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As mulheres transexuais podem buscar o recurso da Lei Maria da Penha em caso de violência nas relações afetivas?

💡 4 Respostas

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Matheus Souza Fonseca

Entendo que, desde que haja o conflito de identidade de genero, sim.

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Especialistas PD

A questão não é pacífica. No entanto, há decisões judiciais entendendo que a Lei Maria da Penha também protege a mulher trans. Sobre o tema, vale a pena conferir o artigo de Sergio Rodas no portal CONJUR, que explica decisão judicial recente sobre a matéria:

“As proteções da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006) resguardam quem exerce o papel social de mulher, seja biológica, transgênero, transexual ou homem homossexual. E o sujeito ativo da violência doméstica contra elas também pode ser do sexo feminino, já fixou o Superior Tribunal de Justiça, desde que fique caracterizado o vínculo de relação doméstica, familiar ou de afetividade.

Com base nesse entendimento, a Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de São Gonçalo (RJ) aceitou pedido da Defensoria Pública do Rio de Janeiro e estabeleceu medidas para proteger uma mulher transgênero de sua mãe.

Após assumir que era trans em janeiro de 2016, a mulher passou a enfrentar forte rejeição de sua mãe, que, opositora da identidade de gênero, acredita que a escolha da filha não passa de uma doença mental adquirida pelo convívio com “más influências”. Devido às ideias de sua mãe, a mulher trans mudou-se para Minas Gerais com sua companheira, também transgênero.

Passado certo tempo, a mãe buscou a reconciliação. A filha acreditou, voltou para São Gonçalo e passou a morar perto dela. No entanto, a mãe retomou a intolerância em relação à orientação sexual da filha e decidiu interná-la em clínica psiquiátrica, à revelia. Assim, certo dia, enfermeiros arrastaram-na, à força, para ambulância que a levaria ao estabelecimento. Os vizinhos presenciaram a filha tentando resistir à internação — ela ficou praticamente nua durante a luta.

A situação, no entanto, não impediu que ela fosse colocada no veículo e levada para clínica fora do Rio. Lá, foi submetida a pseudotratamento e teve seu longo cabelo raspado. Para evitar o sofrimento da jovem, a Defensoria Pública pediu à Justiça que estabelecesse medidas para protegê-la de sua mãe.

Ao julgar o caso, o juiz da Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de São Gonçalo, André Luiz Nicolitt, apontou que a internação e o corte de cabelo forçados violaram a dignidade humana da mulher trans.

“Convicções contrárias à orientação e identidade sexuais da pessoa não merecem acolhida nos dias de hoje, devendo o Poder Judiciário repelir violação ao arcabouço de direitos fundamentais da pessoa humana, em obediência ao princípio da inafastabilidade da jurisdição”, destacou.

Citando filósofas como Simone de Beauvoir e Judith Butler, o juiz afirmou que o gênero é um conceito sociológico independente do sexo. Logo, se a filha “se veste como mulher, se identifica socialmente como mulher, ingere medicamentos hormonais femininos, ou seja, se vê e se compreende como mulher, não possuindo terceira pessoa autoridade para a designar de outra forma”.

Segundo Nicolitt, o sujeito ativo dos crimes previstos na Lei Maria da Penha pode ser tanto homem quanto mulher — entendimento já fixado pelo STJ (Conflito de Competência 88.027).

“Isso porque a cultura machista e patriarcal se estruturou de tal forma e com tamanho poder de dominação que suas ideias foram naturalizadas na sociedade, inclusive por mulheres. Sendo assim, não raro, mulheres assumem comportamentos machistas e os reproduzem, assumindo, não raro, o papel de opressor, sendo instrumentalizadas pelo dominador, como na escravidão existiu o negro que era ‘capitão do mato’, o que vem sendo tratado às vezes como síndrome de Estocolmo”, argumentou o juiz.

E a mãe, no caso, age de forma machista ao afirmar que a filha decidiu deixar de ser homem por influência do “demônio”, “loucura” ou más companhias, ressaltou.

Na visão de Nicolitt, todas as medidas protetivas da Lei Maria da Penha podem ser aplicadas àquelas do gênero feminino, independentemente do sexo. Ou seja: são cabíveis também para resguardar gays, travestis, transgêneros e transexuais, além de mulheres.

Dessa maneira, o juiz aceitou parcialmente o pedido da Defensoria e ordenou que a mãe não chegue a menos de 500 metros da filha e que não entre em contato com ela por nenhum meio de comunicação. Além disso, André Luiz Nicolitt determinou a busca e apreensão dos objetos pessoais da mulher trans que estão na casa de sua mãe.”

Fonte: https://www.conjur.com.br/2017-jun-10/lei-maria-penha-protege-tambem-mulher-transgenero-homem-gay

No TJDF também há decisão na mesma linha:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO CONTRA DECISÃO DO JUIZADO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. DECLINAÇÃO DA COMPETÊNCIA PARA VARA CRIMINAL COMUM. INADMISSÃO DA TUTELA DA LEI MARIA DA PENHA. AGRESSÃO DE TRANSEXUAL FEMININO NÃO SUBMETIDA A CIRURGIA DE REDESIGNAÇÃO SEXUAL (CRS). PENDÊNCIA DE RESOLUÇÃO DE AÇÃO CÍVEL PARA RETIFICAÇÃO DE PRENOME NO REGISTRO PÚBLICO. IRRELEVÂNCIA. CONCEITO EXTENSIVO DE VIOLÊNCIA BASEADA NO GÊNERO FEMININO. DECISÃO REFORMADA. 1. O Ministério Público recorre contra decisão de primeiro grau que deferiu medidas protetivas de urgência em favor de transexual mulher agredida pelo companheiro, mas declinou da competência para a Vara Criminal Comum, por entender ser inaplicável a Lei Maria da Penha porque não houve alteração do patronímico averbada no registro civil. 2. O gênero feminino decorre da liberdade de autodeterminação individual, sendo apresentado socialmente pelo nome que adota, pela forma como se comporta, se veste e se identifica como pessoa. A alteração do registro de identidade ou a cirurgia de transgenitalização são apenas opções disponíveis para que exerça de forma plena e sem constrangimentos essa liberdade de escolha. Não se trata de condicionantes para que seja considerada mulher. 3. Não há analogia in malam partem ao se considerar mulher a vítima transexual feminina, considerando que o gênero é um construto primordialmente social e não apenas biológico. Identificando-se e sendo identificada como mulher, a vítima passa a carregar consigo estereótipos seculares de submissão e vulnerabilidade, os quais sobressaem no relacionamento com seu agressor e justificam a aplicação da Lei Maria da Penha à hipótese. 4. Recurso provido, determinando-se prosseguimento do feito no Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, com aplicação da Lei Maria da Penha. (Acórdão 1089057, Relator Des. GEORGE LOPES, 1ª Turma Criminal, data de julgamento: 5/4/2018, publicado no DJe: 20/4/2018.) 

 

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Nanda

CLaro que sim, principio da igualdade e legalidade.

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