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os principais paradigmas e escolas de pensamento antropológico?

💡 2 Respostas

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LR

Nesta resposta consta o debate a respeito do dos (II) paradigmas e das escolas de pensamento antropológico e o debate e respeito de como podemos definir o campo de estudos da (I) antropologia.  

I) DEFINIÇÃO DE ANTROPOLOGIA:

Descrição Antropologia:

Antropologia é “ciência do homem no sentido mais lato, que engloba origens, evolução, desenvolvimentos físico, material e cultural, fisiologia, psicologia, características raciais, costumes sociais, crenças etc.” (HOUAISS, 2009: 150). O fazer antropológico é a sistematização dos “conhecimentos que se têm a respeito do homem” (ABBAGNANO, 2007: 74). São campos da disciplina a antropologia física e a antropologia cultural:

1) Antropologia física: “a que estuda a origem e a evolução biológica da humanidade e as diversidades raciais de seus subgrupos” (HOUAISS, 2009: 150); a “que considera o homem do ponto de vista biológico, em sua estrutura somática, em suas relações com o ambiente, em suas classificações raciais” (ABBAGNANO, 2009: 74).

2) Antropologia cultural: “a que trata do estudo da cultura do homem em todos os seus aspectos, servindo-se assim de dados e conceitos próprios de diversas outras ciências, como a arqueologia, a etnologia, a etnografia, a linguística, a sociologia, a economia etc” (HOUAISS, 2009: 150), em outras palavras, a “que considera o homem nas características que derivam das suas relações sociais” (ABBAGNANO, 2009: 74).

II) PARADIGMAS E ESCOLAS DE PENSAMENTO ANTROPOLÓGICO:

Segundo consta no site do departamento de Antropologia da Faculdade de Letras, Filosofia e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, principais os paradigmas e as principais escolas de pensamento antropológico são:

Formação de uma literatura “etnográfica” sobre a diversidade cultural

Período

Séculos XVI-XIX

Características 

Relatos de viagens (Cartas, Diários, Relatórios etc.) feitos por missionários, viajantes, comerciantes, exploradores, militares, administradores coloniais etc.

Temas e Conceitos

Descrições das terras (Fauna, Flora, Topografia) e dos povos “descobertos” (Hábitos e Crenças).Primeiros relatos sobre a Alteridade

Alguns
Representantes
e obras de referência

Pero Vaz Caminha (“Carta do Descobrimento do Brasil” - séc. XVI).

Hans Staden (“Duas Viagens ao Brasil” - séc. XVI).

Jean de Léry (“Viagem a Terra do Brasil” - séc. XVI).

Jean Baptiste Debret (“Viagem Pitoresca e Histórica ao Brasil” - séc. XIX).

 

Escola/paradigma

Evolucionismo social

Período

Século XIX

Características 

Definição dos fenômenos sociais como objetos de investigação socio-antropológica.

Definição das regras do método sociológico.

Temas e Conceitos

Representações coletivas.Solidariedade orgânica e mecânica. Formas primitivas de classificação (totemismo) e teoria do conhecimento. Busca pelo Fato Social Total (biológico + psicológico + sociológico). A troca e a reciprocidade como fundamento da vida social (dar, receber, retribuir)

Alguns
Representantes
e obras de referência

Émile Durkheim:“Regras do método sociológico”- 1895; “Algumas formas primitivas de classificação” - c/ Marcel Mauss - 1901; “As formas elementares da vida religiosa” - 1912.

Marcel Mauss:“Esboço de uma teoria geral da magia” - c/ Henri Hubert - 1902-1903; “Ensaio sobre a dádiva” - 1923-1924; “Uma categoria do espírito humano: a noção de pessoa, a noção de eu”- 1938).

 

Escola/paradigma

Funcionalismo

Período

Século XX - anos 20

Características 

Modelo de etnografia clássica (Monografia). Ênfase no trabalho de campo (Observação participante). Sistematização do conhecimento acumulado sobre uma cultura.

Temas e Conceitos

Cultura como totalidade.Interesse pelas Instituições e suas Funções para a manutenção da totalidade cultural. Ênfase na Sincronia x Diacronia.

Alguns
Representantes
e obras de referência

Franz Boas (“Os objetivos da etnologia” - 1888; “Raça, Língua e Cultura” - 1940).

Margaret Mead (“Sexo e temperamento em três sociedades primitivas” - 1935).

Ruth Benedict (“Padrões de cultura” - 1934; “O Crisântemo e a espada” - 1946).

 

Escola/paradigma

Estruturalismo

Período

Século XX -  anos 40

Características 

Busca das regras estruturantes das culturas presentes na mente humana. Teoria do parentesco/Lógica do mito/Classificação primitiva. Distinção Natureza x Cultura.

Temas e Conceitos

Princípios de organização da mente humana: pares de oposição e códigos binários. Reciprocidade.

Alguns
Representantes
e obras de referência

Claude Lévi-Strauss:“As estruturas elementares do parentesco” - 1949.

“Tristes Trópicos”- 1955.

“Pensamento selvagem” - 1962.

“Antropologia estrutural” - 1958

“Antropologia estrutural dois” - 1973

“O cru e o cozido” - 1964

“O homem nu” - 1971

 

Escola/paradigma

Antropologia Interpretativa

Período

Século XX - anos 60

Características 

Cultura como hierarquia de significados

Busca da “descrição densa”.

Interpretação x Leis. 

Inspiração Hermenêutica.

Temas e Conceitos

Interpretação antropológica: Leitura da leitura que os “nativos” fazem de sua própria cultura.

Alguns
Representantes
e obras de referência

Clifford Geertz:

“A interpretação das culturas” - 1973.

“Saber local” - 1983.

 

Escola/paradigma

Antropologia Pós-Moderna ou Crítica

Período

Século XX - nos 80

Características 

Preocupação com os recursos retóricos presentes no modelo textual das etnografias clássicas e contemporâneas. Politização da relação observador-observado na pesquisa antropológica. Critica dos paradigmas teóricos e da “autoridade etnográfica” do antropólogo.

Temas e Conceitos

Cultura como processo polissêmico.

Etnografia como representação polifônica da polissemia cultural.

Antropologia como experimentação/arte da crítica cultural.

Alguns
Representantes
e obras de referência

James Clifford e Georges Marcus (“Writing culture - The poetics and politics of ethnography” - 1986).

George Marcus e Michel Fischer (“Anthropoly as cultural critique” - 1986).

Richard Price (“First time” - 1983).

Michel Taussig (“Xamanismo, colonialismo e o homem selvagem”- 1987).

James Clifford (“The predicament of culture” - 1988).

 

III) A PESQUISA ANTROPOLÓGICA:

Como vimos, a etnografia é “o primeiro estágio da pesquisa antropológica: observação e descrição, trabalho de campo” (ABBAGNANO, 2007: 452), mais especificamente da Antropologia Cultural, “a que trata do estudo da cultura do homem em todos os seus aspectos” (HOUAISS, 2009: 150), a “que considera o homem nas características que derivam das suas relações sociais” (ABBAGNANO, 2009: 74).

àPara Lévi-Strauss não é possível um fazer antropológico desvinculado ao fazer etnográfico. A pesquisa de campo deve ser central na produção de conhecimento feita pelo antropólogo, pois sem ela não é possível constituir o todo, ou seja, compreender a cultura em sai totalidade: “Para ele, ela não é nem um objetivo de sua profissão, nem um remate de sua cultura, nem uma aprendizagem técnica. Representa um momento crucial de sua educação, antes do qual ele poderá possuir conhecimentos descontínuos que jamais formarão um todo, e após o qual, somente, estes conhecimentos se “prenderão” num conjunto orgânico e adquirirão um sentido que lhes faltava anteriormente.” (Lévi-Strauss, 1991: 415 - 416).

àEm Magnani, a pesquisa etnográfica da antropologia cultural deve buscar compreender seu objeto de estudos pela via dos atores envolvidos e pela via dos espeço física em que a vida de reproduz materialmente: “o que se propõe é um olhar de perto e de dentro, mas a partir dos arranjos dos próprios atores sociais, ou seja, das formas por meio das quais eles se avêm para transitar pela cidade, usufruir seus serviços, utilizar seus equipamentos, estabelecer encontros e trocas nas mais diferentes esferas – religiosidade, trabalho, lazer, cultura, participação política ou associativa etc. Esta estratégia supõe um investimento em ambos os pólos da relação: de um lado, sobre os atores sociais, o grupo e a prática que estão sendo estudados e, de outro, a paisagem em que essa prática se desenvolve, entendida não como mero cenário, mas parte constitutiva do recorte de análise.” (Magnani, 2002: 18).

àRoy Wagner, em A invenção da cultura (2010), é o mais específico e ao mesmo tempo o mais completo dos autores citados para compreender esse debate. Para Wagner o antropólogo imerso em seu campo de pesquisa, seja ele na periferia de uma grande cidade ou em uma tribo muito pouco conhecida no mundo ocidental, deve compreender que está ali na condição de um inventor da cultura daquele povo, mas não apenas isso, deve também compreender que está ali também se inventando uma cultura para ele mesmo. Nesse sentido, o autor caminha mostrando como se posiciona a ideia de cultura, e para tanto aponta o que há de mais singular: “o antropólogo usa sua própria cultura para estudar outras, e para estudar a cultura em geral” (WAGNER, 2010: 28), trata-se portanto de uma objetividade relativa, pois “A objetividade absoluta exigiria que a antropólogo não tivesse nenhum viés e portanto nenhuma cultura” (WAGNER, 2010:  28). Essa relação, somente se faz possível pois a figura do antropólogo é a ponte da cultura entre ele e de por quem por ele é observado na condição de objeto de estudo), e o que de fato existe é ela em si, a própria relação, pois a cultura que está sendo radiografada frutifica a partir do universo do antropólogo, este, portanto, acredita Wagner, é um inventor de culturas, “No ato de inventar outra cultura, o antropólogo inventa a sua própria e acaba por reinventar a própria noção de cultura.” (WAGNER, 2010: 31). E é isso que gera no antropólogo a necessidade de tornar a cultura uma coisa, de efetuar um processo objetivo capaz de tornar a cultura visível. E o que torna a cultura visível, são os momentos que se vive a inadequações com o ‘novo’, com o ‘diferente’. É o momento do choque cultural, onde as discrepâncias são objetificadas enquanto entidade. E é neste mesmo momento que ‘uma cultura’ é enfim inventada: “A invenção das culturas, e da cultura em geral, muitas vezes começa com a invenção de uma cultura particular, e esta, por força do processo de invenção, ao mesmo tempo é e não é a própria cultura do inventor.” (WAGNER, 2010: 37). Para Wagner todo ser humano é um antropólogo, um inventor de cultura. Todo homem possui uma herança cultural, e possui porque todo homem nasce e cresce imerso um determinado patrão de vida materialmente e socialmente consolidado através dos séculos. Em outras palavras, todo homem possui para um conjunto de convenções compartilhadas através de uma processo de invenção coletiva da cultura. E esse conjunto de convenções são as ferramentas socias que garantem a reprodutividade da própria vida, na medida em que o torna apto a se comunidade e a compreender as experiências que se apresentam inevitavelmente ao longo da vida. São dois os aspectos elementares aqui: 1) A invenção é o princípio da cultura, e há humanidade sem cultura; 2) É cíclica a seguinte relação: a comunicação é o conjunto de associações e convenções compartilhadas, a o conjunto de associações e convenções compartilhadas é o que permite a comunicação. Expressão e comunicação são interdependentes: nenhuma é possível sem a outra. (WAGNER, 2010:76). Toda experiência e todo compreensão sobre ela, é uma de invenção, ou seja, a relação dialética entre a materialidade concreta da vida e o pensamento gerado por ela, o que elementarmente é o princípio da cultura. Mas a invenção só é possível mediante a existência de um conjunto de associações e convenções compartilhadas, pois é esse conjunto é o que é a própria comunicação e também o que gera a comunicação. A invenção só se concluir quando ela é comunicada, mas não apenas comunicada, mas é expressada, significada. Se a comunicação só “é possível mediante o compartilhamento de associações derivadas de certos contextos convencionais por aqueles que desejam se comunicar.” (WAGNER, 2010: 80), e expressão é mediada de antemão pelo contexto e pelas convenções já dadas, já naturalizadas do indivíduo e no coletivo, por exemplo “A moralidade é uma espécie de significado, um significado com direção, propósito e motivação, e não um substrato sistêmico” (WAGNER, 2010:82). Toda expressão carrega em si um significado. A invenção da cultura é uma relação dialético da experiência e do pensamento, e para tal é necessário a preexistência um conjunto de informações, mas esse processo só se conclui mediante o esforço comunicativo, e o esforço comunicativo é também expressivo, ou seja o ato de expressar algo carrega em si um significado fruto dos sentimentos individuais ou coletiva gerados da experiência vivida, o só se expressa algo através do esforço comunicativo. Ou seja, assim como o antropólogo ou homem algum no mundo, não é tabula rasa, a invenção também não parte do nada, nunca há uma primeira invenção, há um ciclo continuo de invenção e reinvenção da cultura gerado pelo espontaneísmo e pela criatividade tipicamente humana.

 

Referência bibliográfica:

WAGNER, Roy. A invenção da cultura. São Paulo: Cosac Naify, 2010.

ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2007.

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