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Por qual motivo Maquiavel continua sendo um autor estudado com grande interesse?

a) Pela sua importância como teórico da democracia; b) Pelo conteúdo moral de sua obra, especialmente em O Príncipe; c) Pela sua análise centrada na prática política a partir de uma lógica de articulação política, tendo em vista, coerência com o projeto, e a análise concreta das relações de força existentes; d) Pela sua reflexão sobre a importância do acaso ou sorte (fortuna) na condução da política; e) Pela sua reflexão sobre a importância da virtude cristã para o Príncipe.

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Murilo Miguel

obrigado
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LR

Resposta: Alternativa CORRETA c) Pela sua análise centrada na prática política a partir de uma lógica de articulação política, tendo em vista, coerência com o projeto, e a análise concreta das relações de força existentes.

Justificativa: Por exclusão. A alternativa a) Pela importância como teórico da Democracia, está INCORRETA porque Maquiavel não está preocupado com a questão democrática, e sim com a forma com que o principado conquista e mantém o poder. A alternativa b) Pelo conteúdo moral de sua obra, especialmente em O Príncipe, está INCORRETA porque para Maquiavel a ação política não deve ser confundida com a ação moral, e o Príncipe deve sempre preocupar-se com sua ação política, já que a ação moral seria mais prejudicial do que benéfica na condução da coisa pública. A alternativa d) Pela sua reflexão sobre a importância do acaso ou sorte (fortuna) na condução da política, está INCORRETA porque os termos utilizados pelo autor não são “acaso ou sorte (fortuna)”, e sim ‘fortuna’ (sorte) e ‘virtude’. Para o autor não é possível viver mediado apenas pela ‘sorte’, pois isso significaria abrir mão do livre arbítrio. A sorte só é relevante quando não há virtudes, ou seja, onde não se construiu um teto, o sucesso ou o fracasso da sobrevivência do homem dependeria das condições climáticas. A alternativa e) Pela sua reflexão sobre a importância da virtude cristã para o Príncipe está INCORRETA porque a crença no Deus cristão não é uma virtude para Maquiavel, e sim um erro. Assumir que se é governado por Deus e não por si, pressupõe aceitar a sorte que vier e jamais atuar sobre a própria realidade Dessa forma, um príncipe que perde seu reino deveria compreender isso como uma vontade divina, entretanto não é interessante ao príncipe perder o próprio reino. Ou mesmo um reino que se conquiste pela sorte, e não por virtude, segundo Maquiavel, é um reino cujo o poder do príncipe pode com mais facilidade padecer.

Alternativa CORRETA c) Pela sua análise centrada na prática política a partir de uma lógica de articulação política, tendo em vista, coerência com o projeto, e a análise concreta das relações de força existentes.

Em Florença, Maquiavel (1469 – 1527), na condição de secretário de Estado e via-se diante de um período em que a Europa vivia em crises constantes em função de sucessivas guerras, o que hoje é possível compreender ter sido o “processo tormentoso do Nascimento do Estado moderno, que é um Estado nacional”, mediante o “grande fenômeno moderno da nacionalização das massas populares” (FROSINI, 2016: 13). O que Maquiavel escreve, está então, colado ao contexto de seu próprio tempo histórico, ou seja, à um período de conflitos territoriais e político-sociais, tanto com relação a dimensão regional – superação das comunas municipais florentinas para tornar possível a ascensão de uma Republica Florentina –, quanto estatal – superação do feudalismo dificultada pelos interesses do Papado, a fim de construir uma condição de estabilidade  entre os Estados Italianos –, e continental – a busca pela hegemonia de cada Estado europeu, e ao mesmo tempo a necessidade de atingir uma estabilidade no continente. Sendo assim, a dimensão do debate que se faz entre ‘política’ e ‘guerra’ é central para o pensamento político do filósofo: “da política de guerra, e da Guerra como forma de política” (FROSINI, 2016: 20). Dito isso, compreendendo há esta dimensão histórica, é sem dúvidas possível afirmar é que, apesar de não vivermos hoje exatamente as mesmas condições estruturais do Estado descrito por Maquiavel, quando Maquiavel descreve o papel dos governantes, há na atualidade atores políticos relevantes por ocuparem posições de poder que apresentam atitudes segundo as orientações maquiavelianas feitas em O Príncipe – mesmo que assumidas talvez inconscientemente, essas atitudes refletem, claro, em atitudes assumidas em nível institucional, o que quer dizer que as atitudes dos líderes, por possuírem o poder de decisão das ações Estatais, impregnam no Estado o mesmo espectro de atitudes/postura.

Maquiavel é muito reconhecido por ter rompido com uma descrição tradicional de como deveria ser a atitude política dos governantes: “um teórico da política em geral, descobridor das leis distintas e autônomas da política [e esta é a defesa de Maquiavel para a necessidade de romper com o pensamento político anterior], que se acha além, ou melhor aquém, do bem e da moral” (FRASINI, 2016: 20). Na medida em que rompe com a ideia clássica (Platão/Aristóteles) de que o governante deve agir de acordo com uma ética, uma moral, o pensamento maquiaveliano compreende que o governante deve agir independente dos valores éticos, preocupado apenas em consolidar seu poder enquanto conquistador, e/ou manter seu poder enquanto líder de um Estado-nação. Para isso, Maquiavel defende que todos os meios possíveis devem ser usados, mesmo aqueles que gerem ofensas. Assim a centralidade da teoria são duas: 1) A necessidade da Guerra; 2) A política separada da moral. “A objetividade historiográfica e o realismo político constituem, assim, os pois pontos básicos do M. [ler Maquiavelismo] original. Graças a este segundo aspecto, Maquiavel foi considerado fundador da ciência empírica da política, ou seja, disciplina empírica que estuda as regras da arte de governar sem outra preocupação além da eficácia dessas regras.” (ABBAGNANO, 2007: 739)

A lição de Maquiavel que pode ser aplicadas na atualidade é: O campo das opiniões morais não pode influenciar o campo da política. Maquiavel considera que é desejável haver “honestidade e pela lealdade na vida civil e política” (ABBAGNANO, 2007: 739-740), mas um Estado não pode ser regido pelos preceitos morais de seus líderes pois essa atitude condenaria o Estado a uma não coesão interna e ao governante uma situação de ingovernabilidade. A moral religiosa, por exemplo, é uma forma de moralidade que não pode ser em hipótese alguma uma regra de conduta política. “Por M. entende-se também o princípio no qual a partir do século XVII, a doutrina de Maquiavel passou a ser convencionalmente resumida: de que ‘o fim justifica os meios’. Tal máxima, porém, não foi formulada por Maquiavel, que não considera o Estado como fim absoluta e não o julga dotado de existência superior à do indivíduo (…). Além disso, Maquiavel tinha grande simpatia pela honestidade e pela lealdade na vida civil e política; portanto, admirava os Estados regidos por essas virtudes, como, por exemplo, o dos romanos e dos suíços. Entretanto, como dissemos, seu objetivo era formular regras eficazes de governo, tendo como base a experiencia política antiga e nova, considerando que essa eficácia era independente do caráter moral ou imoral das regras. Por outro lado, percebeu que a moral e a religião podem ser – como às vezes são – forças políticas que, como todas as outras, condicionam a atividade política e seu êxito; percebeu também que às vezes isso não acontece e que a ação política se mostra eficaz mesmo quando exercida em sentido contrário ao das leis da moral. Como essa era a realidade mais frequente nas sociedades de seu tempo (especialmente a italiana e a francesa) – que ele chama de ‘corruptas’ – e como Maquiavel tem sobretudo em vista a aplicação de suas regras políticas à sociedade italiana para a constituição de um Estado unificado, explica-se sua insistência em certos preceitos imorais de conduta política, o que acabou sendo mal expresso ou generalizado na máxima de que ‘o fim justifica os meios’.” (ABBAGNANO, 2007: 739-740)

 

Informações complementares sobre o pensamento político em Maquiavel:

A política em Maquiavel: “A política e a moral estendem-se pelo mesmo domínio comum, o da ação ou da práxis humana. Pensa-se que se distinguem entre si em virtude de um princípio ou critério diverso de justificação e avaliação das respectivas ações, e que, em consequência disso, o que é obrigatório em mora, não se pode dizer que o seja em Política, e que é lícito em Política, não se pode dizer que o seja em moral; pode haver ações morais que são impolíticas (ou apolíticas) e ações políticas que são imorais (ou amorais) A descoberta da distinção é atribuída a Maquiavel (daí o nome de maquiavelismo dado a toda teoria política que sustenta e defende a separação da Política da moral), é realmente apresentada como problema de autonomia da Política. Este problema acompanha perpasso a formação do Estado moderno e sua gradual emancipação da Igreja, que chegou até, em casos extremos, à subordinação desta ao Estado e, consequentemente, à absoluta supremacia da Política. Na realidade, o que se chama autonomia Política não é outra coisa senão o reconhecimento de que o critério segundo o qual se julga boa ou má uma ação política (…) é diferente do critério segundo o qual se considera boa ou má uma ação moral. (…) Esta incomensurabilidade está expressa na afirmação de que, em Política, o que vale é a máxima de que ‘o fim justifica os meios’, máxima que encontrou em Maquiavel uma das suas mais fortes expressões: ‘… e nas ações de todos os homens, e máxime dos príncipes, quando não há indicação à qual apenas, se olha ao fim. Faça, pois, o príncipe por vencer e defender o Estado: os meios serão sempre considerados honrosos e por todos louvados’ (Príncipe, XVIII).” (BOBBIO, 1993: 961).

O Príncipe: “Portanto, um príncipe deve ser pouco generoso, para não precisar roubar os súditos, para poder se defender, para não ficar pobre e desprezível, para não ser forçado a se tornar rapace, para não incorrer na fama de miserável A falta de generosidade é um dos vícios que o fazem reinar.” (MAQUIAVEL, 1996: 80); “A um príncipe que marcha com seus exércitos, que se sustenta com presas de Guerra, saques, resgates e maneja o dinheiro dos outros, é-lho necessária esta generosidade. O que não é teu, nem de seus súditos, pode ser largamente distribuído. Como fez Ciro, César e Alexandre. Porque gastar o que é dos outros, não tira a reputação, mas aumenta. Somente causa dano gastar o que é teu.” (MAQUIAVEL, 2996: 81); “Os homens têm menos puder em ofender alguém que se faça amar do que alguém que se faça temer. O amor é mantido por um vínculo de obrigações, que os homens, sendo malvados, rompem quando melhor lhes server. Mas o temos é mantido pelo medo de ser punido, o que nunca termina” (MAQUIAVEL, 1996: 85); “Todavia, o príncipe deve se fazer temer de um modo que, se não conquista o amor, Evita o ódio. É possível ser, ao mesmo tempo, temido, mas não odiado.” (MAQUIAVEL, 1996: 85); “Concluo, pois, tornando ao ser temido e amado que, os homens amados, como eles querem, e sendo temidos por eles, como ele quer, um príncipe sábio deve se basear sobre o que é seu e não sobre o que é dos outros.” (MAQUIAVEL, 1996: 86); “Aquele que deixa o que se faz pelo que se deve fazer aprende a se arruinar em vez de se preserve. Pois o homem que queira professor o bem por toda parte é natural que se arruíne entre tantos que não são bons. Para um príncipe é necessário, querendo se manter, aprender a ser não bom e usar ou não usar isso, conforme precisar.” (MAQUIAVEL, 1996: 77); “Deixando as fantasias sobre um príncipe e discorrendo sobre a realidade, digo que todos os homens, sobretudo os príncipes, por serem em um nível mais alto, tão notados por algumas qualidades que lhe acarretam censura ou louvor. Há quem seja considerado generoso, outro miserável (…); um capaz de doar, outro rapace; um cruel, outro piedoso; um traidor, outro fiel; um efeminado e pusilânime, outro truculento e corajoso; um humano, outro soberbo; um lascivo, outro casto; um franco, outro astuto; um rigoroso, outro incrédulo; um severo, outro superficial; um religioso, outro incrédulo; e assim por diante. Sei que todos confessaram que seria extremamente louvável para um príncipe possuir, de todas as qualidades acima descritas, as que são consideradas boas. Mas como todas não podem ter nem observá-las por complete, pois a condição humana não o permite, é necessário ser prudente e saber fugir à infâmia dos vícios que podem lhe tirar o Estado. É prudente evitar também os que não lhe tirariam, se for possível, do contrário, pode-se entregar a eles sem muito temor. O príncipe não deve se importar com se expor à infâmia dos vícios sem os quais seria difícil salvar o poder. Porque, considerando-se bem tudo, há coisas que parecem virtude e acarretam a ruína, outras que parecem vício e, com elas, obtêm-se a segurança e o bem-estar.” (MAQUIAVEL, 1996: 78); “Digo, portanto, que, nos principados novos, onde haja um príncipe novo, há menores ou maiores dificuldades dependendo das virtudes de quem o conquista. E como este fato de se tornar cidadão em príncipe pressupõe ou virtude ou sorte [fortuna], parece que, em parte, estas duas características ajudam a mitigar as dificuldades. Contudo, quem dependeu menos da sorte, manteve-se por mais tempo.” (MAQUIAVEL, 1996: 31-32); “Aqueles que por vias virtuosas, similares às das personagens acima comentadas, tornam-se príncipes, conquistam o principado com dificuldade, mas com facilidade mantém-no.” (MAQUIAVEL, 1996: 33); “Aqueles que somente pela sorte tornam-se, de cidadãos comuns, príncipes, com pouco trabalho conquistam, mas com muito conseguem mantes. Não tem dificuldades pelos caminhos, pois voam, mas todas as dificuldades surgem quando atingem a meta.” (MAQUIAVEL, 1996: 35); “Estes baseiam o próprio poder na vontade e na sorte de quem lhes permitiu obtê-lo, as quais são duas coisas muito voláteis e instáveis. Não o sabem nem podem manter tal grau. Não o sabem porque, não sendo homens de grande engenhosidade e virtude, não é lógico que, tendo sempre vivido como simples cidadão, saibam comandar. (…) A menos que, como já foi dito, de repente, os que se tornaram príncipes sejam hábeis como quem lhes deu a oportunidade, e saibam, imediatamente, como prepare-se para conserva-lo e construam depois as bases que os outros construíram antes de se tornarem príncipes.” (MAQUIAVEL, 1996: 35-36); “Não me é desconhecido que muitos acreditaram e acreditam que as coisas do mundo sejam governadas pela sorte e por Deus, que os homens, com sua prudência, não podem corrigi-las, ou melhor, não podem lhe dar remédio algum. Portanto, poder-se-ia julgar que não vale inquietar-se muito pelas coisas, mas vale deixar-se governar pela sorte.” (MAQUIAVEL, 1996: 123); “Todavia, para que o nosso livre arbítrio não seja completamente anulado, julgo que a sorte possa determinar a metade de nossas ações, mas que até ele nos permita governar a outra metade.” (MAQUIAVEL, 1996: 123); “A sorte manifesta-se de modo semelhante: Demonstra sua potência onde não há virtude organizada para lhe opor Resistencia/ volta os seus métodos para onde sabe que não foram feitas barragens e reparos para segura-la.” (MAQUIAVEL, 1996: 124); “Concluo, portanto, que, se a fortuna muda e os homens obstinam-se em suas atividades, estes terão sucesso enquanto os dois elementos estiverem de acordo e, quando discordarem, eles fracassaram. Estou convencido do seguinte: É melhor der impetuoso do que cauteloso [nesta parte Maquiavel entende cautela como uma virtude, feita a partir do que os novos observam dos caminhos já percorridos com sucesso]; porque a sorte é mulher e é necessário, para subjuga-la. Espanca-la e surra-la. E vê-se que ela se deixa vencer mais por esses do que por aqueles que, friamente, segue em frente. Sempre, como mulher, é amiga dos jovens, pois são menos cautelosos, mais fogosos e mais audazes ao dominá-la.” (MAQUIAVEL, 1996: 126-127); “Deve-se observar que, ao tomar um Estado, o conquistador deve fazer todas as ofensas necessárias e faze-la todas de uma vez, para não precisar renova-las todos os dias e poder, ao não repeti-las, das segurança aos homens e conquistar sua confiança com benefícios.” (MAQUIAVEL, 1996: 47).

As formas de principado: “Para Maquiavel são duas as principais formas de governo: o principado ou monarquia e a república. Duas são também as espécies de principado: o de um príncipe onde todos os demais são servos que, por sua graça e concessão, ajudam, como ministros, a governar o reino; e o de um príncipe e barões que, ‘não por graça do senhor, mas pela antiguidade do sangue, possuem esse grau’. (…) Maquiavel é um inovador, não só no que respeita à distinção fundamental, pois reúne a aristocracia e a democracia dos antigos na república, como também no que concerne à substituição das formas monárquicas, que reduz a duas. Destas, a primeira, ou seja, aquela em que um só é príncipe e todos os demais são servos, é, sem dúvida, a monarquia despótica dos antigos.” (BOBBIO, 1993: 341).

 

Referência bibliográfica:

FROSINI, Fabio. Maquiavel, o revolucionário. São Paulo: Ideias & Letras, 2016.

BOBBIO, Norbert; MTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de política. 1983.

ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2007.

MAQUIAVEL, Nicolau. O Príncipe. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996.)

LIGUORI, Guido; VOZA, Pasquale. Dicionário Gramsciniano: 1926 - 1937. São Paulo: Boitempo, 2017.

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