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Princípios do tratamento antimicrobiano Farmacologia II – Unicerrado Capítulos 37 e 38 – Farmacologia ilustrada O tratamento antimicrobiano beneficia-se das diferenças bioquímicas que existem entre os microrganismos e os seres humanos. Antimicrobianos são seletivamente tóxicos Na maioria das situações, a toxicidade seletiva é relativa, em vez de absoluta, exigindo que a concentração do fármaco seja cuidadosamente controlada para atingir o microrganismo enquanto ainda está sendo tolerada pelo hospedeiro. A escolha do antimicrobiano Requer conhecimento: • Da identificação do microrganismo • Da suscetibilidade do organismo com relação a um fármaco em particular • Do local da infecção • De fatores do paciente • Da segurança do fármaco • Do custo do tratamento Tratamento empírico antes da identificação do microrganismo 1. Quando começar o tratamento: Pacientes agudamente doentes, com infecção de origem desconhecida, paciente neutropênico e paciente com meningite. Exige tratamento imediato. 2. A escolha do fármaco: Local da infecção e anamnese. Avaliar idade, infecções prévias, relatos de viagens recentes, tratamentos antimicrobianos recentes, estado imune e local onde a infecção foi adquirida (ambiente comunitário ou hospitalar). Em caso de agente patológico desconhecido ou possibilidade de infecção polimicrobiana, optar por fármaco de amplo espectro. 3. Determinação da suscetibilidade antimicrobiana de microrganismos infecciosos: Depois que um patógeno foi cultivado, a sua suscetibilidade a antimicrobianos específicos serve de orientação na escolha do fármaco. A maioria dos bacilos gram-negativos, enterococos e estafilococos com frequência revela padrões imprevisíveis e exige testes de suscetibilidade para determinar o tratamento antimicrobiano apropriado. Fármacos bacteriostáticos x Fármacos bactericidas Bacteriostáticos inibem o crescimento e a multiplicação da bactéria no soro (ou urina) em concentrações que podem ser alcançadas no paciente, limitando, assim, o agravamento da infecção enquanto o sistema imune ataca, imobiliza e elimina os patógenos. Fármacos bactericidas matam a bactéria nas concentrações séricas do fármaco alcançadas no paciente. Devido à sua ação antimicrobiana mais agressiva, os bactericidas são, em geral, de escolha no paciente gravemente enfermo e imunocomprometido. É possível que um antimicrobiano seja bacteriostático para um microrganismo bactericida para outro. Concentração inibitória mínima (CIM) A CIM é a menor concentração de antibacteriano que previne o crescimento visível do microrganismo após 24 horas de incubação. Concentração bactericida mínima (CBM) A CBM é a menor concentração de antibacteriano que resulta em diminuição de 99,9% na contagem de colônias após a incubação noturna em caldo de cultura. Efeito local da infecção no tratamento: a barreira hematoencefálica Níveis adequados de um antimicrobiano devem alcançar o local da infecção para eliminar o microrganismo invasor. - Lipossolubilidade do fármaco é o principal determinante da sua capacidade de entrar no cérebro. - Massa molecular do fármaco - Ligação do fármaco às proteínas plasmáticas: uma taxa elevada de ligação do fármaco às proteínas plasmáticas limita a entrada no LCS. Fatores do paciente - Sistema imune - Disfunção renal - Disfunção hepática - Má perfusão - Idade - Gestação e lactação - Fatores de risco para microrganismos resistentes a vários fármacos Determinantes da dosagem racional 1. Efeito bactericida concentração-dependente 2. Efeito bactericida tempo-dependente (concentração-independente) 3. Efeito pós-antimicrobiano – suspensão do crescimento microbiano que persiste mesmo após os níveis de antimicrobiano caírem abaixo do CIM. Associação de antimicrobianos É recomendável tratar terapeuticamente os pacientes com um fármaco único que seja o mais específico contra o microrganismo infectante. Contudo, algumas situações exigem a associação de antimicrobianos. Por exemplo, o tratamento da tuberculose se beneficia da associação de fármacos. Exemplo: Associação de b-lactâmicos e aminoglicosídeos é mais eficaz que o uso individual de cada fármaco. As associações são indicadas apenas em casos especiais. Inúmeros antimicrobianos atuam somente quando os microrganismos estão se multiplicando. Portanto, a coadministração de um fármaco que cause bacteriostase com um segundo bactericida pode resultar na interferência do primeiro na eficácia do segundo. Resistencia As bactérias são consideradas resistentes a um antimicrobiano quando seu crescimento não é inibido pela maior concentração do fármaco tolerada pelo hospedeiro. - A maioria dos microrganismos gram-negativos é inerentemente resistente à vancomicina. Complicações da terapia com antimicrobianos • Hipersensibilidade • Toxicidade direta • Superinfecções por organismos oportunistas Antimicrobianos inibidores da parede celular – Cap. 38 Interferem seletivamente na síntese da parede celular bacteriana – estrutura que as células dos mamíferos não possuem. Apresentam eficácia máxima quando os microrganismos estão se proliferando. Tem pouco ou nenhum efeito em bactérias que não estejam crescendo ou se dividindo. Os membros mais importantes do grupo são os antimicrobianos b-lactâmicos = Vancomicina e daptomicina. Penicilinas Estão entre os fármacos mais amplamente eficazes e também entre os menos tóxicos conhecidos. Mas o aumento da resistência limitou seu uso. - Mecanismo de ação: As penicilinas interferem na última etapa da síntese da parede bacteriana, resultando em exposição da membrana osmoticamente menos estável. Pode ocorrer lise celular, seja pela pressão osmótica, seja pela ativação de autolisinas. São bactericidas tempo-dependentes. As penicilinas são eficazes somente contra microrganismos em crescimento rápido, que sintetizem a parede celular de peptideoglicano. São inativas contra microrganismos sem essa estrutura: micobactérias, protozoários, fungos e vírus. 1. Proteínas ligadoras de penicilina PLPs: As penicilinas inativam também diversas proteínas na membrana celular da bactéria. Essas PLPs são enzimas bacterianas envolvidas na síntese da parede celular e na manutenção das características morfológicas das bactérias. Alterações em algumas dessas PLPs faz surgir microrganismos resistentes à penicilina. 2. Inibição da transpeptidade As penicilinas inibem a reação catalisada pela transpeptidase, inibindo assim a formação de ligações cruzadas essenciais para a integridade da parede celular. 3. Produção de autolisinas - Autolisinas = produzidas por várias bactérias, principalmente gram-positivas. Na presença de penicilina, a ação degradativa das autolisinas ocorre na ausência de síntese da parede celular. Espectro antibacteriano Determinado pela capacidade do fármaco em atravessar a parede celular de peptidoglicano da bactéria para alcançar as PLPs no espaço periplasmático. Fatores que determinam a suscetibilidade das PLPs aos antimicrobianos • Tamanho • Carga • Hidrofobicidade dos antimicrobianos b- lactâmicos em particular Em geral, os microrganismos gram-positivos tem paredes celulares facilmente atravessadas pelas penicilinas. Os gram-negativos tem uma membrana lipopolissacarídea externa, que envolve a parede celular a atua como barreira contra as penicilinas hidrossolúveis. Contudo, as bactérias gram-negativas tem proteínas inseridas na camada lipopolissacarídea que atuam como canais cheios de água (porinas), permitindo a passagem transmembrana. Penicilinas naturais - Benzilpenicilina (penicilina G)- Fenoximetilpenicilina (penicilina V) Penicilinas semissintéticas - Amoxicilina - Ampicilina A benzilpenicilina é o tratamento básico para infecções causadas por inúmeros cocos gram-positivos e gram- negativos, bacilos gram-positivos e espiroquetas. As penicilinas são suscetíveis à inativação pelas b- lactamases (penicilinases) produzidas pelas bactérias resistentes. Penicilina – Fármaco de escolha para o tratamento da gangrena gasosa e sífilis. A fenoximetilpenicilina tem espectro similar ao da Benzilpenicilina, mas não é usada no tratamento de bacteremias por causa da escassa absorção. Penicilinas antiestafilocócicas - Meticilina (não utilizada na clínica devido à sua toxicidade) - Nafcilina - Oxacilina - Dicloxacilina São penicilinas b-lactamase (penicilinase resistentes). Uso restrito à infecções causadas por estafilococos produtores de penicilinase. Tem atividade mínima ou nula contra infecções gram- negativas. Penicilinas de espectro estendido - Ampicilina - Amoxicilina São usadas amplamente no tratamento de infecções respiratórias. Tem espectro antibacteriano semelhante ao da Benzilpenicilina, mas são mais eficazes contra bacilos gram-negativos. Ampicilina é o fármaco de escolha contra o bacilo gram-positivo Listeria Monocytogenes e espécies de enterococos suscetíveis. Amoxicilina é utilizada na profilaxia de pacientes de alto risco para prevenir endocardite bacteriana por odontólogos. A formulação desses fármacos associada a um inibidor b-lactamase, como o ácido clavulânico ou sulbactam, protege a amoxicilina e a ampicilina da hidrólise enzimática e amplia seu espectro antimicrobiano, respectivamente. Penicilinas antipseudomonas - Piperacilina (+ potente) - Ticarcilina Atividade contra pseudomonas aeruginosa. São eficazes contra vários bacilos gram-negativos, mas não contra Klebsiella. Formulações com ácido clavulânico ou tazobactam, respectivamente, estendem o espectro antimicrobiano desses fármacos, incluindo assim microrganismos produtores de penicilinase. Resistencia Resistencia natural às penicilinas ocorre em microrganismos que não possuem parede celular de peptideoglicano, ou que tem paredes celulares impermeáveis a esses fármacos. - Problema atual – resistência adquirida. • Atividade b-lactamase: microrganismos gram- positivos secretam as b-lactamases extracelularmente, ao passo que as bactérias gram-negativas inativam os fármacos b- lactÂmicos no espaço periplasmático. • Diminuição da permeabilidade ao antimicrobiano • PLPs alteradas (menor afinidade) Reações adversas • Hipersensibilidade – aprox. 5% dos pacientes apresentam reação (varia de urticária a angioedema). Ocorrem reações alérgicas cruzadas entre os antimicrobianos b- lactâmicos. • Diarreia • Nefrite • Neurotoxicidade – pode provocar convulsões em caso de injeções intratecais ou em concentrações altas • Toxicidade hematológica – redução da coagulação em casos de doses elevadas. Cefalosporinas Antimicrobianos b-lactâmicos muito relacionados estrutural e funcionalmente com as penicilinas. - Mesmo mecanismo de ação - Sofrem com os mesmos mecanismos de resistência, no entanto, tendem a ser mais resistentes a certas b- lactamases do que as penicilinas. São classificadas em gerações: primeira, segunda, terceira, quarta e avançada. (essa classificação é feita com base no padrão de suscetibilidade bacteriana e resistência às b-lactamases). ➔ Primeira geração As cefalosporinas de primeira geração atuam como substitutas da Benzilpenicilina. São resistentes à penicilinase do estafilococo. ➔ Segunda geração Apresentam maior atividade contra os microrganismos gram-negativos H. influenzae, Enterobacter aerogenes e algumas espécies de Neisseria. A atividade contra microrganismos positivos é mais leve. A cobertura antimicrobiana das cefamicinas (cefotetano e cefoxitina) também inclui anaeróbicos. Nenhum é fármaco de primeira escolha, devido à crescente prevalência da resistência. ➔ Terceira geração Tratamento de doenças infecciosas Devem ser usadas com cautela, pois são associadas com lesão colateral importante. Menos potentes que os de primeira geração em relação à atividade contra MRSA. Figura 1. MRSA Tem atividade aumentada contra bacilos gram- negativos, bem como a maioria dos outros microrganismos entéricos, além de Serratia Marcescens. Ceftriaxona e Cefotaxima tornaram-se os fármacos de escolha no tratamento da meningite. Ceftazidima tem atividade contra P. aeruginosa, mas é resistência é crescente e o uso deve ser avaliado caso a caso. ➔ Quarta geração Cefepima é classificada como cefalosporina de quarta geração e deve ser administrada por via parenteral. Tem amplo espectro bacteriano – atividade contra estreptococos e estafilococos (mas apenas os que são suscetíveis à meticilina). Ela também é eficaz contra microrganismos gram-negativos. ➔ Geração avançada Ceftarolina é uma cefalosporina de geração avançada e amplo espectro. Ela é o único antimicrobiano disponível comercialmente nos EUA contra MRSA e é indicada para o tratamento de infecções complicadas da pele e sua estrutura, e pneumonias adquiridas na comunidade. Além do amplo espectro de atividade gram-positiva, tem também atividade gram-negativa similar à da ceftriaxona e das cefalosporinas de terceira geração. O regime de duas dosificações diárias limita também o uso fora do ambiente hospsitalar. Outros antimicrobianos b-lactâmicos 1. Carbapenemos São antimicrobianos b-lactâmicos sintéticos cuja estrutura difere das penicilinas. - Imipeném - Meropeném - Doripeném - Ertapeném Efeitos adversos: Imipeném + cilastatina podem causar náusea, êmese e diarreia. Eosinofilia e neutropenia são menos comuns do que com os outros b-lactâmicos. 2. Monobactamos Desorganizam a síntese da parede celular bacteriana. - Aztreonam Não tem atividade contra gram-positivos e anaeróbicos. É resistente à ação da maioria das b-lactamases, com exceção das b-LEE. Efeitos adversos: relativamente não tóxico, mas pode causar flebite, erupções cutâneas e, ocasionalmente, testes de função hapática anormais. Pode ser uma alternativa segura para pacientes alérgicos a penicilinas, cefalosporinas ou carbanemos. Inibidores da b-lactamase A hidrólise do anel β-lactâmico, seja por hidrólise enzimática com β-lactamase ou por ácidos, destrói a atividade antimicrobiana do fármaco β-lactâmico. Inibidores da β-lactamase, como ácido clavulânico, sulbactam e tazobactam ligam-se as b-lactamases e as inativam, protegendo, assim, os antimicrobianos que normalmente seriam substratos dessa enzima. São formulados em associação os antimicrobianos suscetíveis a b-lactamase. ➔ Vancomicina Importante no tratamento de infecções ameaçadoras à sobrevivência por MRSA e Staphylococcus epidermidis resistentes à meticilina, bem como infecções por enterococos. Uso restrito para o tratamento das infecções graves causadas por microrganismos gram-positivos resistentes aos β-lactâmico ou para pacientes com infecções gram-positivas que tenham grave alergia aos β-lactâmicos. A vancomicina por via IV é usada em pacientes com prótese de válvulas cardíacas e em pacientes que serão submetidos à implantação de próteses, especialmente em hospitais onde há elevada incidência de MRSA e MRSE. Uso em formulação oral – colite grave. ➔ Daptomicina Bactericida concentração-dependente tratamento de infecções causadas por microrganismos gram-positivos resistentes, incluindo os MRSAs e os enterococos resistentes à vancomicina. A daptomicina é indicada no tratamento de infecções complicadas na pele e na estrutura da pelee de bacteremias causadas por S. aureus, incluindo aquelas com endocardite infecciosa do lado direito. É inativada pelos surfactantes pulmonares, portanto, nunca deve ser usada no tratamento de pneumonias. ➔ Telavancina Antibacteriano bactericida concentração- dependente. Inibe a síntese da parede celular bacteriana, além de levar à ruptura da membrana celular da bactéria. É uma alternativa para a vancomicina, daptomicina e linezolida no tratamento de infecções complicadas na pele e nas estruturas cutâneas, causadas por microrganismos gram-positivos resistentes, incluindo MRSA. Efeitos adversos significativos – uso limitado. Risco de dano fetal em gestantes. ➔ Fosfomicina Bactericida sintético Bloqueia a síntese da parede celular Indicada contra infecções do trato urinário causadas por E. coli ou E. faecalis. Improvável resistência cruzada com outros antimicrobianos. Distribui-se bem nos rins, na bexiga e na próstata. Mantém concentrações altas na urina durante vários dias, permitindo o tratamento de infecções do trato urinário com uma única dosificação. Principais efeitos adversos: diarreia, vaginite, náuseas e cefaleia. ➔ Polimixinas Se ligam aos fosfolipídeos na membrana celular bacteriana das bactérias gram-negativas. Efeito tipo detergente, que rompe a integridade da membrana celular, levando ao vazamento de componentes celulares e finalmente à morte do agente infeccioso. Alto risco de neurotoxicidade. No entanto, seu uso ressurgiu graças ao aumento da resistência dos gram- negativos. Tratamento de salvação para pacientes com infecções resistentes a vários fármacos.