endossomas. Em se- guida, os endossomas se fundem com os lisossomas, que contêm enzimas digestivas e proteínas antimicrobianas.Dentro destas estruturas, as moléculas estranhas são de- gradadas (Figura 5). A fagocitose ocorre quando uma partícula grande, geralmente uma bactéria, é ingerida por uma célula. Após a ingestão, a partícula estranha é envolvida por um vacúolo fago- cítico (que recebe o nome de fagossoma), que se funde com o lisossoma para formar o fagolisossoma (Figura 5). O fagolisossoma libera poderosas enzimas, espécies re- ativas de oxigênio e proteínas antimicrobianas, que digerem a partícula reduzindo-a a pequenos fragmentos. Figura 05. Etapas da Endocitose e da Fagocitose Fonte: Coico et al. (2010, p.13). 116 Microbiologia e Imunologia U5 Imunidade Inata: Células, Receptores, Mecanismos Efetores E Inflamação Exemplos de células que realizam fagocitose e endocitose são os leucócitos polimorfo- nucleados (basófilos, eosinófilos e neutrófilos), os macrófagos e as células dendríticas. Você deve ter percebido que a fagocitose e a endocitose são mecanismos que levam a eliminação de antígenos extracelulares, mas o que acontece quando o organismo é invadido por um antígeno intracelular, como um vírus? Nestes casos, existem TLRs que se localizam no interior das células, mais precisamen- te no endossomo; quando esses receptores reconhecem um PAMP, ocorre a ativação da célula invadida, com consequente recrutamento de células natural killer (NK) para o local da invasão. Essas células são citotóxicas e têm a função de eliminar células infectadas um processo que ocorre, principalmente, por apoptose. Embora seja responsável pela resposta contra vírus, as células NK também reco- nhecem células que sofreram mutações, como as células tumorais, e promovem sua destruição. IM PO R TA N TE A apoptose é um processo de morte celular que envolve a ativação de um conjunto de proteínas do citoplasma da célula alvo chamadas caspases. Quando ativadas, as caspases induzem a morte da célula. As células NK podem ativar as caspases por dois mecanismos: i) pela interação com um receptor na superfície da célula alvo, chamado de receptor Fas (ou receptor da morte) ou ii) pela liberação do conteúdo de seus grâ- nulos, compostos por granzimas e perforinas; as perforinas tem a função de abrir pe- quenos canais na membrana da célula alvo, por onde as granzimas penetram na célula e iniciam a ativação das caspases (Figura 6). Figura 06. Ativação dos mecanismos de apoptose da célula alvo pela célula NK Fonte: Roit et al (2018, p. 40). U5 117Microbiologia e Imunologia Imunidade Inata: Células, Receptores, Mecanismos Efetores E Inflamação 4. INFLAMAÇÃO A inflamação, um importante componente dos mecanismos de defesa do corpo, é um processo fisiológico que pode ter como causa diversos fatores endógenos como, por exemplo: lesão tecidual por um agente físico (um corte, queimadura ou um arranhão), por um agente químico (como o contato com um ácido), uma reação autoimune (quando o sistema de defesa passa a atacar tecidos próprios), por um agente infeccioso (vírus, bac- téria, ou um parasita), entre outros. A inflamação é um processo destinado a restaurar a homeostasia imunológica, fazendo com que o tecido lesado volte à sua condição normal. Os agentes inflamatórios agridem os tecidos e provocam respostas vasculares e imu- nológicas. As respostas vasculares, são iniciadas pela produção de citocinas por ma- crófagos ou células dendríticas que se localizam no local da lesão, e incluem vasodi- latação e alterações vasculares, com extravasamento de líquido para região externa dos vasos sanguíneos. Como resultado, é observado a formação de um halo averme- lhado ao redor da lesão, com aumento de volume (edema) e da temperatura. A dor é causada pela pressão causada pelo inchaço nas terminações nervosas, além disso, ela ocorre por razão das substâncias químicas liberadas durante a inflamação e pela compressão dos nervos próximos ao edema (Figura 7). Esse conjunto de sintomas são conhecidos como sinais cardinais da inflamação: Rubor (vermelhidão), Tumor (ede- ma), Calor (aumento da temperatura no local) e Dor. Também pode ocorrer perda de função local. Figura 07. Resposta inflamatória Fonte: Abbas et al. (2021, p. 55). 118 Microbiologia e Imunologia U5 Imunidade Inata: Células, Receptores, Mecanismos Efetores E Inflamação A redução no fluxo sanguíneo e concomitante expressão aumentada de moléculas de adesão, induzida por citocinas sobre as células endoteliais que revestem os vasos sanguíneos, promovem a ligação de leucócitos circulantes aos vasos. Estes eventos facilitam a fixação e entrada dos leucócitos, como neurófilos, monócitos e linfócitos, no local da inflamação. A migração dos leucócitos sanguíneos para o sítio inflamatório é muito importante para eliminar os microrganismos invasores e restaurar as funções do local afetado. Neutrófi- los, monócitos, etc., irão atuar junto com as células imunes teciduais na eliminação do agente invasor. Quando cessa o estímulo inflamatório, entra em ação um subconjunto de macrófagos conhecidos como M2, que promovem o remodelamento do tecido lesa- do e formação da cicatriz. Apesar de benéfica para o organismo, a inflamação muito intensa ou descontrolada pode acarretar sérias consequências, podendo causar lesão tecidual, perda de função ou até mesmo a morte do indivíduo. Por este motivo, o controle da inflamação é funda- mental para preservar o funcionamento adequado do organismo. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS Nesta unidade, foi apresentada a resposta imune inata ou natural, que representa a pri- meira linha de defesa do organismo contra patógenos invasores. Ela é composta pelas barreiras, moléculas solúveis e células. O sistema complemento é composto com diversas proteínas séricas que tem como fun- ção opsonizar e estimular a fagocitose dos microrganismos, matar os antígenos por lise osmótica através do Complexo de Ataque a Membrana (MAC) e estimular as respostas inflamatórias com o recrutamento de leucócitos para o local da inflamação Foram apresentados os receptores presentes nas células da imunidade inata, com foco nos receptores do tipo Toll. Esses receptores são responsáveis por reconhecer os pa- drões moleculares associados aos patógenos e realizam a ativação das células, estimu- lando a fagocitose (processo de ingestão e digestão dos antígenos) nos neutrófilos, ma- crófagos, células dendríticas, entre outras; e a ativação de células NK, que são células citotóxicas com a função de eliminar as células infectadas por vírus ou células tumorais. Por fim, foi abordada a inflamação, um importante mecanismo para manter a home- ostase imunológica. O processo de inflamação consiste no recrutamento de células e extravasamento de proteínas plasmáticas através dos vasos sanguíneos, aliados à ativação destas células e proteínas no espaço extravascular. Esses eventos vasculares são responsáveis pelos sinais cardinais da inflamação: Rubor (vermelhidão), Tumor (edema), Calor (aumento da temperatura no local) e Dor. U5 119Microbiologia e Imunologia Imunidade Inata: Células, Receptores, Mecanismos Efetores E Inflamação O sistema complemento é um conjunto de proteínas séricas que têm a função de responder, principalmente, contra a chegada de um microrganismo. Verifique as afirmações abaixo e marque a alternativa correta. I. O sistema complemento tem que ser ativado por ao menos 2 vias para que ocorra ati- vação correta dos seus componentes. II. Uma consequência possível da ativação do sistema complemento é a opsonização dos microrganismos. III. A formação do complexo de ataque a membrana (MAC) acontece após a deposição dos componentes do complemento na superfície do microrganismo e pode levá-lo a morte por lise osmótica. IV. Há três consequências possíveis da ativação do sistema complemento: opsonização dos microrganismos, apoptose do antígeno e a estimulação da resposta inflamatória. V. A via clássica do sistema complemento é ativada quando o componente C9 do sistema complemento, espontaneamente se liga à superfície do antígeno. a. II, IIIe IV b. II, III e V c. II e III d. I, II, III e V e. II, III, IV e V Atividade 1. ATIVIDADES PRÁTICAS Um importante conjunto de receptores que são encontrados na superfície das células da imu- nidade inata são os receptores do tipo toll; esses receptores reconhecem várias moléculas de patógenos. Com relação aos receptores da imunidade inata, assinale a alternativa correta: a. Todas as células expressam os mesmos receptores, ou seja, todos os macrófagos do organismo apresentam os mesmos receptores e reconhecem os mesmos PAMPs b. Os receptores da imunidade inata são variáveis, assim, um neutrófilo pode reconhecer alguns PAMPs enquanto outro neutrófilo reconhece outro conjunto de PAMPs; c. As células da imunidade inata são específicas e recebem receptores diferentes dependen- do dos antígenos presentes no organismo. d. Uma vez ativado, o receptor do tipo Toll induz apoptose da célula e. Os receptores do tipo Toll podem induzir, após o reconhecimento do PAMP, a produção de mo- léculas do sistema complemento. Atividade 2. EDUCANDO PARA A PAZ 121 UNIDADE 10 IMUNIDADE ADAPTATIVA: ATIVAÇÃO DE LINFÓCITOS T E SEUS MECANISMOS EFETORES Analisar as respostas imunes inata e adaptativa e a relação antígenos e anticorpos. C O M PE TÊ N C IA S 1. IMUNIDADE ADAPTATIVA: RESPOSTA CELULAR A imunidade adaptativa é caracterizada pela presença de receptores antigênicos es- pecializados, localizados nos linfócitos B e T, que reconhecem antígenos invasores de forma específica. Diferencia-se, dessa forma, da imunidade inata, que é ativada pelo reconhecimento de padrões moleculares compartilhados por patógenos, através de re- ceptores generalistas. As respostas adaptativas também são mais lentas, sendo seus produtos detectáveis entre 7 e 10 dias após a exposição ao antígeno, enquanto as res- postas inatas podem ser observadas algumas horas após a exposição. A Figura 1 mos- tra as principais diferenças entre imunidade inata e adaptativa. É importante destacar, no entanto, que as respostas imunes inatas não cessam quando se iniciam as respostas adaptativas; ao contrário elas participam da ativação e dos mecanismos efetores da imunidade adaptativa. Figura 01. Comparação Imunidade inata vs Imunidade adaptativa U10 122Microbiologia e Imunologia Imunidade Adaptativa: Ativação de Linfócitos T e seus Mecanismos Efetores Fonte: Abbas et al. (2021, p. 34).] A resposta imune adaptativa é iniciada com o reconhecimento do antígeno pelos linfó- citos virgens nos órgãos linfoides secundários. De acordo com a forma de ativação e mecanismos efetores, a imunidade adaptativa pode ser classificada em i) imunidade humoral, com ativação dos linfócitos B e produção de anticorpos e ii) imunidade me- diada por células, que envolve os linfócitos T, produção de citocinas e citotoxicidade celular. Nesta unidade serão abordados a ativação e os mecanismos efetores da imu- nidade mediada por células. 2. LINFÓCITO T E APRESENTAÇÃO DE ANTÍGENOS Os linfócitos T se diferenciam a partir de células tronco hematopoiéticas pluripotentes na medula óssea e concluem seu processo de maturação no timo. Lá, são estimuladas pela interleucina 7, que promove sua maturação e expressão dos receptores de super- fície, chamados de TCR (receptor de linfócito T). Estes receptores irão determinar a especificidade antigênica do linfócito T; dessa forma, diferentes antígenos serão reco- 123 Microbiologia e Imunologia U10 Imunidade Adaptativa: Ativação de Linfócitos T e seus Mecanismos Efetores nhecidos por linfócitos T com receptores distintos. Durante o processo de maturação, mutações aleatórias ocorrem em trechos do DNA do linfó- cito T, conhecidos como sequências V, D, J e C; essas mutações fazem com que diferentes linfócitos T produzam receptores antigênicos variados. Essa variação é essencial para garan- tir que o sistema imune consiga reconhecer a grande diversidade de antígenos que existem na natureza, e responder a estes antígenos, protegendo o hospedeiro. Como as mutações são aleatórias, os linfócitos T sempre irão reconhecer antígenos diferentes; estima-se que os linfócitos de uma pessoa sejam capazes de reconhecer até 109 antígenos diferentes. IM PO R TA N TE Os linfócitos T somente reconhecem antígenos derivados de proteínas. Para serem reconhecidos pelos receptores dos linfócitos T, os antígenos proteicos precisam ser apresentados ao TCR. A apresentação dos antígenos acontece por ação de células co- nhecidas como células apresentadoras de antígenos (APCs), que incluem as células dendríticas, os macrófagos, e os linfócitos B. Porém, o TCR não reconhece proteínas nativas (ou seja, inteiras); estas precisam ser clivadas pela APC, gerando fragmentos conhecidos como epítopos. O processo de clivagem do antígeno dentro da APC é conhecido como processamento antigênico, e pode ocorrer por duas vias diferentes, dependendo da origem deste antígeno (Figura 2). Figura 02. Processamento de antígenos U10 124Microbiologia e Imunologia Imunidade Adaptativa: Ativação de Linfócitos T e seus Mecanismos Efetores Fonte: Abbas et al. (2021, p. 79). Caso o antígeno seja intracelular, ou seja, esteja localizado no interior da célula (como um vírus, por exemplo), ele será processado por uma estrutura chamada proteassoma. A função do proteassoma é quebrar o antígeno em vários fragmentos, e ligar os epíto- pos resultantes ao receptor MHC de classe 1 (MHC Cl 1). O conjunto formado pelo epítopo antigênico ligado ao MHC Cl1 será expresso na superfície da célula. Caso o antígeno seja extracelular, ou seja, esteja localizado no exterior da célula (como uma bactéria extracelular, por exemplo), ele deverá ser endocitado, processado, e os epítopos resultantes, anexados ao receptor MHC de classe 2 (MHC Cl 2), que em se- guida será expresso na superfície da célula. O complexo de histocompatibilidade principal (MHC), é uma molécula responsável por acomodar o epítopo antigênico e apresentá-lo linfócito T. Há 2 classes de MHC: o MHC de classe 1 é expresso por todas as células nucleadas do corpo, enquanto o MHC de classe 2 é expresso somente pelas células apresentadoras de antígenos. IM PO R TA N TE Após a captura e processamento do antígeno, a célula apresentadora de antígenos deverá migrar para o órgão linfoide secundário mais próximo, onde irá apresentar o epítopo ligado ao MHC, para o linfócito T virgem com o receptor antigênico adequado. O processo de apresentação de antígenos ocorre em duas etapas, conhecidas como1º e 2º sinais (Figura 3), e marca o início da resposta imunológica mediada por células. 125 Microbiologia e Imunologia U10 Imunidade Adaptativa: Ativação de Linfócitos T e seus Mecanismos Efetores Figura 03. Apresentação de antígenos Fonte: Roit et al. (2018, p.179). O 1º sinal consiste na interação do MHC carregando o epítopo com o receptor TCR. Enquanto o TCR se liga ao epítopo, o MHC interage com uma molécula correceptora presente na superfície do linfócito T: o MHC Cl 1 liga-se ao correceptor CD8 (presente nos linfócitos T citotóxicos), enquanto o MHC Cl 2 interage com o correceptor CD4 (pre- sente nos linfócitos T auxiliares). O 2º sinal, que irá completar o processo de apresentação, ocorre pela interação das moléculas coestimulatórias B7 encontradas nas células apresentadoras de antígenos, com o CD28, encontrado nos linfócitos T. Após o 2º sinal, o linfócito T recebe a confir- mação da ativação e se torna uma célula ativada, deixando de ser uma célula virgem. 3. ATIVAÇÃO DO LINFÓCITO T Após a apresentação do antígeno, o linfócito T inicia o seu processo de ativação (Figura 4). Este processo é caracterizado pela produção e secreção da citocina IL-2 pelo linfócito recém ativado e pelo aumento da expressão dos receptores para IL-2 no próprio linfócito. O reconhecimento da IL-2 faz com que o linfócito continue para a próxima etapa de ativação, a expansão clonal. Nesta etapa, o número de linfócitos específicos é aumentado, gerando uma grande quantidade de células responsivascontra o antígeno invasor. Após a expansão clonal, as células efetoras, ou seja, as células prontas para responder ao antígeno, irão migrar pela corrente sanguínea para o local da infecção, onde irão atuar de acordo com as características dos antígenos e de qual linfócito T foi ativado. U10 126Microbiologia e Imunologia Imunidade Adaptativa: Ativação de Linfócitos T e seus Mecanismos Efetores Figura 04. Etapas da ativação do linfócito T Fonte: Abbas et al. (2021, p. 118). É importante notar que existem 2 tipos de linfócitos T: os linfócitos T CD8+, ou linfócitos T citotóxicos (Tc), que respondem a antígenos intracelulares pela interação com células apresentadoras de antígeno expressando o epítopo ligado ao MHC Cl 1; e os linfócitos T CD4+ ou linfócitos T auxiliares (Th), que respondem a antígenos extracelulares pela interação com células apresentadoras de antígenos carregando o epítopo anexado ao MHC Cl 2. 4. FUNÇÃO EFETORA DOS LINFÓCITOS T Cada classe de linfócito T (CD8+ ou CD4+) desempenha uma função diferente no orga- nismo, relacionada com o tipo de antígeno (intra ou extracelular) ao qual irá responder. 4.1 LINFÓCITO T CD8+ Os linfócitos T CD8+ ou linfócitos T citotóxicos (Tc), têm a função de matar células infectadas por patógenos intracelulares (como vírus e algumas bactérias) por apopto- se. O linfócito T CD8+ é apresentado a um antígeno intracelular por uma APC no órgão linfoide secundário, passa pelas etapas de ativação e expansão clonal, tornando-se uma célula efetora para, em seguida, migrar pela corrente sanguínea até o local da infecção. Lá, o linfócito T CD8+, irá reconhecer as células infectadas e destruí-las. Mas como o linfócito irá distinguir as células doentes das saudáveis? A resposta para esta pergunta está nos receptores MHC Cl 1. Todas as células nucle- adas do organismo apresentam este receptor; quando uma célula é infectada por um vírus, ela pode ‘perceber’ essa invasão e apresentar epítopos do vírus ligados a seu receptor MHC Cl 1. O linfócito Tc efetor reconhece o epítopo apresentado pela célula infectada via MHC Cl 1, através de seu receptor TCR, e inicia o processo para destruir a célula (Figura 5). 127 Microbiologia e Imunologia U10 Imunidade Adaptativa: Ativação de Linfócitos T e seus Mecanismos Efetores Figura 05. Mecanismo efetor do linfócito T CD8+. Fonte: Abbas et al. (2021, p. 154). Ao detectar a célula infectada, o linfócito T CD8+ irá interagir fisicamente com a célula, pelo contato dos receptores TCR e MHC de classe 1. Essa interação resulta na libe- ração, pelo linfócito T CD8+ de grânulos contendo perforina e granzima. A perforina é uma substância química que tem como função induzir a captação da granzima pela célula; já a granzima tem a função de ativar os mecanismos de apoptose na célula infec- tada. Após a liberação dos grânulos tóxicos, as células se separam. O linfócito T CD8+ continua a interagir com as outras células do local, e a célula alvo entra em apoptose. As células infectadas não são os únicos alvos dos linfócitos T CD8+, eles também podem reconhecer células tumorais e induzir estas células a entrarem em apoptose. De fato, a ativação de linfócitos T CD8+ contra os antígenos tumorais é o principal mecanismo de defesa imunológica contra tumores. IM PO R TA N TE 4.2 LINFÓCITO T CD4+ Os linfócitos T CD4+ ou linfócitos T auxiliares (Th), recebem este nome pois tem a função de ‘guiar’ a resposta imunológica através da produção e secreção de citocinas. Citocinas são proteínas séricas produzidas por diferentes tipos de células do sistema imunológico. Sua função é regular as respostas imunes e inflamatórias. U10 128Microbiologia e Imunologia Imunidade Adaptativa: Ativação de Linfócitos T e seus Mecanismos Efetores Durante o processo de ativação, os linfócitos T CD4+ se diferenciam em subpopulações celulares, que produzem conjuntos distintos de citocinas, como mostrado na Figura 6. Essas citocinas promovem respostas diversas, que visam controlar a infecção. As prin- cipais subpopulações de linfócitos T CD4+ são: ` Linfócitos Th1: produzem citocinas como IFN-γ e TNF-α, que promovem a ativação de macrófagos e produção de anticorpos da classe IgG. São importantes, por exemplo, na defesa contra bactérias intracelulares, como o Mycobacterium tuberculosis. ` Linfócitos Th2: produzem citocinas como IL-4, IL-5, IL-10 e IL-13, que atuam na ativação de eosinófilos, produção de anticorpos da classe IgE e respostas alérgicas. São importan- tes, por exemplo, na defesa contra vermes helmintos. ` Linfócitos Th17: produzem citocinas como IL-17, que promovem a ativação de neutrófi- los e respostas inflamatórias. Figura 06. Subpopulações de linfócitos T CD4+ Fonte: Abbas et al. (2021, p. 144). Diversos fatores influenciam a diferenciação de um linfócito T CD4+ durante sua ati- vação, incluindo fatores genéticos e ambientais. Quantidades maiores de antígeno, apresentação antigênica por células dendríticas e o coestimulador B7.1 estimulam a di- ferenciação em linfócitos Th1, enquanto menores quantidades de antígeno, apresenta- ção por linfócitos B e o coestimulador B7.2 estimulam a diferenciação em linfócitos Th2. É importante destacar que uma vez iniciada a diferenciação dos linfócitos T CD4+, ocor- re uma polarização da resposta para aquele perfil de citocinas. Assim, as respostas Th2 tendem a aumentar a produção de mais células Th2, enquanto inibem respostas Th1. 129 Microbiologia e Imunologia U10 Imunidade Adaptativa: Ativação de Linfócitos T e seus Mecanismos Efetores 4.3 LINFÓCITOS T DE MEMÓRIA As células de memória são uma subpopulação de linfócitos T, originados de células em diferentes estágios de ativação, que apresentam a produção de moléculas anti-apop- tóticas; dessa forma, apresentam sobrevida mais longa do que as células efetoras, podendo permanecer no organismo por anos ou décadas. Essas células de memória podem migrar para os órgãos linfoides onde ficarão armaze- nadas com uma forma de ‘backup”. São células que já foram apresentadas aos antíge- nos, sendo ativadas no caso de uma reexposição ao mesmo patógeno. Desta forma, a resposta é mais rápida e mais eficiente, uma vez que elas rapidamente podem entrar em processo de expansão clonal e estarão prontas para responder contra a chegada do antígeno. A produção de células de memória é uma característica das respostas imunológicas adaptativas, permitindo que o hospedeiro responda mais rapidamente a uma reinfecção pelo mesmo patógeno. As vacinas são uma estratégia de prevenção de doenças que se baseia na produção de células de memória, que protegem o indivíduo vacinado da infecção. OBJETO DE APRENDIZAGEM Caso clínico JCR, 25 anos do sexo masculino, agendou uma consulta com um médico dermato- logista após verificar uma excessiva queda de cabelos e perda de sensibilidade nas extremidades. Além disso, desde os 20 anos ele havia notado lesões hipopigmentadas nos braços. Essas lesões pioraram com o tempo e, além da queda de cabelo, ele es- tava perdendo pelos no rosto e sobrancelhas. Durante a consulta, o médico verificou várias lesões do tamanho de uma moeda nas regiões dos cotovelos, pulsos, mãos, joelhos e nádegas. Outro sintoma que foi relatado foi a ocorrência de sangramentos nasais frequentes. Devido à perda de sensibilidade, o médico realizou diversos exames neurológicos que foram normais, exceto pela perda parcial de movimento nos dedos mínimos das mãos, que não se mantinham esticados. Um exame de sangue (leucograma) apresentou con- tagens normais de leucócitos, porém o paciente apresentava uma quantidade de anti- corpos IgG aumentada a 2000 mg/dl (normal: 600 – 1100 mg/dl). O paciente informou ao médico que cresceu uma comunidade remota na região norte do Brasil, onde várias pessoas, incluindo dois de seus irmãos, haviam contraído han- seníase (lepra). O médico solicitou uma biópsia das lesões nos braços do paciente, que revelou a presença de bacilos isolados, álcool-ácido resistentes, além denume- rosas células de Virchow (células da linhagem dos macrófagos). As culturas, porém, foram negativas. O médico confirmou o diagnóstico de hanseníase lepromatosa e receitou antibióticos para eliminar a bactéria. Suas lesões diminuíram e ele foi curado. U10 130Microbiologia e Imunologia Imunidade Adaptativa: Ativação de Linfócitos T e seus Mecanismos Efetores Hanseníase O agente causador da hanseníase é o Mycobacterium leprae, uma bactéria em forma de bacilo que infecta os macrófagos do hospedeiro, onde se multiplica. Uma vez no interior dos macrófagos, a bactéria está protegida da ação dos anticorpos, e de muitas moléculas antimicrobianas produzidas pelo organismo do hospedeiro. A bactéria con- segue impedir a fusão do lisossomo com o fagossomo e com isso, passa a colonizar um ambiente propício para a sua multiplicação. A bactéria tem o seu metabolismo adaptado para se desenvolver em temperaturas mais baixas, em torno de 30º C, por este motivo as lesões são observadas em extremidades e regiões mais frias do corpo. A hanseníase é uma doença que pode se manifestar de duas formas distintas de- pendendo do perfil de resposta do sistema imunológico. Caso os linfócitos T ativados pertençam à subpopulação Th1, haverá uma manifestação mais branda, com ativação de macrófagos e inflamação localizada; esta forma é conhecida como tuberculóide. A resposta Th1 inclui a produção das citocinas interferon-γ, TNF-α e IL12, que ativam macrófagos, aumentando o seu poder microbicida e favorecendo a destruição da bac- téria fagocitada. Já na hanseníase lepromatosa, a manifestação clínica é mais grave, com dissemina- ção da bactéria para vários locais do corpo e dano tecidual que pode levar a ampu- tação de algumas regiões como nariz, dedos e orelhas. Nesta forma da doença, há o predomínio da resposta do tipo Th2 que é caracterizada pela produção de citocinas IL4, IL5 e IL10 que, além de levarem a um favorecimento da produção de anticorpos, inibem a ativação de macrófagos, o que acaba por agravar os sintomas da doença pela incapacidade do organismo de eliminar a bactéria, que segue se multiplicando e disseminando pelo organismo. Este caso clínico é interessante, pois dá a possibilidade de observar como as subpo- pulações de linfócitos T e as suas citocinas são importantes para a resolução ou agra- vamento de uma infecção. ATIVIDADE PRÁTICA O paciente foi diagnosticado com hanseníase lepromatosa. Isso significa que: a) Ele teve a forma mais grave da doença, caracterizada por resposta imune com perfil Th2 b) Ele teve a forma mais grave da doença, caracterizada por resposta imune com perfil Th1 c) Ele teve a forma mais branda da doença, caracterizada por resposta imune com perfil Th1 d) Ele teve a forma mais branda da doença, caracterizada por resposta imune com perfil Th2 e) Ele teve a forma mais grave da doença, caracterizada por resposta imune com perfil Th17 Atividade 1. 131 Microbiologia e Imunologia U10 Imunidade Adaptativa: Ativação de Linfócitos T e seus Mecanismos Efetores Na hanseníase tuberculoide, ocorre a ativação dos macrófagos, o que favorece a eliminação das bactérias fagocitadas. O perfil de resposta e a principal citocina produzida neste caso são, respectivamente: a) Th1 e IL-4 b) Th1 e IFN-γ c) Th2 e IFN-γ d) Th2 e IL-4 e) Th2 e IL-10 Atividade 2. O aumento na produção de anticorpos IgG no paciente foi resultado: a) Da inibição de citocinas Th2 que atuam sobre o linfócito B b) Da produção de citocinas do tipo Th1 que atuam sobre o linfócito B c) Da ativação de células T citotóxicas que atuam sobre o linfócito B d) Da produção de citocinas do tipo Th17 que atuam sobre o linfócito B e) Da produção de citocinas do tipo Th2 que atuam sobre o linfócito B Atividade 3. O agente causador da hanseníase é a bactéria Mycobacterium leprae, um bacilo álcool- -ácido resistente. No caso clínico apresentado, as culturas realizadas com o tecido le- sado do paciente foram negativas para bacilos. Qual a explicação para este resultado? a) Mycobacterium leprae não é cultivável em laboratório b) A bactéria estava morta nos tecidos do paciente c) Mycobacterium leprae possui crescimento rápido, que inibe sua detecção em cultura. d) O paciente já estava curado quando procurou auxílio médico. e) O exame foi realizado no início da doença, antes da produção de anticorpos. Atividade 4. U10 132Microbiologia e Imunologia Imunidade Adaptativa: Ativação de Linfócitos T e seus Mecanismos Efetores As respostas imunes mediadas por células T auxiliares (Th) são iniciadas pela apre- sentação dos antígenos por células apresentadoras (APCs). A alternativa que descreve corretamente os eventos deste processo é: a) Primeiro sinal: interação do epítopo antigênico ligado ao MHC Cl 2 com TCR e CD8; se- gundo sinal: interação de B7 com CD28. b) Primeiro sinal: interação do epítopo antigênico ligado ao MHC Cl 1 com TCR e CD8; se- gundo sinal: interação de B7 com CD28. c) Primeiro sinal: interação do epítopo antigênico ligado ao MHC Cl 1 com TCR e CD4; se- gundo sinal: interação de B7 com CD28. d) Primeiro sinal: interação do epítopo antigênico ligado ao MHC Cl 2 com TCR e CD4; se- gundo sinal: interação de B7 com CD28. e) Primeiro sinal: interação de B7 com CD28. Segundo sinal: interação do epítopo antigênico ligado ao MHC Cl 2 com TCR e CD8. Atividade 5. EDUCANDO PARA A PAZ 134 UNIDADE 11 ANTÍGENOS E IMUNOGLOBULINAS: REAÇÃO ANTÍGENO E ANTICORPO 1. ANTÍGENOS E IMUNOGLOBULINAS As respostas imunológicas adaptativas são iniciadas pelo reconhecimento de antíge- nos pelos linfócitos. Os antígenos podem ser diferentes tipos de moléculas, como pro- teínas, polissacarídeos, lipídeos e ácidos nucléicos. A região do antígeno que interage com um receptor específico nos linfócitos é chamada de epítopo. Os receptores antigênicos do linfócito B são imunoglobulinas (Ig) de superfície, popu- larmente chamadas de anticorpos. Além de atuarem como receptores antigênicos, as imunoglobulinas desempenham várias funções importantes na resposta imunológica. Assim, as imunoglobulinas podem apresentar duas formas: i) ligadas à membrana do linfócito B, funcionando como receptores de antígenos para a célula e ii) secretadas pe- los linfócitos B ativados (plasmócitos), atuando como efetores da imunidade humoral. Os plasmócitos são células que se originam a partir da ativação dos linfócitos B vir- gens que reconhecem os antígenos pela primeira vez. Após a ativação, o linfócito B deixa de ser uma célula virgem e passa a ser chamado de plasmócito. G LO SS Á R IO 2. ESTRUTURA DOS ANTICORPOS Todas as moléculas de anticorpos compartilham uma estrutura básica, que lembra uma letra Y (Figura 1). Analisar as respostas imunes inata e adaptativa e a relação antígenos e anticorpos. C O M PE TÊ N C IA S U11 135Microbiologia e Imunologia Antígenos E Imunoglobulinas: Reação Antígeno E Anticorpo Figura 01. Estrutura da molécula de anticorpos Fonte: adaptada de Abbas et al. (2019, p. 98). Esta estrutura é composta por 4 cadeias de polipeptídeos, sendo duas cadeias leves idênticas (representadas na Figura 1 em verde) e duas cadeias pesadas idênticas (representadas na Figura 1 pela cor vermelha). As cadeias são mantidas unidas por pontes dissulfeto. Cada cadeia de polipeptídeo é formada por regiões chamadas de domínios Ig. As cadeias leves possuem um domínio Ig variável (VL) e um constante (CL), enquanto as cadeias pesadas possuem um domínio variável (VH) e três ou quatro domínios constan- tes (CH1, CH2 e CH3). Com base em sua função, os anticorpos são divididos em duas regiões: o fragmento de ligação ao antígeno (Fab) e o fragmento Fc (do inglês, fragment crystallizable). A região Fab, é a região do anticorpo que interage com o antígeno; é composta por uma cadeia leve inteira mais o domínio variável e o primeiro domínio constante da uma cadeia pesa- da, correspondendo a um “braço” da estrutura em Y (Figura 1). A região Fc é composta pelos domínios constantes restantesdas cadeias pesadas, correspondendo à “perna” da estrutura em Y (Figura 1). 136 Microbiologia e Imunologia U11 Antígenos E Imunoglobulinas: Reação Antígeno E Anticorpo As regiões variáveis das cadeias polipeptídicas dos anticorpos possuem segmentos hipervariáveis – sequências curtas de aminoácidos que formam uma superfície com- plementar a uma parte do antígeno, à qual se ligam. Essas sequências são responsá- As sequências hipervariáveis dos anticorpos são geradas por mecanismos de recom- binação genética no DNA do linfócito B em maturação. Elas ocorrem de forma aleató- ria, e produzem uma grande variedade de receptores antigênicos diferentes. As célu- las com receptores adequados são selecionadas, enquanto aquelas com receptores que reconhecem moléculas próprias são eliminadas.IM PO R TA N TE A região Fc é responsável pelas funções efetoras dos anticorpos. Nos receptores anti- gênicos do linfócito B, ela é a responsável pelo ancoramento da molécula à membrana plasmática da célula. Nos anticorpos secretados, ela é responsável por interagir com componentes do sistema imunológico, ativando diferentes tipos de resposta. Embora seja composta por domínios constantes, a região Fc apresenta uma certa variabilidade, que permite a classificação dos anticorpos em cinco classes ou isótopos (Figura 2). Figura 02. Classes ou isótipos das imunoglobulinas Fonte: Abbas et al. (2021, p. 95). U11 137Microbiologia e Imunologia Antígenos E Imunoglobulinas: Reação Antígeno E Anticorpo As classes de anticorpos são denominadas IgA, IgD, IgE, IgG e IgM. Cada uma exerce funções específicas, de acordo com a interação com células e moléculas do sistema imunológico. Algumas classes de anticorpos são divididas em subclasses; por exemplo, anticorpos da classe IgG podem ser IgG1, IgG2, IgG3 e IgG4, enquanto IgA tem duas subclasses, IgA1 e IgA2. Cada subclasse está relacionada a um tipo específico de resposta imune. IM PO R TA N TE 2.1 IMUNOGLOBULINA A IgA também é conhecida como anticorpo das mucosas e do leite; essa molécula corres- ponde a aproximadamente 15% de todas as imunoglobulinas encontradas no organis- mo e é produzida principalmente nas mucosas oral, traqueobrônquica e geniturinária, além do leite e colostro. IgA é encontrada no organismo, majoritariamente, na forma de dímeros, ou seja, duas estruturas básicas unidas por uma cadeia denominada cadeia J (Figura 2). A função principal desta molécula é promover a proteção das mucosas, neutralizando microrganismos e toxinas. 2.2 IMUNOGLOBULINA D IgD é a única imunoglobulina encontrada somente na superfície do linfócito B, atuando como receptor antigênico; não é secretada pelos plasmócitos. Ela se apresenta na for- ma de monômeros (Figura 2) e sua função é atuar como receptor do linfócito B, sendo expressa antes do contato com o antígeno. 2.3 IMUNOGLOBULINA E IgE é uma molécula encontrada em baixas quantidades no organismo, sendo produzida principalmente em resposta a infecções parasitárias ou reações alérgicas. Esta imu- noglobulina é encontrada na forma de monômeros (Figura 2) e tem a função de proteger o organismo contra helmintos, promovendo a ativação de eosinófilos, além se ligar aos mastócitos, atuando na hipersensibilidade imediata. 2.4 IMUNOGLOBULINA G IgG é a principal imunoglobulina encontrada no organismo humano; corresponde a aproximadamente 70% de todas as imunoglobulinas do soro. IgG pode ser encon- trada em 4 subclasses numeradas de 1 a 4, e todas são encontradas na forma de monômeros (Figura 2). IgG é classe de anticorpos que apresenta a maior versatilidade em suas funções, atu- ando na neutralização de microrganismos e toxinas; opsonização de patógenos, faci- litando sua fagocitose; ativação da via clássica do sistema complemento e ativação da citotoxicidade celular dependente de anticorpos (ADCC). 138 Microbiologia e Imunologia U11 Antígenos E Imunoglobulinas: Reação Antígeno E Anticorpo 2.5 IMUNOGLOBULINA M IgM é a classe de anticorpos relacionada com a resposta imunológica primária, ou seja, sempre que um linfócito B reconhece o antígeno pela primeira vez, ele se ativa e se diferencia em plasmócito secretor de IgM. Corresponde a aproximadamente 15% dos anticorpos do organismo. IgM é a única classe que pode atuar, na sua forma monoméri- ca, como receptor de antígenos para o linfócito B, e na forma secretada, como um pen- tâmero (composto por 5 unidades mantidas juntas pela cadeia J). A forma pentamérica da IgM possui 5 estruturas básicas unidas pela cadeia J, a mesma cadeia responsável por unir as unidades da IgA (Figura 2). IgM atua como ativador da via clássica do siste- ma complemento. 3. FUNÇÃO DOS ANTICORPOS Os anticorpos são moléculas muito versáteis, apresentam várias funções de acordo com o antígeno que reconhecem e com as interações que realizam com o sistema imune. Dentre as funções dos anticorpos, estão: 1- Neutralização de microrganismos e toxinas; 2 – Opsonização; 3 – Ativação do sistema complemento; 4- Citotoxicidade celular dependente de anticorpos e 5 –Hipersensibilidade imediata. 3.1 NEUTRALIZAÇÃO DE MICRORGANISMOS E TOXINAS Neutralização é a capacidade dos anticorpos (em particular, IgG e IgA) de se ligar a vírus e toxinas, bloqueando a interação destas partículas com as células alvo no hos- pedeiro. A região Fab dos anticorpos tem a função de se ligar de forma específica ao epítopo antigênico. Se este epítopo for uma região importante para a interação do antí- geno com as células humanas durante a infecção, a ligação do anticorpo pode bloquear essa interação; neste caso, o anticorpo que bloqueia a interação do antígeno com seu alvo, impedindo a infecção, é considerado um anticorpo neutralizante (Figura 3). A neu- tralização é mais comum em vírus e toxinas, que são partículas pequenas e com pou- cas regiões de interação com as células humanas. A neutralização é a única função dos anticorpos que não depende da interação com outros componentes do sistema imune. EXEMPLOS DE NEUTRALIZAÇÃO Exemplo 1: Na infecção pelo vírus SARS-CoV2, causador da COVID-19, a proteína spike (ou S) presente no envelope viral, é responsável por reconhecer moléculas na superfície de células humanas, permitindo sua posterior invasão pelo vírus. Anticor- pos contra o domínio RBD da proteína S bloqueiam a interação da proteína com as células hospedeiras, levando à neutralização do vírus. Este efeito é a base de terapias experimentais baseadas no uso de soro de pacientes recuperados da COVID-19 para tratamento de pacientes graves da doença. Exemplo 2: Os soros antiofídicos são exemplos de anticorpos neutralizantes de toxi- nas. Estes anticorpos são gerados em animais (principalmente cavalos) que foram ino- culados com doses subletais do veneno extraído da cobra; após algumas inoculações, os anticorpos são purificados do soro do animal e utilizados para neutralizar a ação do veneno, caso uma pessoa tenha sido mordida por uma cobra peçonhenta. U11 139Microbiologia e Imunologia Antígenos E Imunoglobulinas: Reação Antígeno E Anticorpo Figura 03. Neutralização promovida pelos anticorpos Fonte: Abbas et al. (2019, p. 277). 3.2 Opsonização e ativação da fagocitose A opsonização consiste no favorecimento da fagocitose de antígenos recobertos por anticorpos. A região Fab dos anticorpos (em particular da classe IgG) reconhece, de for- ma específica, epítopos antigênicos na superfície de bactérias, por exemplo, promoven- do a ligação dos anticorpos. A região Fc destes anticorpos, por sua vez, é reconhecida por receptores presentes na superfície dos fagócitos (como macrófagos e neutrófilos), chamados de FcγRI. Assim, patógenos recobertos por anticorpos são reconhecidos mais facilmente pelos fagócitos, que os capturam e digerem (Figura 4). 140 Microbiologia e Imunologia U11 Antígenos E Imunoglobulinas: Reação Antígeno E Anticorpo Figura 04. Opsonização e fagocitose mediada pelos anticorpos Fonte: Abbas et al. (2019, p. 280). 3.3 Ativação do sistema complemento O sistema complementopode ser ativado por 3 vias distintas, chamadas de Via Clás- sica, Via Alternativa e Via das Lectinas ligantes de manose, que diferem, principalmen- te, na forma como são ativadas. A Via Clássica é iniciada pelo reconhecimento, pelo componente C1, de anticorpos ligados a antígenos específicos, conforme mostrado na Figura 5. Esta ligação promove uma cascata de reações de clivagem, e alguns dos componentes resultantes se depositam no patógeno, resultando em três eventos: i) opsonização e fagocitose; ii) formação do complexo de ataque a membrana (MAC) e iii) estimulação das respostas inflamatórias. Figura 05. Ativação da via clássica do sistema complemento U11 141Microbiologia e Imunologia Antígenos E Imunoglobulinas: Reação Antígeno E Anticorpo Fonte: Abbas et al. (2019, p. 285). 142 Microbiologia e Imunologia U11 Antígenos E Imunoglobulinas: Reação Antígeno E Anticorpo 3.4 CITOTOXICIDADE CELULAR DEPENDENTE DE ANTICORPOS Os anticorpos da classe da IgG também são capazes de reconhecer antígenos expres- sos na superfície de células doentes, como as células tumorais. Ao se ligar de forma específica à célula tumoral, a região Fc dos anticorpos fica disponível para interagir com células NK. Essas células possuem o receptor FcγRIII, que tem a capacidade de reconhecer anticorpos ligados a uma célula doente, induzindo a célula alvo a sofrer apoptose (Figura 6). Figura 06. Ativação da citotoxicidade celular dependente de anticorpos Fonte: Abbas et al. (2019, p. 281). 3.5 HIPERSENSIBILIDADE IMEDIATA. A hipersensibilidade imediata está relacionada aos anticorpos da classe IgE. Estes an- ticorpos são produzidos após o contato do sistema imunológico com helmintos ou em resposta a uma exposição a alérgenos. A IgE é encontrada na forma secretada e uma vez disponível no organismo, é reconhecida pelos mastócitos através de um receptor denominado FcεRI (lê-se epsylon). Alérgenos são antígenos ambientais, como aqueles contidos em partículas de poeira ou em pelos de animais domésticos. São um conjunto de moléculas capazes de indu- zir respostas imunes em pessoas susceptíveis, ou atópicas. G LO SS Á R IO Os mastócitos recobertos por anticorpos IgE são chamados de sensibilizados. Após novo contato com o mesmo alérgeno, a ligação com os anticorpos IgE ancorados no mastócito promove a degranulação da célula, liberando uma grande quantidade de me- diadores inflamatórios que são responsáveis pela reação de hipersensibilidade imediata (Figura 7). U11 143Microbiologia e Imunologia Antígenos E Imunoglobulinas: Reação Antígeno E Anticorpo Figura 07. Hipersensibilidade imediata ativada por anticorpos IgE Fonte: adaptada de Abbas et al. (2019, p. 443). 4. INTERAÇÕES ANTÍGENO-ANTICORPO A interação entre os anticorpos e seus antígenos envolve diversos tipos de ligações químicas não covalentes, tais como pontes de hidrogênio, forças de van der Waals, ligações eletros- táticas e interações hidrofóbicas. Essas ligações dependem da natureza do antígeno e da estrutura do anticorpo, e mais de um tipo de ligação pode estar presente. A força da interação entre um Fab e um epítopo antigênico é chamada de afinidade. Assim, anticorpos de alta afinidade ligam-se mais fortemente ao antígeno do que os de menor afinidade. Além disso, os anticorpos possuem estruturas variadas, e podem ter mais regiões Fab em uma molécula – como é o caso de IgA dimérica e da IgM pentamérica, com 4 e 10 Fab, respectivamente. A quantidade de Fabs influencia a força de interação total entre um antígeno e seu anticorpo, denominada avidez. Dessa forma, anticorpos com mais regiões Fab, ou seja, mais pontos de interação com o antígeno, em geral apresentam maior avidez. 5. DIAGNÓSTICOS E TRATAMENTOS BASEADOS NA INTERAÇÃO ANTÍGENO/ ANTICORPO Os anticorpos são moléculas muito versáteis que desempenham várias funções impor- tantes no organismo, as quais dependem do reconhecimento específico dos antígenos. Explorando esta característica dos anticorpos, foram desenvolvidas várias ferramentas diagnósticas e terapêuticas para diversas doenças. Os ensaios sorológicos – que medem a produção de anticorpos contra certos antí- 144 Microbiologia e Imunologia U11 Antígenos E Imunoglobulinas: Reação Antígeno E Anticorpo genos de patógenos – são uma importante ferramenta no diagnóstico de inúmeras doenças infecciosas. Várias técnicas podem ser empregadas para detectar (e em alguns casos, quantificar) as interações antígeno/anticorpo. Estas técnicas podem ser classificadas de acordo com o uso (ou não) de reagentes marcados. Na imunoprecipitação, antígenos e an- ticorpos não marcados se difundem através de uma substância gelatinosa, e a reação é detectada pela presença de uma linha ou halo de precipitação (dependendo do tipo de técnica utilizada). Na aglutinação, um dos reagentes (antígeno ou anticorpo) está ligado a uma célula ou partícula, que se aglutina quando os imunocomplexos são for- mados. A técnica de ELISA utiliza uma reação enzimática para detectar as interações antígeno/anticorpo. Esta técnica é amplamente utilizada em laboratórios clínicos para o diagnóstico sorológico de doenças infecciosas, como HIV, hepatites, sífilis, Doença de Chagas, etc. Há muitas variações da técnica de ELISA, que incluem ELISA direto, indireto, de competição, entre outras (Figura 8). A imunofluorescência usa moléculas que emitem fluorescência, chamadas fluoróforos, enquanto nos radioimunoensaios, isótopos radioativos são utilizados para detecção de interações antígeno/anticorpo. Figura 08. Esquemas de ligação de anticorpos e antígenos em diferentes tipos de ELISA Fonte: adaptada de 123RF. U11 145Microbiologia e Imunologia Antígenos E Imunoglobulinas: Reação Antígeno E Anticorpo Além das aplicações diagnósticas, os anticorpos são uma importante ferramenta no tratamento de doenças infecciosas, autoimunes e tumores. Em 2014, aconteceu no oeste da África a maior epidemia de ebola já registrada. O ebola é uma doença causada por um vírus que se dissemina através do contato com secreções corporais de pessoas infectadas. A doença é caracterizada por uma alta taxa de letalidade (próxima de 50%) e por sintomas bastante graves como hemorra- gias, insuficiência renal e hepática. Não existe tratamento específico para essa do- ença. Durante este surto, os médicos realizaram alguns tratamentos experimentais, como a utilização de soro de pessoas que se recuperaram da doença (convalescen- tes) que foram administrados aos doentes mais graves. A ideia deste tratamento é que as pessoas que se recuperaram da infecção possuíam, em seu soro, altas concentra- ções de anticorpos neutralizantes contra o vírus, o que contribuiria para a eliminação do vírus dos doentes. Nos testes realizados, uma grande parcela dos pacientes trata- dos com soro sobreviveu. Este tipo de terapia não é novo; o uso de soro de pacientes recuperados para trata- mento de doentes já foi descrito em 1918 na epidemia de gripe espanhola, levando a um aumento de 20% na sobrevivência das pessoas infectadas. FI Q U E SA B EN D O Algumas terapias recentes contra o câncer fazem uso de anticorpos monoclonais que tem como alvo as células cancerígenas, na tentativa de favorecer o reconhecimento e eliminação do tumor pelo sistema imune. Estes anticorpos podem atuar de diferentes formas como, por exemplo, promovendo a citotoxicidade dependente de anticorpos, pela ação de células NK, ou favorecendo a ativação do sistema complemento, que por sua vez amplia a resposta inflamatória do organismo. Alguns anticorpos atuam como antagonistas, bloqueando receptores tumorais e inibindo seu crescimento. Também é possível conjugar (ligar quimicamente) os anticorpos a uma droga, uma molécula ativa- dora, um composto radioativo ou uma citocina à extremidade Fc do anticorpo formando uma imunotoxina. A presença do anticorpo antitumoral permite que a molécula seja ‘entregue’ diretamente às células cancerígenas, favorecendo a sua eliminação. Uma outra possível utilizaçãoantimicrobianos e vacinas. Neste e-book, serão abordadas as características gerais dos microrganismos, as técnicas de microscopia e coloração utilizadas para auxiliar na sua identificação, os antimicrobianos disponíveis para o tratamento e os impactos da resistência bacteriana na sociedade. Também serão explorados os métodos utilizados para controlar o cresci- mento microbiano, as etapas de um processo infeccioso e os fatores de virulência que contribuem para a patogenicidade e são capazes sobrelevar as defesas do hospedeiro. Contrapondo-se aos mecanismos de patogenicidade microbianos, o sistema imunoló- gico é um conjunto de moléculas, células, tecidos especializados e órgãos, que atuam na proteção do organismo contra agentes invasores. Neste e-book, serão abordados a estrutura e organização do sistema imune, suas vias de ativação e mecanismos efeto- res responsáveis pelo controle de infecções. Também serão exploradas estratégias de manipulação das respostas imunes para induzir proteção contra patógenos, como as vacinas. Por fim, serão abordadas as patologias relacionadas ao mal funcionamento do sistema imune: as imunodeficiências e as doenças de hipersensibilidade, e os trata- mentos baseados em imunoterapias. Este e-book foi preparado de modo a oferecer um curso completo nas áreas da microbiologia e imunologia para os alunos de cursos da área da saúde da Universi- dade São Francisco. EDUCANDO PARA A PAZ 13 UNIDADE 1 CARACTERÍSTICAS GERAIS DOS MICRORGANISMOS: BACTÉRIAS, FUNGOS E VÍRUS 1. MICROBIOLOGIA Microbiologia é a ciência destinada a estudar os microrganismos, seres vivos em sua maioria unicelulares – compostos por uma única célula – e invisíveis a olho nu, sendo necessária a utilização de microscópio. A denominação microbiologia vem do grego, em que: Mikrós significa “pequeno”; Bios, vida; Logos, estudo. O estudo dos microrganismos somente se tornou possível a partir da invenção do micros- cópio pelo cientista holandês Anton Van Leeuwenhoek, em 1673. Nesse período, os mi- crorganismos foram denominados “animáculos”. Após a descoberta deste grupo de orga- nismos unicelulares, surgiram diferentes teorias para explicar sua origem. A primeira é a teoria da geração espontânea, em que cientistas e filósofos acreditavam que as formas de vida surgiam espontaneamente a partir de matéria morta. O cientista Louis Pasteur descreveu a teoria da biogênese, comprovando, a partir de uma série de experimentos, que os microrganismos podem estar presentes na matéria não viva sobre sólidos, em líquidos e no ar. Com isso, foi demonstra a impossibilidade da geração espontânea. Identificar as propriedades morfológicas, fisiológicas e de patogenicidade dos microrganismos. C O M PE TÊ N C IA S Acesse o acervo digital e visualize as etapas do experimento de Pasteur que demons- tram que os micróbios estão presentes na matéria não viva – ar, líquidos e sólidos. Fonte: TORTORA, Gerard J.; FUNKE, Berdell R.; CASE, Christine L. Microbiologia. Grupo A, 2017. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788582713549/. Acesso em: 22 mar. 2022.SA IB A M A IS U1 14Microbiologia e Imunologia Características Gerais Dos Microrganismos: Bactérias, Fungos E Vírus É importante ressaltar a relação entre o universo microbiano e a sociedade, pois os microrganismos afetam a comunidade de várias formas: i) são capazes de manter o equilíbrio ambiental, através da reciclagem dos elementos químicos; ii) apresentam importância comercial e industrial, uma vez que é possível obter alimentos e medica- mentos a partir desses seres vivos e iii) na esfera clínica, que inclui os microrganismos patogênicos (causadores de doenças). Antes de compreender as características de cada micróbio, é necessário conhecer a maneira correta de designá-los. Os microrganismos são nomeados seguindo uma no- menclatura padronizada, estabelecida por Carolus Linnaeus em 1935. A terminologia científica utilizada refere-se aos microrganismos primeiramente em gênero e em segui- da a espécie (epíteto específico), sendo ambos escritos em itálico ou sublinhado. Exemplo: Gênero (iniciado com primeira letra maiúscula) espécie (sempre em letra minúscula) – ambos em itálico. O Quadro 1 apresenta exemplos de microrganismos e a nomenclatura correta. MICRORGANISMO FONTE DO NOME DO GÊNERO Salmonella enterica (Bactéria) Em homenagem ao microbiologista Daniel Salmon Streptococcus pyogenes (Bactéria) Aparência das células em cadeias (strepto-) Saccharomyces cerevisiae (Fungo) Fungo (-myces) que utiliza açúcar (saccharo-) Quadro 01. Nomenclatura de microrganismos Fonte: adaptado de Tortora et al. (2017, p. 4). Para compreender as características gerais dos microrganismos, é importante inicial- mente conhecer os tipos básicos de células. As células são classificadas em procarió- ticas ou eucarióticas; as células procarióticas não apresentam envoltório nuclear ou outras estruturas delimitadas por membrana, enquanto as células eucarióticas apre- sentam uma organização mais complexa, com núcleo delimitado por um envoltório nuclear e presença de organelas membranosas. O Quadro 2 apresenta as principais diferenças e semelhanças entre uma célula procariótica e eucariótica. 15 Microbiologia e Imunologia U1 Características Gerais Dos Microrganismos: Bactérias, Fungos E Vírus CARACTERÍSTICA CÉLULAS PROCARIÓTICAS CÉLULAS EUCARIÓTICAS Material genético (DNA) Habitualmente encontrado em um único cromossomo circular. Normalmente encontrado em cromossomos pareados. Localização da informação genética Região nuclear (nucleoide) Núcleo envolvido por membrana Nucléolo Ausente Presente DNA extracromossômico Em plasmídios Em organelas, como mitocôndrias e cloroplastos, e em plasmídios Ribossomos Presente Presente Parede celular Peptidoglicano encontrado na maioria das células Celulose, quitina ou ambas encontradas em células vegetais e fúngicas Divisão celular Fissão binária Mitose e/ou meiose Quadro 02. Características das células procarióticas e eucarióticas Fonte: adaptado de Black (2021, p. 78). Considerando-se as diferenças morfológicas, genéticas e metabólicas, os seres vivos foram classificados em três domínios: ` Eubacteria: Bactérias ` Archaea: Archaebactéria ` Eukarya: Protista, Plantae; Anumália e Fungi. Os domínios Eubacteria e Archaea são seres procariontes e unicelulares e o que os diferem em termos estruturais é a parede celular. Os fungos pertencem ao domínio Eukarya, que inclui organismos eucariontes, com organização celular mais complexa. Os vírus não estão inseridos dentro de domínios, pois não possuem organização celu- lar. São, portanto, considerados partículas infectantes. O estudo da microbiologia é fundamental para entender a natureza e o funcio- namento do universo microbiano e aplicar esse conhecimento em benefício do planeta e da humanidade. 2. BACTÉRIAS As bactérias são organismos unicelulares e procariontes. Apesar de estruturalmente simples, apresentam um metabolismo versátil e complexo. A maioria das células bacterianas são constituídas pelas seguintes estruturas: Cápsula, Parede celular, Membrana plasmática, citoplasma, ribossomos, nucleóide, plasmídeo, flagelo e fímbrias. A Figura 1 apresenta uma célula procariótica típica, demonstrando as estruturas mencionadas. U1 16Microbiologia e Imunologia Características Gerais Dos Microrganismos: Bactérias, Fungos E Vírus Figura 01. Célula procariótica e suas estruturas Fonte: adaptada de Black (2021, p. 81). ` Membrana plasmática: Forma uma barreira responsável por separar os meios interno (citoplasma) e externo da célula, sendo composta de proteínas e fosfolipídeos. Atua como barreira seletiva de substâncias na célula bacteriana, além de participar do processo de produção de energia para a célula. ` Citoplasma: A maior parte do metabolismo bacteriano ocorre no citoplasma e nesta re- gião encontra-se imersas estruturas fundamentais para o funcionamento da célula,dos anticorpos monoclonais é a possibilidade de utilizá-los no tratamento de doenças autoimunes, atuando no controle das respostas deletérias con- tra antígenos próprios ou no controle da resposta inflamatória que danifica os tecidos. Um exemplo desse tipo de terapia são os anticorpos anti-TNFα – uma citocina infla- matória que é produzida em excesso em diversos quadros autoimunes; os anticorpos monoclonais atuam inibindo a ação desta citocina. 146 Microbiologia e Imunologia U11 Antígenos E Imunoglobulinas: Reação Antígeno E Anticorpo Anticorpos monoclonais são anticorpos com a mesma especificidade antigênica, que são derivados de um único clone de linfócitos B e se ligam ao mesmo epítopo no antígeno. São produzidos de forma artificial, em um laboratório, tendo como fonte linfócitos B isolados de camundongos injetados com antígenos do tumor. Esses anti- corpos podem ser posteriormente modificados (humanizados), para reduzir o risco de reações adversas no paciente. G LO SS Á R IO 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS As imunoglobulinas são as moléculas efetoras da imunidade humoral; atuam como recepto- res antigênicos do linfócito B (IgM monomérica e IgD) e são produto dos plasmócitos ativados, sendo secretados nos fluidos corporais e mucosas. Há quatro classes diferentes de anticor- pos secretados com funções distintas, chamadas de IgA, IgE, IgM e IgG. As funções dos anticorpos incluem: 1- Neutralização de microrganismos e toxinas; 2 – Opsonização; 3 – Ativação do sistema complemento; 4- Citotoxicidade celular dependente de anticorpos e 5 –Hipersensibilidade imediata. Diferentes classes de anticorpos apresentam diferentes funções. As interações entre anticorpos e seus antígenos específicos são regidas por duas for- ças, afinidade e avidez. Por fim, os anticorpos também são ferramentas importantes que podem ser utilizadas para o diagnóstico de doenças e tratamento. 7. ATIVIDADES PRÁTICAS Os anticorpos apresentam uma alta variabilidade na região Fab, que reconhece uma ampla gama de antígenos; eles também apresentam a região Fc que é responsável por diferenciar as classes e desempenhar as funções efetoras dos anticorpos. Cite as classes de anticorpos existentes e quais funções um anticorpo pode exercer na resposta imunológica. Exercício 1. U11 147Microbiologia e Imunologia Antígenos E Imunoglobulinas: Reação Antígeno E Anticorpo Os anticorpos podem ser usados para uma ampla variedade de funções. Imagine que você precisa fazer o diagnóstico de uma doença que infecta o sistema respiratório de uma pessoa, qual tipo de amostra biológica você coletaria e qual classe de anticorpos você deve procurar? Infecções respiratórias são caracterizadas pela presença do patógeno na mucosa da naso- faringe o aluno deve coletar amostras da mucosa da nasofaringe do paciente, nesta amostra ele deve procurar por anticorpos da classe IgA, que são os mais comuns de serem encontra- dos nas mucosas em respostas a estes patógenos. Exercício 2. Resposta: Em uma reação de hipersensibilidade imediata a resposta imune é desencadeada pela de- granulação dos mastócitos que é induzida pela ligação de um alérgeno à porção Fab do anti- corpo ancorado ao mastócito. Com base nos seus conhecimentos, a qual classe de anticorpo pertence a molécula citada no texto? a. IgA b. IgD c. IgE d. IgG e. IgM Exercício 3. Anticorpos são moléculas muito versáteis, capazes de reconhecer antígenos de diferente natureza química, como proteínas, carboidratos, lipídeos e até mesmo ácidos nucléicos. Na estrutura do anticorpo, a região responsável pelo reconhecimento do antígeno é chamada de: a. Fab, e cada anticorpo apresenta, no mínimo 2 Fab b. Fc, e cada anticorpo apresenta, no mínimo 2 Fc c. Fab, e cada anticorpos apresenta, no mínimo 1 Fab d. Fc, e cada anticorpo apresenta, no mínimo 1 Fc e. Fc, e cada anticorpo apresenta, no mínimo 5 Fc Exercício 3. 148 Microbiologia e Imunologia U11 Antígenos E Imunoglobulinas: Reação Antígeno E Anticorpo Quando o sistema imune adaptativo é ativado pela primeira vez por um antígeno, qual é a classe de anticorpos que os plasmócitos irão secretar? a. IgA b. IgD c. IgE d. IgG e. IgM Exercício 3. REFERÊNCIAS ABBAS, Abul K.; LICHTMAN, Andrew H.; PILLAI, Shiv. Imunologia Básica - Funções e Distúrbios do Sis- tema Imunológico. 6. ed. Rio de Janeiro: Grupo GEN, 2021. ABBAS, Abul K.; LICHTMAN, Andrew H.; PILLAI, Shiv. Imunologia celular e molecular. 9. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2019. COICO, Richard; SUNSHINE, Geoffrey. Imunologia. 6. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2010. Reim- pressão 2019. DELVES, Peter J.; MARTIN, Seamus J.; BURTON, Dennis R.; ROITT, Ivan M. ROITT - Fundamentos da Imunologia. 13. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2018. EDUCANDO PARA A PAZ 150 UNIDADE 12 IMUNIDADE ADAPTATIVA: ATIVAÇÃO DE LINFÓCITOS B E PRODUÇÃO DE ANTICORPOS Analisar as respostas imunes inata e adaptativa e a relação antígenos e anticorpos. C O M PE TÊ N C IA S 1. IMUNIDADE ADAPTATIVA: LINFÓCITO B A Imunidade adaptativa é dividida em dois ramos: a imunidade celular, cujos efetores são os linfócitos T e a imunidade humoral, caracterizada pela ativação dos linfócitos B e produção de anticorpos. A imunidade humoral é iniciada nos órgãos linfoides secundários, como linfonodos e baço, a partir do reconhecimento dos antígenos por receptores específicos na superfí- cie dos linfócitos B. Após o reconhecimento dos antígenos, os linfócitos B são ativados e transformam-se em plasmócitos secretores de anticorpos. Nesta unidade serão abordadas as etapas de ativação e maturação do linfócito B e os mecanismos efetores da resposta imune humoral. Todas as classes de anticorpos presentes no organismo são produzidas pelos plasmó- citos, que tem origem no linfócito B ativado. IM PO R TA N TE 2. ATIVAÇÃO DE LINFÓCITO B Os linfócitos B, como todas as células do sistema imunológico, tem origem na medula óssea, sendo formados a partir das células troncos hematopoiéticas pluripotentes. Du- rante este processo, os linfócitos B passam a expressar os seus receptores de reconhe- cimento de antígenos, cuja função é reconhecer antígenos de forma específica e iniciar o processo de ativação de célula. U12 151Microbiologia e Imunologia Imunidade Adaptativa: Ativação De Linfócitos B E Produção De Anticorpos Após terminar o processo de maturação, o linfócito B é chamado de linfócito virgem ou naϊve e somente se tornará uma célula ativada após o reconhecimento do antígeno por seu receptor. Os receptores antigênicos do linfócito B recebem o nome de complexo receptor da célula B (BCR) e consistem em moléculas de anticorpos pertencentes a duas classes distintas (IgM monomérica e IgD), que estão ancoradas na superfície onde podem se ligar a antígenos específicos (Figura 1). Figura 01. Complexo receptor do linfócito B Fonte: adaptada de Abbas et al. (2021, p. 165). O BCR possui duas regiões de interação com o antígeno idênticas, formadas pelas cadeias leves mais a região variável e o primeiro domínio constante das cadeias pesa- das dos anticorpos (Figura 1). Estas regiões têm a função de reconhecer o antígeno, que pode ser uma proteína, um polissacarídeo, lipídeo, ou ácido nucleico. Essa ampla variedade no reconhecimento de antígenos é característica do linfócito B; os linfócitos T somente reconhecem proteínas. Outra diferença importante é que o linfócito B é capaz de reconhecer antígenos em sua conformação nativa (como proteínas na superfície de Assim como os linfócitos T, eventos de recombinação gênica são responsáveis por ge- rar uma imensa quantidade de receptores diferentes, possibilitando o reconhecimento e a geração de respostas humorais contra praticamente qualquer antígeno que exista na natureza. IM PO R TA N TE 152 Microbiologia e Imunologia U12 Imunidade Adaptativa: Ativação De Linfócitos B E Produção De Anticorpos Depois de produzidos, os linfócitos B passam por um processo de seleção, no qual as células autorreativas(que reconhecem moléculas próprias) ou com receptores defei- tuosos são eliminadas. IM PO R TA N TE bactérias, por exemplo), enquanto o linfócito T só reconhece antígenos que foram pro- cessados no interior de uma célula apresentadora de antígenos (APC) e apresentados via receptores MHC. A base do receptor BCR permanece ancorada à membrana do linfócito B, participando da ativação do linfócito após o reconhecimento do antígeno. Além do anticorpo de superfície, há duas cadeias acessórias, chamadas Igα e Igß, que participam da sinalização para ativação do linfócito B que reconheceu o antígeno. Outras moléculas correceptoras, como receptores tipo toll e receptores de complemento também estão presentes na superfície do linfócito B e podem atuar amplificando o sinal de ativação pelo BCR. O linfócito B virgem com receptor antigênico adequado irá migrar pela circulação até um órgão linfoide secundário, onde deverá aguardar o contato com o antígeno. Dentro do órgão linfóide, os linfócitos B virgem ficam concentrados em uma região denominada folículo (Figura 2). Figura 02. Distribuição dos linfócitos B em um linfonodo Fonte: adaptada de Abbas et al. (2019, p. 254). U12 153Microbiologia e Imunologia Imunidade Adaptativa: Ativação De Linfócitos B E Produção De Anticorpos 3. PRODUÇÃO DE ANTICORPOS Os antígenos podem penetrar o organismo de diferentes formas, incluindo cortes, quei- maduras, atravessando uma barreira mucosa, etc. Do local de entrada, estes antíge- nos devem ser levados até os órgãos linfoides secundários, para serem reconhecidos por linfócitos B específicos. A migração dos antígenos pode ocorrer de forma passiva através da circulação sanguínea e linfática, ou pelo transporte através de células apre- sentadoras de antígenos. É importante ressaltar que, neste caso, os antígenos são carregados pelas APCs na sua forma nativa, ou seja, sem terem sido processados. Ao chegar no órgão linfoide, os antígenos menores atravessam os condutos até chega- rem aos folículos, enquanto os maiores são transportados por células residentes, como macrófagos e células dendríticas (Figura 2). Nos folículos, os antígenos serão reconhe- cidos pelos linfócitos B virgens com receptores específicos, iniciando a ativação da imunidade humoral. O reconhecimento do antígeno pelo complexo BCR na superfície de um linfócito B pro- duz dois resultados na célula: i) sinalização para ativação do linfócito B e ii) internali- zação do antígeno pelo linfócito B. Os eventos que se seguem ao reconhecimento an- tigênico dependem da natureza do antígeno ativador. Os antígenos proteicos ativam linfócitos B e T, gerando respostas T-dependentes. Antígenos não proteicos, como po- lissacarídeos e lipídeos, ativam a célula B sem a participação do linfócito T, gerando respostas do tipo T-independentes. A seguir, serão descritos os eventos de ativação das respostas contra antígenos proteicos (T-dependentes). No final desta unidade, se- rão discutidas as respostas T-independentes. Quando uma proteína é reconhecida pelo receptor antigênico no linfócito B, inicia-se uma cascata de sinalização intracelular, que leva à ativação de genes de resposta imu- ne na célula. Esta resposta favorece a interação do linfócito B com o linfócito T auxiliar (Th) que também foi ativado pelo antígeno. Para que esta interação ocorra, é necessá- rio que o linfócito B em ativação migre através do folículo para a região da borda, onde encontra linfócitos Th ativados pelo mesmo antígeno. Além disso, o linfócito B expressa receptores para as citocinas produzidas pelo linfócito T e moléculas antiapoptóticas, que prolongam sua vida (Quadro 1). ALTERAÇÕES FENOTÍPICAS CONSEQUÊNCIAS FUNCIONAIS Aumento da expressão do CCR7 Migração para a zona de células T Aumento na expressão do coestimulador B7 Aumento da capacidade de ativar linfócitos T auxiliares Aumento na expressão de receptores para citocinas de linfócitos T Responsividade aumenta aos sinais das células T auxiliares Aumento da expressão de proteínas antiapoptóticas Sobrevida aumenta do linfócito B Quadro 01. Efeitos da ativação do receptor BCR Fonte: adaptado de Abbas et al. (2019, p. 256). 154 Microbiologia e Imunologia U12 Imunidade Adaptativa: Ativação De Linfócitos B E Produção De Anticorpos Ao encontrar o linfócito Th, a célula B apresenta o antígeno (que havia sido internaliza- do) via MHC classe II. Esta interação favorece um conjunto de ligações entre moléculas dos linfócitos Th e B, incluindo CD40 (que interage com CD40 ligante no LTh) e recepto- res de citocinas. Como resultado destas interações, o linfócito B se transforma em uma célula efetora, o plasmócito secretor de anticorpos. A Figura 3 sumariza as interações entre o linfócito B e o linfócito Th durante a ativação da resposta humoral. Figura 03. Interações entre linfócitos B e Th durante a resposta imune humoral Fonte: Abbas et al. (2019, p. 259). A participação do linfócito Th durante a ativação do linfócito B leva à formação do centro ger- minativo, onde os linfócitos B ativados passam por dois processos que ampliam a eficácia das respostas humorais: i) maturação de afinidade e ii) troca de classes de anticorpos. A maturação de afinidade consiste na edição genética dos receptores antigênicos e seleção das células que possuem os receptores com maior afinidade pelo antígeno. Esta edição ocorre através de mutações nos segmentos de DNA que codificam a região hipervariável dos anticorpos de superfície, no linfócito B ativado. Este fenômeno tam- bém é conhecido como hipermutação somática. A troca de classes (ou isótipos), corresponde à mudança na cadeia pesada dos an- ticorpos. Inicialmente, os linfócitos B recém ativados produzem anticorpos da classe IgM de baixa afinidade. Com o amadurecimento da resposta humoral, os plasmócitos passam a secretar anticorpos das classes IgG, IgA ou IgE, dependendo dos estímulos que recebem (Figura 4). Estes estímulos são citocinas produzidas pelo linfócito Th ou por outras células presentes durante a ativação do LB. Assim, a presença da citocina IFN-γ promove a troca para a classe IgG, enquanto IL-4 leva à produção de IgE pe- los plasmócitos. A produção de IgA é influenciada por citocinas como TGF-ß, APRIL e BAFF, produzidas nas mucosas. U12 155Microbiologia e Imunologia Imunidade Adaptativa: Ativação De Linfócitos B E Produção De Anticorpos Figura 04. Troca de classes no linfócito B ativado Fonte: Abbas et al. (2019, p. 263). No centro germinativo também são produzidos os plasmócitos de vida longa e células de memória. Estas últimas produzem altos níveis de moléculas antiapoptóticas, que pro- longam sua sobrevida. Por serem derivadas de linfócitos B ativados, possuem receptores antigênicos de alta afinidade e classes trocadas de Ig. Podem permanecer no organismo por anos ou décadas, sendo reativadas rapidamente após novo contato com o mesmo antígeno. A Figura 5 ilustra as fases da resposta imune humoral T-dependente. 156 Microbiologia e Imunologia U12 Imunidade Adaptativa: Ativação De Linfócitos B E Produção De Anticorpos Figura 05. Fases da resposta imune humoral a antígenos T-dependentes Fonte: Abbas et al. (2019, p. 251). O primeiro contato com um antígeno desencadeia a chamada resposta primária, que é iniciada por linfócitos virgens, com receptores antigênicos de baixa afinidade e pro- dução de anticorpos principalmente da classe IgM. Com a maturação da resposta, são gerados anticorpos de outras classes, como IgG, e células de memória. Caso haja um novo contato com o mesmo antígeno, será desencadeada uma resposta secundária, com ativação de células B de memória com receptores de alta afinidade e produção de anticorpos das classes IgG, IgE ou IgA. As respostas secundárias são, portanto, mais rápidas e mais eficazes do que as respostas primárias. Esta adaptação é característica das respostas imunes T-dependentes. A Figura 6 mostra as diferenças na resposta hu- moral primária e secundária. U12 157Microbiologiae Imunologia Imunidade Adaptativa: Ativação De Linfócitos B E Produção De Anticorpos Figura 06. Resposta imune primária x secundária Fonte: Abbas et al. (2019, p. 253). 4. RESPOSTA T DEPENDENTE E T INDEPENDENTE A ativação dos linfócitos B por antígenos proteicos envolve o engajamento dos linfócitos Th ativados pelos mesmos antígenos, resultando na produção de anticorpos de alta afinidade com isótipos trocados, geração de plasmócitos de vida longa e células de memória. Pela participação dos linfócitos Th, esse tipo de resposta humoral é chamado de resposta T-dependente. No entanto, os receptores antigênicos dos linfócitos B também podem reconhecer antí- genos não proteicos, como polissacarídeos e lipídeos. Neste caso, não há participação do linfócito Th na produção de anticorpos pelo linfócito B, e a resposta é chamada de T-independente. 158 Microbiologia e Imunologia U12 Imunidade Adaptativa: Ativação De Linfócitos B E Produção De Anticorpos Nas respostas T-independentes, o reconhecimento de antígenos multivalentes (que apresentam unidades repetitivas, como os polissacarídeos), promove a ligação cruzada de vários receptores antigênicos no linfócito B ao mesmo tempo. Esse sinal, juntamente com outros sinais ativadores (como o receptor de proteínas do sistema complemento) promove a ativação do linfócito B em plasmócito, na ausência de interações com o linfócito T. Estes plasmócitos produzem, principalmente, anticorpos da classe IgM de baixa afinidade, pois a troca de classe e a maturação de afinidade são processos que dependem de sinais do linfócito Th, que não é ativado neste processo. Também não há produção de plasmócitos de vida longa nem células de memória. Em geral, os an- tígenos T-independentes não induzem respostas secundárias. A Figura 7 compara as respostas de anticorpos T-dependentes e T-independentes. Figura 07. Resposta imune T-dependente x T-independente Fonte: adaptada de Abbas et al. (2019, p. 251). U12 159Microbiologia e Imunologia Imunidade Adaptativa: Ativação De Linfócitos B E Produção De Anticorpos 5. ATIVIDADE PRÁTICA Objeto de Aprendizagem Síndrome da Hiper-IgM MSS, 1 ano de idade, sexo masculino, foi levado a uma consulta médica por sua mãe. Ao médico, a mãe relatou que o bebê frequentemente era acometido por infecções e que neste primeiro ano de vida, já havia sido internado 3 vezes por infecções bacterianas do trato respiratório. Durante a consulta, o médico realizou um exame neurológico, que apresentou resultado normal. O médico solicitou um exame de sangue para verificar a contagem de glóbulos brancos e avaliar a produção de imunoglobulinas. O exame de sangue mostrou que o paciente apresentava contagens normais de leucócitos, porém ele apresentava uma quantidade de anticorpos IgM aumentada a 280 mg/dl (normal: 51 – 195 mg/dl), e ausência de IgG e IgA (normal: IgG: 600 – 1100 mg/dl e IgA: 81 – 387 mg/dl). Após verificar estes resultados, o médico solicitou um exame de genotipagem que ve- rificou uma mutação no gene que codifica o receptor CD40 nos linfócitos B. O médico concluiu o diagnóstico de Síndrome da hiper-IgM ligada ao X. O paciente foi submetido a um transplante de medula óssea que foi realizado com sucesso, e o paciente passou a produzir linfócitos B que expressavam os receptores normalmente. O paciente foi diagnosticado com Síndrome da hiper-IgM, uma doença caracterizada pela ausência da expressão do receptor CD40 no linfócito B. Baseado em seus conhecimentos, qual o efeito da ausência deste receptor para a resposta do linfócito B? Atividade 1. As respostas T-independentes só se tornam maduras por volta dos cinco anos de idade. Por essa razão, antígenos não proteicos, como polissacarídeos, por exemplo, não são capazes de ativar respostas adaptativas eficazes em crianças menores de cinco anos. IM PO R TA N TE 160 Microbiologia e Imunologia U12 Imunidade Adaptativa: Ativação De Linfócitos B E Produção De Anticorpos O exame de sangue mostrou um resultado aumentado para IgM e a ausência de IgA e IgG. Como o defeito no gene de expressão do CD40 está relacionado com este resultado? Atividade 2. O problema do paciente foi resolvido com um transplante de medula óssea. Como o trans- plante pode ajudar o paciente? Atividade 3. O paciente foi levado ao médico por conta de infecções bacterianas recorrentes, como sua doença está relacionada com este tipo de infecções? Atividade 4. Além da ausência na produção de outras classes de anticorpos, qual outro efeito no linfócito B pode ser observado na ausência da expressão do receptor CD40? Atividade 5. REFERÊNCIAS ABBAS, Abul K.; LICHTMAN, Andrew H.; PILLAI, Shiv. Imunologia Básica - Funções e Distúrbios do Sis- tema Imunológico. 6. ed. Rio de Janeiro: Grupo GEN, 2021. ABBAS, Abul K.; LICHTMAN, Andrew H.; PILLAI, Shiv. Imunologia celular e molecular. 9. ed. Rio de Janei- ro: Elsevier, 2019. COICO, Richard; SUNSHINE, Geoffrey. Imunologia. 6. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2010. Reim- pressão 2019. DELVES, Peter J.; MARTIN, Seamus J.; BURTON, Dennis R.; ROITT, Ivan M. ROITT - Fundamentos da Imunologia. 13. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2018. EDUCANDO PARA A PAZ 162 UNIDADE 13 IMUNOPROFILAXIA E IMUNOTERAPIA Avaliar estratégias preventivas e terapêuticas contra patógenos na relação com doenças do sistema imune. C O M PE TÊ N C IA S 1. HISTÓRICO DA VACINAÇÃO As vacinas são uma estratégia de sucesso na prevenção de diversas doenças infecciosas, consistem na administração deliberada de microrganismos mortos ou atenuados, ou de partes de microrganismos (conhecida como imunização), para induzir respostas imunológicas específicas, capazes de proteger o indivíduo contra infecção futura. As vacinas diferem dos medicamentos, pois devem ser administradas a pessoas saudáveis, antes do contato com o patógeno. Assim, a vacinação também é conhecida como imunopro- filaxia. Trata-se de uma estratégia de saúde comunitária, pois a vacinação em massa reduz a circulação do patógeno na população, prevenindo a transmissão e contribuindo para a eli- minação das doenças infecciosas. Este efeito é conhecido como imunidade em massa ou efeito rebanho, e foi responsável pela drástica redução nos casos de doenças preveníveis por vacinação, como poliomielite, tétano e sarampo, entre outras. A primeira vacina humana foi uma formulação contra a varíola, desenvolvida pelo médico inglês Edward Jenner em 1796. Naquela época, uma epidemia de varíola assolava a Eu- ropa. Jenner observou que as ordenhadeiras, após serem expostas a uma variante do vírus que infectava as vacas, apresentam sintomas leves, e depois se tornavam resistentes à in- fecção pelo vírus da varíola humana. Sem saber que se tratava de uma doença viral, Jenner demonstrou que a inoculação de pessoas com uma preparação contendo o vírus da varíola bovina as protegia contra a varíola humana. Este processo pioneiro recebeu o nome de vaci- nação, e levou à erradicação (eliminação) da varíola em 1979. U13 163Microbiologia e Imunologia Imunoprofilaxia E Imunoterapia Figura 01. Edward Jenner (1749-1823) pintado por T. Lawrence e publicado por Fisher, Son & Co London Fonte: 123RF. Outra importante contribuição para a vacinologia resultou das pesquisas dos micro- biologistas Friedrich Henle e Robert Koch, no final do século XIX. Estes dois cientistas foram os responsáveis por comprovar a relação entre microrganismos patogênicos e as doenças que eles causam, através de uma sequência de passos conhecida como Postulados de Henle-Koch. Os postulados de Henle-Koch consistem em um conjunto de experimentos que visam determinar a relação entre a presença de um microrganismo em um hospedeiro e a doença desencadeada. Estes experimentos incluem o isolamento do patógeno a partir de amostras biológicas do doente, seu cultivo em laboratório, a inoculação em um animal saudável e a reprodução, neste animal, dos sintomas do doente. IM PO R TA N TE Uma vez identificadosos microrganismos causadores de doenças, foi possível desen- volver técnicas de atenuação destes patógenos para produção de vacinas. Diversas vacinas foram desenvolvidas a partir de microrganismos atenuados, muitas das quais são utilizadas até os dias atuais. A vacina contra a tuberculose foi desenvolvida em 1921 por Léon Calmette e Alphonse Guérin a partir da atenuação da bactéria Myco- bacterium bovis, causadora da tuberculose bovina, e recebeu o nome de BCG (Bacilo Calmette Guérin). Trata-se de uma vacina viva, administrada logo após o nascimento. 164 Microbiologia e Imunologia U13 Imunoprofilaxia E Imunoterapia Atenuação consiste em reduzir a capacidade de um microrganismo patogênico de causar doença, através de modificações em seu material genético que limitam sua vi- rulência. A atenuação pode ser realizada por métodos físicos (como radiação), quími- cos, genéticos (pela edição dos genes de virulência), ou por passagens consecutivas em meio de cultivo (ou cultura de células, no caso dos vírus). G LO SS Á R IO Décadas mais tarde, nos anos 50 a 60, Jonas Salk e Albert Sabin criaram duas vacinas contra a poliomielite (paralisia infantil): a vacina Sabin, composta por vírus atenuados e administrada por via oral, e a vacina Salk, contendo vírus inativados e injetável. As primeiras vacinas de subunidade (contendo partes do microrganismo) foram pro- duzidas a partir das toxinas tetânica e diftérica, para proteção contra difteria e tétano, respectivamente. Outras vacinas de subunidade incluem as vacinas de polissacaríde- os da cápsula, usadas na prevenção de infecções por bactérias como o pneumococo e o meningococo. Nas últimas décadas, avanços nos campos da imunologia e biologia molecular, in- cluindo a tecnologia do DNA recombinante, permitiram a produção de novas estra- tégias vacinais contra diversas doenças. Um marco recente foi a aprovação, em 2020 da primeira vacina genética – a vacina de RNAm contra a COVID-19, fabricada pela empresa Pfizer. 2. RESPOSTAS IMUNES INDUZIDAS PELA VACINAÇÃO As vacinas são uma estratégia de imunização ativa, na qual microrganismos ou partes deles são usados para estimular respostas imunes específicas no hospedeiro. Estas respostas dependem de diversos fatores, como a quantidade e natureza química dos antígenos, a via de imunização (intramuscular, subcutânea, intradérmica ou oral), a presença de adjuvantes e as características do indivíduo vacinado. Adjuvantes são substâncias que potencializam as respostas contra antígenos vaci- nais. Eles atuam sobre os componentes da imunidade inata, promovendo a migração e/ou ativação de células imunes. Os adjuvantes aprovados para uso humano incluem sais de alumínio e emulsões água-óleo, entre outros. IM PO R TA N TE As respostas imunes induzidas pela vacinação incluem a ativação de linfócitos B com produção de anticorpos contra os antígenos vacinais e, em alguns casos, ativação de células T. Para que as vacinas sejam eficazes na prevenção de doenças, é importante que induzam a produção de células de memória, que podem ser reativadas após con- tato com o patógeno. U13 165Microbiologia e Imunologia Imunoprofilaxia E Imunoterapia Para compreender o funcionamento das vacinas, é necessário relembrar os conceitos de resposta imune primária e secundária. O primeiro contato com um antígeno promove a ativação de linfócitos B e T virgens – células que expressam o receptor antigênico adequado, mas que ainda não encontraram o antígeno específico – nos órgãos linfóides secundários. Após o reconhecimento do antígeno, os linfócitos virgens amadurecem, tornando-se células efetoras ou de memória. Esta resposta ao primeiro encontro com um antígeno é chamada de resposta primária, e leva cerca de 10 a 15 dias para ser formada. Após a eliminação do antígeno, as células de memória permanecem no orga- nismo, sendo reativadas em caso de nova exposição ao mesmo antígeno. Esta respos- ta é chamada de secundária, e possui maior rapidez e amplitude quando comparada à resposta primária. Durante a vacinação, o sistema imune é exposto ao antígeno de forma segura, levando à ativação de uma resposta primária, com geração de células de memória. Em outras palavras, as vacinas primam o sistema de defesa, induzindo respostas que permane- cem no organismo e protegem do contato com o patógeno. Em pessoas não vacinadas, o contato com o patógeno irá induzir uma resposta primária, mais lenta e menos eficaz, muitas vezes apresentando os sintomas da doença. A Figura 2 mostra os efeitos da vacinação sobre a produção de anticorpos. Figura 02. Resposta primária e resposta secundária Fonte: adaptada de Abbas et al. (2019, p. 253). 166 Microbiologia e Imunologia U13 Imunoprofilaxia E Imunoterapia As vacinas podem ativar a produção de diferentes classes de anticorpos, dependendo do tipo de antígeno, presença de adjuvantes e via de inoculação. De maneira geral, as vacinas injetáveis induzem, principalmente, a produção de anticorpos da classe IgG no soro. Além das células de memória, as vacinas podem ativar a produção de plasmócitos de vida longa, que permanecem no organismo por longos períodos se- cretando anticorpos. Além dos anticorpos, as vacinas também podem promover a ativação de linfócitos T citotóxicos (Tc) que promovem a destruição de células doentes. É importante ressaltar que as vacinas induzem respostas específicas contra os antígenos; dessa forma, há várias vacinas diferentes para o controle de diversas doenças infecciosas. 3. TIPOS DE VACINAS As vacinas podem ser classificadas de acordo com o tipo de antígeno incluído na for- mulação, e a forma como esse antígeno é apresentado ao sistema imune. As vacinas mais tradicionais (de primeira geração) contêm microrganismos inteiros, atenua- dos ou inativados (mortos), que podem ser bactérias ou vírus. Nas vacinas atenuadas, o microrganismo está vivo, porém apresenta virulência reduzida. O Quadro 1 mostra exemplos de vacinas baseadas em microrganismos inteiros, atenuados e inativados. Apesar de serem muito seguras, as vacinas podem induzir efeitos adversos, especial- mente em pessoas imunossuprimidas. Por esta razão, vacinas contendo microrganis- mos atenuados não são indicadas para pacientes com imunodeficiências. IM PO R TA N TE As vacinas de segunda geração contêm partes de microrganismos, que podem ser, por exemplo exotoxinas ou moléculas da superfície de patógenos. As vacinas contra a difteria e o tétano são produzidas a partir das toxinas diftérica e tetânica; como são tóxi- cas na forma nativa, as toxinas passam por um processo de detoxificação, produzindo toxóides, que mantêm o potencial de ativação imunológica, mas sem os efeitos tóxicos. TIPO DE VACINAS EXEMPLOS Bactérias atenuadas BCG Bactérias inativadas Pertussis (coqueluche) Vírus atenuados Pólio (Sabin), caxumba, varicela, febre amarela, rubéola, sarampo, rotavírus Vírus inativados Pólio (Salk), raiva, hepatite A, CORONAVAC® Quadro 01. Exemplos de vacinas de organismos inteiros Fonte U13 167Microbiologia e Imunologia Imunoprofilaxia E Imunoterapia Outro exemplo são as formulações baseadas em polissacarídeos da cápsula. Algumas bactérias, como Streptococcus pneumoniae (pneumococo), Neisseria meningitidis (me- ningococo) e Haemophilus influenzae, produzem uma cápsula composta de polissa- carídeos, que recobre toda a superfície da bactéria, protegendo-a da fagocitose pelas células do hospedeiro. As vacinas de polissacarídeos são produzidas a partir do cultivo destes microrganismos e purificação dos açúcares da cápsula. Embora sejam eficazes na proteção de adultos jovens, os polissacarídeos são antígenos T-independentes, e não são imunogênicos em crianças menores de 5 anos de idade. A estratégia desenvolvida para produzir vacinas de polissacarídeos que sejam pro- tetoras para crianças foi a conjugação com proteínas carreadoras, que promovem a ativação de respostas T-dependentes, eficientes nessa faixa etária. A conjugação consiste nafusão, através de reações químicas, entre o polissacarídeo e a proteína, produzindo uma molécula híbrida, o conjugado. Assim, há, por exemplo, dois tipos de formulação vacinal contra o pneumococo: as vacinas de polissacarídeos livres e as vacinas conjugadas. As vacinas contra a hepatite B e o HPV (papilomavírus humano) utilizam uma tecnolo- gia conhecida como VLP (do inglês, virus-like particles). Nestas vacinas, os genes que codificam proteínas do capsídeo dos vírus são isolados e transferidos para um organis- mo receptor, como uma bactéria ou levedura. Nestes organismos, ocorre a produção das proteínas recombinantes. Essas proteínas se organizam formando a estrutura do capsídeo (VLP), porém sem o potencial infectante do vírus. Depois de produzidas, as VLPs são purificadas e utilizadas como vacinas. Proteína recombinante é a proteína produzida por um organismo diferente do organis- mo de origem. Assim, uma proteína humana produzida em uma bactéria, por exemplo, é chamada recombinante. Proteínas recombinantes possuem várias aplicações clíni- cas e biotecnológicas. Exemplos de proteínas recombinantes são a insulina humana e as vacinas contra HPV e hepatite B.G LO SS Á R IO As vacinas de subunidades, em geral, causam menos reações adversas do que as vacinas contendo microrganismos inteiros. Porém, podem apresentar menor imunoge- nicidade, sendo necessário o uso de adjuvantes para potencializar seu efeito. O Quadro 2 contém exemplos de vacinas de subunidades. TIPO DE VACINAS EXEMPLOS Toxóides Exemplos Polissacarídeos capsulares Tétano, difteria Vacinas conjugadas Vacinas contra pneumonia e meningite (adultos) VLPs Vacinas contra pneumonia e meningite (crianças) Quadro 02. Exemplos de vacinas de subunidades Fonte: elaborado pelos autores. 168 Microbiologia e Imunologia U13 Imunoprofilaxia E Imunoterapia Assista ao vídeo do YouTube a respeito de vacinas genéticas. Vídeo: O que são vacinas genéticas? Link: https://youtu.be/8fGySuedxbsSA IB A M A IS As vacinas da Janssen® e AstraZeneca® contra a COIVD-19 utilizam adenovírus carre- gando o RNAm codificante da proteína S. O adenovírus atua como vetor viral, permi- tindo a entrega do antígeno vacinal nas células da pessoa vacinada. O desenvolvimento de uma nova vacina inclui diversas etapas: na fase de descober- ta, é feita a seleção da estratégia vacinal e produção da vacina, em seguida, a vacina passa para a etapa pré-clínica, onde a resposta imune é caracterizada em modelos animais. Caso se mostre segura e protetora, é iniciada e etapa clínica, na qual a se- gurança e eficácia da vacina são avaliadas em voluntários humanos (fases I, II e III). As vacinas aprovadas nos ensaios clínicos passam para a etapa final, que consiste no registro e comercialização. Mesmo após a aprovação, as vacinas continuam sendo monitoradas (fase IV) para garantir a segurança da população. SA IB A M A IS A maior parte das vacinas é administrada nos primeiros anos de vida, pois as crianças menores de 5 anos constituem grupo de risco para muitas doenças infecciosas. No en- tanto, há vacinas indicadas para adultos, idosos, gestantes e outros grupos. As vacinas de terceira geração também são chamadas de vacinas genéticas. Contêm fragmentos de DNA ou RNAm do organismo patogênico, que são administrados ligados a nanopartículas. No organismo humano, a informação genética é lida e a proteína é produzida. Dessa forma, os antígenos microbianos produzidos no citoplasma das célu- las serão apresentados e ativarão respostas imunes protetoras. A primeira vacina gené- tica aprovada para uso humano foi a vacina contra a COVID-19 produzida pela Pfizer. Essa formulação contém uma sequência de RNA mensageiro modificada, que codifica a proteína S (do inglês spike) na superfície do vírus. O RNAm está contido em uma nanopartícula de lipídeos, que garante estabilidade ao antígeno e permite a interação com células do hospedeiro. U13 169Microbiologia e Imunologia Imunoprofilaxia E Imunoterapia Para conferir os calendários de vacinação brasileiros, clique nos links: Criança: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-a-z/c/calendario-nacio- nal-de-vacinacao/calendario-vacinal-2020/calendario-de-vacinacao-2020_crianca-1. pdf/view. Acesso em: 30 mai. 2022. Adolescente: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-a-z/c/calendario- -nacional-de-vacinacao/calendario-vacinal-2020/calendario-de-vacinacao-2020_ado- lescente.pdf/view. Acesso em: 30 mai. 2022. Adulto e Idoso: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-a-z/c/calendario- -nacional-de-vacinacao/calendario-vacinal-2020/calendario-de-vacinacao-2020_adul- to-e-idoso.pdf/view. Acesso em: 30 mai. 2022. Gestante: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-a-z/c/calendario-na- cional-de-vacinacao/calendario-vacinal-2020/calendario-de-vacinacao-2020_gestan- tes.pdf/view. Acesso em: 30 mai. 2022. SA IB A M A IS 4. IMUNOTERAPIAS Imunoterapias são um conjunto de estratégias utilizadas no tratamento de doenças que afe- tam o funcionamento do sistema imune, como tumores, doenças autoimunes e alergias. No tratamento de tumores, as imunoterapias têm como objetivo ativar mecanismos imunológicos antitumorais, ou fornecer células e moléculas imunes que atuam na destruição do tumor. As alergias e doenças autoimunes são causadas por respostas imunológicas mal controladas ou inadequadamente direcionadas contra antígenos am- bientais ou moléculas do próprio corpo. Nestes casos, as imunoterapias têm a função de imunomodulação, inibindo respostas imunes nocivas e, em alguns casos ativando mecanismos de tolerância imunológica. O termo “tolerância imunológica” refere-se à capacidade do sistema imune de distin- guir os antígenos estranhos, que devem ser combatidos, das moléculas próprias do organismo, que devem ser toleradas. G LO SS Á R IO As imunoterapias podem ser classificadas em dois tipos: as imunoterapias ati- vas promovem a ativação (ou modulação) de respostas imunes do hospedeiro, enquanto as imunoterapias passivas fornecem ao paciente células e moléculas efetoras pré-formadas. 170 Microbiologia e Imunologia U13 Imunoprofilaxia E Imunoterapia A terapia com células T-CAR tem sido utilizada com sucesso no tratamento de al- guns tipos de tumor, incluindo mieloma, linfoma e leucemias. As células T-CAR são linfócitos T citotóxicos coletados do paciente, que tem seu receptor antigênico modi- ficado (receptor CAR, do inglês chimeric antigen receptor) para o reconhecimento do antígeno tumoral e ativação. Ao serem administradas ao paciente, as células T-CAR reconhecem as células tumorais e as destroem. As células T-CAR também têm sido avaliadas como possíveis tratamentos para doen- ças autoimunes, como o lúpus eritematoso sistêmico. SA IB A M A IS Os anticorpos monoclonais são uma ferramenta amplamente utilizada no tratamento de tumores a doenças autoimunes. Podem atuar ativando mecanismos imunológicos, como a fagocitose ou a citotoxicidade por células NK (ADCC), ou inibindo células ou moléculas imunes. Alguns anticorpos monoclonais podem ser ligados a drogas antitu- morais ou radioisótopos, promovendo o direcionamento dessas moléculas para o tumor. A Figura 3 mostra alguns exemplos de anticorpos monoclonais e suas aplicações. As imunoterapias ativas, por sua vez podem ser classificadas como inespecíficas ou específicas. As terapias inespecíficas atuam promovendo respostas inflamatórias não específicas contra os tumores, e incluem o uso de citocinas inflamatórias e substâncias adjuvantes (por exemplo, onco-BCG). As imunoterapias específicas promovem a ativa- ção de respostas imunes direcionadas contra antígenos do tumor. Exemplos incluem a injeção de células tumorais mortas ou de células apresentadoras de antígenos (como células dendríticas) transformadas com antígenos tumorais. Nos dois casos, as células são retiradas do próprio paciente, modificadas em laboratório e re-injetadas. Ao entrar no organismo, as células modificadasirão ativar linfócitos antitumorais, que atuam na destruição do tumor. No caso das alergias, a administração repetida do alérgeno em baixas doses por via subcutânea, por exemplo, pode inibir as respostas alérgicas e/ou ativar mecanismos de tolerância. As imunoterapias passivas podem ser baseadas em células ou anticorpos monoclonais. Na terapia celular adotiva, linfócitos citotóxicos ou células NK antitumorais são cole- tadas do paciente, modificadas em laboratório e re-injetadas. Ao entrar em contato com o tumor, essas células imunes promovem a destruição das células tumorais. Nesse tipo de terapia passiva, a duração do efeito é determinada pelo tempo de vida da célula de defesa injetada no paciente. U13 171Microbiologia e Imunologia Imunoprofilaxia E Imunoterapia Figura 03. Anticorpos monoclonais aprovados para o tratamento de doenças Fonte: adaptada de Abbas et al. (2021, p.95). Além de seu potencial terapêutico, os anticorpos monoclonais também são empregados no diagnóstico de diversas doenças infecciosas, na tipagem sanguínea, em estes de gravidez e na pesquisa científica. 172 Microbiologia e Imunologia U13 Imunoprofilaxia E Imunoterapia 4. ATIVIDADE PRATICA Essa atividade consistirá na elaboração de um panfleto que deverá abordar vacinas presen- tes no calendário de vacinação brasileiro. Devendo conter: contra quais patógenos a vacina protege, quais os antígenos presentes na vacina, se possui adjuvante e no caso positivo, qual, quando ela deve ser administrada (criança menor de X anos, adulto), quantas doses são necessárias para o protocolo completo, é necessário reforço de quanto em quanto tem- po. Todas as respostas, caso existam, devem estar contidas no seu panfleto. O panfleto deve ter um caráter informativo, e você poderá adicionar fotos, desenhos, tre- chos de músicas, ilustrações e utilizar tanto programas de computador, quanto papel e lápis de cor, canetinha, recortes de revistas/ jornais, etc. Neste caso, o panfleto deverá ser esca- neado para o envio. Atividade 1. REFERÊNCIAS ABBAS, Abul K.; LICHTMAN, Andrew H.; PILLAI, Shiv. Imunologia Básica - Funções e Distúrbios do Sis- tema Imunológico. 6. ed. Rio de Janeiro: Grupo GEN, 2021. ABBAS, Abul K.; LICHTMAN, Andrew H.; PILLAI, Shiv. Imunologia celular e molecular. 9. ed. Rio de Janei- ro: Elsevier, 2019. COICO, Richard; SUNSHINE, Geoffrey. Imunologia. 6. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2010. Reim- pressão 2019. DELVES, Peter J.; MARTIN, Seamus J.; BURTON, Dennis R.; ROITT, Ivan M. ROITT - Fundamentos da Imunologia. 13. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2018 EDUCANDO PARA A PAZ 174 UNIDADE 14 HIPERSENSIBILIDADES E IMUNODEFICIÊNCIAS Avaliar estratégias preventivas e terapêuticas contra patógenos na relação com doenças do sistema imune. C O M PE TÊ N C IA S 1. HIPERSENSIBILIDADES E IMUNODEFICIÊNCIAS O sistema imunológico tem a função de proteger o organismo contra o ataque dos mais diversos tipos possíveis de antígenos, mas o que acontece quando o sistema imunoló- gico falha e induz, por exemplo, a uma resposta contra tecidos do próprio hospedeiro? Ou inicia uma resposta desproporcionalmente intensa contra um antígeno? Nestas situ- ações são observadas as reações de hipersensibilidade que serão discutidas neste capítulo. Em seguida, serão abordadas as imunodeficiências, que correspondem a situações em que o sistema imunológico possui a deficiência em algum componente imunológico importante, levando a um prejuízo na resposta imunológica. 2. HIPERSENSIBILIDADE TIPOS 1-4 As hipersensibilidades são doenças causadas por respostas imunológicas mal controla- das ou erroneamente direcionadas contra antígenos próprios ou moléculas ambientais; estas respostas inadequadas são a causa do dano tecidual e funcional. As hipersensi- bilidades são divididas em 4 tipos, de acordo com o mecanismo imunológico causador das lesões (Figura 1). U14 175Microbiologia e Imunologia Hipersensibilidades e imunodeficiências Figura 01. Classificação das reações de hipersensibilidade Fonte: Abbas et al. (2021, p. 252). 176 Microbiologia e Imunologia U14 Hipersensibilidades E Imunodeficiências 2.1 REAÇÃO DE HIPERSENSIBILIDADE TIPO I A reação de hipersensibilidade do tipo I também pode ser chamada de reação de hiper- sensibilidade imediata, devido à rapidez com que a resposta é ativada e se manifesta no organismo – em geral cerca de 10 a 15 minutos. As reações de hipersensibilidade do tipo I incluem as alergias ou desordens atópicas. São um conjunto de doenças caracterizadas pela ativação de respostas com perfil Th2, produção de anticorpos da classe IgE e ativação de mastócitos. Estas células, quan- do ativadas, sofrem degranulação, liberando massivas doses de aminas vasoativas (como a histamina), mediadores lipídicos (prostaglandinas e leucotrienos) e citocinas inflamatórias (como TNF-α). Estas respostas podem se manifestar de formas diferen- tes, dependendo da quantidade de mastócitos ativados e do local de ativação, causando desde alergias respiratórias como a rinite, até reações graves e potencialmente fatais. A alergia é o tipo de hipersensibilidade mais comum no mundo; estima-se que cerca de 10 - 20% da população sofra de algum tipo de alergia, sendo que este número é maior em países mais desenvolvidos. C U R IO SI D A D E Algumas pessoas são mais propensas a desenvolverem alergias, essas pessoas são chamadas de atópicas. A atopia é influenciada por diferentes fatores, incluindo predis- posição genética e exposição a certos antígenos ambientais, chamados alérgenos. Em pessoas atópicas, o contato com um alérgeno irá induzir uma resposta que levará a diferenciação dos linfócitos T CD4+ na subpopulação Th2, com produção das citocinas IL-4, IL-5 e IL-13. Essas citocinas induzem a troca de classe no linfócito B, estimulando a produção de anticorpos da classe IgE. Também atuam na ativação de eosinófilos – outra célula que participa das reações alérgicas – e produção de muco. As reações de hipersensibilidade tipo I apresentam duas fases. No primeiro contato com o alérgeno, ocorre a etapa de sensibilização do mastócito. Nesta fase, os anti- corpos IgE produzidos pelos plasmócitos ativados pelo alérgeno são reconhecidos por receptores específicos na superfície do mastócito (e do eosinófilo), chamados recepto- res Fcε. Dessa forma, o mastócito recoberto por IgE específica para o alérgeno se torna sensibilizado para aquele alérgeno. Após uma nova exposição ao mesmo alérgeno, ocorre o reconhecimento pelos anti- corpos IgE ligados ao mastócito promovendo sua ativação e degranulação. Os mastó- citos ativados produzem dois tipos de grânulos. Os grânulos pré-formados, ricos em histamina e mediadores lipídicos (como prostaglandinas e leucotrienos), são libera- dos logo após o contato do mastócito com o alérgeno, sendo responsáveis pela fase imediata da resposta alérgica. Os grânulos neoformados, produzidos após ativação do mastócito pelo alérgeno, contêm citocinas inflamatórias (como TNF-α) e são res- ponsáveis pelos sintomas da fase tardia da resposta alérgica (Figura 2). U14 177Microbiologia e Imunologia Hipersensibilidades e imunodeficiências A histamina induz contração da musculatura lisa (como a encontrada nas vias res- piratórias e sistema digestório) e vasodilatação, que resulta em aumento da perme- abilidade vascular e edema. Como resultado, as reações alérgicas podem incluir in- chaço (resultante do edema), dificuldade respiratória (bronco-constrição) e sintomas digestivos como dores vômito e diarreia. Esses sintomas podem ser exacerbados pela liberação de mediadores lipídicos, enquanto as citocinas da fase tardia atraem células inflamatórias. Além disso, a citocina IL-13, produto da resposta Th2, aumenta a produção de muco. Embora os mastócitos sejam as principais células envolvidas com as respostas alérgi- cas, basófilos e eosinófilos também participam deste mecanismo. Figura 02. Sequência de eventos na hipersensibilidade imediata Fonte:adaptada de Abbas et al. (2021, p. 253). Diferentes tipos de alérgenos desencadeiam respostas de hipersensibilidade tipo I; essas moléculas compartilham algumas características, como baixo peso molecular e elevada biodisponibilidade. Além disso, alguns antibióticos, como a penicilina, tem a capacidade de se ligar a proteínas do hospedeiro, formando complexos hapteno-car- reador, que desencadeiam reações de hipersensibilidade. As manifestações clínicas das doenças alérgicas podem ser mais ou menos gra- ves de acordo com as características específicas dos alérgenos e de caracterís- ticas do indivíduo. A Figura 3 mostra algumas doenças causadas por reações de hipersensibilidade tipo I. 178 Microbiologia e Imunologia U14 Hipersensibilidades E Imunodeficiências Figura 03. Manifestações clínicas das reações de hipersensibilidades Fonte: Abbas et al. (2021, p. 258). 2.2 REAÇÃO DE HIPERSENSIBILIDADE TIPO II As doenças de hipersensibilidade do tipo II são caracterizadas pela produção de anti- corpos. que reconhecem e se ligam a moléculas presentes em tecidos do próprio hos- pedeiro. São, portanto, consideradas doenças autoimunes. Uma vez que estas respos- tas são direcionadas ao órgão ou tecido onde o antígeno é produzido, as doenças de hipersensibilidade tipo II são tecido-específicas. Essas reações podem ser causadas por anticorpos das classes IgM ou IgG que ao re- conhecer antígenos próprios, podem causar três efeitos distintos no organismo: 1 – Op- sonização e promoção da fagocitose; 2 – Inflamação mediada pela ligação do anticorpo ou pela ativação do sistema complemento e; 3 - Bloqueio de função do órgão ou tecido afetado. Esses efeitos podem ser vistos na Figura 4. U14 179Microbiologia e Imunologia Hipersensibilidades e imunodeficiências Figura 04. Mecanismos efetores causados pela hipersensibilidade do tipo II Fonte: Abbas et al. (2019, p. 421). Um exemplo de manifestação clínica onde os anticorpos que se ligam em tecidos pró- prios causam opsonização e ativação da fagocitose é a anemia hemolítica autoimune. Nesta doença, anticorpos se ligam a proteínas da membrana das hemácias, estimulan- do sua destruição por fagocitose e causando anemia. A febre reumática é causada pela ligação de anticorpos da classe IgG originalmente produzidos contra uma proteína presente na bactéria Streptococcus pyogenes (a prin- cipal causa bacteriana de infecções de garganta). Esses anticorpos se ligam de forma cruzada à miosina cardíaca, uma proteína presente no coração. Essa semelhança en- 180 Microbiologia e Imunologia U14 Hipersensibilidades E Imunodeficiências tre antígenos de microrganismos e proteínas próprias é conhecida como mimetismo molecular. A ligação dos anticorpos à miosina desencadeia uma reação inflamatória (miocardite) que destrói as células do tecido cardíaco. A Doença de Graves é uma doença autoimune causada pela produção de anticorpos contra o receptor do hormônio estimulador da tireoide (TSH); a ligação dos anticorpos causa uma estimulação constante do receptor, resultando em um quadro de hiperti- reoidismo, com a liberação de hormônios tiroidianos. Outros exemplos de doenças causadas por hipersensibilidade do tipo II estão mostrados na Figura 5. Figura 05. Doenças humanas mediadas por anticorpos (hipersensibilidade tipo II) Fonte: Abbas et al. (2021, p. 261). 2.3 REAÇÃO DE HIPERSENSIBILIDADE TIPO III As reações de hipersensibilidade do tipo III são doenças causadas por anticorpos das classes IgG ou IgM, que formam imunocomplexos com antígenos circulantes. Como esses comple- xos não são formados em um local específico e circulam no organismo, este tipo de hipersen- sibilidade caracteriza doenças sistêmicas. Os locais de deposição destes imunocomplexos U14 181Microbiologia e Imunologia Hipersensibilidades e imunodeficiências irão determinar o tipo de doença. Assim, se os imunocomplexos se depositarem, por exemplo, nos rins, causam nefrite; na sinóvia, artrite; e nos vasos sanguíneos, vasculite. A formação dos imunocomplexos é exemplificada na Figura 6. Figura 06. Formação de imunocomplexos na hipersensibilidade tipo III Fonte: Coico e Sunshine (2010, p. 242). 182 Microbiologia e Imunologia U14 Hipersensibilidades E Imunodeficiências As reações de hipersensibilidades do tipo III são a causa de várias doenças autoimu- nes, como o lúpus eritematoso sistêmico (LES), nesta doença, são produzidos anticor- pos contra proteínas encontradas no núcleo das células ou contra DNA, que se ligam aos antígenos-alvo formando imunocomplexos. Estes circulam no organismo, podendo se depositar em diversos locais e ativar respostas inflamatórias. Figura 07. Doenças humanas mediadas por imunocomplexos (hipersensibilidade tipo III) Fonte: Abbas et al. (2021, p. 262). 2.4 REAÇÃO DE HIPERSENSIBILIDADE TIPO IV As reações de hipersensibilidade do tipo IV envolvem a ativação de respostas celulares, com participação de linfócitos T auxiliares (Th) e citotóxicos (Tc). Em geral, essas rea- ções são formadas contra moléculas próprias, resultando em doenças autoimunes, em- bora também podem ser desencadeadas por infecções crônicas, como a tuberculose. Esse tipo de resposta imune também é conhecido como hipersensibilidade tardia, e em geral leva de 1 a 3 dias para se desenvolver, após contato com o antígeno ativador. A ativação dos linfócitos T auxiliar e sua diferenciação nas populações Th1 e Th17 leva à liberação de citocinas como o IFN-γ e IL-17, respectivamente. Ambas contribuem com a ativação de respostas inflamatórias e dano tecidual: IFN-γ promove a ativação de macrófagos, enquanto IL-17 atrai neutrófilos. Os linfócitos T citotóxicos também con- tribuem para a destruição dos tecidos afetados, por sua ação citolítica e produção de citocinas. U14 183Microbiologia e Imunologia Hipersensibilidades e imunodeficiências Assim como ocorre na hipersensibilidade tipo II, o tipo de antígeno ativador determina a doença resultante. Na esclerose múltipla, o reconhecimento de proteínas que compõem a bainha de mielina causa sua destruição, enquanto respostas inflamatórias contra an- tígenos das ilhotas do pâncreas causam diabetes tipo I. A Figura 8 contém exemplos de doenças causadas por reações de hipersensibilidade tardia. É importante salientar que estas reações não são alergias, pois o mecanismo da lesão não envolve a participação de anticorpos IgE nem mastócitos. Figura 08. Doenças humanas mediadas por células T (hipersensibilidade tipo IV) Fonte: Abbas et al. (2021, p. 266). O teste da tuberculina é utilizado no diagnóstico da tuberculose. Consiste na aplica- ção intradérmica de um preparado de antígenos da bactéria Micobacterium tuberculo- sis (PPD, do inglês purified protein derivative), que, em pessoas que tiveram contato prévio com a bactéria, promove uma resposta inflamatória local após 1 a 3 dias. Essa resposta causa uma pápula no local da aplicação, que pode ser mensurada para análise diagnóstica. SA IB A M A IS 184 Microbiologia e Imunologia U14 Hipersensibilidades E Imunodeficiências 3. IMUNODEFICIÊNCIAS CONGÊNITAS E ADQUIRIDAS Imunodeficiências são doenças resultantes de falhas nos mecanismos de defesa imu- nológica, que se caracterizam por uma maior susceptibilidade a infecções e a certos tipos de tumor. As imunodeficiências são classificadas em dois grupos: as primárias ou congênitas, e as secundárias ou adquiridas. As imunodeficiências primárias são causadas por mutações em genes envolvidos com a produção de células imunes ou seu funciona- mento. Incluem tanto defeitos na imunidade inata quanto na adaptativa, e resultam em um amplo conjunto de doenças. Mutações em genes envolvidos com a maturação dos linfócitos B e T resultam em falha na produção de linfócitos funcionais. Pacientes com esses tipos de mutação não desenvolvem respostas adaptativas adequadas. Diversos defeitos genéticos podem afetar o desenvolvimento dos linfócitos, quando LT e LB são afetados, a doença resultante é chamada de imunodeficiênciacombinada severa. De- pendendo da localização cromossômica do gene defeituoso, a doença resultante pode ser autossômica (quando o gene afetado se localiza em um cromossomo não sexual) ou ligada ao X (quando o gene defeituoso se encontra no cromossomo X). A Figura 9 inclui exemplos de imunodeficiências primárias resultantes de defeitos na maturação dos linfócitos. Figura 09. Exemplos de imunodeficiências primárias que resultam de defeitos na maturação de linfócitos Fonte: Abbas et al. (2021, p. 274). U14 185Microbiologia e Imunologia Hipersensibilidades e imunodeficiências Há imunodeficiências nas quais os defeitos genéticos não impedem a produção dos linfócitos, mas afetam seu funcionamento. Certas mutações podem afetar a ativação dos linfócitos T pelas células apresentadoras de antígenos (como a síndrome do linfó- cito nu), ou as interações entre linfócitos T e B (como a síndrome de hiper-IgM). Defeitos que afetam a imunidade inata incluem, por exemplo, a doença granulomato- sa crônica. Esta doença é consequência da falha da produção da enzima oxidase fa- gocítica, envolvida na destruição de microrganismos fagocitados. Nos pacientes com esta doença, ocorre uma falha no mecanismo de fagocitose, que resulta na formação de granulomas. Granulomas são agregados de células inflamatórias, normalmente produzidos em resposta a infecções crônicas. A persistência dos antígenos no organismo promove contínua ativação de macrófagos e células T, que foram estruturas multicelulares para tentar evitar a disseminação da infecção. Os granulomas são comuns nos pul- mões de pacientes com tuberculose, por exemplo. SA IB A M A IS Outros defeitos na imunidade inata incluem deficiências em proteínas do sistema com- plemento, impedindo a ativação adequada da cascata do complemento e resultando em maior susceptibilidade a vários tipos de infecção, e deficiência na adesão leucocitá- ria, na qual mutações em genes que codificam integrinas reduzem a capacidade dos leucócitos de migrarem para os tecidos durante infecções. As imunodeficiências secundárias são aquelas adquiridas pelo paciente como resul- tado de infecções, certos tipos de tratamento, ou deficiências nutricionais. A Figura 10 sumariza as principais causar de imunodeficiências adquiridas e o mecanismo imuno- lógico prejudicado. 186 Microbiologia e Imunologia U14 Hipersensibilidades E Imunodeficiências Figura 10. Principais causas de imunodeficiências adquiridas Fonte: Abbas et al. (2021, p. 279). O principal exemplo de imunodeficiência adquirida é a infecção pelo vírus da imuno- deficiência humana (HIV). Esse vírus infecta células que expressam a molécula CD4, como o linfócito T auxiliar (LTh), o macrófago e a célula dendrítica. Com a evolução da doença, a destruição das células infectadas pelo vírus resulta em um quadro de imuno- deficiência. Quando o número de células T se torna criticamente baixo, o paciente entra na fase final da doença, ou AIDS (SIDA, síndrome da imunodeficiência adquirida). Nes- ta fase, são comuns infecções oportunistas, que podem resultar na morte do paciente. ATIVIDADE PRÁTICA Anafilaxia MJS, 4 anos, sexo feminino, participava de um piquenique com a família no campo quando foi picada por uma abelha no antebraço esquerdo, que ficou inchado. Alguns minutos depois da picada, MJS desenvolveu dificuldade respiratória e começou a vo- mitar. Também se queixou de fraqueza generalizada. Seus pais a levaram à emer- gência, e no caminho ela perdeu a consciência. Ao chegar ao hospital, MJS foi ime- diatamente examinada. Sua pressão sanguínea estava muito baixa (40:20, sendo o normal=90:40), ela estava taquicárdica e sua respiração era superficial e rápida. Foi diagnosticada reação anafilática, e a criança foi tratada com epinefrina intravenosa, an- ti-histamínico e prednisona (um anti-inflamatório). Em 30 minutos, sua pressão voltou a normal, a pulsação diminuiu e a respiração se tornou menos forçada. Após 6 horas em observação, MJS recebeu alta e uma receita de anti-histamínico e anti-inflamatório oral para continuar o tratamento em casa. U14 187Microbiologia e Imunologia Hipersensibilidades e imunodeficiências Quais sintomas de MJS são sugestivos de uma reação anafilática? Qual a causa des- ses sintomas? Atividade 1. Quais sintomas de MJS são sugestivos de uma reação anafilática? Qual a causa desses Quais são as etapas de uma reação de hipersensibilidade tipo I, como a apresentada por MJS? Atividade 2. Por que foram prescritos anti-histamínico e anti-inflamatório à paciente? Atividade 3. 188 Microbiologia e Imunologia U14 Hipersensibilidades E Imunodeficiências CONCLUSÃO: Microbiologia é ciência que estuda os microrganismos – seres microscópicos como bactérias, fungos e vírus. O mundo microbiano afeta vários aspectos da vida cotidia- na; muitos microrganismos e seus produtos são utilizados nas indústrias de alimentos, bebidas alcóolicas, farmacêutica, etc; outros desempenham importantes papéis ecoló- gicos, atuando como decompositores de matéria orgânica. Há ainda microrganismos de importância clínica – os patógenos, responsáveis por diversas doenças de gravidade variável, como por exemplo febre hemorrágica, AIDS e Candidíase. Neste e-book, fo- ram apresentados aspectos da morfologia, estrutura, reprodução e metabolismo micro- biano, bem como técnicas de coloração e microscopia utilizadas para sua identificação e cultivo em laboratório – ferramentas importantes no diagnóstico de infecções e na pesquisa. Também foram abordados os métodos utilizados para controlar o crescimento microbiano e os mecanismos de resistência desenvolvidos pelos microrganismos, que influenciam a escolha da opção terapêutica ou técnica de assepsia mais adequada. Finalizando a primeira parte do e-book, foram abordadas as etapas do processo infec- cioso e os fatores de virulência que contribuem para a patogenicidade, superando as defesas do hospedeiro. O sistema imunológico atua na defesa do organismo, graças à sua capacidade de distin- guir o próprio (tecidos do hospedeiro) do não próprio (agentes invasores, como micror- ganismos patogênicos) e montar uma resposta contra o não próprio. Na segunda parte deste e-book, foram abordados os componentes do sistema imune, sua organização e etapas da resposta imunológica, desde a entrada do antígeno no organismo, ativação das defesas inatas, e resposta imunológica adaptativa, e seus mecanismos efetores. Foram apresentados aspectos referentes à manipulação do sistema imune, por meio da vacinação e das imunoterapias. Por fim, foram apresentadas as doenças causadas pelo funcionamento inadequado do sistema imune, incluindo as imunodeficiências – em que há falhas na maturação ou ativação de células ou moléculas de defesa – e as hipersen- sibilidades – caracterizadas por respostas imunes mal controladas ou mal direcionadas. EDUCANDO PARA A PAZ CONCLUSÃO Microbiologia é ciência que estuda os microrganismos – seres microscó- picos como bactérias, fungos e vírus. O mundo microbiano afeta vários aspectos da vida cotidiana; muitos microrganismos e seus produtos são utilizados nas indústrias de alimentos, bebidas alcóolicas, farmacêuti- ca, etc; outros desempenham importantes papéis ecológicos, atuando como decompositores de matéria orgânica. Há ainda microrganismos de importância clínica – os patógenos, responsáveis por diversas doen- ças de gravidade variável, como por exemplo febre hemorrágica, AIDS e Candidíase. Neste e-book, foram apresentados aspectos da morfologia, estrutura, reprodução e metabolismo microbiano, bem como técnicas de coloração e microscopia utilizadas para sua identificação e cultivo em laboratório – ferramentas importantes no diagnóstico de infecções e na pesquisa. Também foram abordados os métodos utilizados para contro- lar o crescimento microbiano e os mecanismos de resistência desenvol- vidos pelos microrganismos, que influenciam a escolha da opção tera- pêutica ou técnica de assepsia mais adequada. Finalizandoa primeira parte do e-book, foram abordadas as etapas do processo infeccioso e os fatores de virulência que contribuem para a patogenicidade, superando as defesas do hospedeiro. O sistema imunológico atua na defesa do organismo, graças à sua ca- pacidade de distinguir o próprio (tecidos do hospedeiro) do não próprio (agentes invasores, como microrganismos patogênicos) e montar uma resposta contra o não próprio. Na segunda parte deste e-book, foram abordados os componentes do sistema imune, sua organização e etapas da resposta imunológica, desde a entrada do antígeno no organismo, ativação das defesas inatas, e resposta imunológica adaptativa, e seus mecanismos efetores. Foram apresentados aspectos referentes à mani- pulação do sistema imune, por meio da vacinação e das imunoterapias. Por fim, foram apresentadas as doenças causadas pelo funcionamento inadequado do sistema imune, incluindo as imunodeficiências – em que 191 REFERÊNCIAS ABBAS, Abul K.; LICHTMAN, Andrew H.; PILLAI, Shiv. Imunologia Básica - Funções e Distúrbios do Sis- tema Imunológico. 6. ed. Rio de Janeiro: Grupo GEN, 2021. ABBAS, Abul K.; LICHTMAN, Andrew H.; PILLAI, Shiv. Imunologia celular e molecular. 9. ed. Rio de Janei- ro: Elsevier, 2019. COICO, Richard; SUNSHINE, Geoffrey. Imunologia. 6. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2010. Reim- pressão 2019. DELVES, Peter J.; MARTIN, Seamus J.; BURTON, Dennis R.; ROITT, Ivan M. ROITT - Fundamentos da Imunologia. 13. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2018. há falhas na maturação ou ativação de células ou moléculas de defesa – e as hipersensibilidades – caracterizadas por respostas imunes mal controladas ou mal direcionadas. EDUCANDO PARA A PAZcomo os ribossomos, responsáveis pela síntese de proteínas. ` Nucleóide: É a região da célula procariótica onde se localiza o DNA bacteriano, que ge- ralmente é único e circular. ` Plasmídeo: São moléculas de DNA extracromossômicos, que não estão ligados ao DNA bacteriano principal. Incluem genes que não são essenciais para sobrevivência de bacté- rias, mas que conferem vantagens seletivas, como resistência a um antibiótico ou metal pesado, por exemplo. ` Flagelo: Uma estrutura alongada, permite a locomoção da célula bacteriana. Podem ser únicos ou múltiplos, localizados, em geral, na região polar das células. É importante res- saltar que apenas algumas espécies de bactérias contêm flagelo. ` Fímbrias: São filamentos proteicos menores e mais numerosos que os flagelos, au- xiliam no processo de adesão aos tecidos e participam do processo de conjugação bacteriana (pilus). ` Ribossomos: Estão presentes em células procarióticas e eucaróticas, atuando na síntese proteica. 17 Microbiologia e Imunologia U1 Características Gerais Dos Microrganismos: Bactérias, Fungos E Vírus ` Parede celular: É uma estrutura externa à membrana plasmática, responsável pela ma- nutenção da forma das bactérias, além de influenciar o processo de divisão celular. É composta por peptideoglicanos – moléculas formadas por unidades de N-acetilglicosami- na e ácido N-acetil murâmico ligadas, formando uma rede. ` Cápsula: É uma estrutura presente em algumas espécies bacterianas, localizada exter- namente à parede celular. Funciona como reservatório de água, facilita o processo de adesão e invasão nos tecidos e dificulta a ação do sistema imune. As bactérias normalmente se reproduzem por fissão binária, isso significa que uma célula dá origem a duas células iguais. Em termos nutricionais, a maioria das bactérias utiliza compostos orgânicos como fonte de energia, mas é importante ressaltar que al- gumas bactérias são capazes de fabricar seu próprio alimento através da realização da fotossíntese (ex.: cianobactérias) e outras obtêm alimentos de compostos inorgânicos. 2.2 FUNGOS A ciência responsável por estudar os fungos é chamada de micologia. Por um longo período, os fungos foram considerados como vegetais, porém em 1969, os fungos foram inseridos em seu próprio reino denominado Fungi. São compostos por células eucariontes, podendo ser unicelulares (leveduras) ou multicelulares (fungos filamentosos). Apresentam parede celular composta por quitina (o que difere da parede celular das bactérias). A forma de reprodução dos fungos pode ser assexuada ou sexuada. São aeróbios ou anaeróbios facultativos, e de- gradam compostos orgânicos para obtenção de energia. Os fungos apresentam duas formas: ` Leveduras: Unicelulares, com forma esférica alongada e reprodução por brotamento (Figura 2). Figura 02. Leveduras em brotamento - (Micrografia Saccharomyces cerevisiae) Fonte: adaptada de Tortora et al. (2017, p. 323). ` Fungos filamentosos: São os bolores e apresentam estrutura na forma de filamentos, U1 18Microbiologia e Imunologia Características Gerais Dos Microrganismos: Bactérias, Fungos E Vírus sendo multicelulares (Figura 3). Figura 03. Características das hifas dos fungos - A- Hifas septadoas e B- Hifas sem septos (cenocíticas) Fonte: adaptada de França e Leite (2018, p. 139). Alguns fungos, classificados com dimórficos, podem se apresentar na forma de leveduras ou filamentosos, dependendo das condições ambientais (temperatura e concentração de CO2). O crescimento dos fungos depende de condições ambientais como a temperatura, umi- dade, quantidade de luz e pH (4-7), concentrações de O2 e CO2, macronutrientes (Ex.: Cálcio e Magnésio) e micronutrientes (Ex.: Zinco e fósforo). A parede celular dos fungos atua na proteção da célula, promove manutenção da forma e induz a produção de anticorpos, sendo composta por quitina, carboidratos e cadeias lon- gas de polissacarídeos, além de apresentar lipídeos e glicoproteínas. A membrana plas- mática dos fungos atua como barreira semipermeável no transporte de substâncias além de conter esteróis como o ergosterol, uma molécula inerente a esse grupo de organismos. A forma de reprodução fúngica é variada; as leveduras se reproduzem por brotamen- to, enquanto os fungos filamentosos podem se reproduzir de forma sexuada ou asse- xuada, sendo os esporos a unidade reprodutiva desses dois processos. 19 Microbiologia e Imunologia U1 Características Gerais Dos Microrganismos: Bactérias, Fungos E Vírus FUNGOS BACTÉRIAS Tipo de célula Eucariótica Procariótica Membrana celular Esteróis presentes Esteróis ausentes (exceto Myco- plasma) Parede celular Glicanos, mananas e quitina Peptideoglicano Metabolismo Limitado a heterotrófico, aeróbio e anaeróbio facultativo Heterotrófico, autotrófico, aeróbio, anaeróbio facultativo e anaeróbio Quadro 03. Principais diferenças entre fungos e bactérias Fonte: adaptada de Tortora et al. (2017, p. 321). Para se aprofundar sobre o assunto, acesse o acervo digital e faça a leitura da Uni- dade 3 do livro Micologia e virologia, tópico “Características reprodutivas dos fungos”. Fonte: FRANÇA, Fernanda S.; LEITE, Samantha B. Micologia e virologia. SAGAH EDUCAÇÃO S.A., 2018. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/ books/9788595026827/. Acesso em: 08 abr. 2022.SA IB A M A IS Existem diversas espécies de fungos patogênicos, que causam desde micoses tópicas (na pele ou unhas) até infecções sistêmicas graves e potencialmente fatais. Os fungos patogênicos têm a capacidade de penetrar nos tecidos, casando dano tecidual. Duas características são consideradas mecanismos de patogenicidade dos fungos: a primei- ra é o dimorfismo, que permite que os fungos cresçam de duas formas distintas (levedu- riforme/filamentoso) e a segunda é sua elevada resistência contra oxidantes presentes nas células de defesa. Os fungos também interferem na produção de citocinas e dimi- nuem a atividade exercida por macrófagos. Exemplos de fungos patogênicos incluem Criptococcus spp.; Aspergillus spp e Rhizopus spp. Além dos fungos de importância clí- nica, há espécies que infectam plantas, causando graves prejuízos econômicos, como por exemplo Sclerotium rolfsii, que causa o apodrecimento de folhas e frutos que ficam em contato direto com solo sob condições de umidade. Diversas espécies de fungos são utilizadas na indústria alimentícia. Alguns deles, como shitake, shimeji e cogumelo paris, são iguarias muito apreciadas em diversos países, enquanto as leveduras, graças à sua ação fermentativa, são utilizadas na fabricação de bebidas alcoólicas, laticínios, pães, etc. Os fungos também desempenham um im- portante papel biológico, atuando como agentes decompositores de matéria orgânica. Fique atento e memorize! Principais diferenças entre bactérias e fungos a partir dos dados do Quadro 3. U1 20Microbiologia e Imunologia Características Gerais Dos Microrganismos: Bactérias, Fungos E Vírus 3. VÍRUS Os vírus são diferentes dos grupos mencionados anteriormente, sendo tão pequenos que sua visualização só é possível utilizando a microscopia eletrônica. Não seguem o sistema de classificação em ordens, famílias, subfamílias, gênero e espécie. Definir os vírus como seres vivos ou não é uma polêmica na literatura, já que não possuem a or- ganização básica de uma célula, nem são capazes de se reproduzir sozinhos. Por essa razão, alguns autores designam os vírus como partículas subcelulares. Outros pes- quisadores afirmam que os vírus são seres vivos, pois apresentam a características inerentes a seres vivos, como a capacidade de reprodução (usando a maquinaria da célula hospedeira), mutação e evolução, além de apresentam material genético. Ambas justificativas são descritas e apresentadas nas principais referências de microbiologia. Todos os vírus são parasitas intracelulares obrigatórios, pois dependem da maquinaria da célula hospedeira para multiplicação. Além disso, os vírus não apresentammetabolismo ativo fora de uma célula, logo não produzem sua própria energia e proteínas. Uma partícula viral completa recebe a denominação de vírion e inclui o material genético – que pode ser DNA ou RNA, recoberto por um capsídeo formado por proteínas. Alguns vírus também possuem um envelope externo ao capsídeo, composto por lipídeos e pro- teínas (Figura 4). Dessa forma, a estrutura dos vírus é composta de: ` Capsídeo: É uma capa proteica de diferentes formatos que compreende a maior parte da massa viral, tendo como função proteger o material genético. Cada capsídeo e composto por uma subunidade de proteína denominada capsômero. ` Ácido nucleico: Nos vírus podem ser encontrados DNA ou RNA, sendo esse sentido positivo ou sentido negativo. ` Envelope: Alguns vírus apresentam envelope constituído de lipídeos, proteínas e carboi- dratos; o envelope envolve o capsídeo. Figura 04. A- Morfologia de um vírus poliédrico não envelopado. B- Morfologia de um vírus helicoidal envelopado Fonte: adaptada de Tortota et al. (2017, p. 361). 21 Microbiologia e Imunologia U1 Características Gerais Dos Microrganismos: Bactérias, Fungos E Vírus Os vírus podem infectar qualquer classe de seres vivos, incluindo bactérias, plantas e animais. Os vírus que infectam bactérias são chamados de bacteriófagos. O ciclo infeccioso de um bacteriófago se inicia com a adsorção do vírus à bactéria, através de receptores específicos de superfície. Em seguida, ocorre a penetração, que consiste na injeção do DNA viral na célula bacteriana. A etapa seguinte, de biossíntese, envolve a produção de moléculas virais pela célula. Essas moléculas são agrupadas compondo as partículas virais completas na etapa de maturação e, por fim, ocorre a liberação dos vírus recém-formados e morte de célula. Este ciclo é chamado de ciclo lítico. Os vírus também podem apresentar um ciclo conhecido como lisogênico, no qual o material genético viral se funde ao genoma bacteriano e permanece latente, multiplicando-se a cada ciclo reprodutivo da bactéria. O ciclo lisogênico pode ser mantido até que o mate- rial genético do vírus é ativado e entra no ciclo lítico. A Figura 05 sumariza os ciclos lítico e lisogênico de infecção viral. Figura 05. Ciclo lítico e Ciclo lisogênico de infecção viral 1 4A 2 3A 5 3B DNA do fago (fita dupla). O fago adsorve a célula hospedeira e injeta seu DNA. Cromossomo bacteriano. Ocasionalmente, o profago pode ser removido do cromossomo bacteriano por outro evento de recombinação, iniciando um ciclo lítico. Muitas divisões celulares Ciclo lisogênico 4B A bactéria lisogênica se reproduz normalmente Profago Por um processo de recombinação, o DNA do fago se integra ao cromossomo bacteriano e se torna um profago. O DNA do fago circulariza e entra em ciclo lítico ou lisogênico ou Lise celular e liberação de novos vírions. O DNA e as proteínas dos novos fagos são sintetizados e montados, formando novos vírions. Ciclo lítico Fonte: adaptada de Tortota et al. (2012, 371). Os vírus que infectam células animais possuem um ciclo ligeiramente diferente dos bacteriófagos. Nestes, durante a penetração, o capsídeo viral também entra na célula. Em seguida, ocorre uma etapa conhecida como desnudamento, onde o capsídeo se desorganiza e libera o material genético do vírus. As demais etapas prosseguem como mostrado na Figura 6. U1 22Microbiologia e Imunologia Características Gerais Dos Microrganismos: Bactérias, Fungos E Vírus Figura 06. Multiplicação dos vírus animal Fonte: adaptada de Tortota et al. (2012, p. 375). Diversos vírus são capazes de infectar células humanas e causar doença. Exemplos de vírus de RNA incluem os vírus da poliomielite, COVID-19, HIV, raiva, gripe, sarampo, ebola, entre outros; os vírus de DNA que causam infecção em humanos são, por exem- plo, herpes-vírus e o vírus HPV (papilomavirus). Fique atento e memorize! Principais diferenças entre bactérias e vírus BACTÉRIAS VÍRUS Parasita intracelular Algumas espécies Sim Membrana plasmática Sim Não Reprodução por fissão binária Sim Não Passagem por filtros bacterio- lógicos Não Sim Possui DNA e RNA Sim Não (apenas um tipo de material genético) Metabolismo de geração de ATP Sim Não Ribossomos Sim Não Sensíveis a antibióticos Sim Não Quadro 04. Diferenças entre Bactérias e vírus Fonte: adaptada de Tortota et al. (2017, p. 359). 23 Microbiologia e Imunologia U1 Características Gerais Dos Microrganismos: Bactérias, Fungos E Vírus 3. EXERCÍCIO COMENTADO Antes dos experimentos de Louis Pasteur, acreditava-se que os organismos vivos surgiam de matéria não-viva, por verem moscas surgindo do estrume e larvas surgindo de animais mortos e por observarem microrganismos em líquidos depois de um ou dois dias. Fonte: TORTORA, Gerard J.; FUNKE, Berdell R.; CASE, Christine L. Microbiologia. ARTMED, 2017. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788582713549/. O enunciado refere-se a qual teoria? O experimento de Louis Pasteur contribuiu para divulgação de qual teoria? Explique as etapas desse experimento. O enunciado refere-se a teoria da abiogênese, conhecida como geração espontânea. Os cientistas que defendiam esta teoria acreditavam que os microrganismos se originavam a partir de plantas e tecidos de diversos animais mortos. O experimento de Louis Pasteur de- monstrou a impossibilidade da geração espontânea. Pasteur demonstrou que os microrganis- mos estão presentes no ar e podem contaminar soluções estéreis. Ele encheu vários frascos, que tinham a abertura em forma de pescoço curto, com caldo de carne e, então, ferveu o conteúdo. Alguns deles ele deixou que esfriassem abertos. Em poucos dias, esses frascos estavam contaminados com micróbios. Os outros frascos, lacrados após a fervura, estavam livres de microrganismos. A partir desses resultados, Pasteur fundamentou que os micróbios do ar eram os agentes responsáveis pela contaminação da matéria não viva. Pasteur, em se- guida, colocou caldo em frascos de pescoço longo, com abertura terminal, e dobrou os pes- coços, formando curvas no formato de um S. Os conteúdos dos frascos foram então fervidos e resfriados. O meio de cultura nos frascos não apodreceu e não apresentou sinais de vida, mesmo após meses. O modelo único criado por Pasteur permitia que o ar entrasse no frasco, mas o pescoço curvado capturava todos os microrganismos do ar que poderiam contaminar o meio de cultura. Pasteur mostrou que os microrganismos podem estar presentes na matéria não viva – sobre sólidos, em líquidos e no ar. Além disso, ele demonstrou conclusivamente que a vida microbiana pode ser destruída pelo calor e que métodos podem ser idealizados com o objetivo de bloquear o acesso dos microrganismos do ar aos meios nutrientes. Essas descobertas formam a base das técnicas de assepsia, que previnem a contaminação por microrganismos indesejáveis e que agora são práticas rotineiras para muitos procedimentos médicos e em laboratórios. Exercício 1. Resposta: U1 24Microbiologia e Imunologia Características Gerais Dos Microrganismos: Bactérias, Fungos E Vírus 4. ATIVIDADES PRÁTICAS Microbiologia é ciência que estuda os microrganismos, ou seja, os seres vivos minúsculos que só podem ser vistos por meio do microscópio. Alguns microrganismos são considerados patogênicos. O que seria um microrganismo patogênico? a. É um microrganismo com capacidade de causar doença. b. É um microrganismo que não apresenta capacidade de causar doença. c. É um microrganismo que faz parte da microbiota de determinado tecido. d. É um microrganismo que faz parte da microbiota, mas com capacidade em causar doença. e. É um microrganismo com fatores de virulência. Atividade 1. Durante muito tempo, os fungos foram considerados como vegetais e, somente a partir de 1969, passaram a ser classificados como um reino à parte denominado Fungi, sendo a Mico- logia é a ciência que estuda os fungos. Sobre os fungos é correto afirmar que: a.Sua parede celular é composta por peptideoglicano. b. Sua parede celular é composta por glicanos, mananas e quitina. c. Suas células são procarióticas. d. Sua membrana celular não apresenta esteróis. e. Apresentam esporos não reprodutivos. Atividade 2. 25 Microbiologia e Imunologia U1 Características Gerais Dos Microrganismos: Bactérias, Fungos E Vírus Os vírus são seres muito simples e pequenos, visíveis apenas por meio de microscopia eletrônica Sobre os vírus é correto afirmar que: I. Não apresenta membrana plasmática. II. São parasitas intracelulares obrigatórios. III. Ficam retidos por filtros bacteriológicos. IV. São sensíveis a antibióticos. V. Não se multiplicam por fissão binária. Está correto o que se afirma em: a. I, III e V b. Somente II c. I, II e V d. II e V e. II e IV Atividade 3. Em um sistema de nomenclatura descrito por Carolus Linnaeus (1735), cada organismo vivo é identificado por dois nomes, seguindo regras específicas. Qual das opções abaixo estão respeitando as regras de nomenclatura para microrganismos? A- Mycobacterium Tuberculosis. B- Bacilo da tuberculose. C- Escherichia Coli D- ESCHERICHIA COLI E- Mycobacterium tuberculosis. Atividade 4. U1 26Microbiologia e Imunologia Características Gerais Dos Microrganismos: Bactérias, Fungos E Vírus Os vírus são partículas que apresentam material genético, DNA ou RNA, que podem ser de fita dupla ou simples, envolto por um capsídeo. A morfologia do capsídeo varia de uma es- pécie de vírus para outra. Os bacteriófagos apresentam uma cabeça icosaédrica e um corpo cilíndrico. Ainda apresentam estruturas adicionais como uma cauda que faz a ligação do vírus com a superfície da célula hospedeira. Levando em consideração o conhecimento em relação aos bacteriófagos, assinale a alterna- tiva que descreve corretamente o modo de replicação dos bacteriófagos: A- Os bacteriófagos são vírus que infectam células humanas e podem se replicar utilizando dois processos: 1- Ciclo lítico, no qual a célula hospedeira morre ao final da replicação. 2- Ciclo lisogênico, no qual a célula hospedeira permanece viva. B- Os bacteriófagos são vírus que infectam células bacterianas, e podem se replicar por fissão binária, onde uma partícula viral duplica seu material genético e em seguida se divide, gerando dois vírus idênticos. C- Os bacteriófagos são vírus que infectam células bacterianas, e podem se replicar utilizan- do dois processos: 1- O ciclo lisogênico em que se recombina com o DNA bacteriano. 2- Ciclo lítico, se multiplica e leva à produção de novos fagos, causando a morte da célula bacteriana durante sua liberação. D- Os bacteriófagos são vírus que infectam células bacterianas, e podem se replicar utilizan- do por dois processos: 1-Ciclo lítico, no qual a célula hospedeira permanece viva ao final da replicação.2- Ciclo lisogênico, no qual a célula hospedeira morre. E- Os bacteriófagos são vírus que infectam células animais, e podem se replicar utilizando dois processos: 1- O ciclo lisogênico em que se recombina com o DNA bacteriano. 2- Ciclo lítico, se multiplica e leva à produção de novos fagos, causando a morte da célula bacteriana durante sua liberação. Atividade 5. REFERÊNCIAS BLACK, Jacqueline G. Microbiologia - Fundamentos e Perspectivas. Grupo GEN, 2021. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788527737326/. Acesso em: 22 mar. 2022. TORTORA, Gerard J.; FUNKE, Berdell R.; CASE, Christine L. Microbiologia. ARTMED, 2017. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788582713549/. Acesso em: 22 mar. 2022. FRANÇA, Fernanda S.; LEITE, Samantha B. Micologia e virologia. SAGAH EDUCAÇÃO S.A., 2018. Dispo- nível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788595026827/. Acesso em: 22 mar. 2022. TORTORA, Gerard J.; FUNKE, Berdell R.; CASE, Christine L. Microbiologia. ARTMED, 2012. EDUCANDO PARA A PAZ 28 UNIDADE 2 MORFOLOGIA, ASPECTOS DA MICROSCOPIA E COLORAÇÕES USADAS EM MICROBIOLOGIA 1. MORFOLOGIA E ARRANJO BACTERIANO As bactérias são seres muito pequenos; enquanto uma célula humana possui ente 10 e 100 μm (lê-se micrômetros), a maioria das bactérias varia de 0,5 a 2,0 μm. A presença da parede celular faz com que as bactérias apresentem formas variáveis, sendo as mais comuns: esférica (coco), alongada (bacilo), curvada (vibrião) e espiral (espirilo e es- piroqueta), como mostra a Figura 01. Cocos, bacilos, vibriões e espirilos apresentam estrutura rígida, enquanto as espiroquetas são flexíveis. Figura 01. Formas mais comuns em bactérias Fonte: adaptada de Black (2021, p. 80). Certas células bacterianas, incluindo cocos e bacilos, podem ainda se organizar, for- mando arranjos característicos. Os arranjos mais comuns incluem células organizadas em duplas, cadeias ou cachos de uva. Assim, cocos organizados em duplas são diplo- cocos. em cadeias, estreptococos, e em cachos de uva, estafilococos. É importante ressaltar que existem inúmeras variações de arranjos. A Figura 2 apresenta os arranjos mais comuns de bactérias. Identificar as propriedades morfológicas, fisiológicas e de patogenicidade dos microrganismos. C O M PE TÊ N C IA S U2 29Microbiologia e Imunologia Morfologia, Aspectos Da Microscopia E Colorações Usadas Em Microbiologia Figura 02. Arranjos de bactérias Fonte: elaborada pelo autor. O estudo da morfologia e organização celular auxilia no processo de identificação das bactérias, pois as bactérias de uma determinada espécie apresentam forma e arranjo característicos. Por exemplo, a bactéria Escherichia coli possui a forma de bacilo isola- do, enquanto Streptococcus pneumoniae apresenta-se como cocos organizados em duplas, ou seja, diplococos. Entretanto, alguns microrganismos podem apresentar alteração em seu arranjo quando cultivados em laboratório. 1.1. BACTÉRIAS GRAM-POSITIVAS E GRAM-NEGATIVAS Além da morfologia e arranjo, as bactérias podem ser classificadas por meio das carac- terísticas da parede celular em dois grandes grupos: Gram-positivas e Gram-negativas. A parede celular das bactérias Gram-positivas é composta basicamente por peptideo- glicano, formado por açúcares e aminoácidos, e constitui até 75% de camada ao redor da célula. Ácidos teicoicos e lipoteicoicos também podem ser encontrados ao longo da parede celular das bactérias Gram-positivas. Esses ácidos podem atuar facilitando a entrada e saída de cátions das células bem como regular a atividade da autolisina, uma enzima que tem como função degradar a camada de peptideoglicano da bactéria durante o processo de divisão celular. Na parede celular das bactérias Gram-negativas, a camada de peptideoglicano é mais fina, e os ácidos teicóicos e lipoteicóicos não estão presentes. Entretanto, a parede celular desse grupo de bactérias é mais complexa. Um espaço periplasmático separa a membrana plasmática da membrana externa, composta por proteínas, lipoproteínas, fosfolipídeos e lipopolissacarídeos (LPS). O LPS é formado por lipídeos e açúcares que variam de espécie para espécie; atua como endotoxina promovendo respostas inflama- tórias e causando febre. É importante ressaltar que a maioria das bactérias de importância clínica possuem a parede celular típica (Gram-positivas e Gram-negativas). No entanto, existem bactérias com parede celular atípica, como as micobactérias, e bactérias sem parede celular, tais como micoplasmas. Observe no Quadro 1 a classificação das bactérias com relação à parede celular. 30 Microbiologia e Imunologia U2 Morfologia, Aspectos Da Microscopia E Colorações Usadas Em Microbiologia Bactérias com parede celular típica ` Gram-positivas ` Gram-negativas Bactérias com parede celular atípica ` Micobactérias ` Espiraladas ` Clamídias ` Riquétsias Quadro 01. Grupos de bactérias com relação à parede celular Fonte: elaborado pelo autor. 2. COLORAÇÕES USADAS EM MICROBIOLOGIA Uma vez que as bactérias são, em sua maioria, transparentes, não é possível observar a sua estruturaou arranjo sem o auxílio de uma coloração. Logo, técnicas de colora- ções são muito úteis no laboratório de microbiologia, especialmente a coloração de Gram, pois permite a visualização da maioria das bactérias de importância clínica. A coloração de Gram foi desenvolvida em 1884 pelo médico dinamarquês Hans Chris- tian Gram. Esse método baseia-se na capacidade das paredes celulares das bactérias reterem, ou não, o corante. Assim, as bactérias com capacidade de reter um dos co- rantes utilizados na técnica foram denominadas Gram-positivas e as bactérias que não retém o corante, Gram-negativas. A coloração de Gram não é a única técnica de coloração utilizada para a visualização de bactérias. Acesse o acervo digital e conheça outros métodos de coloração para visualizar bactérias de parede celular atípica. Fonte: TORTORA, Gerard J.; FUNKE, Berdell R.; CASE, Christine L. Microbiologia. Porto Alegre: Grupo Artmed, 2017. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca. com.br/#/books/9788582713549/. Acesso em: 29 mar. 2022. SA IB A M A IS 2.1. PREPARANDO ESFREGAÇO PARA COLORAÇÃO DE GRAM Para que as bactérias possam ser coradas, primeiramente estas devem ser espalhadas sobre uma lâmina, procedimento denominado esfregaço, e posteriormente fixadas por meio do calor da chama de um bico de Bunsen. Esse procedimento simples precisa ser realizado com cuidado, pois, caso as bactérias não sejam fixadas de maneira adequada sobre a lâmina, poderão ser descartadas durante a técnica de coloração. U2 31Microbiologia e Imunologia Morfologia, Aspectos Da Microscopia E Colorações Usadas Em Microbiologia Passo a passo Esfregaço 01. Esterilizar a alça bacteriológica no bico de Bunsen; 02. Coletar uma gota de solução salina estéril com a alça bacteriológica; 03. Colocar a gota de solução salina no centro de uma lâmina pré-identificada; 04. Esterilizar a alça bacteriológica novamente, esperar a alça esfriar; 05. Coletar 2 a 3 colônias de bactéria, com a mesma morfologia, da placa de petri; 06. Espalhar as colônias na gota de solução salina fazendo movimentos circulares até secar; 07. Passar a lâmina sobre a chama do bico de Bunsen para fixar as células. 2.2. TÉCNICA DE COLORAÇÃO DE GRAM Após o preparo do esfregaço, as células bacterianas devem receber um tratamento com corantes, fixador e descorante, para serem visualizadas, com o auxílio de um mi- croscópio óptico, e diferenciadas em Gram-positivas ou Gram-negativas. A primeira etapa do processo consiste em cobrir o esfregaço da lâmina com um corante roxo, denominado cristal violeta ou violeta genciana. Neste estágio todas as células adquirem a coloração roxa proveniente do corante. A segunda etapa corresponde na cobertura do esfregaço com uma solução de lugol. Este atua como um mordente, formando um complexo com o cristal violeta, fixando o corante no citoplasma das células. A terceira etapa da técnica implica lavar o esfregaço com uma solução de álcool-ace- tona. Nesse estágio, a espessa camada de peptideoglicano, presente na parede ce- lular das bactérias Gram-positivas sofrerá um ressecamento e fará com que o corante cristal violeta permaneça dentro das células. Por outro lado, a camada de LPS da membrana externa das bactérias Gram-negativas será dissolvida, fazendo com que o corante seja excluído das células. Esta é etapa diferencial da coloração de Gram, na qual as bactérias Gram-negativas permanecem roxas, enquanto as Gram-positivas perdem a coloração. A etapa final consiste na aplicação de um contra corante rosado, que pode ser fucsina ou safranina, sobre o esfregado. As bactérias Gram-positivas permanecem com a cor roxa (Figura 3 A), enquanto as Gram-negativas se coram de vermelho (Figura 3 B). 32 Microbiologia e Imunologia U2 Morfologia, Aspectos Da Microscopia E Colorações Usadas Em Microbiologia Figura 03. Coloração de bactérias Gram-positivas e Gram-negativas Fonte: adaptada de Canva. É importante ressaltar que alguns corantes de Gram podem ter tonalidades diferentes. Portanto, as bactérias Gram-positivas podem apresentar coloração roxo-azulada, en- quanto bactérias Gram-negativas são observadas na cor rósea-avermelhada. Passo a passo Coloração de Gram 01. Cobrir o esfregaço com o corante Cristal Violeta por 1 minuto; 02. Descartar o corante e lavar o esfregaço com água destilada; 03. Cobrir o esfregaço com Lugol por 1 minuto; 04. Lavar o esfregaço com água destilada; 05. Lavar o esfregaço com uma solução de Álcool-acetona; 06. Lavar o esfregaço com água destilada; 07. Cobrir o esfregaço com contra-corante Fucsina por 30 segundos; 08. Lavar o esfregaço com água destilada; 09. Esperar a lâmina secar em posição vertical; 10. Observar a lâmina em microscópio óptico. U2 33Microbiologia e Imunologia Morfologia, Aspectos Da Microscopia E Colorações Usadas Em Microbiologia Na Figura 4, é possível observar o que acontece nas células durante as etapas da coloração de Gram. Figura 04. Coloração das bactérias nas etapas da coloração de Gram Gram + Gram - Esfregaço Cristal Violeta Lugol Álcool-Acetona Fuscina Fonte: elaborada pelo autor. 3. TÉCNICAS EM MICROSCOPIA As técnicas de microscopia permitem o aumento de imagens, através da luz ou feixes de elétrons que incidem sobre uma amostra e passam por um conjunto de lentes ob- jetivas e oculares. A formação de imagens pelos microscópios fundamenta-se em um sistema de lentes combinadas, que são colocadas de forma a ampliar a imagem de objetos microscópicos. A microscopia de luz, representada pelo microscópio óptico, possui objetivas de 4, 10, 40 e 100x. Valores que, quando multiplicados pela ampliação das lentes oculares (10x), ampliam o objeto analisado em 40, 100, 400 e 1000x, respectivamente. Nesse tipo de microscópio, o limite de resolução é de 200 nm, sendo possível observar microrganis- mos como: bactérias, fungos e protozoários. A figura 05 mostra os tipos de objetivas mais utilizadas na microscopia óptica. Em linhas gerais, os seguintes componentes ópticos do microscópio participam, direta ou indiretamente, na formação da imagem ampliada do objeto na retina do observador: Fonte de luz, lente condensadora, lentes objetivas e lente ocular. 34 Microbiologia e Imunologia U2 Morfologia, Aspectos Da Microscopia E Colorações Usadas Em Microbiologia Figura 05. Tipos de objetivas na microscopia óptica 4x 10X 40X 100X Fonte: elaborada pelo autor. Os componentes mecânicos do microscópio estabilizam o sistema de lentes que repro- duzem a imagem. A porção mecânica do microscópio é constituída pelos seguintes itens: I. base, com função estabilizadora; II. parafusos macro e micrométrico, que permitem a movimentação da base para cima e para baixo, promovendo o ajuste grosso (macrométrico) e fino (micrométrico) do foco; III. haste, onde estão articuladas todas as outras porções do microscópio; IV. charriot, que possibilita o movimento da lâmina no sentido horizontal; v) mesa, que cor- responde à plataforma de suporte da amostra a ser analisada; V. revólver de objetivas que suportam as lentes objetivas; VI. canhão, que comporta duas lentes oculares na porção superior do microscópio. Na Figura 6 é possível observar as partes mecânicas e ópticas de um microscópio óptico. U2 35Microbiologia e Imunologia Morfologia, Aspectos Da Microscopia E Colorações Usadas Em Microbiologia Figura 06. Componentes mecânicos e ópticos do microscópio óptico 1. Base 2. Fonte de luz 3. Parafusos macro e micrométrico 4. Haste 5. Leite condensadora 6. Mesa 7. Charriot 8. Lentes objetivas 9. Revólver de objetivas 10. Canhão 11. Lente ocular Fonte: adaptada de Carvalho (2019, p. 46). Os princípios que regem a microscopia eletrônica são os mesmos descritos para a mi- croscopia de luz; entretanto, ao invés de luz, feixes de elétrons incitam a amostra para a formação da imagem. Além disso, enquanto as lentes de microscópios ópticos são de vidro, microscópicos eletrônicos possuem lentes eletromagnéticas. A microscopiaeletrônica possui um limite de resolução de ampliação de um objeto de até 0,2 nm, permitindo a visualização de detalhes estruturais das células e a visualização de vírus. Passo a passo Focalização em microscópio óptico 01. Ligue o microscópio; 02. Coloque a lâmina sobre a platina e prenda com a presilha; 03. Movimentando o charriot, coloque o material na direção da luz; 04. Certifique-se que a lente de 4x está posicionada; 05. Suba a mesa movimentando o macrométrica até travar; 06. Olhando pelas oculares, abaixe lentamente a mesa com macrométrico até a ima- gem ficar nítida; 36 Microbiologia e Imunologia U2 Morfologia, Aspectos Da Microscopia E Colorações Usadas Em Microbiologia 07. Utilize o micrométrico, se necessário, para ajustar o foco da imagem; 08. Posicione a objetiva de 10x e gire o micrométrico para ajustar o foco; 09. Posicione a objetiva de 40x e gire o micrométrico para ajustar o foco; 10. Antes de posicionar a objetiva de 100x, pingue uma gota do óleo de imersão sobre a amostra. Isso evita o risco na lente e permite uma melhor visualização. 11. Após terminar, limpe a objetiva de 100 x e a lâmina com éter. Assista ao vídeo Coloração de Gram Disponível em: https://drive.google.com/file/d/1QyTd-AXzS2TGcaDioqVoHfJjTYnhm- BmC/view?usp=sharing. Acesso em: 28 jun. 2022 SA IB A M A IS 4. EXERCÍCIO COMENTADO A coloração de Gram, é um método de coloração de bactérias desenvolvido pelo médico dinamarquês Hans Christian Gram em 1884, o qual permite diferenciar bactérias a partir das colorações que estas adquirem após tratamento com agentes químicos específicos. O mé- todo consiste em tratar sucessivamente um esfregaço bacteriano, fixado pelo calor, com os reagentes cristal violeta, lugol, álcool-acetona e fucsina. Em qual estrutura das bactérias o reagente de Gram reage? Quais grupos de bactérias é possível observar após a coloração de Gram? Além da coloração, que outros aspectos im- portantes são possíveis observar nas bactérias. A coloração de Gram é uma técnica que permite diferenciar bactérias com diferentes estru- turas de parede celular a partir das colorações que estas adquirem após tratamento com agentes químicos específicos. Assim, é possível observar e diferenciar bactérias em dois diferentes grupos: Gram-positivas e Gram-negativas. Além da diferenciação pela cor, outros aspectos, tais como: morfologia e arranjo, são possíveis após a confecção da técnica. Exercício 1. Resolução U2 37Microbiologia e Imunologia Morfologia, Aspectos Da Microscopia E Colorações Usadas Em Microbiologia 5. ATIVIDADES PRÁTICAS Em relação à classificação das bactérias: 1. Bactérias esféricas agrupadas em cadeia recebem o nome de estafilococos. 2. Bacilos organizados em dupla são denominados diplobacilos. 3. A coloração de Gram tem o intuito de corar a membrana plasmática das bactérias. 4. Bactérias Gram-negativas apresentam uma parede celular de grande complexidade. 5. A camada de peptideoglicano está presente na parede celular das bactérias Gram-positi- vas e Gram-negativas. Assinale a alternativa que classifica, na ordem correta, as afirmações abaixo (1 a 5), como verdadeiras ou falsas: a. 1 (F); 2 (V); 3 (F); 4 (V); 5 (V). b. 1 (F); 2 (V); 3 (F); 4 (V); 5 (F). c. 1 (V); 2 (V); 3 (F); 4 (V); 5 (F). d. 1 (F); 2 (V); 3 (V); 4 (V); 5 (V). e. 1 (V); 2 (F); 3 (V); 4 (V); 5 (V). Atividade 1. Durante uma aula prática de coloração de Gram, um estudante identificou bactérias com for- ma arredondada, de coloração roxa, organizadas em arranjos complexos, semelhantes a ca- chos de uva. Concluiu tratar-se de estafilococos Gram-negativos. A conclusão do aluno está: a. Parcialmente correta, pois se trata de estafilococos Gram-positivos. b. Parcialmente correta, pois se trata de estreptococos Gram-negativos. c. Totalmente correta, pois se trata de estafilococos Gram-negativos. d. Totalmente errada, pois se trata de estreptococos Gram-positivos. e. Parcialmente correta, pois se trata de estafilobacilos Gram-negativos. Atividade 2. 38 Microbiologia e Imunologia U2 Morfologia, Aspectos Da Microscopia E Colorações Usadas Em Microbiologia A técnica de coloração de Gram utiliza uma série de lavagens e incubações sequenciais para distinguir as bactérias em dois grandes grupos, Gram-positivas e Gram-negativas. A lavagem com álcool-acetona compreende uma das etapas da coloração de Gram. Esta etapa é im- portante porque: a. A lavagem com álcool-acetona remove o LPS da parede celular das bactérias Gram-nega- tivas, permitindo a saída do corante roxo. b. A lavagem com álcool-acetona remove os açúcares da parede celular das bactérias Gram- -positivas, permitindo a saída do corante roxo. c. A lavagem com álcool-acetona remove os açúcares da parede celular das bactérias Gram- -negativas, permitindo a saída do corante roxo. d. A lavagem com álcool-acetona remove o LPS da parede celular das bactérias Gram-nega- tivas, permitindo a entrada do corante roxo. e. A lavagem com álcool-acetona remove os açúcares da parede celular das bactérias Gram- -positivas, permitindo a entrada do corante roxo. Atividade 3. Durante o procedimento da coloração de Gram, um microbiologista inverteu a sequência dos corantes e submeteu a amostra à solução de álcool-acetona antes de adicionar a amostra no lugol. Com base na morfologia de bactérias e o objetivo da técnica de Coloração de Gram, qual é a consequência da distração do profissional? Assinale a alternativa correta. a. Por conta desse erro, as bactérias Gram-positivas serão descoradas pela ação do álco- ol-acetona. b. As bactérias serão coradas normalmente, pois, o lugol é um corante que não faz nenhuma diferença na coloração de Gram. c. Por conta desse erro, as bactérias Gram-negativas não serão coradas pelo lugol. d. As bactérias permanecerão com o corante, pois, o álcool-acetona pode ser adicionado em qualquer etapa da coloração de Gram. e. Apesar desse erro, o lugol também funciona como descorante e com isso consegue retirar o excesso de cristal violeta das células. Atividade 4. U2 39Microbiologia e Imunologia Morfologia, Aspectos Da Microscopia E Colorações Usadas Em Microbiologia A técnica de coloração de Gram é muito útil e muito usada em microbiologia. A técnica é simples, rápida e tem capacidade de identificar bactérias patogênicas classificadas de acordo com a composição da parede celular em Gram-positivas ou Gram-negativas. Sobre a colora- ção de Gram marque a alternativa CORRETA: a. Nas primeiras etapas, as bactérias Gram-positivas e Gram-negativas absorvem de manei- ra idêntica o cristal violeta e o lugol. b. Bactérias Gram-positivas e Gram-negativas apresentam o mesmo comportamento ao se- rem tratadas com o álcool. c. Ao receber o lugol, as bactérias Gram-negativas são coradas na cor avermelhada do corante. d. Ao receber a fucsina, as bactérias Gram-positivas adquirem uma coloração rosada. e. As bactérias Gram-positivas adquirem coloração rosa proveniente do violeta genciana e as Gram-negativas coloração violeta. Atividade 4. REFERÊNCIAS BLACK, Jaqueline G.; Microbiologia: fundamentos e perspectivas. 10. ed. Rio de Janeiro: GUANABARA KOOGAN, 2021. CARVALHO, Hernandes F.; RECCO-PIMENTEL, Shirlei M. A Célula. 4. ed. Barueri: MANOLE, 2019. TORTORA, Gerard J.; FUNKE, Berdell R.; CASE, Christine L. Microbiologia. Porto Alegre: ARTMED, 2017. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788582713549/. Acesso em: 22 mar. 2022. TORTORA, Gerard J.; FUNKE, Berdell R.; CASE, Christine L. Microbiologia. Porto Alegre: ARTMED, 2012. TRABULSI, Luiz R.; ALTERTHUM. Microbiologia. 6. ed. São Paulo: Atheneu, 2015. EDUCANDO PARA A PAZ 41 UNIDADE 3 METABOLISMO E CULTIVO MICROBIANO RELAÇÃO DAS COMPETÊNCIAS Reconhecer estratégias de controle de crescimento microbiano com base nos mecanismos de ação e resistência. 1. METABOLISMO MICROBIANO Todos os seres vivos, incluindo as bactérias, necessitam de energia para sobreviver e se reproduzir. A somatória de todos osprocessos químicos efetuados por organismos vivos recebe o nome de metabolismo. Existem dois tipos de processos metabóli- cos básicos: o catabolismo, no qual macromoléculas são quebradas em componentes mais simples com liberação de energia, e o anabolismo, que inclui as reações com gasto de energia, para formar moléculas mais complexas a partir das mais simples. O processo anabólico é utilizado para o crescimento, reprodução e reparação das células e o catabólico disponibiliza ao organismo energia necessária para realização de even- tos consideradas indispensáveis, como motilidade, transporte e a produção de molécu- las complexas. A Figura 1 representa a relação entre catabolismo e anabolismo. Figura 01. Metabolismo: Anabolismo e Catabolismo Moléculas maiores Moléculas menores Energia Fonte: elaborada pelo autor. As enzimas são fundamentais para o metabolismo celular. São responsáveis por cata- lisar as reações químicas, convertendo substratos em produtos. Elas atuam reduzin- do a energia de ativação das reações químicas. Para exercer sua função catalítica, algumas enzimas necessitam da participação de moléculas denominadas cofatores; estes podem ser inorgânicos (como os íons metálicos) ou orgânicos (carreadores de elétrons, como FAD, NAD+ e NADP+. É importante ressaltar que sem energia algumas reações não aconteceriam, mesmo com a presença de enzimas. U3 42Microbiologia e Imunologia Metabolismo E Cultivo Microbiano A energia das células é armazenada na forma da molécula trifosfato de adenosina (ATP). Assim, a quebra da molécula de ATP libera energia para a célula. ` Enzimas: Facilitam as reações metabólicas; ` ATP: Utilizado pelos microrganismos e outras células para obtenção de energia; ` Catabolismo: Reações acopladas à síntese de ATP; ` Anabolismo: Reações acopladas à quebra do ATP.FI Q U E AT EN TO ! Os microrganismos podem obter energia a partir de diversos processos metabólicos, e então armazená-la na forma de ATP. De acordo com a forma como os organismos obtém energia, podem ser classificados em: ` Fototróficos: obtêm energia a partir da luz; ` Quimiotróficos: obtêm energia a partir de compostos químicos orgânicos ou inorgânicos. Além da fonte de energia, os microrganismos precisam de uma fonte de carbono, que pode ser uma molécula orgânica, como um carboidrato, ou inorgânica, como CO2 (di- óxido de carbono). De acordo com a fonte de carbono que utilizam, os microrganismos podem ser classificados em: ` Autotróficos: organismos com capacidade de produzir seu próprio alimento, utilizando CO2 para gerar moléculas orgânicas; ` Heterotróficos: necessitam de moléculas orgânicas já sintetizadas para utilizar como ali- mento, pois não são capazes de produzir seu próprio alimento. Assim, os microrganismos que obtêm energia a partir da quebra de compostos orgâni- cos podem ser classificados como quimioheterotróficos, enquanto aqueles que utilizam luz e CO2 para produção de energia são chamados fotoautotróficos. A figura 2 sumariza a diversidade metabólica dos microrganismos. 43 Microbiologia e Imunologia U3 Metabolismo E Cultivo Microbiano Figura 02. Classificação nutricional dos organismos Fonte: adaptada de Tortora et al. (2017, p. 138). 1.1 CATABOLISMO DE CARBOIDRATOS Os microrganismos utilizam como principal fonte energética o catabolismo dos carboi- dratos, sendo a glicose o carboidrato de preferência para realização deste processo. Além disso, muitos microrganismos podem catabolizar lipídeos e proteínas para suprir a necessidade energética. Para produzir energia a partir da molécula de glicose, os microrganismos utilizam dois processos: Respiração celular e fermentação. Ambos se iniciam da mesma forma, com a quebra da molécula de glicose em um processo chamado de glicólise e, a partir deste ponto, seguem percursos diferentes. A respiração da glicose envolve três etapas: 1- Glicólise, 2-Ciclo de Krebs e 3-Cadeia transportadora de elétrons. A Figura 3 apresenta as reações da a partir da glicólise diferenciando as etapas distintas para respiração e fermentação. U3 44Microbiologia e Imunologia Metabolismo E Cultivo Microbiano Figura 03. Reações de glicólise; Respiração e Fermentação Fonte: adaptada de Tortora et al. (2017, p. 120). A glicólise é a etapa em que ocorre a oxidação da glicose em ácido pirúvico, produzindo ATP e NADH. No Ciclo de Krebs, ocorre a oxidação de acetil-CoA (oriundo do ácido pirúvico) em dióxido de carbono (CO2), com produção de ATP, NADH e FADH2. Na ca- deia transportadora de elétrons, NADH e FADH2 sofrem oxidação, fornecendo elétrons que são transportados dos substratos por meio de reações de oxido-redução. A energia liberada destas reações é utilizada para gerar ATP. Na respiração celular, a maior parte do ATP é produzido na terceira etapa. Se o microrganismo necessita de oxigênio para seus processos metabólicos, é definido como aeróbio e aquele que não utiliza oxigênio, anaeróbio. Existem ainda organismos definidos como anaeróbio facultativos, que utilizam oxigênio quando este está dispo- nível, mas sobrevivem na ausência. A respiração celular pode ser classificada como aeróbica – quando o aceptor final de elétrons da cadeia transportadora é o oxigênio ou anaeróbica – quando o aceptor final de elétrons é outra molécula inorgânica diferente do O2, como nitrato ou sulfato ou, em raros casos, uma molécula orgânica. A respiração anaeróbica resulta em uma menor produção de ATP do que a aeróbica. 45 Microbiologia e Imunologia U3 Metabolismo E Cultivo Microbiano O processo de fermentação ocorre na ausência de oxigênio (O2). A etapa inicial con- siste no processo de glicólise, porém não há Ciclo de Krebs nem cadeia transportadora de elétrons; o piruvato oriundo da glicólise é transformado em um produto orgânico. A quantidade de ATP gerado é menor do que na respiração, sendo, portanto, um pro- cesso com rendimento energético menor. Há dois tipos de fermentação: fermentação ácida, que gera ácido láctico e fermentação alcóolica, que produz etanol. A primeira é realizada por bactérias do gênero Streptococcus e Lactobacillus, denominadas homo- láticas (produzem somente ácido láctico). A fermentação do ácido láctico pode resultar na deterioração de alimentos; porém, também é utilizada para produção de alimentados fermentados, como iogurte, chucrute e picles. A fermentação alcoólica é efetuada por diversas bactérias e fungos (leveduras). As leveduras do gênero Saccharomyces, como resultado final do seu metabolismo energético, produzem etanol e CO2; o etanol é o álcool das bebidas alcoólicas e o dióxido de carbono é utilizado para o crescimento da massa do pão. Alguns organismos conseguem produzir tanto o ácido láctico quanto o etanol, e por isso recebem a denominação de heteroláticos. Acesse o acervo digital e diferencie as etapas do processo de fermentação do ácido lático e fermentação alcoólica. Capítulo 5- Metabolismos microbiano. Fonte: TORTORA, Gerard J.; FUNKE, Berdell R.; CASE, Christine L. Microbiologia. Grupo A, 2017. 9788582713549. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca. com.br/#/books/9788582713549/.SA IB A M A IS PRODUTO DA FERMENTAÇÃO USO COMERCIAL MICRORGANISMO Etanol Cerveja, vinho Saccharomyces cerevisiae Ácido acético Vinagre Acetobacter Ácido láctico Queijo e iogurte Lactobacillus, Streptococcus Ácido láctico Pão de centeio Lactobacillus delbrueckii Acetona e butanol Uso farmacêutico e industrial Clostridium acetobutylicum Quadro 01. Aplicações industriais para diferentes tipos de fermentações Fonte: adaptado de Tortora et al. (2017, p. 132). 2. CRESCIMENTO MICROBIANO O termo crescimento para microrganismos não se refere ao tamanho, mas sim ao au- mento do número de células que ocorre através da divisão. As bactérias, ao crescerem, multiplicam-se e se acumulam formando colônias; uma colônia bacteriana é formada por centenas ou milhares de células microbianas. U3 46Microbiologia e Imunologia Metabolismo E Cultivo Microbiano