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Qual a relação entre a sociologia de durkheim e o direito enquanto ciência?

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Ellen Araujo

Émile Durkheim (1858-1917) é considerado um dos fundadores da sociologia enquanto ramo científico dotado de método próprio. Sua abordagem consiste em olhar para a sociedade como um todo composto por fatos sociais, que devem ser vistos como se fossem coisas. Assim, o papel do sociólogo é descrever essas “coisas” de modo objetivo, sem incluir na descrição suas opiniões pessoais, seus preconceitos e seus juízos de valor.

(...)

Para Durkheim, o direito é um mecanismo de controle social. Seu objetivo é assegurar a solidariedade, impedindo que fatos contrários à sociedade ocorram ou passem impunes. Assim, as normas jurídicas estabelecem os padrões socialmente desejáveis de comportamento e suas sanções são aplicadas, pelo Poder Judiciário, àqueles que se desviam desses padrões. Órgãos estatais como a polícia cuidam da fiscalização geral das pessoas, procurando aqueles que se comportam de modo indesejável para serem punidos.

O estudo do direito pode, inclusive, revelar o tipo de sociedade e o grau de consciência coletiva de seus membros. As sociedades menos complexas costumam possuir um direito essencialmente repressivo; as sociedades mais complexas, possuem um direito essencialmente restitutivo. Esses direitos indicam o tipo de solidariedade que interliga os fatos sociais.

Muito interessante esse material: http://introducaoaodireito.info/wp/08-durkheim-e-o-direito/ 

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LR

Kelsen, em Teoria geral do direito e do Estado (2005), define Estado, segundo a doutrina jurídica, como um fato social concreto: 1. “O Estado é a comunidade criada por uma ordem jurídica nacional (em contraposição a uma internacional). O Estado como pessoa jurídica é a personificação dessa comunidade ou a ordem jurídica nacional que constitui essa comunidade.” (KELSEN, 2005: 261 – 262); 2. “Um sistema de normas, segundo essa visão, possui a unidade e a individualidade, que faz merecer o nome de ordem jurídica nacional, exatamente porque está, de um modo ou de outro, relacionado a um Estado como fato social concreto, porque é criado ‘por’ um Estado ou válido ‘para’ um Estado.” (KELSEN, 2005: 262); 3. “O Estado é aquela ordem da conduta humana que camacha de ordem jurídica, a ordem à qual se ajustam as ações humanas, a ideia à qual os indivíduos  adaptam sua conduta.” (KELSEN, 2005: 272); 4. “Apenas como ordem normativa o Estado pode ser uma autoridade com o poder de obrigar, especialmente se essa autoridade for soberana” (KELSEN, 2005: 273); 5. “O Estado é uma organização política por ser uma ordem que regula o uso da força, porque ela monopoliza o uso da força. Porem (...) esse é um dos caracteres essenciais do Direito. O Estado é uma sociedade politicamente organizada porque é um comunidade constituída por uma ordem coercitiva, e essa ordem coercitiva é o Direito.” (KELSEN, 2005: 273).

Esta categoria de fato social é central em Durkheim. O Estado é um fato social concreto, como vimos, e é também um ordenamento jurídico. Por fato social Durkheim compreende ser algo externo ao indivíduo e generalizado no sociedade, no senso comum, no que se tem por ‘normal’. Um fato social é então tão normal, quando é uma coisa (externa). O Direito ordena o senso comum. O Estado é um ordenamento jurídico porque o Estado é um fato social. A conjunto de leis que regem este dado Estado, representam também a tradução dos fatos sociais presentes.

Sobre os fatos sociais: Para entender o fato social como coisa é necessário suprir a teoria das fronteiras que o definem. Ser coisa significa dizer ser um fenômeno externo e ao mesmo tempo generalizado. Generalizado porque tal fenômeno deve ter certo nível de recorrência no conjunto da sociedade. Externo porque deve ser algo afastado as consciências individuais, ou seja, algo independente das manifestações isoladas. Em um país onde o sistema de governo organiza-se em torno de eleições periódicas, as eleições, ou mesmo o sistema de governo como um todo, seria um fato social? A democracia é um fenômeno naturalizado no conjunto de uma determinada sociedade, os períodos eleitorais são momentos não apenas normais, como esperados. Caso um único indivíduo não concorde com esta forma de organização acarretará em um golpe de Estado? Em uma mudança organizativa? Segundo Durkheim, não, o indivíduo isolado não é capaz de sobrepor sua opinião a esta estrutura já dada por haver nela uma poder coercitivo, uma força imperativa, que pode ter uma origem naturalizada por meios como os costumes, a educação, a família, ou uma origem da coerção mais violenta que se manifesta pelo uso repressivo do exército ou da polícia, em cumprimento do que a justiça e seus “interpretes autorizados” determinam (DURKHEIM, 1966: 2). Por ser algo generalizado e independente da consciência individual, o exemplo dado tem status de coisa, tem a solidez necessária para ser considerado um fato social, e assim ser relevante em uma pesquisa sociológica. Ficando aqui então definida as fronteiras de um fato social, a regra primeira do método sociológico: trata-lo como coisa (DURKHEM, 1966: 13). Mais uma assertiva: o crime é normal. As eleições são normais e esperadas, o crime é tão normal e esperado quanto. Em contrapartida é sintoma patológico que a contragosto de uma sociedade um governo pautado em elementos democráticos, seja substituído por um governo totalitário. Qualquer ação que ultrapasse os limites do se prevê como crime, do que se é esperado, passa a ser considerado anormal, patológico e inaceitável (DURKHEIM, 1966: 61). Há duas outras regras assertivas que devem constar aqui, antes de partir para um ultimo exemplo. Um fato apenas é útil se for possível identificar suas causas. Um governo democrático, um consenso sobre o casamento, as transformações da lei e do que se considera crime, ou seja, a própria vida social tem causas próprias, internas de ser como é. As leis se transformam ao passo que a sociedade naturalmente se modifica. Trata-se de uma regra de causalidade entre os fatos sociais: as modificações da justiça, sendo ela em si um fato social, estão ligadas por uma relação de causa com a generalização de um novo comportamento social, considerado igualmente fato social (P. 88). É dedutível desta regra, a próxima: ao verificar uma relação de causa entre os fatos sociais, verificou-se antes que recorrência de algo, e para tal verificação é necessário um certo exercício de comparação empírica dos fenômenos da sociedade para se destacar quais deles são fatos sólidos, coisificados (DURKHEIM, 1966: 117). Com as ferramentas dadas, e as noções a respeito de fato social, crime e patologia, um ultimo exemplo: um morador de rua pode construir um barraco em algum reduto qualquer da cidade, este mesmo morador será vigiado, controlado de diversas formas, seja pela própria consciência, pela própria submissão ao espaço social ao qual foi socialmente relegado, seja pelo julgamento da sociedade que o mantém politicamente silenciado, seja pelos olhos da polícia e da justiça caso haja qualquer ofensa às letras da lei. O que aconteceria se um conjunto maior de indivíduos sem teto aglutinasse em torno de um ato transgressor como a invasão de uma propriedade privada? Ação essa que ofende a lei, os costumes da sociedade, e até próprio pensamento social como um elemento naturalizado de coerção, de controle que falhou em seu propósito de existir, mas em contrapartida não representa o núcleo, o conjunto da sociedade. Podemos considerar que este grupo de sem tetos é um ramo doente? Há nele um risco patológico? Algo que deve ser suprimido, neutralizado, antes que se generalize o suficiente para se impor uma revolução que um manifestação isolada jamais seria capaz? Para Durkheim, a revolução é possível? Entendemos que o crime é normal, como um fato social necessário para que a vida social mantenha-se no caminho natural da evolução moral, e do próprio direito. Quando na sociedade, e por consequência na lei, não havia um consenso a respeito do divorcio, a separação era considerada um crime. Quando o conjunto de criminosos, ou seja, de casamentos desfeitos alcançou uma certa aprovação social, consequentemente a lei também se altera. Mas como tratar o patológico nos termos do exemplo anterior? Para Durkheim é dever do homem de estado atuar como um médico, que “por meio de uma boa higiene, previne a eclosão das doenças, e, quanto estas se declaram, procura sana-las” antes que evoluam para uma revoluções, deve-se atuar com “regular perseverança para manter o estado normal, restabelecendo-o se perturbado” (DURKHEIM, 1966: 69). Mas para tratar a doença é necessário que se estabeleça antes a imagem do que é uma saúde desejável. Para a patologia criada pelos sem teto transgressores, qual é o remédio? É prover moradia digna? É higienizar a cidade relegando-os aos locais mais afastados e precários? É liquida-los? O que é socialmente desejável em uma sociedade composta por princípios capitalistas? Deve-se garantir a saúde segundo quem tem a posse individual de bens ou segundo quem mal tem a posse da própria vida? Como Durkheim definiria os tipos sociais desta sociedade aqui descrita? Tendo em vista que uma das regras de seu método sociológico é que se deve distinguir o conjunto de acordo com os indivíduos que o compõe (DURKHEIM, 1966: 78), quais são os tipos sociais de relevância e quais são os tipos invisíveis nesta análise? O capital e a consequente existência normal da pobreza. Pobreza, assim como o crime, é considerado algo normal. O Capital, assim como o crime e a pobreza, é considerado normal. Será essa a imagem do que é uma saúde social aceitável? Este e outros exemplos não foram dados pelo autor, mas a leitura do livro desperta diversas reflexos a aproximações de questionamentos mais ligados ao contemporâneo, as mazelas atuais.

 

Referências Bibliográficas:

DURKHEIM, Émile. As regras do método sociológico. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 4ed, 1966.

KELSEN, Hans. Teoria geral do direito e do Estado. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2005.

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