Prévia do material em texto
Teorias de Personalidade 4ª edição Rio de Janeiro UVA 2016 Barbara Angelica dos Santos Monteiro Carissimi 4ª edição Rio de Janeiro UVA 2016 Teorias de Personalidade Copyright © UVA 2014 Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida por qualquer meio sem a prévia autorização desta instituição. Texto de acordo com as normas do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa. ISBN 978-85-65812-41-2 Autoria do Conteúdo Barbara Angelica dos Santos Monteiro Carissimi Design Instrucional Diana Ferreira de Melo Wagner G. A. Destro Projeto Gráfico UVA Diagramação Cristina Lima Revisão Tássia Braga Janaina Vieira Ficha Catalográfica elaborada pelo Sistema de Bibliotecas da UVA. Biblioteca Maria Anunciação Almeida de Carvalho. C277t Carissimi, Barbara Angelica dos Santos Monteiro. Teorias de personalidade [livro eletrônico] / Barbara Angelica dos Santos Monteiro Carissimi. – 4. ed. – Rio de Janeiro : UVA, 2016. 357 KB. ISBN 978-85-65812-41-2 Disponível também impresso. 1. Personalidade. I. Universidade Veiga de Almeida. II. Título. CDD – 155.2 SUMÁRIO Apresentação...............................................................................................................7 Sobre a autora...............................................................................................................8 Capítulo 1 - A Gestão de Pessoas sob a ótica da Psicologia.........................................................................9 Definição, histórico e objeto da Psicologia...................................10 A Psicologia Social e a Psicologia Organizacional.....................18 A Gestão de RH pela ótica da Psicologia....................................25 Referências......................................................................................................30 Capítulo 2 - A personalidade e suas implicações no mundo do trabalho........................................................33 O conceito de personalidade...............................................................34 Os elementos e fatores determinantes da personalidade.......38 A influência da personalidade nas relações de trabalho.........44 Referências......................................................................................................50 Capítulo 3 - Teorias de personalidade: as perspectivas básicas da personalidade...............................................53 Perspectivas biológicas, behavioristas e da aprendizagem.....54 Perspectivas cognitivas e sociocognitivas do traço e da personalidade...........................................................................................62 Perspectivas humanista e existencial, perspectiva interacionalista pessoa-situação.........................................................66 Perspectivas analítica e neoanalíticas..............................................70 Referências......................................................................................................77 Capítulo 4 - Transtornos de personalidade................79 Conceito e tipos de transtornos de personalidade.......................80 Análise e encaminhamento de soluções para os problemas de desempenho nas organizações causados por transtornos de personalidade.......................................................................................96 Referências...................................................................................................102 Considerações finais....................................................103 7 APRESENTAÇÃO APRESENTAÇÃO Este livro trata de Teorias de Personalidade, a área da Psicologia que estuda e procura explicar as particularidades humanas que influenciam o comportamento. A personalidade pode ser definida como o conjunto de características que determinam os padrões pessoais e sociais de uma pessoa, sendo a sua formação um processo gradual, complexo e único para cada indivíduo. No senso comum, o termo “personalidade” é usado para descrever características marcantes de uma pessoa, po- rém tal conceito também está relacionado às mudanças de habilidades, atitudes, crenças, emoções, desejos e ao modo constante e particular do indivíduo perceber, pensar, sentir e agir, além da interferência de fatores culturais e sociais nessas características. Ao final da leitura desta obra, você terá, portanto, aprendido a re- conhecer a contribuição da Psicologia para a Gestão de Pessoas, a identificar processos básicos do comportamento social no trabalho, a analisar as principais teorias da personalidade e a descrever trans- tornos a fim de solucionar problemas de desempenho funcional de colaboradores em empresas. Desejamos que você aproveite ao máximo esta experiência e que a leitura desta obra promova uma oportunidade de reflexão sobre os conteúdos abordados, contribuindo efetivamente para o seu enrique- cimento cultural e acadêmico. ...................................................................................................................................................................................................................... 8 SOBRE A AUTORA Barbara Angelica dos Santos Monteiro Carissimi é graduada em Psi- cologia pela Pontifícia Universidade Católica – PUC-RJ (1997), mestre em Psicanálise, Saúde e Sociedade pela Universidade Veiga de Almeida – UVA (2008) e pós-graduada em Gestão de Recursos Humanos pela Universidade Gama Filho – UGF (2002). É sócia-diretora da Prominen- ce Consulting, consultoria em Educação Corporativa, com mais de 15 anos de experiência em Recursos Humanos em empresas de diversos segmentos. Na UVA, é professora do MBA presencial de Gestão de Re- cursos Humanos e autora e tutora da disciplina Treinamento e Desen- volvimento Organizacional do MBA a distância de Gestão de Recursos Humanos. Possui experiência em ministrar aulas, como professora convidada, em cursos e eventos de graduação em Psicologia na UVA e na Celso Lisboa, e também na Imersão do MBA em Gestão do Conheci- mento (MBKM) – CRIE/COPPE/UFRJ. 9Definição, histórico e objeto da Psicologia ...................................................................................................................................................................................................................... CAPÍTULO 1 A GESTÃO DE PESSOAS SOB A ÓTICA DA PSICOLOGIA O gestor de Recursos Humanos atua no planejamento e gerenciamento de processos de recursos humanos, pro- movendo ações para o desenvolvimento de competências comportamentais e funcionais. Seu papel envolve, dentre outras coisas, promover a melhoria dos processos organi- zacionais gerindo o clima organizacional, conflitos e inte- resses das pessoas e da empresa. Compreender as vertentes do comportamento humano pela ótica do saber da Psicologia é essencial para o exercí- cio da função de forma segura e eficaz. A Gestão de Pessoas sob a ótica da Psicologia10 ...................................................................................................................................................................................................................... DEFINIÇÃO, HISTÓRICO E OBJETO DA PSICOLOGIA Em algum momento de nossas vidas nos perguntamos: Quais são as minhas qualidades e defeitos? O modo como me relaciono com as pessoas é adequado? Sou feliz?Faço as pessoas felizes? Sei lidar bem com os meus medos, conflitos e limitações? Enfim, são perguntas como essas que nos fazem refletir sobre quem somos. Em outros momentos, refletimos sobre o bem e o mal, a paz e a guerra, a solidariedade e o desprezo, a capacidade e a dificuldade de amar, o poder destrutivo do ser huma- no, entre outras questões. Teles (1991, p. 7) nos mostra que a “investigação sobre a natureza humana antecede, talvez, a História escrita e a própria Filosofia. Esta, como ato reflexivo, é tão antiga quanto o Homem”. Segundo Schultz (1975, p. 7), “parece que o homem sempre se fascinou pelo seu próprio comportamento e as reflexões sobre a natureza e a conduta humanas enchem muitos vo- lumes filosóficos e teológicos”. 11Definição, histórico e objeto da Psicologia ...................................................................................................................................................................................................................... Podemos concluir que as mesmas perguntas que nos fazemos hoje já foram feitas há muitos séculos. A Psicologia (psico, do grego, psykhé, significa “psique”, “alma”, “mente” e logia, do grego, lógos, “palavra”, “razão” ou “estudo”) é uma ciência que busca recursos para com- preender a natureza humana. Para Teles (1991, p. 9), a Psi- cologia “procura compreender o Homem, seu comporta- mento, para facilitar a convivência consigo próprio e com o outro. É, pois, a Ciência do Comportamento”. Tal defini- ção foi concebida por William McDougall1 em 1908. Porém, muitas coisas antecederam essa definição. Vejamos! Como ciência, a Psicologia nasceu no momento em que o homem passou a utilizar recursos científicos, tais como: a observação e experimentação controladas criteriosa- mente, para estudar a natureza humana. Schultz (1975, p. 7-9) explica que, nesse momento, a Psicologia se tornou independente de seus antecedentes filosóficos. “Sabemos que boa parte da herança da Psicologia provém da Filoso- fia.” Ou seja, “para romper com a Filosofia, a Psicologia tinha que desenvolver um método mais preciso e objetivo de tratar seus problemas”, refinando “suas ferramentas, técnicas e métodos de estudo, a fim de adquirir cada vez maior precisão e objetividade tanto em suas respostas como em suas interrogações”. Ou seja, descobrir as per- guntas certas para buscar respondê-las. Considera-se que, no final do século XIX, a Psicologia co- meçou a surgir como um campo distinto de investigação. 1 Psicólogo inglês nascido em Chadderton, Lancashire, criador da teoria do funcionalismo. A Gestão de Pessoas sob a ótica da Psicologia12 ...................................................................................................................................................................................................................... Wilhelm Wundt, médico, filósofo e psicólogo alemão, é con- siderado um dos fundadores da moderna psicologia experi- mental, ao lado de Ernst Heinrich Weber (médico anatomis- ta e fisiologista alemão) e Gustav Theodor Fechner (cientista alemão). Wundt, em 1879, foi responsável por estabelecer, na Alemanha, o primeiro laboratório psicológico do mundo! E ainda fundou, em 1881, a primeira revista científica de psicologia, intitulada Philosophische Studien. Diante desse novo cenário, o campo da Psicologia cresceu e ganhou mais espaço. Nos Estados Unidos, a Psicologia também estava encontrando o seu lugar. Em 1888, sur- ge a primeira docência em Psicologia no mundo. Schultz (1975, p. 8) mostra que “antes desse tempo, os psicólogos eram nomeados para os departamentos de Filosofia”. O primeiro professor de Psicologia foi James McKeen Cattel, da Universidade da Pensilvânia. E não parou por aí! Em 1887, G. Stanley Hall fundou a primeira revista psicológica americana, chamada de Ame- rican Journal of Psychology. Schultz (1975, p. 8) relata que “vinte e quatro laboratórios psicológicos e três revistas de Psicologia” foram criadas nos EUA entre 1880 e 1895. Araújo (2008, p. 6-7) relata que a década de 1960 “foi impor- tante para a Psicologia [no Brasil] pela conquista de sua au- tonomia e pelo reconhecimento da profissão de psicólogo, regulamentada pela Lei nº 4.119, de 27 de agosto de 1962, que estimulou a criação de novos cursos, assim como con- solidou o ensino da Psicologia nos cursos superiores”. Europa – século XIX. EUA – século XIX. Brasil – década de 1960. 13Definição, histórico e objeto da Psicologia ...................................................................................................................................................................................................................... Porém, voltemos ao início de tudo... Voltemos a Wundt para contar essa história! “Sozinho, ele determinou o objeto de estudo, o método apropriado de pesquisa, os tópicos a cujo respeito a pes- quisa devia ser realizada e os objetivos dessa nova ciên- cia, a sua nova ciência. E, assim, durante algum tempo, a Psicologia foi moldada à sua imagem e semelhança” (Schultz, 1975, p. 14). Nessa época, a Filosofia e a Fisiolo- gia eram os campos dominantes e fontes de conhecimen- to. Nesse sentido, preservava-se o vocabulário cartesiano de René Descartes (1596–1650). Descartes e sua “teoria do dualismo psíquico — distinção entre corpo e mente — impregnou as ideias da época e influenciou toda a Psicologia posterior. [...] Desta forma, durante algum tempo, a Psicologia continuou sendo o es- tudo da mente ou da consciência” (TELES, 1991, p. 10). Como falamos, em 1879 surge a Psicologia como disci- plina, pelas mãos de Wundt, porém, não se falava ain- da de comportamento, mas tão somente de mente e de consciência. Teles (1991, p. 13) enfatiza a primazia do “vocabulário cartesiano, distinguindo-se, de um lado, a consciência — sede das percepções, ideias, sentimentos e motivos — e, de outro, os movimentos”. Porém, como afirma Schultz (1975, p. 14), “em poucos anos, a situação da Psicologia mudou radicalmente e muitas controvérsias e cisões ganharam corpo entre o número crescente de psicólogos. [...] Alguns psicólogos contestaram a versão de Wundt de Psicologia e propuse- A Gestão de Pessoas sob a ótica da Psicologia14 ...................................................................................................................................................................................................................... ram suas próprias concepções”. Sendo assim, no início do século XX, “ocorre um rompimento com o dualismo implícito da Psicologia, então definida como a ciência do psiquismo ou dos fatos da consciência” (TELES, 1991, p. 13), com o aparecimento de diferentes posições sistemá- ticas ou escolas psicológicas de pensamento, tais como: Estruturalismo, Funcionalismo, Behaviorismo, Gestaltis- mo e Psicanálise. Schultz (1975, p. 14-15) explica que “o termo ‘escola’ re- fere-se a um grupo de psicólogos que se associaram ideo- logicamente e, por vezes, geograficamente, ao líder de um movimento. [...] O surgimento de diferentes escolas de pensamento e seu subsequente declínio é uma das carac- terísticas mais impressionantes da história da Psicologia”. Lopes (2004, p. 75) relata que “brigas epistemológicas sé- rias ocorreram entre as diversas abordagens psicológicas — emergentes no decorrer do século XX — na tentativa de definir um espaço de verdade e saber a respeito do real sentido de ‘ser humano’’. Cabe comentar, porém, que esse fenômeno não é exclu- sivo da psicologia. Sabemos que um novo paradigma, quando provadocientificamente, leva à rejeição do an- terior dominante. Essa verdade, entretanto, pode ser di- fícil demais para os velhos cientistas, grandes homens da ciência, muito comprometidos com suas crenças e posições. E esse continua sendo um grande desafio para a ciência. 15Definição, histórico e objeto da Psicologia ...................................................................................................................................................................................................................... Schultz (1975, p. 15) cita o físico Max Plank sobre essa si- tuação da ciência: “A nova verdade científica não triunfa porque convença os seus opositores e os faça ver a luz, mas porque os seus opositores acabarão morrendo de velhos.” Vale registrar que cada uma das escolas de pensamento que surgiram naquela época, mesmo que por um curto período de tempo, contribuiu para o desenvolvimento da Psicologia, fornecendo as ferramentas, métodos e esque- mas fundamentais para constituir esse campo. Teles (1991, p. 15), entretanto, afirma que conceber a Psi- cologia como uma ciência “que se baseia principalmente no método experimental, seria empobrecê-la por demais, já que o Homem é um ser especial da natureza”. Aceita-a, en- tão, “como uma ciência que não tem condições de usar sem- pre os métodos tradicionais das chamadas ciências exatas”. Vale ressaltar, ainda, que o objeto de estudo da psicolo- gia é o sujeito e o seu comportamento. Porém, o estudo do comportamento animal para fins de pesquisa e corre- lação, na área da psicologia comparada, também desem- penhou um papel importante. Teles (1991, p. 15) afirma que o estudo do comportamento de animais, como ratos e chimpanzés, ofereceu conhecimentos interessantes na compreensão das bases do comportamento humano. “Ge- reralizar, porém, como regra, as reações animais para o Homem, seria ignorar a peculiaridade deste ser capaz de criar cultura, emocionar-se, perceber o que se passa com seus iguais e sentir com eles.” A Gestão de Pessoas sob a ótica da Psicologia16 ...................................................................................................................................................................................................................... Para Teles (1991, p. 17), “como estudo científico do com- portamento, a Psicologia deve procurar alcançar três obje- tivos: a descrição, a predição (ou previsão) e o controle do comportamento”. Na tabela abaixo, encontramos as diferenças entre esses três objetivos do estudo científico do comportamento: 1ª etapa Descrição Descrever o comportamento de um indivíduo significa, em primeiro lu- gar, o desenvolvimento de métodos de observação e análise que sejam o mais possível objetivos e, em seguida, utilizar esses métodos para o levanta- mento de dados confiáveis. A obser- vação e a análise do comportamento podem ocorrer em diferentes níveis — desde complexos padrões de com- portamento, como a personalidade, até a simples reação de uma pessoa a um sinal sonoro ou visual. 2ª etapa Previsão As previsões em psicologia procuram expressar, com base nas explicações disponíveis, a probabilidade com que um determinado tipo de comporta- mento ocorrerá ou não. Com base na capacidade dessas explicações de pre- ver o comportamento futuro se deter- mina também a sua validade. 3ª etapa Controle Controlar o comportamento significa aqui a capacidade de influenciá-lo, com base no conhecimento adquiri- do. Essa é a parte mais prática da psi- cologia, que se expressa, entre outras áreas, na psicoterapia. 17Definição, histórico e objeto da Psicologia ...................................................................................................................................................................................................................... A Psicologia é um saber fascinante Nasceu do interesse em se explicar o comportamento hu- mano, na tentativa de um controle social para se viver em um mundo melhor, previsível, ideal. Hoje, preocupa-se em pensar o sujeito em sua subjetividade e trocas simbólicas com o outro e o meio. Sujeito este que problematiza, ques- tiona e desafia a própria Psicologia, colocando-a em mo- vimento. O saber da Psicologia se torna multidisciplinar, sem perder sua singularidade, mas relacionando-se com as ciências humanas (Filosofia, Teoria do conhecimento), biológicas (Biologia, Neurofisiologia, Psicofarmacologia), sociais (Sociologia, Antropologia) e, porque não dizer, com as exatas (Ergonomia, Psicofísica). Psicologia é ciência e profissão! Gera uma prática profis- sional. Uma prática que coloca o conhecimento por ela acumulado por meio da ciência a serviço de indivíduos e instituições. Assim, como deve ser com todas as ciências, é uma forma- ção que estimula o aluno à pesquisa, ensinando-o a pergun- tar, a construir o conhecimento e a buscar novas respostas. Para nós, o conhecimento deve ser ensinado em sua histó- ria, ou melhor, como histórico, isto é, como um saber cons- truído para responder às questões que norteiam um de- terminado momento da sociedade, evidenciando que um saber não se finda, deve estar em constante movimento. 18 ...................................................................................................................................................................................................................... A Gestão de Pessoas sob a ótica da Psicologia A PSICOLOGIA SOCIAL E A PSICOLOGIA ORGANIZACIONAL Neste tópico, esperamos que você aprenda a definir os conceitos de Psicologia Social e Psicologia Organizacional. Apresentaremos, a seguir, os conceitos de Psicologia So- cial e Psicologia Organizacional para nos aproximarmos cada vez mais da compreensão do processo de gestão de pessoas sob a ótica da Psicologia. Psicologia Social Retomando a história da Psicologia vista no tópico ante- rior, podemos situar o surgimento da Psicologia Social no século XX. Do ponto de vista cronológico, o advento da Psicologia Social se aproxima do surgimento da própria Psicologia enquanto ciência independente. A Psicologia Social surgiu na Europa, porém, com a neces- sidade de migração de estudiosos europeus para a Améri- ca do Norte no período entre guerras, a Psicologia Social eclodiu nos Estados Unidos. Araújo (2008, p. 1) afirma que “a Psicologia Social apare- ce em 1908, com a publicação de Social Psychology, de Edward Ross, e An Introduction to Social Psychology de William McDougall. Ross, de orientação sociológica, fazia referência a conceitos como mente coletiva, costumes so- ciais, opiniões sociais e conflitos. McDougall dizia que as 19A Psicologia Social e a Psicologia Organizacional ...................................................................................................................................................................................................................... características sociais e o comportamento se baseavam na natureza biológica, ideia em que a Psicologia Social se apoiou em seu desenvolvimento”. Aroldo Rodrigues, psicólogo social brasileiro e autor res- peitado de diversas obras, define a Psicologia Social como uma ciência cujo objeto é o estudo das “manifestações comportamentais suscitadas pela interação de uma pes- soa com outras pessoas ou pela mera expectativa de tal interação” (RODRIGUES, 1981). Podemos conceber a Psicologia Social como um saber apli- cado da psicologia que faz uma interface com as demais ciências humanas, tais como a Sociologia e a Antropologia. Os cientistas sociais espanhóis José Luis Álvaro e AliciaGarrido, professores e autores do livro Psicologia Social - Perspectivas Psicológicas e Sociológicas (2007, São Paulo: McGraw-Hill), afirmam que “a Psicologia, cuja pre- tensão inicial foi o estudo científico da mente, teve que assumir de súbito que a mente humana não surge nem se desenvolve em um vazio social, se não que é produ- to da interseção da pessoa dentro de uma coletividade. O mesmo se pode dizer da conduta individual. A Sociologia, por sua parte, que surgiu com a pretensão de converter-se no estudo científico da sociedade, tampouco pode ignorar em suas análises a existência de fatores psicológicos ou individuais que influem no comportamento social” (ÁLVA- RO; GARRIDO, 2004, p. 7). [Tradução livre]. Nesse sentido, para esses estudiosos, seria a Psicologia Social o encontro entre esses dois saberes, uma vez que não é possível con- ceber o indivíduo separado da sociedade. 20 ...................................................................................................................................................................................................................... A Gestão de Pessoas sob a ótica da Psicologia Araújo (2008, p. 6) esclarece que “a Psicologia Social, até o início dos anos 1960, parecia que daria respostas a todos os problemas sociais, mas foi atravessada por uma polê- mica em torno de seu caráter teórico e ideológico, ocasio- nando uma crise”. Tal crise foi chamada de “crise da Psi- cologia Social”, causada pela ausência de uma “base sólida de conhecimentos estruturada na realidade social e nas vi- vências cotidianas”. Baseado nas produções da Psicologia Social americana, esse saber foi questionado na América Latina por não enxergar as características histórico-sociais de outras populações. “Tendo em vista que o contexto so- cial da América Latina não era o mesmo dos Estados Uni- dos, surge a necessidade de uma nova proposta de Psico- logia Social, que atendesse às necessidades da sociedade latino-americana, com suas características próprias.” Dian- te disso, a Psicologia Social brasileira voltou-se para ques- tões relevantes e exclusivas ao nosso contexto social. Strey (1998) afirma que “não há a possibilidade do huma- no sem ser no social”. O indivíduo é um ser relacional, dia- lógico, que nasce dependendo dos cuidados do outro para sobreviver. Essa dependência — não mais de seus cuida- dos para sobreviver, mas de se relacionar com o outro — prosseguirá por toda a sua existência. Não são incomuns relatos de idosos que são encontrados mortos, sozinhos em suas moradias, depois de dias do óbito. A necessidade de se relacionar é vital. O abandono, a falta do outro, pode ser mortal. É importante destacar que, para a Psicologia, o sujeito se constrói a partir das relações com o outro. 21A Psicologia Social e a Psicologia Organizacional ...................................................................................................................................................................................................................... Segundo Araújo (2008, p. 9), citando Freitas (2000), a “Psi- cologia Social que hoje conhecemos e com a qual convi- vemos, nos diferentes centros de investigação e trabalho, foi e está sendo construída por profissionais que estão aí, em pleno exercício das suas atividades, comprome- tendo-se com as demandas e necessidades explícitas em seus locais de atuação. Trata-se de pessoas que viveram a “crise” da Psicologia Social, e colaboraram para chamar a atenção sobre realidades sociais e cotidianas que se dife- renciavam daquelas vividas nos centros de domínio eco- nômico, político e científico”. Para concluir, podemos dizer que é fundamental que a Psi- cologia Social se comprometa com a realidade social em que está inserida. Para as organizações de trabalho, tendo a Psicologia Social como objeto, o comportamento humano no social e, como método, o estudo empírico da interação dentro dos grupos, são relevantes as suas contribuições sobre a estrutura gru- pal, os estilos de liderança, os conflitos e as motivações. A Psicologia Social tem espaço nas organizações para contri- buir, por exemplo, para a melhoria da produtividade, de- sempenho, relações interpessoais e em grupo, qualidade nos ambientes de trabalho etc. Psicologia Organizacional Assim como a Psicologia e a Psicologia Social, a Psicologia Organizacional — chamada anteriormente de Psicologia In- dustrial — surgiu no século XX pelas mãos de psicólogos experimentais preocupados em resolver os problemas que comprometiam o desempenho e a eficiência no trabalho. 22 ...................................................................................................................................................................................................................... A Gestão de Pessoas sob a ótica da Psicologia Hugo Münsterberg, na Alemanha, foi quem desenvolveu as bases e justificativas da Psicologia Industrial, definindo que a eficiência industrial apoiava-se na análise e na adaptação do trabalho ao trabalhador e do trabalhador ao trabalho. Walter Dill Scott, psicólogo e professor da Universidade do Noroeste (Illinois, EUA), interessado na seleção de fun- cionários e no uso de testes psicológicos, ofereceu-se para selecionar militares quando os Estados Unidos aderiram à 1ª Guerra Mundial. Após a guerra, Scott fundou uma con- sultoria de seleção de pessoal, a Companhia Scott. Durante esse período, muitos nomes surgiram na Admi- nistração clássica, como Frederick Taylor e Henry Ford. Estes estiveram em evidência pela sua contribuição para a Administração Científica na Era Industrial. Vale ressaltar a importância das grandes guerras para a Psi- cologia Organizacional. A Primeira Guerra Mundial foi um importante impulso para o seu desenvolvimento e reconhe- cimento. Segundo Muchinsky (2004), psicólogos experimen- tais investigavam a motivação dos soldados, a moral e os problemas psicológicos decorrentes da incapacidade física e de disciplina. Desenvolveram, ainda, testes de inteligência geral e pesquisas para alocar os soldados a partir da sua capacidade física e mental. Na Segunda Grande Guerra, os psicólogos estavam com suas técnicas de seleção mais apuradas e foi uma época de consolidação da prática. 23A Psicologia Social e a Psicologia Organizacional ...................................................................................................................................................................................................................... Percebemos, então, a importância do processo de seleção para a Psicologia Organizacional, visto que esta parecia a função principal desta área. Na década de 1960, psicó- logos organizacionais fundaram consultorias em seleção para atender às diversas empresas. Assim, com as mudanças que ocorreram no mundo desde o século passado, no âmbito social, político, ideológico, tecnológico e econômico, a Psicologia Organizacional cres- ceu e ampliou a sua área de atuação. A Psicologia Organizacional não pode se limitar a aplica- ções de técnicas, mas deve pautar-se no estudo do homem social, em interação com o meio, com a organização. Deve desenvolver saberes para lidar com as diversas exigências deste campo de atuação. O psicólogo organizacional deve atuar nos diversos pro- cessos de recursos humanos, tais como: • Recrutamento e seleção. • Aplicação e avaliação de testes psicológicos. • Acompanhamento, orientação e aconselhamento psicológico. • Treinamento de pessoal e desenvolvimento orga- nizacional. • Avaliação de desempenho. • Análise decargos e salários. ...................................................................................................................................................................................................................... 24 ...................................................................................................................................................................................................................... A Gestão de Pessoas sob a ótica da Psicologia • Planejamento, diagnóstico, desenvolvimento e execução de projetos de RH. • Benefícios. • Supervisão de estagiários em psicologia organi- zacional. • Apoio à equipe de segurança do trabalho, garan- tia da saúde do trabalhador e qualidade de vida no trabalho. • Consultoria externa ou interna. A proposta na or- ganização não é de psicoterapia, porém, o psicólogo organizacional, e somente este, está habilitado para diagnosticar problemas e transtornos psicológicos para encaminhar e acompanhar os funcionários em tratamento. O papel do psicólogo organizacional é estratégico. Ele deve ser um agente de mudanças organizacionais, propondo so- luções para os problemas que envolvam os recursos huma- nos e elaborando políticas de recursos humanos para evi- tar e prevenir conflitos. Sua atuação na organização deve buscar propiciar um bom clima organizacional, a qualida- de de vida no trabalho, ou seja, programas que visem à saúde, proteção, valorização e satisfação do trabalhador. 25A Gestão de RH pela ótica da Psicologia ............................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................ A GESTÃO DE RH PELA ÓTICA DA PSICOLOGIA Vimos, no tópico anterior, o papel do psicólogo organi- zacional e as suas atribuições funcionais na organização. Agora, descreveremos mais detalhadamente tais atribui- ções, ampliando o olhar da Psicologia para os processos de recursos humanos. Neri nos mostra que “a rigor, a única atividade privati- va do psicólogo do trabalho é a aplicação e avaliação de testes psicológicos” (p. 155-156). Porém, apesar da maio- ria dos profissionais iniciar suas carreiras no processo de recrutamento e seleção, e muitos permanecerem atuando durante anos no mesmo processo, sabemos que, hoje em dia, o psicólogo de Recursos Humanos pode e deve atuar nos demais processos da área. Mendonça (1982) afirma que exercer as atividades buro- cráticas de administração de pessoal, tais como admis- sões, pagamentos, demissões e registros de caráter legal, compõem uma fase pioneira da carreira do psicólogo or- ganizacional. Diante das mudanças ocorridas no âmbito das organizações e as novas exigências do mercado, as atividades e as responsabilidades dos psicólogos expan- diram-se para funções mais amplas, inclusive, desenvolvi- mento e pesquisa. 26 ...................................................................................................................................................................................................................... A Gestão de Pessoas sob a ótica da Psicologia Martins e Bastos (1990) sugerem quatro objetivos gerais da atuação do psicólogo em uma organização. São eles: 1. Realizar, em equipe multiprofissional, estudos/ pesquisas com vistas à produção de conhecimento e tecnologias relativas à Psicologia Organizacional, bem como ao planejamento ambiental, elaboração e definição de políticas de RH nas organizações. 2. Desenvolver, em equipe multiprofissional, ações relativas à avaliação, aperfeiçoamento, reciclagem profissional, bem como à formação de mão de obra para integrar o quadro da organização. 3. Definir e implementar, em equipe multiprofissio- nal, programas que visem à saúde, proteção, valori- zação e satisfação do trabalhador, bem como faci- litem o seu acesso e de seus dependentes a bens e serviços básicos. 4. Desenvolver ações, em equipe multiprofissional, que permitam a adequada alocação e o controle da vida funcional de trabalhador. Em todos os objetivos apresentados, vimos os autores demonstrarem que o desenvolvimento e a responsabili- dade dos processos devem ser compartilhados com uma equipe multidisciplinar. Eles explicam que “tal área não pode ser vista como domínio exclusivo de qualquer uma das inúmeras profissões que nela atuam, sendo indispen- sável, pela multidimensionalidade dos problemas que abarca, a visão convergente de diferentes formações e enfoques na análise de uma mesma questão” (MARTINS; BASTOS, 1990). 27A Gestão de RH pela ótica da Psicologia ...................................................................................................................................................................................................................... O primeiro objetivo apresentado pelos autores nos reme- te à função básica do psicólogo, que deve ser a pesquisa, mesmo atuando em um ambiente organizacional, para pro- duzir conhecimento e tecnologia, compreender os proble- mas humanos e sociais no âmbito das organizações e des- crever as atividades envolvidas na execução do trabalho. “O fato de lidar com o comportamento humano — tanto na sua dimensão individual quanto social — deve credenciar o psicólogo ao manejo de métodos e técnicas de investiga- ção dos problemas psicossociais inevitáveis em quaisquer contextos de trabalho” (MARTINS; BASTOS, 1990). Sobre o objetivo segundo, podemos afirmar que ele é um dos focos principais do psicólogo organizacional: o trei- namento e desenvolvimento de recursos humanos. Esse processo envolve identificar as necessidades de capacita- ção e desenvolvimento de pessoas, desenvolver as ações, implementar e avaliar para verificar se os objetivos finais foram alcançados, ou seja, o desenvolvimento das com- petências funcionais ou técnicas e comportamentais, nos níveis operacionais, táticos e estratégicos. Esse processo é fundamental para o alcance dos objetivos estratégicos da organização. Sendo o psicólogo um profissional da área da saúde e es- pecialista na compreensão das relações sociais, temos o objetivo terceiro voltado para o desenvolvimento de ações que garantam a boa saúde do trabalhador (no sentido pre- ventivo e remediativo) e, também, para facilitar as rela- ções interpessoais e de grupo na empresa (administrando conflitos e interesses). 28 ...................................................................................................................................................................................................................... A Gestão de Pessoas sob a ótica da Psicologia O último objetivo refere-se às funções de recrutamento e seleção, movimentação funcional, administração de car- gos e salários e a própria gestão da área, quando o psicó- logo assume esse cargo. Podemos concluir que as atribuições do profissional psi- cólogo que atua na organização são abrangentes — não mais focadas apenas em aplicações de testes para seleção — e necessárias para o bom andamento dos processos de recursos humanos. Com um papel atual mais estratégico, sua atuação sensibi- lizada com as questões humanas tende a ser assertiva no planejamento e na execução dos processos de gestão de pessoas, tais como: • Definição de estratégias de recrutamento. • Seleção dos melhores candidatos aos cargos pau-tados num perfil comportamental. • Avaliação de desempenho. • Ações de treinamento e desenvolvimento de co- laboradores e de lideranças. • Tratamento do estresse. • Promoção da qualidade de vida no trabalho. • Implementação de planos de motivação, remune- ração e resultados. • Avaliação de cargos, salários e benefícios. 29A Gestão de RH pela ótica da Psicologia ...................................................................................................................................................................................................................... • Fornecimento de atendimento individual ou co- letivo. • Entrevistas de desligamento. Em suma, o profissional psicólogo deve atuar no geren- ciamento de processos, pessoas, conflitos, interesses e conhecimento. Conhecemos neste capítulo a Psicologia, sua história e ob- jeto de estudo. Passeamos no tempo para estudar desde o surgimento deste saber no final do século XIX até o seu apogeu no século seguinte. Compreendemos que a Psico- logia é a “Ciência do Comportamento” e que seu objeto de estudo é o sujeito e seu comportamento. Vimos que a Psicologia Social é a interseção entre a Psi- cologia e a Sociologia e que deve deter-se, à sua época, ao estudo dos fenômenos psicológicos no ambiente social, considerando as particularidades da sociedade estudada. Entendemos que, nas organizações, a psicologia social pode contribuir, por exemplo, para a melhoria da produ- tividade, desempenho, relações interpessoais e em grupo, qualidade no ambiente de trabalho etc. A Psicologia Organizacional foi apresentada como uma área aplicada da Psicologia que exerce papel fundamen- tal na gestão de recursos humanos, evidenciando a sua importância para tal processo. O psicólogo organizacio- nal, com um papel atual mais estratégico, tem sua atuação sensibilizada com as questões humanas, tendendo assim a ser assertivo no planejamento e na execução dos proces- sos de gestão de pessoas. 30 ...................................................................................................................................................................................................................... A Gestão de Pessoas sob a ótica da Psicologia REFERÊNCIAS ARAÚJO, M.A.P. A Psicologia Social no Brasil, um pequeno resgate. In: ENCONTRO HUMANÍSTICO NACIONAL, 8, São Luis, 2008. Trabalhos... São Luís: UFMA, 2008. Mesa-re- donda Psicologia Social no Brasil: percursos e possibilida- des de atuação. Disponível em: <http://www.nucleohuma- nidades.ufma.br/pastas/EH/VIII/Marcia%20Antonia%20 Piedade%20Araujo.pdf>. Acesso em: 25 jun. 2013. BASTOS, A. V. B.; GALVAO-MARTINS, A. H. C. O que pode fazer o psicólogo organizacional. Psicologia: ciência e pro- fissão, Brasília, v. 10, n. 1, 1990 . Disponível em: <http:// pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pi- d=S1414-98931990000100005&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 11 abr. 2012. LOPES, E.S. A Psicologia e seu objeto. Revista de Psico- logia da UnC, vol. 1, n.2, p.74-81, 2004. Disponível em: <http://www.nead.uncnet.br/revista/psicologia>. Acesso em: 22 jan. 2014. MENDONÇA, J. R. A. Anotações para um possível papel possível do profissional de RH: uma volta atrás. In: Ad- ministração e desenvolvimento de recursos humanos: teoria e prática. Salvador: UFBA, ISP, 1982. MUCHINSKY, P. M. Psicologia organizacional. São Paulo: Thomsom, 2004. 31 ...................................................................................................................................................................................................................... NERI, A. A. Psicologia de trabalho: reflexão de um profes- sor (s.n.d.) mimeo. FALTA O LINK DO PAPER SCHULTZ, D. História da psicologia moderna. São Paulo: Cultrix, 1975. SCHULTZ, D. História da psicologia moderna. São Paulo: Cultrix, 1975. TELES, M.L.S. O que é psicologia. São Paulo: Brasiliense, 1991. ...................................................................................................................................................................................................................... 32 33O conceito de personalidade ...................................................................................................................................................................................................................... CAPÍTULO 2 A PERSONALIDADE E SUAS IMPLICAÇÕES NO MUNDO DO TRABALHO O termo “personalidade” é fascinante para todos os públi- cos. Quem não deseja compreender a sua essência, as mo- tivações que nos levam a agir dessa ou daquela maneira, as heranças genéticas que determinaram o nosso tempe- ramento? Enfim, os fatores ora herdados, ora aprendidos que levaram cada um de nós a ser como é. Neste capítulo, compreenderemos o conceito de personalidade para ten- tarmos decifrar as múltiplas ações e reações dos sujeitos no mundo do trabalho. 34 ...................................................................................................................................................................................................................... A personalidade e suas implicações no mundo do trabalho O CONCEITO DE PERSONALIDADE “Poucas palavras são tão fascinantes para o público como o termo personalidade.” (HALL; LINDZEY, 1984, p. 6) Inicio este tópico sobre o conceito de personalidade com a frase de Hall & Lindzey, pois é a mais pura verdade! O termo “personalidade” se popularizou e é comum ouvir- mos falar, ou até mesmo falarmos, que determinada pes- soa tem uma personalidade forte ou fraca, boa ou má. Como nos mostram esses autores, “o observador selecio- na um atributo ou qualidade marcante do indivíduo e que, presumivelmente, vem a ser um aspecto característico da impressão que ele causa no contato com os outros, e sua personalidade passa a ser identificada por esse termo” (HALL; LINDZEY, 1984, p. 6). Como nos mostra Martins (2004, p. 83), “o conceito per- sonalidade, em seu sentido literal, aparece desde suas ori- gens associado à noção de pessoa. Pessoa, termo derivado do latim persona, que significa ‘máscara caracterizadora do personagem teatral’, designa, na abrangência do termo, o homem em suas relações com o mundo”. O senso comum adotou o termo personalidade, principalmente para atribuir valor às pessoas. 35O conceito de personalidade ...................................................................................................................................................................................................................... E para a Psicologia? Qual seria a definição apropriada? Para Hall & Lindzey (1984, p. 7), a forma como este termo será definido na Psicologia depende da teoria psicológica a que o mesmo está vinculado: “Se o indivíduo elabora ou adota uma certa teoria, sua definição de personalidade será, por certo, influenciada por essa teoria.” Veremos no capítulo 3 as diferentes correntes psicológicas e os seus constructos teóricos sobre a personalidade ao longo da história da Psicologia. Segundo o Dicionário Enciclopédico Ilustrado Larousse (2007), o termo personalidade tem os seguintes significados: 1. Caráter do que é pessoal; pessoalidade. 2. Individualidade psicológica de uma pessoa que se manifes- ta em seu comportamento. 3. Conjunto dos comportamentos, das aptidões, das motiva- ções etc, cuja unidade e permanência constituem a individua- lidade, a singularidade de cada um. 4. Aspecto pelo qual se afirma uma originalidade qualquer. 5. Pessoa de certa importância social, conhecida, influente ounotável. 6. Força, energia com a qual se exprime o caráter, a originalida- de de cada um: mulher dotada de personalidade. Pelo dicionário, o uso popular do termo parece correto em algumas das definições, especialmente na quarta e na sexta. Percebemos, então, que encontrar um único significado para o termo não é tarefa simples. 36 ...................................................................................................................................................................................................................... A personalidade e suas implicações no mundo do trabalho Porém, nosso objetivo neste capítulo é esclarecer e não complicar o seu entendimento. Apesar de ser um conceito que possui uma multiplicidade de definições, é possível nos atentarmos a definições que nos levam a compreen- der esse conceito de forma a nos esclarecer como a per- sonalidade se constitui e influencia as relações sociais e, principalmente, no ambiente de trabalho, assunto que nos interessa no presente estudo. Na literatura psicológica alemã, Carver e Scheier definem personalidade como sendo “uma organização interna e di- nâmica dos sistemas psicofísicos que criam os padrões de comportar-se, de pensar e de sentir característicos de uma pessoa”. Apesar de ser uma concepção psicológica, esta não desconsidera, em sua definição, a importância dos aspectos biológicos. Seria, nesse sentido, uma orga- nização dinâmica que se expressa de diferentes maneiras (comportamento, pensamento e emoções). Personalidade é definida por “padrões únicos e relativa- mente consistentes de pensamentos, sentimentos e com- portamentos de um indivíduo” (HOCKENBURY; HOCKE- NBURY, 2001, p. 200). Concebemos a personalidade, então, como o conjunto de pen- samentos, motivos, emoções, interesses, atitudes e capaci- dades de uma pessoa que a diferem das outras pessoas. É composta por um conjunto de características que diferenciam as pessoas, tornando-as singulares, únicas. “O indivíduo[...] constitui-se em unidade com a sociedade e sua existência como tal reside exatamente em sua autodiferenciação para com aque- la, o que lhe confere, inclusive, papel de sujeito no processo de construção dessa sociedade” (MARTINS, 2004, p. 85). A persona- lidade determina a maneira como a pessoa se relacionará com o mundo que a cerca. 37O conceito de personalidade ...................................................................................................................................................................................................................... Sendo um conjunto de características, generalizar a perso- nalidade de alguém como forte ou fraca, boa ou má, seria reduzir esse sujeito a um juízo de valor. A Psicologia re- jeita esse juízo de valor! Personalidade não se reduz a um traço apenas ou a um valor moral. Não é tão simples assim. Podemos concluir citando e complementando a definição de Volpi (2004, p. 5) para o conceito de personalidade: “Em linhas gerais, podemos definir personalidade como sendo o conjunto de elementos temperamentais que fo- ram herdados durante a gestação e de elementos adquiri- dos do meio durante as etapas do desenvolvimento, que formam o mundo interno psíquico de uma pessoa e são expressos pelo seu caráter.” Porém, para compreender completamente a definição acima, você precisará passar para o próximo tópico para conhecer os elementos e fatores determinantes da personalidade. 38 ...................................................................................................................................................................................................................... A personalidade e suas implicações no mundo do trabalhoo OS ELEMENTOS E FATORES DETERMINANTES DA PERSONALIDADE No tópico anterior, compreendemos o conceito de perso- nalidade. Entendemos que o importante para a Psicologia é conceber o sujeito em sua singularidade, entendê-lo como um ser único, dotado de suas próprias característi- cas, ora herdadas, ora aprendidas. Agora, vamos conhecer os elementos e fatores determinantes da personalidade. É importante ressaltar que estamos apresentando concei- tos gerais sobre o tema, sem nos fixarmos ainda nos cons- tructos teóricos de uma ou outra escola da Psicologia. No próximo capítulo, conheceremos as teorias e metodologias de três delas: a psicanálise de Freud — a cognitivo-com- portamental (fusão da teoria cognitiva e do behaviorismo), que se baseia no conhecimento empírico da Psicologia — e o existencialismo de Sartre. Quais são os elementos formadores da personalidade? Relacionados ao conceito de personalidade estão os de ca- ráter, temperamento e transtornos de personalidade. Os dois primeiros, caráter e temperamento, referem-se aos elementos da personalidade, além da constituição física. 39Os elementos e fatores determinantes da personalidade ...................................................................................................................................................................................................................... No último capítulo deste livro conheceremos os transtor- nos de personalidade que são considerados distúrbios psicológicos. Para Volpi (2004, p. 2), o temperamento “representa a pe- culiaridade e intensidade individual dos afetos psíquicos e da estrutura dominante de humor e motivação”. Ainda, segundo ele, “seria uma disposição inata e particular de cada pessoa, pronta a reagir aos estímulos ambientais; é a maneira interna de ser e agir de uma pessoa, geneticamen- te determinado; é o aspecto somático da personalidade”. Vale ressaltar que o temperamento é considerado como geneticamente determinado, ou seja, trans- mitido de pais para filhos. É possível perceber o temperamento de uma criança desde muito cedo pela estrutura dominante de seu humor. “Desde o momento da fecundação, todas as informações ge- néticas do pai e da mãe passam ao novo bebê, cons- tituindo o seu temperamento.” (VOLPI, 2004, p. 6) Hipócrates foi o primeiro a formular uma teoria sobre o temperamento que influenciou todo o pensamento oci- dental. Para este filósofo grego, há quatro tipos de tem- peramento: sanguíneo, fleumático, colérico e melancólico. Vejamos cada um deles: • O temperamento sanguíneo (fluido corporal: san- gue) refere-se às pessoas expansivas, otimistas, irri- táveis e impulsivas. • O temperamento fleumático (fluido corporal: lin- fa ou fleuma) refere-se às pessoas sonhadoras, pací- ficas, dóceis, presas aos hábitos e racionais. 40 ...................................................................................................................................................................................................................... A personalidade e suas implicações no mundo do trabalhoo • O temperamento colérico (fluido corporal: bílis) refere-se às pessoas ambiciosas, dominadoras, pro- pensas a reações abruptas e explosivas. • O temperamento melancólico (fluido corporal: astrabílis ou bílis negra) refere-se às pessoas nervo- sas e excitáveis, pessimistas, rancorosas e solitárias. Hipócrates: considerado, por muitos, uma das figuras mais im- portantes da história da saúde, frequentemente considerado “o pai da medicina”, apesar de ter desenvolvido tal ciência muito depois de Imhotep, do Egito antigo. É referido como uma das grandes figuras entre Sócrates e Aristóteles durante o floresci- mento intelectual ateniense. Hipócrates era um asclepíade, isto é, membro de uma família que durante várias gerações praticou os cuidados em saúde. Segundo Volpi (2004, p. 5-6), citando Reich (2005), “o ca- ráteré o conjunto de reações e hábitos de comportamento que vão sendo adquiridos ao longo da vida e que especifi- cam o modo individual de cada pessoa”. É o que difere um indivíduo de outro, ou uma espécie de outra. Para Volpi, o caráter “seria composto das atitudes habituais de uma pessoa e de seu padrão consistente de respostas para vá- rias situações. [...] É a forma com a que a pessoa se mos- tra ao mundo; [...] é a expressão do temperamento e da personalidade por meio das atitudes de uma pessoa, [...] a expressão do seu mundo interno [...] Conhecer o caráter de uma pessoa significa conhecer os traços essenciais que determinam o conjunto de seus atos, [...] sua forma de agir e reagir perante a vida”. 41Os elementos e fatores determinantes da personalidade ...................................................................................................................................................................................................................... Para ilustrar, podemos citar a reação de algumas pesso- as que vivenciaram o ataque de 11 de setembro de 2001, que causou o desabamento das famosas Torres Gêmeas, o World Trade Center, após os choques consecutivos de dois aviões comerciais. Sabemos, pelos inúmeros depoi- mentos de sobreviventes, imagens filmadas em tempo real e divulgadas na mídia, filmes e documentários produzi- dos após o atentado, que muitos se jogaram pelas janelas, alguns tentaram escapar pelas escadas, outros se dispu- seram a ajudar pessoas mais machucadas a escaparem ao invés de tentarem sair sozinhos, enfim, uma sucessão de comportamentos diversos perante a mesma situação, evi- denciando a diferença entre as pessoas. Cada ser humano é singular, e isso é o que interessa para a Psicologia. Se- gundo Volpi (2004, p. 6), cada pessoa reage “com base em sua estrutura de caráter”. Podemos incluir como elemento da personalidade a cons- tituição física do sujeito. Essa constituição corresponde ao aspecto físico-morfológico da personalidade. As carac- terísticas físicas das pessoas, tais como: feições, estatura, peso, malformação congênita, ou ainda, acidentes que ge- ram lesões, cicatrizes, deficiências, sem dúvida alguma, influenciam decisivamente a personalidade. Sheldon (SHELDON; STEVENS, 1942) correlacionou algu- mas constituições físicas com tipos de temperamento e chegou aos seguintes resultados: 42 ...................................................................................................................................................................................................................... A personalidade e suas implicações no mundo do trabalhoo Físico Temperamento Endomorfo: gordas vísceras digestivas bem desenvolvidas, predominam as formas arre- dondadas. Viscerotônico: expansivo apre- ciador de conforto, sociável. Mesomorfo: musculoso, predo- minam os tecidos ósseos, atlético. Somatotônico: firme, afirma- tivo, corajoso, gosta de correr riscos. Ectomorfo: delgado, predomi- nam as formas lineares, alto, magro, frágil, é o que possui o maior cérebro, sistema nervoso sensível. Cerebrotônico: tendência a re- traimento, introversão, inibido, gosto pela solidão e isolamento. Podemos, então, considerar os seguintes elementos da personalidade: o temperamento (ou tipo temperamental), a constituição física (ou tipo morfológico) e o caráter. E quais são os fatores que influenciam o desenvolvimento da personalidade? A personalidade desenvolve-se pela combinação de fato- res biológicos (herança genética, fisiologia e constituição), ambientais (influências do meio em que o sujeito está in- serido: cultura, classe social, família, pares etc.) e pelas experiências vivenciadas. Como vimos, os fatores biológicos e hereditários têm grande influência no desenvolvimento da personalidade de uma pessoa. Porém, cada sujeito é único, inclusive, na sua singularidade fisiológica e morfológica. Um exemplo disso são os gêmeos univitelinos, idênticos. Aqueles que conhecem ou convivem com gêmeos, fisicamente muito 43Os elementos e fatores determinantes da personalidade ...................................................................................................................................................................................................................... semelhantes, podem perceber que os mesmos demons- tram características distintas de personalidade. Herdamos características, temperamento, mas a combina- ção com outros fatores e situações que possam ocorrer na gestação, no nascimento e ao longo da vida, podem determinar as características de personalidade que uma pessoa desenvolverá. Os fatores ambientais, ou seja, as influências do meio em que o sujeito está inserido: cultura, classe social, família, pares etc. também exercem papel importante no desenvol- vimento da personalidade. A família, por exemplo, é o pri- meiro grupo social com quem um indivíduo vai conviver. Com ela vai aprender valores que determinarão o modo como enxergará a vida. O modo como os pais (ou aqueles que representam esse papel na vida de uma criança) se re- lacionam com as pessoas e com o mundo será aprendido. A qualidade das relações e o clima predominante também exercerão forte influência. E, por fim, temos as experiências pessoais vivenciadas. Ao longo da vida, os acontecimentos não passam sem dei- xar marcas. Esses acontecimentos são representados pelo indivíduo em sua subjetividade, na sua singularidade, no seu psiquismo. A maneira como o sujeito lidará com as diversas situações, positivas ou negativas, é o reflexo de sua personalidade. 44 ...................................................................................................................................................................................................................... A personalidade e suas implicações no mundo do trabalho A INFLUÊNCIA DA PERSONALIDADE NAS RELAÇÕES DE TRABALHO Se voltarmos no tempo e chegarmos ao período da escra- vatura, época do Brasil Colônia, encontraremos duas figu- ras principais: os senhores de engenho, no topo da socie- dade, com poderes políticos e econômicos, e os escravos, na base, tratados como mercadorias e responsáveis por todo o trabalho produtivo. Se pularmos para a Era Indus- trial, encontraremos os donos das fábricas e os operários, em uma visão mecanicista do trabalho. Esses trabalhado- res passaram a controlar máquinas que pertenciam aos donos dos meios de produção, os quais recebiam todos os lucros. Os operários eram vistos como máquinas. A história do trabalho é marcada pelas tensões entre as formas de poder e controle, sendo estes, dois dos aspec- tos mais relevantes que influenciam as relações de traba- lho, inclusive na atualidade. “Quer conhecer um homem? Empodere-o!” Não é o que dizem? Uma pessoa egoísta, autocrata, exigente, centralizadora, ra- cional, ambiciosa, explosiva, controladora, ao assumir uma posição de chefia, certamente propicia um clima muito ten- so para aqueles que trabalham com ela. Geralmente, essas chefias são temidas por todos, mas, principalmente, por aqueles que são mais tímidos, retraídos, afetuosos e sen- 45A influência da personalidade nas relações de trabalho ...................................................................................................................................................................................................................... síveis. Nesse caso, a solução parece simples: demitir esse chefe! Contratar para o seu lugar um profissional cujo perfil seja o de um líder. Porém, nem sempre é tão simplesas- sim. E quando esse egoísta, autocrata, exigente, explosivo é o dono da empresa? Uma das atribuições da área de Recursos Humanos é o re- crutamento e selecão de pessoas, que deve identificar os diversos perfis técnicos e comportamentais para recrutar e selecionar os profissionais certos para os lugares certos. É fundamental que se considere sempre o perfil comportamen- tal. Não basta ter um bom perfil técnico, estar preparado para as- sumir funcionalmente um cargo. Além das funções exigirem um determinado perfil comportamental, é fundamental considerar com quem essa pessoa irá trabalhar. Se eu, profissional de recursos humanos, responsável por recrutar e selecionar pessoas para os cargos da empresa em que trabalho, vou selecionar um profissional para a vaga de assistente do tal “chefe terrível”, terei que consi- derar a sua personalidade para encontrar a pessoa ideal. Lembremos que na nossa estorinha ele é o mandachuva, o poderoso. Muitas vezes, o alto turnover — a alta rotatividade em uma área ou função na empresa — acontece devido à difi- culdade de haver bom relacionamento interpessoal entre chefes e subordinados e entre pares. É a incompatibilida- de de personalidades e a área de recursos humanos deve estar atenta a isso. 46 ...................................................................................................................................................................................................................... A personalidade e suas implicações no mundo do trabalho O poder e o controle, no entanto, não são os únicos as- pectos relevantes que influenciam as relações de traba- lho. Vejamos outro aspecto: a relação entre a personali- dade e a função exercida. Imagine um profissional positivo, motivado, interessado, apaixonado por sua profissão, mas que não conseguiu uma colocação no mercado em sua área. Ele se vê obriga- do a trabalhar em alguma outra função que, muitas vezes, está muito longe de ser aquilo que deseja. Isso o frustra muito! Trabalha apenas pela necessidade. Muitas pessoas que vivem essa situação e que têm as características des- critas acima sentem-se agradecidas pela oportunidade e sua necessidade e “ética do dever” ficam na frente da “éti- ca do prazer”. Porém, com o passar do tempo, a frustração aumenta, principalmente se o trabalho exercido é difícil, complicado e desgastante. Essas pessoas podem começar a apresentar características muito distintas de sua essên- cia. Tornam-se desmotivadas, tristes, caladas, impacientes e, muitas vezes, agressivas. O trabalho que é desenvolvido apenas pelo retorno financeiro, que não proporciona ne- nhum tipo de satisfação, torna-se enfadonho e adoecedor. Sem dúvida alguma, as relações pessoais e profissionais deste profissional serão comprometidas. Em casos como esse, a área de recursos humanos deve atuar de duas formas: a primeira, preventiva e, a segunda, remediativa. Vejamos: Preventiva: mais uma vez, retornamos ao processo de recrutamento e seleção. Identificar as preferências, inte- resses e motivações do profissional que está em processo 47A influência da personalidade nas relações de trabalho ...................................................................................................................................................................................................................... seletivo para determinada vaga é fundamental. Muitas ve- zes, a necessidade financeira do profissional é tão grande que ele, naquele momento, percebe que o que está sendo oferecido não vai atendê-lo em curto prazo. Ele aceita a proposta para não perder a oportunidade, mas não fica- rá muito tempo no emprego. Pessoas apaixonadas pelas suas profissões, dificilmente sentem-se felizes em exercer atividades muito distintas, o que lhes traz grande infeli- cidade, comprometendo vários setores de sua vida, prin- cipalmente a saúde e suas relações. Evitar a contratação dessas pessoas é uma das formas de atuação do RH para evitar tal problemática. Remediativa: se você o contratou, no primeiro momento ele pareceu bem positivo, interessado, agradecido, ale- gre e feliz. Contudo, com o passar do tempo, seu sorriso murchou, sua produtividade baixou e ele não parece mais aquela pessoa que estava tão desesperada pela oportuni- dade. O que fazer agora? Nesses momentos, a área de Re- cursos Humanos deve agir da seguinte maneira: em primei- ro lugar, convidá-lo para uma conversa e esclarecer todos esses pontos, que é uma oportunidade para ambas as par- tes falarem e ouvirem. Algumas empresas trabalham com o processo de movimentação funcional. Se o profissional tiver um perfil adequado à empresa e bom potencial, po- derá ser aproveitado na área que deseja, se tiver uma vaga. Outro aspecto relevante é quando o profissional não con- segue lidar com os seus problemas pessoais de forma po- sitiva, comprometendo a sua produtividade e as relações no trabalho. Também teremos que lidar com pessoas de- sagregadoras que parecem ter prazer em gerar conflitos Como podemos ver, as personalidades são diversas. O ser humano é único, singular, com seu temperamento e características particulares. 48 ...................................................................................................................................................................................................................... A personalidade e suas implicações no mundo do trabalho nas organizações. Outras, não sabem trabalhar em equipe, por exemplo, e comprometem o resultado do trabalho de todo um grupo. A área de recursos humanos deve estar preparada para gerenciar conflitos e enfrentar as problemáticas causadas pelas diferenças entre as pessoas, criando ações em seus processos que possam prevenir e/ou remediar os diversos cenários apresentados e outros possíveis. Quando trata- mos de pessoas, sabemos que as situações podem ser di- versas e adversas. Criar um canal de comunicação, uma abertura real entre RH e colaboradores é fundamental para poder atuar assertivamente. Conhecer as lideranças e seus estilos, criar programas de desenvolvimento de competências comportamentais e técnicas para toda a cadeia produtiva da empresa, pro- piciar um clima de trabalho favorável, ter um processo seletivo sério e efetivo, prover qualidade de vida e saúde no trabalho, valorizar e reconhecer os profissionais são ações preventivas e remediativas que a área de recursos humanos pode e deve adotar para minimizar os aspectos que influenciam negativamente as relações de trabalho. Conhecemos neste capítulo o conceito de personalidade. Compreendemos que o termo é fascinante e que, na Psico- logia, será definido de acordo com os constructos teóricos das escolas psicológicas que veremos no próximo. Para a Psicologia, interessa compreender o ser humano como um ser único, singular, dotado da capacidade de construir a sua própria subjetividade. 49A influência da personalidade nas relações de trabalho ...................................................................................................................................................................................................................... Entendemos que o temperamento é adquirido genetica- mente, herdado dos pais, e que o caráter é a expressão do mundo interno, ou seja, sua forma de agir. Além da consti- tuição física, o caráter e o temperamento são os elementos da personalidade. Conhecemos que os fatores determinantes para o desen- volvimento da personalidade são: os biológicos, os am- bientais e as experiências vividas. Compreendemos queesses três fatores influenciam o desenvolvimento da per- sonalidade — mutável, desde o início e ao longo da vida. Por fim, entendemos que, nas organizações, alguns aspec- tos relevantes da personalidade influenciam as relações, tais como controle e poder. Vimos que a área de recursos humanos pode e deve atuar de forma preventiva ou reme- diativa frente às diversas situações e problemáticas causa- das pelas diferenças entre as pessoas, comprometendo a produtividade e as relações no trabalho. 50 ...................................................................................................................................................................................................................... A personalidade e suas implicações no mundo do trabalho REFERÊNCIAS CARISSIMI, B. A. S. M. Não basta ser líder, tem que ser coach, mentor e counsel: as diferenças essenciais entre essas práticas. Rio de Janeiro: RH, 2005. Disponível em: <http://www.rh.com.br>. Acesso em: 28 ago. 2013. Do “mal-estar na civilização” ao ao mal-estar na organização: um percurso. Dissertação (Metrado em Psi- canálise, Saúde e Sociedade) - Universidade Veiga de Al- meida, Rio de Janeiro, 2008. ERTHAL, T.C.S. Terapia vivencial: uma abordagem exis- tencial em psicoterapia. Petrópolis: Vozes, 1989. FRIEDMAN, H.S.; SCHUSTACK, M.W. Teorias da personali- dade. São Paulo: Pearson, 2004. HALL, C. S. & LINDZEY, G. Teorias da personalidade. São Paulo: EPU, 1984. MATOS, M.A. Behaviorismo metodológico e Behavioris- mo Radical. Palestra apresentada no II Encontro Brasileiro de Psicoterapia e Medicina Comportamental, Campinas, out. 93. Versão revisada encontra-se publicada em: Ber- nard Rangé (Org). Psicoterapia comportamental e cogniti- va: pesquisa, prática, aplicações e problemas. Campinas: Editorial Psy, 1995. Disponível em: <http://www.cfh.ufsc. br/~wfil/matos.htm>. Acesso em: 18 out. 2013. 51 ...................................................................................................................................................................................................................... MAY, P.R., A implantação de modelos de gestão em uma empresa pública: o modelo de gestão participativa e o mo- delo de controle da qualidade total na centrais elétricas de Santa Catarina – CELESC. Dissertação (Mestrado em Enge- nharia de Produção)- Universidade Federal de Santa Ca- tarina, Florianópolis, 1999. Disponível em: <http://www. eps.ufsc.br/disserta99/may/>. Acesso em: 17 nov. 2013. SCHULTZ, D. História da psicologia moderna. São Paulo: Cultrix, 1975. SILVEIRA, E.G.F. Gestão do conhecimento nas organi- zações: perfil motivacional e tipos psicológicos jun- guianos: um estudo de caso em uma empresa de saúde. Dissertação (Mestrado em Engenharia e Gestão do Conhe- cimento) - Universidade Federal de Santa Catarina, Floria- nópolis, 2006. SKINNER, B. F. A case history of scientific method. Ameri- can Psychologist, [S.l.], n. 11, p. 221-233, 1956 ...................................................................................................................................................................................................................... 52 53Perspectivas biológicas, behavioristas e da aprendizagem ...................................................................................................................................................................................................................... CAPÍTULO 3 TEORIAS DE PERSONALIDADE: AS PERSPECTIVAS BÁSICAS DA PERSONALIDADE No capítulo anterior, compreendemos que o conceito de personalidade para a Psicologia está diretamente ligado a uma escola ou teoria psicológica. Agora, conheceremos as perspectivas básicas da personalidade. 54 ...................................................................................................................................................................................................................... Teorias de personalidade: as perspectivas básicas da personalidade PERSPECTIVAS BIOLÓGICAS, BEHAVIORISTAS E DA APRENDIZAGEM Podemos começar este tópico respondendo a seguinte pergunta: O que é uma teoria? Segundo o Dicionário Enciclopédico Ilustrado Larousse (2006, p. 982), teoria é um “conjunto organizado de prin- cípios, regras, leis científicas que visam descrever e expli- car um certo conjunto de fatos”. Nesse sentido, uma teoria da personalidade na Psicologia nascerá de uma linha teórica de referência pela qual a per- sonalidade será pesquisada, estudada. Para Hall & Lindzey (1984, p. 11), “a personalidade é de- finida por conceitos particulares contidos em uma teoria considerada adequada para a completa descrição e com- preensão do comportamento humano”. Ainda segundo os autores, uma teoria “deve ser capaz de abranger um campo amplo de comportamento humano e fazer predições sobre ele. Ela deveria ser capaz, igualmen- te, de tratar qualquer fenômeno de comportamento que tenha significado para o indivíduo”. 55Perspectivas biológicas, behavioristas e da aprendizagem ...................................................................................................................................................................................................................... Podemos compreender com o exposto que uma teoria da personalidade se preocupa com os fenômenos relevantes do comportamento humano para buscar explicá-los. Vejamos agora, uma de cada vez, três relevantes teorias de personalidade: a biológica, a behaviorista e a da per- sonalidade. Perspectiva biológica Os principais teóricos desta perspectiva são: Charles Dar- win, Ivan Pavlov, Hans Eysenck e Francis Galton. Vejamos cada um deles e suas contribuições: Charles Darwin (1809–1892), naturalista inglês, afirmou, com sua teoria evolucionista da personalidade, que as pessoas não são uma criação divina, mas uma evolução direta das espécies mais primitivas. Para Darwin, todas as espécies possuem um ancestral comum. Sua teoria é chamada de Teoria da Evolução das Espécies pela Seleção Natural. Ou seja, a evolução acontece pela seleção natural, por meio da luta pela sobrevivência do mais apto: mais forte, mais inteligente, mais adaptável, mais agressivo etc. A contribuição de Darwin para a Biologia é fundamental. A evolução é a base de todos os seus conceitos. Ivan Pavlov (1849–1936) foi um filósofo russo reconhe- cido por suas contribuições acerca do papel do condicio- namento na psicologia do comportamento. Para Pavlov, as respostas comportamentais podem ser inatas ou aprendi- das (por meio de estímulos agradáveis ou aversivos). Esta 56 ...................................................................................................................................................................................................................... Teorias de personalidade: as perspectivas básicas da personalidade descoberta foi a base da Psicologia Comportamental que veremos em seguida. A teoria do traço biológico de Hans Eysenck, psicólogo alemão, identificou em suas pesquisas três tipos funda- mentais de estrutura da personalidade, que variam pela intensidade de escores nos processos neurais em cada sujeito: extroversão (+=sociável, animado, ativo/-= in- trovertido, retraído); neuroticismo (+=ansiosos, deprimi- dos, tensos/-= estabilidade emocional) e psicoticismo (+= agressivo, frio, egocêntrico/-= empático, sociável). Para Eysenck, os fatores biológicos são determinantes no de- senvolvimento da personalidade. E, por fim, Francis Galton (1822–1911), cientista, mate- mático,estatístico e antropólogo inglês. Galton propôs a eugenia por meio de uma reprodução seletiva. A eugenia seria a evolução de uma determinada espécie pela sele- ção artificial. Por meio da psicometria (testes de inteligên- cia), homens e mulheres poderiam ser avaliados nas suas capacidades mentais. Neste caso, a reprodução humana entre homens e mulheres inteligentes poderia gerar uma espécie mais evoluída. Interessante destacar que Francis Galton era primo de Charles Darwin. Teoria comportamental Em 1913, John Broadus Watson, psicólogo que, aos 35 anos, iniciou uma revolução contra a Psicologia vigente daquela época. O seu movimento foi chamado de beha- viorismo e, em pouco tempo, tornou-se o mais importante sistema americano de Psicologia (SCHULTZ, 1975). 57Perspectivas biológicas, behavioristas e da aprendizagem ...................................................................................................................................................................................................................... Para Watson, a Psicologia deveria ser objetiva, preocupa- da com o comportamento observável para que fosse pos- sível descrevê-lo. A Psicologia Mentalista que predominava foi criticada por Watson e considerada pouco produtiva. Sua proposta era mudar o foco da Psicologia do estudo dos processos mentais (pensamentos e sentimentos) para o comporta- mento observável. Como nos explica Matos (1995), “no mentalismo, o acesso às ideias ou imagens se faria somente através da intros- pecção, que seria então revelada através de uma ação, ges- to ou palavra. Temos aqui um modelo causal de ciência: (a) o indivíduo passivo recebe impressões do mundo; (b) es- tas impressões são impressas na sua mente constituindo sua consciência; (c) que é então a entidade agente respon- sável por, ou local onde ocorrem processos responsáveis por nossas ações”. Ainda segundo a autora, “o behaviorismo surgiu em oposi- ção ao mentalismo e ao introspeccionismo. Em fins do sécu- lo passado a ciência de modo geral começou a colocar uma forte ênfase na obtenção de dados ditos objetivos, em me- didas, em definições claras, em demonstração e experimen- tação. Esta influência se fez sentir na psicologia, no começo deste século, com a proposta behaviorista feita por Watson em 1924: “Por que não fazemos daquilo que podemos ob- servar, o corpo de estudo da Psicologia?” (MATOS, 1995). 58 ...................................................................................................................................................................................................................... Teorias de personalidade: as perspectivas básicas da personalidade Nascia a Psicologia do Comportamento, com a finalidade de prever e controlar o comportamento dos sujeitos, que se concentrava unicamente no que podia ser visto. A teoria comportamental diz que os comportamentos são mutáveis a partir de alterações no ambiente (na presença de reforçadores ou de situações aversivas). Esses reforçadores ou as situações aversivas são conside- rados estímulos negativos ou positivos. Um exemplo clássico para compreendermos essa teoria é quando a criança pequena que está começando a engati- nhar coloca o dedinho no interruptor de energia, ou seja, na tomada. O choque será um estímulo negativo, uma si- tuação aversiva, que a levará a não colocar mais o dedinho na tomada. Seu ato de conduta (comportamento) mudará a partir da experiência. Watson era um defensor da psicologia animal, acreditan- do ser essa vantajosa para a pesquisa psicológica. Em seu livro A Psicologia do ponto de vista de um behaviorista, de 1919, ele afirmou que os princípios e métodos adota- dos para a psicologia animal eram igualmente aplicáveis e legítimos para o estudo do homem (SCHULTZ, 1975). Inspirado em Pavlov, filósofo russo, que propôs o mo- delo de condicionamento chamado de condicionamento clássico, o Behaviorismo Clássico de Watson concebe o comportamento como sendo uma resposta a um estímulo específico. Nesse sentido, tornou-se comum referir-se ao behaviorismo como Psicologia do Estímulo e Resposta, ou S-R (Stimulus-Response). 59Perspectivas biológicas, behavioristas e da aprendizagem ...................................................................................................................................................................................................................... Comportamento = Estímulo + Resposta Para Watson, o homem é o produto de associações esta- belecidas durante a vida entre estímulos (do ambiente) e respostas (comportamento observável). Essa proposta viria a ser superada por behavioristas pos- teriores, como Burrhus F. Skinner, fundador do Behavio- rismo Radical. Como nos apresenta Schultz (1975, p. 276), “em muitos e importantes aspectos, a posição de Skinner representa uma renovação do mais antigo behaviorismo watsoniano”. O método de trabalho de Skinner é o indutivo, ou seja, evi- ta completamente a teoria e pratica um positivismo estrito. O que isso significa? Skinner não construiu teorias ou hipóteses para poste- riormente comprová-las ou não experimentalmente. Este “parte dos dados empíricos” para “generalizações conjec- turais” (SCHULTZ, 1975). “Nunca abordei um problema construindo uma hipótese. Nunca deduzi teoremas nem os submeti à verificação ex- perimental. Até onde posso vislumbrar, não tive um mo- delo preconcebido de comportamento — certamente não um fisiológico ou mentalista, e creio que tampouco um modelo conceptual” (SKINNER, 1956, p. 227). 60 ...................................................................................................................................................................................................................... Teorias de personalidade: as perspectivas básicas da personalidade O Behaviorismo Radical de Skinner preocupa-se com a descrição dos comportamentos observáveis. “Esse beha- viorismo puramente descritivo foi denominado a “aborda- gem de organismo vazio” (SCHULTZ, 1975, p. 277). Sua teoria é ambientalista! O que isso quer dizer? O comportamento é afetado pela mudança de ambiente e no ambiente. E a aprendizagem? Para o behaviorismo, a aprendizagem acontece pelo con- dicionamento. O homem é concebido como um organis- mo que responde a estímulos do ambiente de forma con- dicionada. Skinner nomeou de comportamento respondente quando a resposta comportamental é “suscitada por uma situação de estímulo específica e observável” (SCHULTZ, 1975, p. 278). Essa situação de condicionamento foi descrita por Pavlov. Pavlov verificou que os cães salivavam ao cheiro ou quan- do viam a comida. Quando a comida era oferecida, soava a campainha. O cão foi condicionado a salivar ao ouvir a campainha. Surge a ideia de reforço. E chamou de comportamento operante quando a respos- ta do organismo é aparentemente espontânea, ocorrendo sem nenhum estímulo externo possível de observação. 61Perspectivas biológicas, behavioristas e da aprendizagem ...................................................................................................................................................................................................................... Skinner deu ênfase a esse comportamento, afirmando que tendemos a repetir o que é agradável e a evitar o que é desagradável. Na caixa de skinner, “o rato aciona a alavanca, obtém alimento, e não recebe recompensa alimentar nenhuma enquanto não acionar a alavanca. Skinner considera o comportamento operante muito mais representativo da si- tuação de aprendizagemhumana na vida real” (SCHULTZ, 1975, p. 278). Para o behaviorismo, o homem desenvolve suas caracterís- ticas em função das condições presentes no meio em que vive. O comportamento é controlado por suas consequên- cias, pelos estímulos que se segue às respostas. Recom- pensar ou punir para alcançar a aprendizagem desejada. O homem é produto do meio A perspectiva da aprendizagem incorpora a perspectiva behaviorista. Para esta, aprender significa mudança de comportamento. Essa abordagem aproxima-se das perspectivas cognitivas e sociais. A personalidade é influenciada pela aprendiza- gem e pelas exigências da sociedade. O meio será o principal responsável pelas respostas dadas pelo sujeito, a partir de estímulos sociais que influenciam o comportamento (aprovação, aceitação e atenção externa). 62 ...................................................................................................................................................................................................................... Teorias de personalidade: as perspectivas básicas da personalidade PERSPECTIVAS COGNITIVAS E SOCIOCOGNITIVAS DO TRAÇO E DA PERSONALIDADE Na abordagem cognitiva e sociocognitiva, a personalidade tem como base a percepção e a cognição de uma pessoa. Isso quer dizer que a percepção e a interpretação indivi- duais dos sujeitos sobre o mundo são elementos centrais de sua personalidade. Os principais teóricos dessa abordagem são: Kurt Lewin, Jean Piaget, George Kelly, Julian Rotter e Albert Bandura. Kurt Lewin (1890–1947), psicólogo alemão-americano, afirmava que somente por meio do estudo de pequenos grupos poderíamos compreender o macro grupo. Com isso, abriu novos caminhos para a Psicologia Social tor- nando-a autônoma da Psicologia e da Sociologia. Dentre as suas principais contribuições, estão: • O indivíduo vive ligado, inevitavelmente, a grupos maiores (classes sociais, sociedade) ou menores (fa- mília, grupo de vizinhos, trabalho, escola, religiosos). • As pessoas são dotadas de sua historicidade, escrita por suas vivências pessoais e profissionais, bem como por suas características de personalida- de. Em grupo, terão ações e reações individuais e, também, as influenciadas pelo grupo. 63Perspectivas cognitivas e sociocognitivas do traço e da personalidade ...................................................................................................................................................................................................................... • Desenvolveu a teoria de campo: o comportamen- to de uma pessoa está relacionado tanto às carac- terísticas pessoais quanto à situação social na qual está inserida = observação e manipulação de variá- veis envolvendo grupos. • Foi o principal responsável pelo avanço dos estu- dos de dinâmica de grupo. Jean Piaget (1896–1980), suíço, desenvolveu sua teoria cognitiva para explicar o desenvolvimento cognitivo hu- mano. Para Piaget, a inteligência infantil é do tipo sen- sório-motor, tratando-se de uma inteligência prática. A manipulação de objetos e a sua percepção, antes da con- cretização da linguagem e do pensamento, caracterizam essa inteligência prática. Segundo ele, a inteligência evolui até se tornar uma inteli- gência propriamente dita, na medida em que o sujeito se relaciona com o meio e este o influencia. George Kelly (1905–1967) desenvolveu a teoria da perso- nalidade como a teoria do constructo pessoal. Esta foca a compreensão e predição dos comportamentos pessoais e dos outros por meio de constructos. Os constructos seriam referências, modelos criados pelo sujeito que tenta adaptá-los para dar sentido à realidade. Não são estáticos, podendo ser alterados. Julian Rotter (1916–2014), psicólogo americano, em sua teoria sociocognitiva afirma que as pessoas escolhem seu 64 ...................................................................................................................................................................................................................... Teorias de personalidade: as perspectivas básicas da personalidade comportamento por meio dos seus centros de controle. Para as pessoas cujo centro de controle é interno, ou seja, que tem como expectativa que a sua própria ação determi- nará um resultado, são mais independentes, focados nas suas próprias realizações e com capacidade empreendedo- ra. Para as pessoas cujo centro de controle é externo, ou seja, que tem como expectativa que pessoas ou situações externas a elas determinem os resultados de suas ações, são menos independentes e mais suscetíveis a transtornos de ansiedade, estresse e, até mesmo, depressão. Albert Bandura (1925), psicólogo e pedagogo canadense, definiu que a aprendizagem por observação não exige a necessidade de reforço, como propõe o behaviorismo clássico. Os processos internos do sujeito resultam na au- torregulação do comportamento. Esses processos focam o autorreforçamento e a autoeficácia. Na perspectiva do traço e da habilidade sobre a perso- nalidade, os sujeitos são percebidos como conjuntos de traços, habilidades e temperamentos, reduzindo a quanti- dade de dimensões básicas da personalidade. Suas técnicas de avaliação individual são consideradas adequadas, levando em conta comparações entre sujei- tos, além de pesquisas científicas teóricas e práticas. As técnicas mais comuns de avaliação individual nessa perspectiva são: análise, fatorial, autorrelatos, testes de estilos e habilidades, análise de documentos, observação comportamental e entrevistas. 65Perspectivas cognitivas e sociocognitivas do traço e da personalidade ...................................................................................................................................................................................................................... R. B. Cattel (1905–1998), psicólogo inglês, desenvolveu a análise fatorial da personalidade e definiu 16 traços de personalidade. São eles: expansivo-reservado desconfiado-confiante mais-menos inteligente imaginativo-prático estável-sentimental astuto-franco assertivo-humilde apreensivo-plácido despreocupado-moderado inovador-conservador consciencioso-evasivo autossuficiente- dependendo do grupo ousado-tímido controlador-descontraído compassivo-determinado tenso-calmo Uma abordagem contemporânea sobre traços define cinco dimensões ou fatores de personalidade, chamados de os Cinco Grandes. São eles: extroversão (sociabilidade-cordialidade-asserti- vidade), amabilidade (fraqueza, confiança, altruísmo, mo- déstia), conscienciosidade (competência-prudência-per- sistência-luta pela excelência), neuroticismo (ansiedade, hostilidade, depressão e vulnerabilidade) e abertura (ima- ginação, percepção estética, curiosidade intelectual). Psicólogos do traço reconhecem influências biológicas, cognitivas e psicodinâmicas em sua teoria. 66 ...................................................................................................................................................................................................................... Teorias de personalidade: as perspectivas básicas da personalidade PERSPECTIVAS HUMANISTA E EXISTENCIAL, PERSPECTIVA INTERACIONALISTA PESSOA-SITUAÇÃO A perpectiva existencial-humanista considera os seres hu- manos livres para realizarem sua existência. Em primeiro lugar, cabe colocar que o existencialismo não surgiu como uma escola psicológica, mas como uma filo- sofia existencial. Seu surgimento ocorreu na França e na Alemanha, no século XIX, pelas mãos e pensamentosde Kierkegaard, considerado o pai do existencialismo. Mas outros nomes, como Heidegger e Sartre, são fundamentais na disseminação e expressão da filosofia existencial. Neste tópico, focaremos o existencialismo sartreano. Como filosofia, o existencialismo influenciou a Psicologia e o surgimento de uma psicologia existencial. O existencialismo se fundamenta na crença de que “a exis- tência precede a essência”, segundo a definição do filóso- fo existencialista Jean-Paul Sartre. O que isso quer dizer? Erthal (1989, p. 23) explica que tal afirmação “significa di- zer que o homem precisa escolher a cada momento o que 67Perspectivas humanista e existencial, perspectiva interacionalista pessoa-situação ...................................................................................................................................................................................................................... será no momento seguinte; só existindo poderá ser. [...] O homem é o que atua ser”. Jean-Paul Charles Aymard Sartre (Paris, 1905–1980) foi um filósofo, escritor e crítico francês, conhecido como representante do existencialismo. Acreditava que os inte- lectuais têm de desempenhar um papel ativo na socieda- de. Era um artista militante, e apoiou causas políticas de esquerda com sua vida e obra. Sua filosofia dizia que o homem primeiro existe, depois se define, enquanto todas as outras coisas são o que são, sem se definir, e por isso sem ter uma essência posterior à existência. Conceber uma essência significa conceber o homem pron- to. O existencialismo encara uma contínua criação, uma existência, um constante vir-a-ser. Com esse pensamento, surge um homem livre e responsá- vel para existir, fazer escolhas, sem que seu ser seja pre- definido. Nesse vir-a-ser contínuo, vivencia novas experiências e, com isso, redefine o próprio pensamento e adquire novos conhecimentos a respeito de si mesmo. Sartre define o homem como responsável pela própria li- berdade. E, frente a essa liberdade de ação, o ser humano se angustia, pois a liberdade implica fazer escolhas, as quais só o próprio indivíduo pode fazer. 68 ...................................................................................................................................................................................................................... Teorias de personalidade: as perspectivas básicas da personalidade Até quando nos abstemos de fazer escolhas, já estamos escolhendo... A escolha é não agir! Segundo Erthal (1989, p. 37), “para Sartre, o homem é aqui- lo que faz de si próprio. [...] Assim, a liberdade não é algo levianamente construído, senão que existe uma responsa- bilidade absoluta pelo que resulta. Se a natureza humana fosse um molde rígido ou mesmo maleável, como propõem os psicanalistas, porém passivo, como afirmam os behavio- ristas, o homem não podia ser responsável por si mesmo”. A ideia de inconsciente para o existencialismo é rejeitada e tratada como má-fé. “O inconsciente passa a ser a indicação máxima de má-fé que uma pessoa estabelece para si mesma, [...] seria a ati- tude escolhida para minimizar o peso da escolha respon- sável e [...] colabora na redução das possibilidades de uma existência plena.” O homem é um eterno vir-a-ser A perspectiva interacionalista pessoa0-situação percebe o sujeito com uma variabilidade de reações frente às diver- sas situações. Podemos chamar de um self social, em que as respostas comportamentais variam de acordo com as circunstâncias sociais. Para Harry Stack Sullivan (1892–1949), psiquiatra ameri- cano, um dos principais nomes dessa abordagem, a pes- soa pode ter tantas personalidades quanto as situações sociais lhe exigirem. 69Perspectivas humanista e existencial, perspectiva interacionalista pessoa-situação ...................................................................................................................................................................................................................... Definiu personalidade como um “padrão relativamente duradouro de relações interpessoais que caracterizam uma vida humana”. Foca as experiências interpessoais sempre em desenvolvimento. Sua abordagem é relacional. De acordo com essa visão, uma personalidade não pode ser separada do apanhado de suas relações interpessoais. Para ele, um homem individu- al é inconcebível. Seria complicado falar de traços de personalidade, uma vez que, para os interacionalistas, o comportamento muda muito de uma situação para outra. É uma relação contínua entre self e ambiente. Nessa perspectiva, uma pessoa pode ser introvertida e se portar de forma descontraída em um encontro com ami- gos. Uma pessoa pode ser sincera e honesta, porém even- tualmente mentir para não magoar alguém. Para ele, a vida é uma contínua busca da necessidade de satisfação e de segurança. Vejamos em seguida as últimas perspectivas da personali- dade: as psicanalíticas e neoanalíticas. 70 ...................................................................................................................................................................................................................... Teorias de personalidade: as perspectivas básicas da personalidade PERSPECTIVAS ANALÍTICA E NEOANALÍTICAS Vejamos agora as considerações psicanalíticas do pai da psicanálise: Sigmund Freud. Sigismund Schlomo Freud (Příbor, 6 de maio de 1856 — Londres, 23 de setembro de 1939), mais conhecido como Sigmund Freud, foi um médico neurologista judeu-aus- tríaco, fundador da psicanálise. Freud nasceu em Freiburg, na época pertencente ao Império Austríaco; atualmente a localidade é denominada Příbor, na República Tcheca. Freud iniciou seus estudos pela utilização da hipnose como método de tratamento para pacientes com histeria. Ao observar a melhora de pacientes de Charcot, elaborou a hipótese de que a causa da doença era psicológica, não orgânica. Essa hipótese serviu de base para seus outros conceitos, como o do inconsciente. Não foi Freud o primeiro a utilizar o termo inconscien- te, mas foi na psicanálise freudiana que ele teve seu lugar destacado. “A obra freudiana marcou a humanidade e revelou, a par- tir do conceito de inconsciente, que o homem não domina a si mesmo. [...] O sujeito da psicanálise não é o mesmo sujeito da psicologia comportamental, por exemplo, nem da ciência positivista. O sujeito de que trata é o sujeito 71Perspectivas analítica e neoanalíticas ...................................................................................................................................................................................................................... do inconsciente, do desejo, da singularidade” (Carissimi, 2008, p. 9-12). Freud definiu o inconsciente como sendo uma instância psíquica que se manifesta por meio de lapso, ato falho, sintoma, chistes, sonho e fantasia. Para Freud, “a personalidade é composta de três grandes sistemas: o id, o ego e o superego” (HALL; LINDZEY, 1984, p. 25), representando a impulsividade, a racionalidade e a moralidade, respectivamente. O id é um componente fundamental da estrutura da per- sonalidade, sendo o seu sistema original, básico e mais central. É o reservatório de energia de toda personalidade que põe em funcionamento o ego e o superego. Os seus conteúdos são quase todos inconscientes, incluem con- figurações mentais que nunca foram conscientes, como também o material que foi considerado inaceitável pela consciência, que foi rejeitado. A outra estrutura é o ego.“A diferença básica entre o id e o ego reside em que o primeiro conhece somente a realidade subjetiva da mente, enquanto o segundo faz a distinção en- tre as coisas da mente e as do mundo exterior” (HALL; LIN- DZEY, 1984, p. 27). Quando sentimos fome ou sede, preci- samos reconhecer, procurar, encontrar e consumir bebidas e alimentos que nos satisfaçam. Transformar a imagem em percepção. Esse é o papel do ego. Quando o bebê começa a interagir com o ambiente, o ego se desenvolve. É a busca do prazer em contato com a realidade. Ou seja, se desenvolve a partir do id, para atender e aplacar suas exigências. Tem 72 ...................................................................................................................................................................................................................... Teorias de personalidade: as perspectivas básicas da personalidade como tarefa garantir a saúde, a segurança e a sanidade da personalidade. Sua função é enfrentar a necessidade de mi- nimizar a tensão e maximizar o prazer. A terceira parte da estrutura da personalidade é o supe- rego. “Ele é o representante interno dos valores e ideais tradicionais da sociedade, transmitidos pelos pais e refor- çados pelo sistema de recompensas e castigos impostos à criança” (HALL; LINDZEY, 1984, p. 28). Atua como uma censura dizendo ao ego o que é correto e incorreto sobre os pensamentos deste. É o “depósito” dos códigos morais e os modelos de conduta da personalidade do sujeito. “De modo geral podemos considerar o id como o compo- nente biológico da personalidade, o ego como o compo- nente psicológico, e o superego como o componente so- cial” (HALL; LINDZEY, 1984, p. 28). Freud concebeu o sujeito como o sujeito do inconsciente, o que diferencia a Psicanálise da Psicologia do Compor- tamento, por exemplo. Para Freud, esse sujeito vive “em parte no mundo da realidade e em parte no da imagina- ção, envolvido em conflitos e contradições interiores e, contudo, capaz de pensamento e ações racionais, movido por forças que ele pouco conhece e por aspirações além de seu alcance; às vezes lúcido, às vezes confuso, frustrado, satisfeito, esperançoso e desesperado, egoísta e altruísta; em suma, um ser humano complexo. Para muitos, esse quadro do homem tem um valor essencial” (HALL; LIND- ZEY, 1984, p. 52). 73Perspectivas analítica e neoanalíticas ...................................................................................................................................................................................................................... O sujeito é o sujeito do inconsciente A teoria freudiana destacou a importância do inconscien- te para explicar a psique humana. Para os sucessores de Freud, em uma perspectiva neoanalítica da personalidade, o ego foi considerado de grande importância. O conceito de self-consciente, ou, quem eu acredito/suponho/penso ser, é relevante nas concepções teóricas desta perspectiva. Carl Jung, sem dúvida, se destaca como sucessor de Freud e tem adeptos e seguidores de sua teoria pelo mundo inteiro. Jung definiu as dimensões da personalidade, extroversão e introversão, para apresentar as forças opostas que com- petem em busca de equilíbrio. A extroversão representa a tendência de nos concentrarmos no externo e a introver- são representa a tendência de focarmos no interno. A luta interna do self está voltada para as emoções e os impulsos internos, enquanto que a luta externa do self às exigências do mundo. Jung desenvolveu o conceito de inconsciente coletivo, como a camada mais profunda da psique, constituído de materiais e arquétipos (imagens e símbolos que não cor- respondem às experiências individuais) comuns a todos os seres humanos. Apresentou as quatro funções psíquicas: sensação, senti- mento, pensamento e intuição, que, integradas às atitudes de introversão e extroversão correspondem aos tipos psi- cológicos definidos por Jung. 74 ...................................................................................................................................................................................................................... Teorias de personalidade: as perspectivas básicas da personalidade Para ele, percebemos o mundo a partir da sensação e da in- tuição, e julgamos os fatos pelo pensamento e sentimento. Diante de todas essas perspectivas, podemos compreen- der que personalidade e comportamento são termos dis- tintos, porém, interligados. Comportamento é ação, res- posta; personalidade é “quem eu sou”, mesmo que esse conceito varie tanto. O que fundamenta o comportamento individual no traba- lho é o fenômeno motivacional, uma vez que o ser humano busca, pela sua própria natureza, satisfazer suas necessi- dades, preencher a falta, o vazio, a ausência de satisfação. Neste capítulo, conhecemos as oito perspectivas básicas da personalidade. No primeiro tópico, das perspectivas biológicas, behavio- ristas e da aprendizagem, compreendemos a importância dos fatores biológicos, hereditários e sociais no desenvol- vimento da personalidade. Para o behaviorismo, o homem desenvolve suas caracte- rísticas em função das condições presentes no meio em que vive. O comportamento é controlado por suas con- sequências, pelos estímulos que se seguem às respostas. Recompensar ou punir para alcançar a aprendizagem de- sejada. O homem é produto do meio. O behaviorismo é a psicologia do comportamento. As perspectivas cognitivas e sociocognitivas e do traço e da habilidade, vistas no segundo tópico, focam a capa- 75Perspectivas analítica e neoanalíticas ...................................................................................................................................................................................................................... cidade cognitiva e de percepção do mundo no desenvol- vimento da personalidade. A perspectiva dos traços nos apresenta traços de personalidade que explicam o ser in- teragindo no mundo e suas respostas comportamentais. O terceiro tópico, das perspectivas humanista e existen- cial, nos mostrou que o existencialismo não surge como uma escola psicológica e sim como uma filosofia existen- cial, e virá a fundamentar uma psicologia existencial, que concebe um homem livre e responsável. Sartre define o ho- mem como sendo o responsável pela própria liberdade. E, frente a essa liberdade de ação, o ser humano se angustia, pois a liberdade implica fazer escolhas, as quais só o pró- prio indivíduo pode fazer. O homem é um eterno vir-a-ser. A perspectiva interacionalista pessoa-situação apresenta a teoria de que a personalidade não é estática, mas possui padrões relativamente estáveis. A relatividade pode ser explicada pela ideia de que as respostas dos indivíduos podem variar diante de diferentes situações. E, por fim, as perspectivas analíticas e as neoanalíticas. Para a psicanálise freudiana, a personalidade é estrutura- da em três instâncias psíquicas: o id (componente biológi- co), o ego (componente psicológico) e o superego (compo- nente social). Freud concebeu o sujeito como o sujeito do inconsciente, o que diferencia a Psicanálise da Psicologia do Comportamento, por exemplo. Jung, em sua perspectiva neoanalítica, desenvolveu o con- ceito das quatro funções psíquicas: sensação, sentimento, 76 ...................................................................................................................................................................................................................... Teorias de personalidade: as perspectivas básicasda personalidade pensamento e intuição. Integradas às atitudes de introver- são e extroversão, correspondem aos tipos psicológicos definidos por Jung. Ou seja, percebemos o mundo a partir da sensação e intuição e julgamos os fatos pelo pensa- mento e sentimento. Personalidade e comportamento são termos distintos, po- rém, interligados. Meu comportamento pode ser determi- nado pela minha personalidade. Percebemos que o fundamento do comportamento indivi- dual no trabalho é o fenômeno motivacional, uma vez que o ser humano busca, pela sua própria natureza, satisfazer suas necessidades, preencher a falta, o vazio, a ausência de satisfação. 77 ...................................................................................................................................................................................................................... REFERÊNCIAS CARISSIMI, B. A. S. M. Não basta ser líder, tem que ser coach, mentor e counsel: as diferenças essenciais entre essas práticas. Rio de Janeiro: RH, 2005. Disponível em: <http://www.rh.com.br>. Acesso em: 28 ago. 2013. Do “mal-estar na civilização” ao mal-estar na or- ganização: um percurso. Dissertação (Metrado em Psica- nálise, Saúde e Sociedade)- Universidade Veiga de Almei- da, Rio de Janeiro, 2008. ERTHAL, T.C.S. Terapia vivencial: uma abordagem exis- tencial em psicoterapia. Petrópolis: Vozes, 1989. FRIEDMAN, H.S.; SCHUSTACK, M.W. Teorias da personali- dade. São Paulo: Pearson, 2004. HALL, C. S. & LINDZEY, G. Teorias da personalidade. São Paulo: EPU, 1984. MATOS, M.A. Behaviorismo metodológico e Behavioris- mo Radical. Palestra apresentada no II Encontro Brasileiro de Psicoterapia e Medicina Comportamental, Campinas, out. 93. Versão revisada encontra-se publicada em: Ber- nard Rangé (Org). Psicoterapia comportamental e cogniti- va: pesquisa, prática, aplicações e problemas. Campinas: Editorial Psy, 1995. Disponível em: <http://www.cfh.ufsc. br/~wfil/matos.htm>. Acesso em: 18 out. 2013. ...................................................................................................................................................................................................................... 78 ...................................................................................................................................................................................................................... Teorias de personalidade: as perspectivas básicas da personalidade MAY, P.R., A implantação de modelos de gestão em uma empresa pública: o modelo de gestão participativa e o modelo de controle da qualidade total na centrais elétricas de Santa Catarina – CELESC. Dissertação (Mestrado em En- genharia de Produção)- Universidade Federal de Santa Ca- tarina, Florianópolis, 1999. Disponível em: <http://www. eps.ufsc.br/disserta99/may/>. Acesso em: 17 nov. 2013. SCHULTZ, D. História da psicologia moderna. São Paulo: Cultrix, 1975. SILVEIRA, E.G.F. Gestão do conhecimento nas organi- zações: perfil motivacional e tipos psicológicos jun- guianos: um estudo de caso em uma empresa de saúde. Dissertação (Mestrado em Engenharia e Gestão do Conhe- cimento)- Universidade Federal de Santa Catarina, Floria- nópolis, 2006. SKINNER, B. F. A case history of scientific method. Ameri- can Psychologist, [S.l.], n. 11, p. 221-233, 1956. 79Conceito e tipos de transtornos de personalidade ............................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................................ CAPÍTULO 4 TRANSTORNOS DE PERSONALIDADE No capítulo anterior, compreendemos os fundamentos do comportamento individual nas organizações para pautar- mos a gestão de pessoas. Neste capítulo, conheceremos os diferentes tipos de transtornos de personalidade para ajudar ao gestor de RH a reconhecê-los a fim de que possa encaminhar as soluções cabíveis em cada situação. 80 ...................................................................................................................................................................................................................... Transtornos de personalidade CONCEITO E TIPOS DE TRANSTORNOS DE PERSONALIDADE Ao longo da leitura desta obra, compreendemos o concei- to de personalidade e suas teorias para fundamentarmos o comportamento das pessoas nas organizações e dire- cionarmos as estratégias da gestão de recursos humanos. Porém, precisamos ir mais além, abordando alguns transtornos psicológicos graves que comprometem as relações e a performance no trabalho: os transtornos de personalidade. Antes de iniciarmos esse tema é importante esclarecer que o gestor de recursos humanos não tratará terapeu- ticamente transtornos psicológicos. Essa atribuição é do profissional psicólogo. Este capítulo pretende ajudar o gestor de pessoas a detectar sinais e sintomas e identifi- car transtornos de personalidade que estão comprome- tendo o desempenho e as relações e direcionar ou enca- minhar o indivíduo para tratamento psicológico com um psicoterapeuta, por exemplo. E, nesse caso, esse encami- nhamento será a solução possível, a tomada de decisão do gestor. Bom, não devemos nos preocupar com isso agora. Esse foi apenas um esclarecimento inicial para evitarmos expecta- tivas erradas. Veremos, no segundo tópico, como o gestor de recursos humanos deverá tratar tais questões. 81Conceito e tipos de transtornos de personalidade ...................................................................................................................................................................................................................... Iniciemos, pois, este tópico com o conceito de transtorno. Ao buscarmos esse termo no Dicionário Enciclopédico Ilustrado Larousse (2006, p. 1005), encontramos em sua origem o verbo transtornar que se refere ao ato de desor- ganizar, atrapalhar, perturbar, transformar, levar a ou perder o equilíbrio, desorientar (se) perturbar (se), des- figurar-se. Diante do exposto, percebemos que um trans- torno de personalidade prejudica a si próprio e aos que o rodeiam, pois tal transtorno dificulta a adaptação do indivíduo ao meio ao qual ele pertence. Podemos definir como transtorno de personalidade o de- sequilíbrio ou desajuste nas formas de pensar, agir e sen- tir comuns de um indivíduo, que causam prejuízo e so- frimento a ele próprio e às demais pessoas que o cercam. A Psiquiatria concebe a maioria dos transtornos psico- lógicos como síndromes. Para Kaplan e Sadock (1993, p. 230), “uma síndrome é um grupo de sinais e sintomas que ocorrem juntos, constituindo uma condição identificável. [...] Sinais são achados objetivos observados pelo médico (por ex., taquicardia e hiperatividade motora); sintomas são queixas subjetivas apresentadas pelo paciente (por ex., palpitações e ansiedade)”. O estudante do comportamento humano, seja ele psicólo- go ou psiquiatra, deve conhecer os sinais e sintomas para identificar o transtorno psicológico do seu paciente e ini- ciar o tratamento. 82 ...................................................................................................................................................................................................................... Transtornos de personalidade O gestor de recursoshumanos não tratará o indivíduo, mas sendo conhecedor de tais sinais e sintomas poderá reconhe- cer tal problemática e direcioná-lo para tratamento espe- cífico. Diante dessa situação, muitas empresas não sabem como agir por falta de esclarecimento e preparo dos profis- sionais das áreas humanas atuantes nas organizações. Vejamos alguns aspectos da capacidade humana que, afe- tados, demonstram sinais e sintomas de possíveis trans- tornos apresentados e descritos no Compêndio de Psi- quiatria: Ciências Comportamentais – Psiquiatria Clínica (KAPLAN; SADOCK, 1993, cap. 8, pp. 230-8). O primeiro deles é a consciência, definida como estado de lucidez. As perturbações da consciência estão relaciona- das aos seguintes sinais e sintomas: 1. Desorientação: dificuldades para reconhecer tempo, lugar ou pessoas. 2. Pensamento pouco claro. 3. Estupor (falta de reação). 4. Delírios (medos e alucinações). 5. Coma (grau profundo de inconsciência) ou coma vigil (parece estar adormecido, mas pronto para ser despertado). 6. Sonolência. 7. Dificuldades para concentrar a atenção (capaci- dade para manter foco em alguma atividade). 83Conceito e tipos de transtornos de personalidade ...................................................................................................................................................................................................................... 8. Bloqueio para o que gera ansiedade. 9. Hipervigilância (atenção excessiva). 10. Resposta obediente e sem crítica a uma ideia ou influência. Um outro aspecto a ser considerado é a emoção do indiví- duo. Esse aspecto se relaciona principalmente ao afeto e humor. Um afeto adequado demonstra se o tom emocio- nal está em harmonia com a ideia, pensamento ou fala que o acompanham. Vejamos: 1. Afeto inadequado: tom emocional, ideia, pensa- mento ou fala desarmônicos. Pode ser embotado (tom contido ou reduzido severamente); restrito (leve redução do tom); plano (tom ausente ou quase ausente) e lábil (alternado, com mudanças bruscas, sem relação com estímulos externos). 2. Humor inadequado: disfórico (estado de âni- mo desagradável); irritável (facilmente provocado até a raiva); lábil (alternado, oscilação entre eu- foria e depressão); exaltado (mais animado que o normal); euforia (sentimentos de grandeza); êxtase (arrebatamento); depressão e anedonia (sentimento psicopatológico de tristeza e perda do interesse e afastamento de todas as atividades regulares e pra- zerosas); tristeza ou luto (adequada a uma perda real) e alexitimia (incapacidade ou dificuldade para descrever ou conscientizar-se das próprias emoções e estados de ânimo). 84 ...................................................................................................................................................................................................................... Transtornos de personalidade 3. Ansiedade: sentimento de apreensão provocado pela antecipação de um perigo, interno ou externo. 4. Medo: ansiedade provocada por um perigo reco- nhecido. 5. Agitação: inquietação motora. 6. Tensão: aumento desagradável da atividade mo- tora ou psicológica. 7. Pânico: ataque intenso, agudo e episódico de ansiedade, associado a sentimentos sufocantes de medo. 8. Apatia: tom emocional sombrio, associado com desapego ou indiferença. 9. Ambivalência: coexistência simultânea de dois impulsos opostos com relação à mesma coisa. 10. Variação diurna: o humor está regularmente pior pela manhã, imediatamente após o despertar, melhorando ao longo do dia. Abordaremos agora o comportamento motor. Vejamos al- guns dos seus sinais e sintomas: 1. Ecopraxia: imitação patológica dos movimentos de outra pessoa. 2. Catatonia: anomalias motoras — desde uma posi- ção imóvel constantemente mantida a uma ativida- 85Conceito e tipos de transtornos de personalidade ...................................................................................................................................................................................................................... de motora agitada, sem finalidade e não influencia- da por estímulos externos. 3. Cataplexia: perda temporária do tono muscular e fraqueza. 4. Estereotipia: padrão repetitivo fixo de ação física ou fala. 5. Maneirismos: movimentos involuntários estereo- tipados. 6. Automatismo: desempenho automático de atos. 7. Mutismo: falta de produção da fala sem anorma- lidades estruturais. 8. Hiperatividade: agitação, inquietude, tique, so- nambulismo, compulsão (para ingerir álcool, furtar, arrancar os próprios cabelos, por exemplo). 9. Hipoatividade: atividade motora diminuída ou retardada. 10. Agressão: ação verbal ou física intensa dirigida a um objetivo. Outro aspecto a ser considerado é o pensamento. Suas perturbações podem ocorrer na sua forma (F) ou no seu conteúdo (C). 1. Transtorno mental (F): síndrome comportamental ou psicológica associada a angústia ou incapacidade. 86 ...................................................................................................................................................................................................................... Transtornos de personalidade 2. Psicose (F): incapacidade de distinguir entre rea- lidade e fantasia. 3. Pensamento autista (F): preocupação com o mun- do interior e privado. 4. Neologismo (F): novas palavras criadas por ra- zões psicológicas. 5. Verbigeração (F): repetição sem sentido de pala- vras ou frases específicas. 6. Ecolalia (F): repetição psicopatológica de pala- vras ou frases de outra pessoa. 7. Fuga de ideias (F): jogo de palavras que produzem uma constante mudança de uma ideia para outra. 8. Bloqueio (F): interrupção abrupta no curso do pensamento sem que a pessoa se recorde do que estava falando. 9. Glossolalia (F): também conhecido como “falar em línguas” — palavras ininteligíveis. 10. Pobreza de conteúdo (C): pensamento que, devi- do ao seu caráter vago, oferece poucas informações. 11. Delírio (C): falsa crença que não pode ser corri- gida pela argumentação (de pobreza, perseguição, grandeza, controle, infidelidade etc). 12. Hipocondria (C): preocupação exagerada com a própria saúde, sem base em patologia orgânica real, 87Conceito e tipos de transtornos de personalidade ...................................................................................................................................................................................................................... mas em uma interpretação irreal de sinais ou sensa- ções físicas como anormais. Nas organizações, não é incomum haver pessoas que acre- ditam ser perseguidas por seus chefes, pares e subordina- dos, sem que tenha acontecido algum fato que comprove isso. Também não é difícil conhecermos alguém que se preocupa excessivamente com a saúde e acredita ter doen- ças. Muitos hipocondríacos, ao saberem que alguém está doente, acreditam, por exemplo, terem também a tal doen- ça. Suas visitas aos médicos são frequentes, assim como sentem dores sem causa específica. E a fala? Quais são os sinais e sintomas desse aspecto da capacidade humana quando comprometido? 1. Pressão da fala: fala rápida, aumentada em quan- tidade e dificilmente interrompida. 2. Pobreza da fala: respostas monossilábicas. 3. Disprosódia: perda da melodia normal da fala. 4. Disartria: dificuldades na articulação. 5. Fala excessivamente alta ou baixa. 6. Gagueira. 7. Afasia: perturbações na emissão da linguagem (por exemplo: afasia nominal — dificuldade paralembrar o nome do objeto). 88 ...................................................................................................................................................................................................................... Transtornos de personalidade A percepção, que é um processo mental pelo qual os es- tímulos sensorais se tornam conscientes, também é um aspecto a ser considerado nos transtornos psicológicos. Vejamos: 1. Alucinação: percepção sensorial falsa, não asso- ciada com a realidade (pode ser auditiva, visual, ol- fativa, gustativa, tátil etc). 2. Autotopagnosia: negação de uma parte do corpo. 3. Macropsia: os objetos parecem maiores do que são. 4. Micropsia: os objetos parecem menores do que são. 5. Personalidade múltipla: uma pessoa que, em di- ferentes momentos, parece estar de posse de uma personalidade ou caráter inteiramente diferente. E a memória? Como ela é afetada? 1. Amnésia: incapacidade total ou parcial para re- cordar experiências passadas, podendo ter origem orgânica ou emocional. 2. Paramnésia: falsificação da memória pela distor- ção da recordação, falso reconhecimento da memória. 3. Hipermnésia: grau exagerado de retenção e re- cordação. 4. Imagens eidéticas: recordações visuais de vivi- dez quase alucinatória. 89Conceito e tipos de transtornos de personalidade ...................................................................................................................................................................................................................... A inteligência, ou seja, a capacidade de entender, recordar e integrar o aprendizado também é um aspecto a ser con- siderado em nosso estudo. A seguir, sinais e sintomas de seu comprometimento. 1. Retardo mental: falta de inteligência que com- promete o desempenho social e ocupacional. 2. Demência: deterioração do funcionamento inte- lectual, provocada por disfunção cerebral orgânica, sem obscurecer a consciência. 3. Pseudodemência: semelhante à demência, porém provocada frequentemente pela depressão. E, por fim, temos o insight: a capacidade para compreen- der causa e significado reais de uma situação; e o julga- mento: capacidade para avaliar e agir adequadamente diante de uma situação. Uma vez prejudicados, temos as seguintes reações do indivíduo: 1. Insight prejudicado: redução na capacidade para compreender a realidade objetiva de uma situação. 2. Julgamento prejudicado: redução na capacida- de para compreender corretamente uma situação e agir adequadamente. Como vimos, a lista apresentada acima nos esclarece acer- ca de sinais e sintomas de possíveis transtornos patoló- gicos. Porém, cabe ressaltar que somente o profissional psicólogo ou o médico psiquiatra estão habilitados para diagnosticarem e tratarem tais transtornos. 90 ...................................................................................................................................................................................................................... Transtornos de personalidade O diagnóstico de um transtorno psicológico é algo muito sério, que precisa ser feito com cautela e após avaliações psicológicas. Um sinal ou sintoma isolados não caracteri- zam um transtorno psicológico. Situações estressantes e perdas podem desencadear sintomas isolados sem neces- sariamente caracterizarem uma patologia, uma síndrome. O gestor de recursos humanos pode, no entanto, ser sen- sibilizado acerca deles para reconhecer quando um indi- víduo na organização precisa de ajuda profissional para fazer o devido encaminhamento. A seguir, vamos conhecer os tipos de transtornos de per- sonalidade. Quando conhecemos uma pessoa, acreditamos poder su- por quais serão suas reações em determinadas situações. Isso é possível porque a personalidade é composta por traços emocionais e comportamentais relativamente está- veis e previsíveis. Segundo Kaplan e Sadock (1993, p. 556), “apenas quando os traços de personalidade são inflexíveis e desajustados, causando funcionamento significativamente prejudicado ou aflição subjetiva, constituem uma classe de transtorno de personalidade. Os pacientes com distúrbios de perso- nalidade mostram padrões profundamente entranhados, inflexíveis e mal ajustados de relacionamento e percepção do ambiente e de si mesmos”. De acordo com o Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (DSM-III-R), os transtornos de persona- 91Conceito e tipos de transtornos de personalidade ...................................................................................................................................................................................................................... lidade podem ser divididos em três grupos, conforme ta- bela a seguir. Grupos A B C Tipos Paranoide Histriônico Evitativo Esquizoide Narcisista Dependente Esquizotípico Antissocial Obsessivo-compulsivo Borderline Passivo-agressivo Fonte: KAPLAN; SADOCK, 1993, p. 556. Vejamos cada um deles. GRUPO A: 1. Transtorno de personalidade PARANOIDE: as pessoas que sofrem deste transtorno são desconfia- das e acreditam ser exploradas, perseguidas e hu- milhadas pelos outros. Ciumentos, não confiam na lealdade dos amigos e na fidelidade do cônjuge. São irritáveis, rancorosos e reagem com agressividade e hostilidade frente a diversas situações. Essas pes- soas não assumem para si a responsabilidade pe- los seus sentimentos e acusam os demais por suas emoções, impulsos e pensamentos. São frias e geral- mente geram medo nas pessoas. Em geral, suas rela- ções pessoais e profissionais são permanentemente conflituosas. 2. Transtorno de personalidade ESQUIZOIDE: esse transtorno acomete pessoas extremamente retra- ídas, que evitam interagir com outras, preferindo atividades solitárias. Parecem frios, indiferentes, distantes, isolados e não possuem amigos ou con- 92 ...................................................................................................................................................................................................................... Transtornos de personalidade fidentes. Dificilmente retribuem a um aceno ou sorriso. Não experimentam emoções como raiva ou alegria. Sua libido pode ser direcionada para ativi- dades que não dependem de contato ou relaciona- mento, tal como a matemática. Podem ser ligadas a animais. 3. Transtorno de personalidade ESQUIZOTÍPICA: as pessoas com esse transtorno são percebidas pe- los outros como estranhas, abobalhadas e alheias. Geralmente são excêntricas no modo de se vestir e de se comportar. Podem ser supersticiosos e costu- mam acreditar que possuem um sexto sentido, ou que podem sentir a presença de pessoas ausentes ou falecidas. Seu discurso é pobre, vago e estranho, muitas vezes parecendo ter sentido somente para si mesmas. Sentem-se desconfortáveis diante de pes- soas desconhecidas e são sensíveis à agressividade dos outros. Seu afeto é inadequado ou constrito. Nos casos graves do transtorno pode ocorrer ane- donia ou depressão grave. GRUPO B: 1. Transtorno de personalidade HISTRIÔNICO: os histriônicos são extrovertidos, sedutores, exuberan- tes, dramáticos e emotivos. Desejam ser o centro das atenções e sentem-se desconfortáveis em situa- ções contrárias a isso. Exageram sentimentos, pen- samentos e comportamentos. Precisam de elogios e de aprovação dos outros e, se não recebem, podem ficar mal-humorados, fazer acusações e chorar aos soluços. 93Conceito e tipos de transtornos de personalidade ......................................................................................................................................................................................................................2. Transtorno de personalidade NARCISISTA: o narcisista considera-se especial e melhor do que os outros. Não aceita críticas, reagindo a elas com raiva. Quer levar vantagem em tudo por acreditar que merece o melhor: sucesso, poder, beleza, amor, dinheiro. Sem capacidade empática, desmerece os sentimentos e problemas dos outros e se acha um ser único e especial que merece ser reconhecido. A exploração nos relacionamentos pessoais e profis- sionais é muito comum para alcançar vantagens. 3. Transtorno de personalidade ANTISSOCIAL: pessoas com este transtorno são manipuladoras, mentirosas e não confiáveis. Frias, inconsequentes, agressivas e desprovidas de culpa ou remorso. Bur- lam normas e regras desde a infância, como faltar à escola, fugir de casa, cometer furtos, envolver-se em brigas e em atividades ilegais. Pode ser fisicamente cruel com pessoas e animais. Estabelece relaciona- mentos, mas não os mantêm. Esse tipo de transtorno se manifesta geralmente na infância ou adolescência. 4. Transtorno de personalidade BORDERLINE: são emocionalmente instáveis e apresentam humor os- cilante. Podem estar deprimidos em um momento e eufóricos em outro. Suas relações são tumultuadas, pois a personalidade borderline pode ser tanto depri- mida e dependente quanto raivosa e hostil quando frustrada. Possuem incertezas sobre si mesmos e suas escolhas. Podem cometer atos suicidas e de au- toflagelo. Apresentam sentimento de vazio crônico e dividem as pessoas como boas ou más, idealizando as “boas” e rejeitando e desvalorizando as “más”. Pro- 94 ...................................................................................................................................................................................................................... Transtornos de personalidade curam alianças com pessoas e grupos instáveis, osci- lando entre “grande amizade” e “rancor profundo”. GRUPO C: 1. Transtorno de personalidade EVITATIVO: a per- sonalidade evitativa refere-se a pessoas que são tí- midas, retraídas e com grande sensibilidade à rejei- ção. Seu forte desejo de relacionar-se e ser aceito sem críticas vai de encontro ao medo de serem re- jeitadas, fazendo com que evitem relacionamentos que não lhes assegurem afeto. No trabalho, assu- mem posições de subordinação e preferem servir a liderar. Gostam de agradar as pessoas para serem amados e aceitos. Facilmente magoam-se por conta de críticas e desaprovação. 2. Transtorno de personalidade DEPENDENTE: as pessoas que sofrem deste transtorno são inseguras, passivas e não conseguem tomar decisões. Geral- mente se unem a pessoas controladoras, que pos- sam tomar as rédeas de sua vida. Têm forte medo da solidão e abandono, por isso se submetem aos desejos dos outros sem questionar e a atividades humilhantes para serem amados e aceitos. 3. Transtorno de personalidade OBSESSIVO-COM- PULSIVO: pessoas acometidas por esse transtorno são rígidas, inflexíveis, seguem uma rotina preesta- belecida que impõem às suas vidas e tentam impor aos demais. Sentem medo do erro, pois buscam a perfeição. Tal medo dificulta a tomada de decisão. Preferem trabalhos rotineiros, metódicos e precisos. 95Conceito e tipos de transtornos de personalidade ...................................................................................................................................................................................................................... 4. Transtorno de personalidade PASSIVO-AGRES- SIVO: resistem passivamente às demandas dos ou- tros, evitando obrigações. Irritam-se ao serem soli- citadas a fazer algo que não desejam, tornando-se agressivas. No trabalho em equipe não cumprem com suas responsabilidades, sobrecarregando ou- trem. Acreditam realizar um bom trabalho e não aceitam críticas sobre sua produtividade. Para cada transtorno de personalidade um tratamento pode ser indicado. No próximo tópico, veremos como o gestor de recursos humanos deve agir frente aos colabora- dores que demonstram sofrerem algum tipo de transtorno e que estejam comprometendo o desempenho funcional, a produtividade e as relações de trabalho. 96 ...................................................................................................................................................................................................................... Transtornos de personalidade ANÁLISE E ENCAMINHAMENTO DE SOLUÇÕES PARA OS PROBLEMAS DE DESEMPENHO NAS ORGANIZAÇÕES CAUSADOS POR TRANSTORNOS DE PERSONALIDADE Como apresentamos, para cada transtorno de persona- lidade a área de saúde mental indicará um tipo de tra- tamento específico. Na maioria dos casos, a psicoterapia deve ser acompanhada da farmacoterapia, ou seja, do uso de medicamentos. Nesses casos, o tratamento deve ser conduzido por equipe multidisciplinar, pois o profissio- nal psicólogo não pode medicar pacientes. A Psiquiatria, sendo a especialidade médica que trata as doenças men- tais, é representada pelo médico psiquiatra, e somente ele poderá prescrever medicações. Antes de apresentarmos as indicações de tratamento ideais para cada tipo de transtorno de personalidade, foco deste tópico, cabe uma pequena observação sobre o conhecimen- to que estaremos adquirindo a partir deste capítulo. O gestor de recursos humanos deverá ter muito cuida- do para não enquadrar erroneamente colaboradores nos tipos de transtornos de personalidade apresentados. O diagnóstico é de responsabilidade de profissional da saú- de mental: psicólogos e psiquiatras. Este guia é uma refe- rência, mas não propõe nenhum tipo de enquadramento de pessoas nas empresas. Ele poderá ajudar o profissional de recursos humanos no processo seletivo, por exemplo, 97Análise e encaminhamento de soluções para os problemas de desempenho nas organi- zações causados por transtornos de personalidade ...................................................................................................................................................................................................................... para compreender a personalidade de candidatos a va- gas na organização. Poderá, ainda, orientar o gestor de recursos humanos sobre como proceder diante de surtos psicológicos que ocorram na empresa. Poderá colaborar indicando que decisão deverá ser tomada a respeito de um colaborador que pareça sofrer de algum transtorno por conta de sua baixa produtividade ou que esteja enfren- tando conflitos nas relações interpessoais, que afetem seu desempenho. Vale lembrar que pessoas que sofrem do transtorno de personalidade obsessivo-compulsivo, por exemplo, são al- tamente produtivas em tarefas rotineiras, sistemáticas e precisas. Nem todo transtorno significa impossibilidade ou incapacidade de trabalho. Em alguns casos, o tratamen- to pode proporcionar uma vida normal para essas pessoas. Com caráter informativo, uma vez que o gestor de recur- sos humanos não atuará como psicólogo ou psiquiatra na empresa, seguem abaixo as Técnicas de Tratamento para Transtornos de Personalidade do DSM-III-R, contidas no Compêndio de Psiquiatria: ciências comportamentais - Psiquiatria Clínica (KAPLAN; SADOCK, 1996, p. 574-575). GRUPO A: 1. Transtorno de personalidade PARANOIDE: a psi- coterapia deverá ser conduzida de modo a reduzir a hipersensibilidade às críticas, melhorar habilida- des sociais e identificar os estressores principais. A farmacoterapia deve considerar o uso de antip- sicóticos. 98 ......................................................................................................................................................................................................................Transtornos de personalidade 2. Transtorno de personalidade ESQUIZOIDE: a psicoterapia, nesses casos, deve encorajar gradual- mente atividades interpessoais. A farmacoterapia deve considerar o uso de antipsicóticos, beta blo- queadores e IMAOs. 3. Transtorno de personalidade ESQUIZOTÍPICA: a psicoterapia deve treinar habilidades cognitivas e o manejo da ansiedade para a fobia social que acomete. Compreender os sentimentos íntimos do paciente e especificá-los poderá colaborar com a resposta posi- tiva deste ao tratamento. A farmacoterapia deve con- siderar o uso de antipsicóticos, tricíclicos e IMAOs. GRUPO B: 1. Transtorno de personalidade HISTRIÔNICO: a psicoterapia deve identificar padrões mal ajustados na escolha de parceiros íntimos, salientar a impor- tância de tentar manter a calma, a lógica e a razoabi- lidade nas crises e impor limites. Deverá buscar mo- derar a expressão emocional e a manipulação para conseguir atenção. Encorajar a ternura, a sincerida- de e a empatia. A farmacoterapia deve considerar a prescrição de IMAOs. 2. Transtorno de personalidade NARCISISTA: a psi- coterapia deve mesclar confrontação e empatia, co- municando as qualidades e as vulnerabilidades do paciente. Capacitar o paciente no controle de seus impulsos. A farmacoterapia deve considerar a pres- crição de lítio, IMAOs e tricíclicos. 99Análise e encaminhamento de soluções para os problemas de desempenho nas organi- zações causados por transtornos de personalidade ...................................................................................................................................................................................................................... 3. Transtorno de personalidade ANTISSOCIAL: a psicoterapia indicada para este transtorno deve ser a de grupo. Deverão ser avaliados os recursos e as fraquezas do paciente. Ele deverá ser introduzido em atividades pró-sociais e tratado com respeito e consideração. A farmacoterapia para esse transtor- no não está determinada. 4. Transtorno de personalidade BORDERLINE: o relacionamento na psicoterapia deve ser de soli- dariedade e entendimento. Foco no senso frágil da identidade e nas impressões mutáveis e altamente contraditórias de si mesmo. Deve ser direcionado para o controle de seus impulsos e para a solução de problemas. A farmacoterapia deve prever o uso de antipsicóticos, IMAOs, tricíclicos, carbamazepi- na, lítio e estimulantes. GRUPO C: 1. Transtorno de personalidade EVITATIVO: a psi- coterapia deve facilitar oportunidades de aumen- tar a autoestima, treinando habilidades sociais e a reestruturação cognitiva. A farmacoterapia deve prever o uso de IMAOs, bloqueadores beta adrenér- gicos, estimulante. 2. Transtorno de personalidade DEPENDENTE: a psicoterapia deve aumentar a capacidade de funcio- namento mais independente do paciente e ajudá-lo a manejar a sua ansiedade. A farmacoterapia deve prever o uso de tricíclicos, IMAOs e alprazolam. 100 ...................................................................................................................................................................................................................... Transtornos de personalidade 3. Transtorno de personalidade OBSESSIVO-COM- PULSIVO: a psicoterapia deve encorajá-lo a libe- rar-se e a se divertir, evitando a intelectualização excessiva. Desenvolver o modo de lidar apropriada- mente com suas próprias emoções e as dos outros. Afrouxamento de enfoque racional, lógico e obsti- nado à vida. Para a farmacoterapia deve-se conside- rar o uso de clomipramina, fluoxetina. 4. Transtorno de personalidade PASSIVO-AGRESSI- VO: a psicoterapia deve evitar o aconselhamento de conselhos apoiadores ou “salvamento”. Deverá con- frontar com cunho terapêutico pagamentos atrasa- dos, atrasos em horários, faltas a sessões etc. As técnicas apresentadas acima devem ser conduzidas por profissional específico da área de saúde, conforme mencionado inúmeras vezes neste capítulo. O profissio- nal de recursos humanos, conhecedor dos sinais e sinto- mas desses transtornos, poderá se sensibilizar diante de situações específicas com colaboradores, que podem ser justificadas por suas experiências. Essas situações podem envolver baixo desempenho e produtividade, problemas de relacionamento e surtos psicológicos. Caberá ao gestor fazer o reconhecimento e o encaminha- mento para profissional específico na empresa, que pode ser um psicólogo ou médico do trabalho, que saberá con- duzir o colaborador para tratamento específico. Uma vez em tratamento e com indicação médica para con- tinuar atuando na empresa, este guia poderá colaborar na forma de lidar com cada tipo de transtorno. 101Análise e encaminhamento de soluções para os problemas de desempenho nas organi- zações causados por transtornos de personalidade ...................................................................................................................................................................................................................... Vejamos alguns exemplos: No caso do transtorno de personalidade dependente. Como vimos, a psicoterapia deve aumentar a capacidade de funcionamento mais independente do paciente e aju- dá-lo a manejar a sua ansiedade. Na empresa, o gestor de recursos humanos pode orientar o gestor do colaborador a delegar-lhe funções, projetos e responsabilidades sem que este dependa do trabalho de outra pessoa. Assim, ele estará colaborando com o tratamento. No transtorno de personalidade evitativo, a pessoa que está em tratamento poderá ser ajudada na empresa sen- do envolvida em trabalhos de equipe, por exemplo, ou apoiando campanhas sociais que necessitem a solicitação da colaboração de outros. A campanha do agasalho, por exemplo, envolve solicitar casacos, cobertores, mantas para doação. 102 ...................................................................................................................................................................................................................... Transtornos de personalidade REFERÊNCIAS GLINA, D.R.M; ROCHA, L.E.; BATISTA, M.L.; MENDONÇA, M.G.V, Saúde mental e trabalho: uma reflexão sobre o nexo com o trabalho. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Ja- neiro, v. 17, n. 3, p. 607-616, maio/jun., 2001. Disponível em: <http://www.scielosp.org/pdf/csp/v17n3/4643.pdf>. Acesso em: 10 jul. 2013. KAPLAN, H.I., M.D.; SADOCK, B.J., M.D. Compêndio de psiquiatria: ciências comportamentais: psiquiatria clínica. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1993. LOUZÃ NETO, Mario Rodrigues; CORDÁS, Táki Athanná- sios. Transtornos de personalidade. Porto Alegre: Ed.Art- med, 2011. Disponível em: < http://www.grupoa.com. br/livros/psiquiatria/transtornos-da-personalidade-e- book/9788536325804>. Acesso em: 8 fev. 2014. 103 ...................................................................................................................................................................................................................... CONSIDERAÇÕES FINAIS Enquanto gestores de recursos humanos, devemos estar preparados para enfrentar as dificuldades com os cola- boradores, que poderão necessitar de ajuda especial. Co- laborar com a psicoterapia não significa assumir para si a responsabilidade sobre o tratamento do paciente, mas trabalhar em parceria com o profissional responsável (psi- cólogo ou médico) para que o tratamento tenha sucesso. Neste capítulo, conhecemos os sinais e sintomas dos transtornos psicológicos que podem ser percebidos nas alterações dacapacidade humana. Entendemos que um sintoma ou sinal isolado pode não caracterizar uma doença mental, pois um transtorno é definido como um conjunto de sinais e sintomas corres- pondentes a uma patologia específica. Ficou claro que o psicólogo e o médico são os profissio- nais habilitados e responsáveis pelo diagnóstico e trata- mento dessas enfermidades. Conhecemos ainda os tipos de transtornos de personali- dade e as técnicas mais indicadas para cada tipo. Compreendemos que o gestor de recursos humanos, co- nhecedor dos sinais e sintomas desses transtornos, po- derá se sensibilizar diante de situações específicas com colaboradores, que podem ser justificadas por suas ex- periências. Essas situações podem envolver baixo desem- 104 penho e produtividade, problemas de relacionamento e surtos psicológicos. Caberá ao gestor fazer o reconhecimento e o encaminha- mento para profissional específico na empresa, que pode ser um psicólogo ou médico do trabalho que saberá con- duzir o colaborador para tratamento específico. Uma vez em tratamento e com indicação médica para con- tinuar atuando na empresa, este guia poderá colaborar na forma de lidar com cada tipo de transtorno. E assim encerramos o nosso estudo, certos de que o conteúdo apresentado deverá ser bastante útil para aqueles que atuam ou atuarão como gestores de pes- soas e assumem com isso um compromisso com a saú- de da organização. Desejamos sucesso em sua caminhada!