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por que o pensamento evolucionista social é insuficiente para explicar a divercidade cultural humana?

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Yasmin Pedroso II

No campo das antropologias não-biológicas (etnologia; antropologia social e cultural), há uma diversidade de abordagens. A noção de cultura é básica para se compreender os movimentos pelos quais passou esta disciplina, inicialmente parte da Antropologia (geral, sem distinções) do início do século XIX, e que pretendia abordar todos os aspectos das questões acerca da diversidade humana.

O mesmo debate que, na Antropologia Física (biológica) substitui o conceito de Raça pelo de População, desde meados do século XIX até meados do Século XX, ocorreram no âmbito da Antropologia de cunho mais social, em que a diversidade humana transitou pelos conceitos de Raça; Etnia e Cultura. E se confunde com a própria história da disciplina.

Para uma visão mais abrangente, resumirei antes de entrar no assunto específico do conceito de cultura e o debate entre este conceito e o de raça, enfocarei outra questão importante, que diz respeito à história da antropologia.
Por influência do darwinismo, no início da antropologia social, o projeto de dar conta da diversidade cultural levou naturalistas e historiadores a debruçarem-se sobre os relatos de viajantes; exploradores e administradores coloniais que falavam sobre “as exoticidades” das sociedades “inferiores”; incivilizadas; simples, em relação a uma visão industrial da técnica; e, finalmente, primitivas, por serem mais remanescentes de formas antigas, primeiras, da evolução das sociedades humanas. O relativo isolamento geográfico destas sociedades e povos contribuiu para esta visão. Assim, a Antropologia Social , partindo de questões evolucionistas importantes para os estudiosos do século XIX, ficou vista como “ciência das sociedades primitivas”. Mas com a persistência destas sociedades em resistirem até a atualidade de forma bastante diferente da tradição européia, colocou um problema crucial para esta visão evolucionista e etnocêntrica da diversidade humana. Este fato motivou variações ao longo da história da disciplina e de seus conceitos. Os antropólogos voltaram-se, a partir dos próprios resultados das pesquisas nestes povos com “culturas diferenciadas”, para sub-grupos ou sub-culturas no interior das sociedades “complexas”: os estudos de “comunidades camponesas” de Redford; os estudos voltados para grupos marginalizados nas regiões urbanas até, finalmente, estudos voltados para grupos pertencentes às classes populares e altas da sociedade moderna, culminaram por desembocar em uma análise crítica da visão de mundo ocidental moderna e da globalização, inclusive a da própria cultura científica nas áreas médicas e da saúde pública (cf. Verani, 1990 e 1994; Duarte, et al., 1998; Lupton, 1999; Petersen e Bunton, 2002).

Voltando ao conceito de cultura, algumas das principais correntes teóricas que influenciaram variações do mesmo são: o evolucionismo e suas influências no difusionismo e na sociologia francesa de Durkheim e Mauss; o marxismo e a sociologia de Marx Weber; e o estruturalismo de Lévi-Strauss. O funcionalismo inglês e as vertentes culturalistas americanas também se inserem neste campo.

Tylor e Boas foram os que mais enfatizaram o adjetivo cultural ligado à antropologia, em um movimento iniciado na Inglaterra, em início do século XIX, e nos Estados Unidos. Mas na França, com a Sociologia de Comte bem solidificada enquanto disciplina independente das demais Ciências Humanas, Durkheim; Mauss e Lévi-Strauss são autores importantes que vinculam a Antropologia Social à Sociologia, como uma sub-disciplina desta última.

A noção de cultura é o cerne de uma antropologia que separava o determinismo biológico “racial” das manifestações de comportamento aprendidas pelos indivíduos de uma sociedade após o nascimento. Estes aspectos eram considerados então como de ordem “ambiental” no debate das relações entre Raça e Cultura. Para uma revisão dos diversos conceitos de cultura e de antropologia, até à metade do século XX, com suas teorias subjacentes, conferir a coletânea de Shapiro, 1956; Mair, 1965; Copans, 1971; Laraia, 1986. Mas para efeitos didáticos, cito aqui a definição de cultura de Tylor (1871, apud Mair, op.cit.:15-16): Cultura é (...) “conhecimentos; crenças; artes; moral; leis; costume e quaisquer outras capacidades e hábitos adquiridos pelo homem como membro da sociedade.”

Como comenta Mair, esta é mais uma lista de itens do que uma definição ou uma teoria que descreva e explique a diversidade humana.Boas, na América, interessou-se pelas “artes e técnicas”. Na prática, o estudo da cultura refere-se a costumes; maneiras e técnicas tradicionais específicas de uma sociedade. Esta vertente culturalista da Antropologia considerava-se mais próxima da Antropologia Física; da Lingüística; e da Arqueologia. Sua ênfase maior era em descrever e entender a diversidade humana.

Já a outra vertente citada, incluindo o funcionalismo institucional de Malinowiski e o funcionalismo-estrutural de Radcliffe-Brown, considerando-se mais próximo das Ciências Sociais, detiveram-se mais, através do método comparativo, no desenvolvimento teórico de generalizações sobre todos os tipos de sociedades humanas.

Malinowiski, também considerado o “pai do trabalho de campo”, o método privilegiado de estudos etnológicos, enfatizava que os estudiosos deveriam descrever todos os aspectos vinculados numa dada sociedade ao complexo, por exemplo, da função alimentar : técnicas agrícolas; formas de distribuição dos alimentos entre grupos e indivíduos; instituições de trocas (comércio ou circulação de bens); etc. Malinowiski via a sociedade através de uma metáfora anatômica em que na morfologia das sociedades, as instituições cumpriam as mesmas funções que os órgãos e sistemas do corpo humano. A metáfora mecânica de estrutura e funcionamento também influenciou as teorias sobre as sociedades humanas, como no funcionalismo, em que, porém, a metáfora fisiológica predominava. A noção de sistema dinâmico é parte desta influência.

É necessário, não obstante, as diferenças atribuídas ao conceito de “estrutura”. Apesar de utilizado por Malinowiski; Radcliffe-Brown; Evans-Pritchard; e outros, foi com Lévi-Strauss que este conceito, influenciado pelas teorias da lingüística, tornaram-se mais abstratos e ligados a questões mais sociais que a metáforas tomadas de disciplinas como a biologia e a mecânica. Lévi-Strauss, critica e sintetiza a definição de cultura mais utilizada: “hábitos; atitudes; comportamentos; maneiras próprias de agir sentir e pensar de um povo” e enfatiza a “estrutura sub-consciente de pensamento”. Para o estruturalismo de Lévi-Strauss, a diversidade humana não é importante, e sim a similaridade humana de pensamento. Nesta teoria, o conceito de cultura ganha um sentido residual. “Residual, porém irredutível”, como coloca Carneiro da Cunha (1986), em que a identidade de grupo é fundamental na construção da Pessoa Humana.

Para o a antropologia atual, cultura é um sistema simbólico (Geertz, 1973), característica fundamental e comum da humanidade de atribuir, de forma sistemática; racional e estruturada, significados e sentidos “às coisas do mundo”. Observar; separar; pensar e classificar; atribuindo uma ordem totalizadora ao mundo, é fundamental para se compreender o conceito de cultura atualmente definido como “sistema simbólico”, e sua diversidade nas sociedades humanas, mesmo neste período atual de modernidade tardia.

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