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SOLUÇÃO DE CONFLITOS JURÍDICOS Martha Luciana Scholze Arbitragem: conceito, natureza jurídica e finalidade Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Definir o que é arbitragem. Explicar a natureza jurídica, a finalidade e o conceito de convenção arbitral. Analisar a Lei nº. 9.307, de 23 de setembro de 1996, os arts. 851 a 853 do Código Civil e o compromisso arbitral. Introdução A arbitragem é uma forma de solução de conflitos prevista em lei que pode ser utilizada quando estamos diante de um impasse decorrente de um contrato. Para isso, as partes nomearão árbitros, que poderão ser qualquer pessoa maior de idade, no domínio das suas faculdades mentais, e que tenham a confiança das partes. Também deverão ser independentes e imparciais — isto é, não podem ter interesse no resultado da demanda nem estar vinculados a qualquer das partes. A arbitragem não é instituto novo no Direito brasileiro. Desde a Cons- tituição Imperial de 1824 até a atualidade, sempre esteve presente no ordenamento jurídico, com a denominação de juízo arbitral ou compro- misso. A pouca utilização da arbitragem se devia ao fato de não oferecer garantia jurídica e ser muito burocratizada. Atualmente, a arbitragem é regulamentada pela Lei nº. 9.307, de 23 de setembro de 1996, tendo ganhado força com o Código de Processo Civil (CPC) de 2015. Neste capítulo, você vai estudar o conceito de arbitragem, entender a natureza jurídica, a finalidade e o conceito de convenção arbitral, bem como analisar a Lei da Arbitragem, junto com alguns artigos do Código Civil. Arbitragem A arbitragem, conforme nos ensina Cahali (2017), ao lado da jurisdição, re- presenta uma forma heterocompositiva de solução de confl itos. Diante de um litígio, as partes capazes, de comum acordo ou por meio de uma convenção, estabelecem que um terceiro, ou um colegiado, terá poderes para solucionar a controvérsia, sem a intervenção estatal, sendo que a decisão terá a mesma efi cácia que uma sentença judicial. Por essas razões, a arbitragem também é chamada de mecanismo privado de resolução de litígios, ou meio alternativo de solução de controvérsia. Esse dispositivo assim se denomina tendo como parâmetro a jurisdição; no entanto, não atua como substituto de um sistema jurídico, capaz de se desvencilhar do ordenamento. Na arbitragem, aplica-se o Direito Material e Processual, além dos princípios gerais da Constituição Federal; ou seja, é uma alternativa à Justiça estatal, mas que segue regras jurídicas para o julgamento. Denomina- -se, ainda, método extrajudicial de solução de conflitos. Na busca pela melhor alternativa às partes, temos na arbitragem o modelo mais adequado para diversas situações. É o caso de conflitos complexos, que envolvem o aprofundamento em matérias específicas e exigem estrutura e dedicação, aspectos difíceis de serem obtidos no Poder Judiciário, pelas suas características genéricas e pelo grande volume de trabalho. Conforme Cahali (2017), uma das mais reconhecidas vantagens da arbi- tragem é a possibilidade, em certa medida, de escolha do julgador dentre as pessoas que mais inspiram confiança às partes, levando-se em consideração a experiência, a conduta, os conhecimentos específicos sobre a matéria, a idade, etc. Observe, porém, que a definição do árbitro ou do colegiado, bem como as regras de impedimento dos julgadores, são temas um pouco mais complexos. Também se pode apontar como benefício do procedimento arbitral a sua rapidez, principalmente ao se tomar como comparativo o processo judicial. Enquanto a taxa de congestionamento dos tribunais aponta um prazo de- masiadamente longo para o trânsito em julgado de uma sentença judicial, a Lei de Arbitragem estabelece que o procedimento arbitral deve encerrar em seis meses após a instituição da arbitragem, embora as partes, o árbitro e os regulamentos das câmaras arbitrais possam dispor de forma diversa. Arbitragem: conceito, natureza jurídica e finalidade2 Há questões complexas que serão resolvidas pela arbitragem que podem levar um tempo maior para serem julgadas. Porém, mesmo com uma instrução tumultuada e vários incidentes no decorrer do julgamento, as estimativas realizadas entre as instituições que trabalham com a arbitragem demostram que o prazo é mais célere que o andamento processual. De qualquer forma, é necessária a fixação de um prazo final para a arbitragem, o que afasta o risco de o julgamento se prolongar no tempo. Com isso, dificilmente ocorrem situações em que o prazo é superior a um ano. Um dos motivos para essa celeridade é o fato de que o julgamento arbitral se faz em única instância, ou seja, sem a possibilidade de recursos. Querendo, as partes podem estabelecer um julgamento colegiado, mas este acompanha o procedimento desde seu início e não em instância recursal. Segundo Cahali (2017), pressupõe-se que as partes escolheram as pessoas mais habilitadas para o exame daquela questão, como lhes é facultado. E, na perspectiva de terem os eleitos se dedicado intensamente ao estudo e à solução do conflito, não se justifica pensar em instância recursal. Outro aspecto importante que devemos considerar em relação à arbitragem é a flexibilidade do procedimento. O método arbitral é muito pragmático. Com efeito, pela sua abrangência a toda e qualquer situação, as regras estabelecidas no Código de Processo Civil e os procedimentos cartorários no Judiciário geram a necessidade da prática de uma série de atos, protocolos, providências, despachos, inúmeras formalidades (até para a segurança do jurisdicionado). Já na arbitragem, o foco maior é a solução da matéria de fundo, e, assim, há maior informalidade nas providências para se alcançar o objetivo: solucionar a controvérsia. Cahali (2017), na sua obra, nos apresenta mais algumas importantes van- tagens do procedimento arbitral: Cumprimento espontâneo das decisões. As partes estão comprometidas em aceitar como imperativo a sentença arbitral por elas encomendada, visto que elegeram o julgador por vontade própria, pela confi ança, e considerando ser ele conhecedor da matéria; a experiência demonstra que as partes respeitam a sentença arbitral e a ela se submetem voluntariamente. Confi dencialidade. Embora não tenha na Lei da Arbitragem a exigência de procedimento arbitral confi dencial ou sigiloso, geralmente não só a con- venção arbitral dispõe sobre essa reserva de publicidade, como também os 3Arbitragem: conceito, natureza jurídica e finalidade regulamentos das principais câmaras de arbitragem estabelecem essa regra, salvo se o procedimento envolver a Administração Pública. Um exemplo é o caso do art. 17.4 do Regulamento da Câmara de Conciliação, Mediação e Arbitragem CIESP/FIESP: O procedimento arbitral é rigorosamente sigiloso, sendo vedado aos membros da Câmara, aos árbitros e às próprias partes divulgar quaisquer informações com ele relacionadas, a que tenham acesso em decorrência de ofício ou de participação no referido procedimento (CÂMARA DE ARBITRAGEM, MEDIAÇÃO E CONCILIAÇÃO DO CIERGS, 2018). Tanto as partes quanto o objeto conflituoso não serão divulgados, evitando- -se, por exemplo, ferir a imagem da empresa ou divulgar segredos industriais ou, até mesmo, o valor da demanda. Método econômico-fi nanceiro. Em um primeiro momento, os valores para se instaurar um procedimento arbitral poderiam desencorajar o uso do instituto, mas o resultado fi nal, medido a partir do custo-benefício — por exemplo, a confi dencialidade, a tecnicidade do árbitro ou a insegurança das decisões judiciais, bem como a celeridade na obtenção do resultado —, pode levar a outra conclusão quando comparado a um processo na Justiça estatal. Só de se pensar em um julgamento em instância única, sem os ônus decorrentes da demora e das despesas para sustentar o processo com diversos recursos, já se pode reconhecer a vantagem econômica. Contudo, nem todos os litígios podem ser resolvidospela arbitragem. A Lei nº. 9.307/1996 estabelece limites ao objeto da arbitragem, de acordo com a qualidade das partes envolvidas ou a matéria em questão. A cláusula compromissória é autônoma com relação ao contrato ou ao negócio jurídico a que está ligada, não o seguindo em caso de nulidade ou qualquer outra questão, de acordo com o art. 8 da Lei de Arbitragem. Essa autonomia tem origem no princípio competência-competência do juízo arbitral, o qual é competente para decidir sobre a sua própria competência. Arbitragem: conceito, natureza jurídica e finalidade4 A natureza jurídica e a finalidade da arbitragem e o conceito de convenção arbitral A arbitragem tem natureza jurídica pública, e a função exercida pelos ár- bitros é também pública, por ser função de pacifi cação de confl itos, de nítido caráter de colaboração com o Estado na busca de seus objetivos essenciais. Portanto, tem-se que a natureza da arbitragem e seus requisitos são públicos, e não estatais. A convenção de arbitragem é a matriz desse método de solu- ção de confl itos, ou seja, é a forma pela qual as partes exercem a sua opção pela jurisdição arbitral e representa o espaço de liberdade, o lugar para as partes contratarem livremente, nos limites da lei e de seus detalhes. Sendo bem delineada a convenção, há expectativa de um caminhar tranquilo para a solução do confl ito. Porém, se vícios ou falhas vierem a existir nessa fase, compromete-se a saúde da arbitragem, exigindo um tratamento de maior ou menor complexidade, podendo até mesmo obstar sua utilização. Conforme Abreu (2014), quando é convencionada a arbitragem entre as partes, fica excluída a apreciação do litígio pelo Poder Judiciário. Essa con- dição é conhecida como efeito negativo da convenção arbitral, o qual é dirigido ao Estado. Já o efeito positivo se refere às partes, as quais somente poderão submeter seus conflitos à jurisdição privada. Conforme Martins (1999), ao firmarem a cláusula compromissória, os contratantes concordam com a submissão de eventual conflito à justiça privada, não mais podendo arrepender-se ou reverter a questão, unilateralmente, à jurisdição ordinária. Entretanto, isso não significa dizer que, convencionada a arbitragem, as partes estão obrigatoriamente vinculadas a tal instituto em qualquer hipótese. Na legislação, há expressa referência à convenção, como gênero do qual são espécies a cláusula compromissória e o compromisso arbitral, conforme o art. 3º da Lei nº. 9.307/1996. A arbitragem somente poderá ser instituída pela vontade livre das partes por meio da convenção de arbitragem, conforme Sentença Estrangeira Contestada nº. 6.75307: A convenção de arbitragem é a fonte ordinária do direito processual arbitral, espécie destinada à solução privada dos conflitos de interesses e que tem por fundamento maior a autonomia da vontade das partes. Estas, espontaneamente, optam em submeter os litígios existentes ou que venham a surgir nas relações negociais à decisão de um árbitro, dispondo da jurisdição comum (BRASIL, 2002, documento on-line). Com isso, veremos os conceitos de cláusula compromissória e compromisso arbitral, bem como as suas diferenças. 5Arbitragem: conceito, natureza jurídica e finalidade A cláusula compromissória é a previsão em contrato de que eventuais conflitos dele emergentes serão resolvidos pela arbitragem. Nos contratos, ela é uma cláusula preventiva, sendo que as partes que contratam esperam que haja o cumprimento dos compromissos acertados no contrato. Caso isso não ocorra, o litígio ou a divergência deve ser resolvido por arbitragem, e não pelo judiciário. Para tanto, a Lei de Arbitragem faz exigência de que esse tipo de cláusula seja escrita, podendo estar inserida no próprio contrato ou em documento apartado que a ele se refira, sob pena de nulidade. Além disso, para que seja válida, conforme o art. 2º da Lei de Arbitragem, deverá ser assinada por pessoas capazes (arts. 1º ao 5º do Código Civil brasileiro) e apenas poderá prever soluções de litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis. Fora os requisitos acima apontados, a Lei não faz mais nenhuma exigência formal. É importante ressaltar que, conforme Abreu (2014) nos ensina, havendo nulidade em qualquer cláusula contratual ou sendo nulo o contrato, a cláusula arbitral permanecerá válida, cabendo ao árbitro julgar a nulidade do contrato ou de suas cláusulas. O contrário também é possível: no caso de a cláusula arbitral ter sido pactuada de forma que seja nula, seja por não ter sido escrita, ou por não ter sido firmada por pessoas capazes, tal fato não tornará o contrato nulo ou anulável. Por sua vez, o compromisso arbitral vem previsto no art. 9º da Lei de Arbitragem, para o qual o compromisso arbitral é a convenção arbitral por meio da qual as partes submetem um litígio à arbitragem de uma ou mais pessoas, podendo ser judicial ou extrajudicial (BRASIL, 1996). Diferentemente da cláusula arbitral, cujo único requisito específico é o de ser escrita, a Lei, além daqueles requisitos genéricos, previstos em seu art. 2º, prevê outros requisitos. O compromisso judicial deverá ser celebrado por termo nos autos, perante juízo ou tribunal onde tiver curso a demanda. Já o extrajudicial será celebrado por escrito particular, assinado por duas testemunhas, ou por instrumento público. Além desses requisitos, quanto à forma de constituição do compromisso, o legislador também fez exigências quanto ao conteúdo do mesmo, as quais vêm previstas no art. 10 da mencionada Lei (BRASIL, 1996): o nome, profissão, estado civil e domicílio das partes; o nome, profissão e domicílio do árbitro, ou dos árbitros, ou, se for o caso, a identificação da entidade à qual as partes delegaram a indicação de árbitros; a matéria que será objeto da arbitragem; o lugar em que será proferida a sentença arbitral. Arbitragem: conceito, natureza jurídica e finalidade6 A diferença entre o compromisso arbitral e a cláusula compromissória consiste no fato de que, enquanto o compromisso arbitral se destina a submeter ao juízo arbitral uma controvérsia concreta já surgida entre as partes, a cláusula compromissória objetiva a submeter ao processo arbitral apenas questões indeterminadas e futuras, que possam surgir no decorrer da execução do contrato, como já decidiu a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça. São, então, dois momentos distintos, com circunstâncias e características próprias. Enquanto a previsão da cláusula compromissória se faz em contrato ou em documento próprio a ele reportado, cujo cumprimento se espera das partes, no compromisso o litígio já está presente, e diante dele as partes resol- vem buscar a solução arbitral para preservar os direitos que entendem lesados. A cláusula pressupõe o vínculo contratual. Já o compromisso pode referir-se à relação conflituosa com origem em negócio ou em fato jurídico, sem ter sido necessariamente cogitada a arbitragem previamente ao nascimento do conflito. Fora isso, o compromisso arbitral exige requisitos próprios, e a Lei de Arbitragem sugere também elementos facultativos. Para Cahali (2017), conforme o que contém na cláusula compromissória, verificado o conflito, podem surgir duas situações distintas: 1. ser prontamente instaurado o procedimento arbitral; 2. ser necessária a formalização de um compromisso arbitral, diretamente entre as partes ou por meio de procedimento judicial próprio, conforme os arts. 6º e 7º da Lei nº. 9.307/1996. Sob outra perspectiva, o compromisso pode ou não ser precedido de cláusula compromissória, conforme o caso, e, ainda, poderá ser judicial ou extrajudicial. Ainda, na convenção arbitral (por compromisso ou cláusula), pode-se eleger tanto a arbitragem institucional como a arbitragem ad hoc, tudo de acordo com a vontade das partes. 7Arbitragem: conceito, natureza jurídica e finalidade É sabido que a arbitragem pode ser utilizada em disputas relacionadas a direitos patrimoniais por qualquerpessoa que tenha condições e esteja disposta a contratar o serviço, e hoje também é oferecida por startups. Exemplo disso é a Câmara Internacional de Arbitragem e Mediação em Tecnologia da Informação, E-commerce e Comunicação (CIAMTEC), que iniciou as suas atividades no Brasil. Ela funciona como um tribunal de arbitragem formado por profissionais especializados nas leis e no Direito aplicado à tecnologia da informação. A sua função é resolver conflitos que envolvem golpes eletrônicos, fraudes, concorrência desleal, compras coletivas, violação de privacidade e outros assuntos relacionados à tecnologia da informação. A Lei nº. 9.307/1996, os arts. 851 a 853 do Código Civil e o compromisso arbitral O compromisso arbitral é a convenção por meio da qual as partes submetem à arbitragem um litígio já inaugurado. É isso que o Código Civil prevê nos arts. 851 a 853 (BRASIL, 2002): no art. 851, é admitido compromisso, judicial ou extrajudicial, para resolver litígios entre pessoas que podem contratar; no art. 852, é vedado compromisso para solução de questões de estado, de direito pessoal de família e de outras que não tenham caráter estri- tamente patrimonial; no art. 853, admite-se nos contratos a cláusula compromissória, para resolver divergências mediante juízo arbitral, na forma estabelecida em lei especial. O compromisso arbitral pode ser judicial, celebrado nos termos nos autos, perante o juízo ou tribunal onde tem curso a demanda, ou extrajudicial, pro- movido por meio de instrumento público ou particular, sendo, nessa última forma, necessariamente por documento escrito e com duas testemunhas. Quando realizado no curso do processo judicial, segue a forma do termo previsto no art. 209 do CPC, sendo necessária a assinatura das partes e dos respectivos patronos. Adverte-se que o advogado só poderá firmar compro- misso em nome das partes se lhe tiverem sido outorgados poderes especiais e específicos para tanto. Arbitragem: conceito, natureza jurídica e finalidade8 Com o compromisso, extingue-se o processo sem resolução de mérito. Subtrai-se do judiciário a análise do mérito, outorgando-se às partes a ju- risdição privada e o poder decisório ao árbitro. Conforme Carmona (2009), o compromisso judicial ou extrajudicial representa negócio jurídico com forma prescrita em lei e, portanto, com requisitos próprios. Assim, além das formalidades, o art. 10 da Lei de Arbitragem traz exigências específicas para a validade do compromisso arbitral, conforme visto anteriormente. In verbis: Art. 10 Constará, obrigatoriamente, do compromisso arbitral: I — o nome, profissão, estado civil e domicílio das partes; II — o nome, profissão e domicílio do árbitro, ou dos árbitros, ou, se for o caso, a identificação da entidade à qual as partes delegaram a indicação de árbitros; III — a matéria que será objeto da arbitragem; e IV — o lugar em que será proferida a sentença arbitral (BRASIL, 1996, documento on-line). Sobre a natureza jurídica do compromisso arbitral, discute-se muito a respeito. Alguns o consideram como contrato processual, tendo como conteúdo o procedimento arbitral. Já outros autores enquadram o compromisso como um contrato complexo e composto, ou seja, uma combinação unitária de vários contratos elementares, concluindo que concerne mais propriamente à ação ou às suas modalidades de exercício, tendo os efeitos no campo do processo. Pode-se concluir que o compromisso arbitral tem natureza jurídica contratual, eis que se trata de um acordo de vontades firmado pelas partes, a fim de ver solucionado o conflito por meio da arbitragem, afastando a competência estatal para tanto. Com relação à indicação dos árbitros, pode ser feito no compromisso, desde o início, mesmo se encomendada a arbitragem a uma instituição. Porém, nesse caso, é recomendado que a instituição eleita aceite o procedimento com árbitros estranhos ao seu quadro. O comum, nessas situações, é a instauração de um colegiado arbitral, sendo que os árbitros escolhidos pelas partes, no compromisso, devem definir qual será o terceiro e o presidente do painel, dentre aqueles integrantes da instituição indicada. E, na divergência quanto à escolha, esta caberá à instituição. Por outro lado, quando há a indicação direta do árbitro, é prudente a enumeração de outros em substituição ao primeiro escolhido, para a hipótese de impedimento, recusa ou qualquer outro fator que impeça a participação do eleito. Quanto ao objeto da arbitragem, é relevante saber que, na latitude da autonomia da vontade, podem as partes limitar o quanto será tratado no 9Arbitragem: conceito, natureza jurídica e finalidade procedimento e o quanto seguirá no Judiciário, excluído do objeto definido pelas partes. Pode-se, por exemplo, em conflitos envolvendo diversas questões relativas a uma obra, como prazo, responsabilidade, cumprimento de diversas obrigações, reservar para a arbitragem matérias técnicas, como medição e qualidade de materiais, mantendo-se no judiciário os demais aspectos. Em momento apropriado, quando da instalação da arbitragem, as partes deverão especificar seus pedidos e divergências. Se houver dúvida, verificada a ne- cessidade de explicitar a questão disposta na convenção de arbitragem, será elaborado, juntamente com as partes, um adendo firmado por todos, que passará a fazer parte integrante da convenção, conforme o art. 19 da Lei nº. 9.307/1996. Se houver conflito a respeito da extensão do compromisso, cabe ao árbitro a decisão, na amplitude do seu poder. O tema da arbitragem pode ser encontrado em muitos estudos sobre o tema. Algumas dicas de leitura podem ser conferidas nos links abaixo. https://goo.gl/s8JiQx https://goo.gl/Pf62DL A arbitragem pode ser utilizada em contratos de locação residencial ou comercial, contratos de compra e venda de bens em geral, cobranças de títulos vencidos empre- sariais, contratações de serviços, conflitos trabalhistas, seguros, inventários, questões comerciais em geral, etc. Arbitragem: conceito, natureza jurídica e finalidade10 ABREU, M. S. O. Da convenção de arbitragem e seus efeitos. JusBrasil, 21 out. 2014. Disponível em: <https://daniellixavierfreitas.jusbrasil.com.br/artigos/146770849/da- -convencao-de-arbitragem-e-seus-efeitos>. Acesso em: 18 jul. 2018. BRASIL. Lei nº. 9.307, de 23 de setembro de 1996. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 24 set. 1996. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ Leis/L9307.htm>. Acesso em: 18 jul. 2018. BRASIL. Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 11 jan. 2002. Disponível em: <http://www.planalto.gov. br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm>. Acesso em: 18 jul. 2018. BRASIL. Lei nº. 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 17 mar. 2015. Disponível em: <http://www. planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 18 jul. 2018. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Sentença Estrangeira Contestada nº. 6.75307, Tribunal Pleno. Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, Acórdão de 13 jun. 2002. CAHALI, F. J. Curso de Arbitragem. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017. CÂMARA DE ARBITRAGEM, MEDIAÇÃO E CONCILIAÇÃO DO CIERGS. Regulamento de Arbitragem da CAMERS. 2018. Disponível em: <http://cbar.org.br/site/wp-content/ uploads/2018/04/camers-arbitragem.pdf>. Acesso em: 6 ago. 2018. Arbitragem: conceito, natureza jurídica e finalidade11 CARMONA, C. A. Arbitragem e processo. São Paulo: Atlas, 2009. MARTINS, P. A. B. Convenção de arbitragem: aspectos fundamentais da Lei de Arbitragem. Rio de Janeiro: Forense, 1999. Leituras recomendadas ALEM, F. P. Arbitragem. São Paulo: Saraiva, 2009. GRINOVER, A. P.; CINTRA, A.; DINAMARCO, C. Teoria geral do processo. 30. ed. São Paulo: Malheiros, 2014. GUILHERME, L. F. V. A. Distinção entre cláusula compromissória e compromissoarbitral. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 58, 1 ago. 2002. 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