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Para ilustrar a diversidade, consideraremos, como ponto de referência uma das reflexões feita por Malinowski

Para ilustrar a diversidade, consideraremos, como ponto de referência uma das reflexões feita por Malinowski, logo na introdução do livro de sua autoria “Os Argonautas do Pacífico Ocidental” (1922) que diz:

Imagine-se o leitor repentinamente sozinho, em meio, a todo o seu equipamento, em uma praia tropical perto de uma aldeia nativa, enquanto a lancha ou o escaler que o trouxe vai-se afastando no mar até sumir de vista. Depois de se ter acomodado no alojamento de algum homem branco da vizinhança, comerciante ou missionário, o que lhe resta a fazer é começar imediatamente o seu trabalho etnográfico.

 

Diante da análise desta afirmativa é correto dizer que:

Escolha uma:

💡 4 Respostas

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LR

 

Resposta: Está CORRETA a alternativa (a) faz alusão ao chamado modelo clássico de etnografia.

Justificativa: O antropólogo Bronislaw Kasper Malinowski (1884 – 1942), foi um importante antropólogo funcionalista. Muito preocupado com a investigação de campo, tem como uma de suas obras mais celebradas o livro Os Argonautas do Pacífico Ocidental publicado em 1922. “Em se tratando de um novo método de investigação antropológica, não se pode deixar de fazer referência ao seu principal fundador Bronislaw Malinowski (1884-1942). A publicação da sua principal obra Os argonautas do Pacífico Ocidental, trouxe uma revolução para a antropologia no que diz respeito à forma de compreender o homem e a sua cultura como também à forma de “fazer” antropologia. Do ponto de vista metodológico, o trabalho de Malinowski se fundamenta na convivência intensa com os nativos como elemento importante para compreender a sua cultura.” (SANTOS, 2008: 286). O funcionalismo de Malinowski toma como verdade que “os homens só podem satisfazer as suas necessidades, sejam as básicas - nutrição, proteção e procriação – ou as derivadas destas, dentro da cultura” (SANTOS, 2008: 287), e dessa forma focaliza-se em “algumas instituições específicas procurando chegar ao todo através das partes diferentemente do culturalismo que se propõe a descrever os costumes de uma cultura” (SANTOS, 2008: 287).

A Respeito do livro citado, algumas considerações são interessantes:

“Um dos grandes desafios para qualquer texto antropológico é o momento de tradução da experiência de campo para a narrativa, isto é, a construção do texto etnográfi co. Malinowski opta por iniciar com os capítulos que oferecem o background para o conhecimento da instituição Kula em Argonautas do Pacífico Ocidental. Ali, o autor descreve de forma pormenorizada o quadro geográfico no qual a expedição ou a preparação da mesma se encontra. Ao seguir o movimento da viagem, Malinowski constantemente interrompe, em um primeiro momento, o fio descritivo para oferecer explicações sociológicas, sendo que o livro é organizado “retalhando” uma viagem Kula para posteriormente observá-la em sentido inverso em um só fôlego.” (CORDEIRO, 2013: 120).

“O elemento da viagem é crucial, possuindo diferentes temporalidades ao longo da narrativa, seja esta aumentada durante os primeiros capítulos ou condensada no capítulo que representa a viagem de Sinaketa a Dobu. Desta forma, no livro tem-se, no primeiro momento, uma proposição sobre como a viagem antropológica deve ser realizada (introdução) e, posteriormente, a descrição pormenorizada da expedição em seus elementos geográficos e sociológicos, em tempo ampliado, de forma a demonstrar todos os detalhes à exaustão. Em seguida, é realizada uma viagem sem interrupções reflexivas no sentido inverso, costurando os fios que conformam a instituição e já são de conhecimento do leitor para que o autor possa realizar nos próximos cinco capítulos algumas descrições ainda não completamente detalhadas ou sintetizadas, finalizando com um capítulo síntese de toda a obra. Isto é, a viagem reproduz a aproximação do etnógrafo, sendo necessário esse deslocamento físico e analítico para a produção da compreensão do “espírito nativo” de modo menos modelar e mais modulado a cada fôlego metodológico e narrativo.” (CORDEIRO, 2013: 120).

“Na obra, Malinowski por vezes aparece como um observador onisciente, não explicitando o processo pelo qual chegou às conclusões apresentadas, o que atendia ao estilo científico do momento histórico em que escreve. Ao passo que na maior parte dos momentos, o autor se inclui no texto e faz parte da construção narrativa, estilo este que se impõe e o aproxima de suas observações.” (CORDEIRO, 2013: 120)

“Para utilizar as noções propostas por este artigo, no primeiro caso o autor estaria construindo modelos e no segundo modulações. Um exemplo de seu primeiro movimento é o seu (não)lugar na maioria das cerimônias apresentadas ou no modo como acompanhava as viagens marítimas, junto ou longe dos nativos. No entanto, em outras passagens, o autor pincela observações diretas com as suas impressões, como no capítulo VIII, quando conta que fez uma viagem de barco sozinho, depois de um dia de muito trabalho nos estágios iniciais do Kula. Assim, ele pôde ver que, como os nativos de Trobriand, aqueles de Guamasila que haviam partido para o Kula na manhã do mesmo dia estavam sentados em uma praia há pouca distância da aldeia de onde haviam se preparado para ir. Outro exemplo relevante de sua interação explicitada com os nativos é aquela já mencionada no capítulo X, quando ele adoece e sua enfermidade é explicada pelos nativos como efeito de um “chute” de uma bruxa voadora, pois ficava perto da plataforma de canoas, onde era advertido pelos nativos a não permanecer. Por meio de um ritual, foi realizada a cura do autor que, mesmo duvidando da relação entre causa e efeito nos procedimentos nativos, faz o registro na etnografia, sem lançar mão de juízos de valor.” (CORDEIRO, 2013: 121).

“Ressalte-se que o processo da viagem em si – desde o conhecimento da compleição física das tribos que habitam as ilhas Trobriand, passando pelas suas divisões de trabalho, posições de chefia e ornamentações festivas para o grande sistema de trocas que abrange a maioria das ilhas – é mais detalhado pelo etnógrafo do que o momento mesmo da troca ritual. Isto porque esses momentos anteriores à troca fornecem a “carne” e o “sangue” procurados pelo autor; daí a necessidade de percorrer esse caminho metodológico, uma espécie de estratégia adotada seguida por Malinowski. Nesse contexto, o suposto clímax – as trocas dos objetos do Kula – acaba não se revelando como o momento mais importante da narrativa.” (CORDEIRO, 2013: 121).

“Desta forma, o clímax em Argonautas do Pacífico Ocidental é, de certo modo, um anticlímax. Ao compararmos o elemento da viagem e movimento desta obra com No coração das Trevas, de Joseph Conrad (2008), ficam evidentes as diferenças entre as mesmas. A obra de Conrad exercita uma viagem com implicações pessoais e não acompanha uma expedição ritual de um povo, tal como a de Malinowski. Assim, aquilo que é mais relevante, ou seja, o clímax da viagem em No coração das trevas é o encontro com Kurtz e suas palavras a respeito do horror, isto é, o estranhamento ocorre somente após visitar as trevas. Ao passo que em Argonautas do Pacífico Ocidental, o objeto de estudo é modulado por meio da viagem, sendo o esperado clímax a culminância de uma síntese possível dos elementos nativos observados e da análise construída sobre os mesmos. No entanto, não há reifi cação do Kula, sendo essa instituição apresentada como os vínculos e pontos de fuga do circuito de trocas modulados a partir das expedições acompanhadas.” (CORDEIRO, 2013: 121-122).

 

--A respeito do método etnográfico:

A etnografia é “o primeiro estágio da pesquisa antropológica: observação e descrição, trabalho de campo” (ABBAGNANO, 2007: 452). Mas a antropológica não é um campo uniforme, há categorias internas de pesquisa. A etnografia é o primeiro estágio da pesquisa antropológica que trata especificamente da cultura: A antropologia cultural. No tópico I Descrição Antropologia, consta o que devemos compreender por Antropologia, e por duas de suas categorias de pesquisa, a antropologia cultural e a antropologia física. No tópico II Antropologia e pesquisa etnográfica serão citadas as formas com que o debate surge em Levi-Strauss, Magnani, e Roy Wagner.

I Descrição Antropologia:

Antropologia é “ciência do homem no sentido mais lato, que engloba origens, evolução, desenvolvimentos físico, material e cultural, fisiologia, psicologia, características raciais, costumes sociais, crenças etc.” (HOUAISS, 2009: 150). O fazer antropológico é a sistematização dos “conhecimentos que se têm a respeito do homem” (ABBAGNANO, 2007: 74). São campos da disciplina a antropologia física e a antropologia cultural:

1) Antropologia física: “a que estuda a origem e a evolução biológica da humanidade e as diversidades raciais de seus subgrupos” (HOUAISS, 2009: 150); a “que considera o homem do ponto de vista biológico, em sua estrutura somática, em suas relações com o ambiente, em suas classificações raciais” (ABBAGNANO, 2009: 74).

2) Antropologia cultural: “a que trata do estudo da cultura do homem em todos os seus aspectos, servindo-se assim de dados e conceitos próprios de diversas outras ciências, como a arqueologia, a etnologia, a etnografia, a linguística, a sociologia, a economia etc” (HOUAISS, 2009: 150), em outras palavras, a “que considera o homem nas características que derivam das suas relações sociais” (ABBAGNANO, 2009: 74).

II Antropologia e pesquisa etnográfica

Como vimos, a etnografia é “o primeiro estágio da pesquisa antropológica: observação e descrição, trabalho de campo” (ABBAGNANO, 2007: 452), mais especificamente da Antropologia Cultural, “a que trata do estudo da cultura do homem em todos os seus aspectos” (HOUAISS, 2009: 150), a “que considera o homem nas características que derivam das suas relações sociais” (ABBAGNANO, 2009: 74).

àPara Lévi-Strauss não é possível um fazer antropológico desvinculado ao fazer etnográfico. A pesquisa de campo deve ser central na produção de conhecimento feita pelo antropólogo, pois sem ela não é possível constituir o todo, ou seja, compreender a cultura em sai totalidade: “Para ele, ela não é nem um objetivo de sua profissão, nem um remate de sua cultura, nem uma aprendizagem técnica. Representa um momento crucial de sua educação, antes do qual ele poderá possuir conhecimentos descontínuos que jamais formarão um todo, e após o qual, somente, estes conhecimentos se “prenderão” num conjunto orgânico e adquirirão um sentido que lhes faltava anteriormente.” (Lévi-Strauss, 1991: 415 - 416).

àEm Magnani, a pesquisa etnográfica da antropologia cultural deve buscar compreender seu objeto de estudos pela via dos atores envolvidos e pela via dos espeço física em que a vida de reproduz materialmente: “o que se propõe é um olhar de perto e de dentro, mas a partir dos arranjos dos próprios atores sociais, ou seja, das formas por meio das quais eles se avêm para transitar pela cidade, usufruir seus serviços, utilizar seus equipamentos, estabelecer encontros e trocas nas mais diferentes esferas – religiosidade, trabalho, lazer, cultura, participação política ou associativa etc. Esta estratégia supõe um investimento em ambos os pólos da relação: de um lado, sobre os atores sociais, o grupo e a prática que estão sendo estudados e, de outro, a paisagem em que essa prática se desenvolve, entendida não como mero cenário, mas parte constitutiva do recorte de análise.” (Magnani, 2002: 18).

àRoy Wagner, em A invenção da cultura (2010), é o mais específico e ao mesmo tempo o mais completo dos autores citados para compreender esse debate. Para Wagner o antropólogo imerso em seu campo de pesquisa, seja ele na periferia de uma grande cidade ou em uma tribo muito pouco conhecida no mundo ocidental, deve compreender que está ali na condição de um inventor da cultura daquele povo, mas não apenas isso, deve também compreender que está ali também se inventando uma cultura para ele mesmo. Nesse sentido, o autor caminha mostrando como se posiciona a ideia de cultura, e para tanto aponta o que há de mais singular: “o antropólogo usa sua própria cultura para estudar outras, e para estudar a cultura em geral” (WAGNER, 2010: 28), trata-se portanto de uma objetividade relativa, pois “A objetividade absoluta exigiria que a antropólogo não tivesse nenhum viés e portanto nenhuma cultura” (WAGNER, 2010:  28). Essa relação, somente se faz possível pois a figura do antropólogo é a ponte da cultura entre ele e de por quem por ele é observado na condição de objeto de estudo), e o que de fato existe é ela em si, a própria relação, pois a cultura que está sendo radiografada frutifica a partir do universo do antropólogo, este, portanto, acredita Wagner, é um inventor de culturas, “No ato de inventar outra cultura, o antropólogo inventa a sua própria e acaba por reinventar a própria noção de cultura.” (WAGNER, 2010: 31). E é isso que gera no antropólogo a necessidade de tornar a cultura uma coisa, de efetuar um processo objetivo capaz de tornar a cultura visível. E o que torna a cultura visível, são os momentos que se vive a inadequações com o ‘novo’, com o ‘diferente’. É o momento do choque cultural, onde as discrepâncias são objetificadas enquanto entidade. E é neste mesmo momento que ‘uma cultura’ é enfim inventada: “A invenção das culturas, e da cultura em geral, muitas vezes começa com a invenção de uma cultura particular, e esta, por força do processo de invenção, ao mesmo tempo é e não é a própria cultura do inventor.” (WAGNER, 2010: 37). Para Wagner todo ser humano é um antropólogo, um inventor de cultura. Todo homem possui uma herança cultural, e possui porque todo homem nasce e cresce imerso um determinado patrão de vida materialmente e socialmente consolidado através dos séculos. Em outras palavras, todo homem possui para um conjunto de convenções compartilhadas através de uma processo de invenção coletiva da cultura. E esse conjunto de convenções são as ferramentas socias que garantem a reprodutividade da própria vida, na medida em que o torna apto a se comunidade e a compreender as experiências que se apresentam inevitavelmente ao longo da vida. São dois os aspectos elementares aqui: 1) A invenção é o princípio da cultura, e há humanidade sem cultura; 2) É cíclica a seguinte relação: a comunicação é o conjunto de associações e convenções compartilhadas, a o conjunto de associações e convenções compartilhadas é o que permite a comunicação. Expressão e comunicação são interdependentes: nenhuma é possível sem a outra. (WAGNER, 2010:76). Toda experiência e todo compreensão sobre ela, é uma de invenção, ou seja, a relação dialética entre a materialidade concreta da vida e o pensamento gerado por ela, o que elementarmente é o princípio da cultura. Mas a invenção só é possível mediante a existência de um conjunto de associações e convenções compartilhadas, pois é esse conjunto é o que é a própria comunicação e também o que gera a comunicação. A invenção só se concluir quando ela é comunicada, mas não apenas comunicada, mas é expressada, significada. Se a comunicação só “é possível mediante o compartilhamento de associações derivadas de certos contextos convencionais por aqueles que desejam se comunicar.” (WAGNER, 2010: 80), e expressão é mediada de antemão pelo contexto e pelas convenções já dadas, já naturalizadas do indivíduo e no coletivo, por exemplo “A moralidade é uma espécie de significado , um significado com direção, propósito e motivação, e não um substrato sistêmico” (WAGNER, 2010:82). Toda expressão carrega em si um significado. A invenção da cultura é uma relação dialético da experiência e do pensamento, e para tal é necessário a preexistência um conjunto de informações, mas esse processo só se conclui mediante o esforço comunicativo, e o esforço comunicativo é também expressivo, ou seja o ato de expressar algo carrega em si um significado fruto dos sentimentos individuais ou coletiva gerados da experiência vivida, o só se expressa algo através do esforço comunicativo. Ou seja, assim como o antropólogo ou homem algum no mundo, não é tabula rasa, a invenção também não parte do nada, nunca há uma primeira invenção, há um ciclo continuo de invenção e reinvenção da cultura gerado pelo espontaneísmo e pela criatividade tipicamente humana.

 

Referência bibliográfica:

WAGNER, Roy. A invenção da cultura. São Paulo: Cosac Naify, 2010.

ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2007.

HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Salles; FRANCO, Francisco Manoel de Messo. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009.

MAGNANI, J. G. De perto e de dentro: notas para uma etnografi a urbana. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 17, n. 49, p. 11-29, 2002.

LÉVI-STRAUSS, C. Antropologia estrutural. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1991.

SANTOS, Ligia Amparo da Silva. A questão alimentar na trajetória do pensamento antropológico clássico. In FREITAS, MCS., FONTES, GAV., and OLIVEIRA, N., orgs. Escritas e narrativas sobre alimentação e cultura. Salvador: EDUFBA, 2008.

CORDEIRO, Manuela Souza Siqueira. O narrador e o etnógrafo: uma leitura de Argonautas do pacífico ocidental, de Malinowski. In Revista de Ciências Sociais, Fortaleza, v. 44, n. 2, 2013.

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Maria Adélia dos santos

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