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FICHAMENTO ACADEMICO1 
 
Márcio Ricardo Oliveira dos Santos 2 
Referência da Obra: KELSEN, Hans; MACHADO, João Batista. Teoria pura do direito. 
 “[...] o indivíduo que, atuando racionalmente, põe o ato, liga a este um determinado sentido que 
se exprime de qualquer modo e é entendido pelos outros. Este sentido subjetivo, porém, pode 
coincidir com o significado objetivo que o ato tem do ponto de vista do Direito, mas não tem 
necessariamente de ser assim. [...]” p.2 
“ [...] O que transforma este fato num ato jurídico (lícito ou ilícito) não é a sua facticidade, não é 
o seu ser natural, isto é, o seu ser tal como determinado pela lei da causalidade e encerrado no 
sistema da natureza, mas o sentido objetivo que está ligado a esse ato, a significação que ele 
possui. O sentido jurídico específico, a sua particular significação jurídica, recebe-a o fato em 
questão por intermédio de uma norma que a ele se refere com o seu conteúdo, que lhe empresta a 
significação jurídica, por forma que o ato pode ser interpretado segundo esta norma. [...]”p.3 
“[...] o juízo em que se enuncia que um ato de conduta humana constitui um ato jurídico (ou 
antijurídico) é o resultado de uma interpretação específica, a saber, de uma interpretação 
normativa. Mas também na visualização que o apresenta como um acontecer natural apenas se 
exprime uma determinada interpretação, diferente da interpretação normativa: a interpretação 
causal. A norma que empresta ao ato o significado de um ato jurídico (ou antijurídico) é ela 
própria produzida por um ato jurídico, que, por seu turno, recebe a sua significação jurídica de 
uma outra norma. [...]” p.3 
“[...] Quando um indivíduo, através de qualquer ato, exprime a vontade de que um outro indivíduo 
se conduza de determinada maneira, quando ordena ou permite esta conduta ou confere o poder 
de a realizar, o sentido do seu ato não pode enunciar-se ou descrever-se dizendo que o outro se 
conduzirá dessa maneira, mas somente dizendo que o outro se deverá conduzir dessa maneira. 
Aquele que ordena ou confere o poder de agir, quer, aquele a quem o comando é dirigido, ou a 
quem a autorização ou o poder de agir é conferido, deve. [...]” p.4 
 
1 Trabalho solicitado como parte integrante dos requisitos para a aprovação na disciplina de filosofia 
juridica. 
2 Discentes do curso de Bacharelado em Direito-N01, da FAT, 2º semestre. 
 
 “[...] Há enunciados sobre o ato cujo sentido é o comando, a permissão, a atribuição de um poder 
ou competência. O sentido dessas proposições, porém, não é o de um enunciado sobre um fato da 
ordem do ser, mas uma norma da ordem do dever-ser, quer dizer, uma ordem, uma permissão, 
“[...] deve notar-se que uma norma pode ser não só o sentido de um ato de vontade mas também 
- como conteúdo de sentido - o conteúdo de um ato de pensamento. Uma norma pode não só ser 
querida, como também pode ser simplesmente pensada sem ser querida. Neste caso, ela não 3 é 
uma norma posta, uma norma positiva. Quer isto dizer que uma norma não tem de ser 
efetivamente posta - pode estar simplesmente pressuposta no pensamento.” p.7 
“Como a vigência da norma pertence à ordem do dever-ser, e não à ordem do ser, deve também 
distinguir-se a vigência da norma da sua eficácia, isto é, do fato real de ela ser efetivamente 
aplicada e observada, da circunstância de uma conduta humana conforme à norma se verificar na 
ordem dos fatos. [...]” p.8 
“[...] Uma norma jurídica é considerada como objetivamente válida apenas quando a conduta 
humana que ela regula lhe corresponde efetivamente, pelo menos numa certa medida. Uma norma 
que nunca e em parte alguma é aplicada e respeitada, isto é, uma norma que - como costuma dizer-
se - não é eficaz em uma certa medida, não será considerada como norma válida (vigente). Um 
mínimo de eficácia (como sói dizer-se) é a condição da sua vigência. [...]” (p.8) 
 “[...] A regulamentação da conduta humana por um ordenamento normativo processa-se por uma 
forma positiva e por uma forma negativa. A conduta humana é regulada positivamente por um 
ordenamento positivo, desde logo, quando a um indivíduo é prescrita a realização ou a omissão 
de um determinado ato. (Quando é prescrita a omissão de um ato, esse ato é proibido.) 4 Ser a 
conduta de um indivíduo prescrita por uma norma objetivamente válida é equivalente a ser esse 
indivíduo obrigado a essa conduta. [...]” p.11 
“[...] Enquanto um indivíduo pratica as ações para que uma norma lhe confere competência, ou 
se conduz tal como lhe é positivamente consentido por uma norma, aplica a norma. Competente 
por força de uma lei, que é uma norma geral, para decidir os casos concretos, o juiz com a sua 
decisão - que representa uma norma individual - aplica a lei a um caso concreto. Competente, por 
força da decisão judicial, para executar uma determinada pena, o órgão de execução aplica a 
norma individual da decisão judicial. Ao fazer-se uso da legítima defesa, aplica-se a norma que 
positivamente permite o emprego da força. Aplicação de uma norma, contudo, é ainda o juízo 
através do qual exprimimos que um indivíduo se conduz ou se não conduz tal como uma norma 
lho prescreve ou positivamente consente, ou que ele age ou não age de acordo com o poder ou 
competência que uma norma lhe atribui.” p.11 
 
 “Se o valor é constituído por uma norma objetivamente válida, o juízo que afirma que um quid 
real, uma conduta humana efetiva, é “boa”, isto é, valiosa, ou “má”, isto é, desvaliosa, exprime e 
traduz que ela é conforme a uma norma objetivamente válida, ou seja, que deve ser (tal como é), 
ou que contradiz uma norma objetivamente válida, quer dizer, não deve ser (tal como é). O valor, 
como dever-ser, coloca-se em face da realidade, como ser; valor e realidade - tal como o dever-
ser e o ser - pertencem a duas esferas diferentes.” p.13 
“Quando designamos os juízos de valor que exprimem um valor objetivo como objetivos, e os 
juízos de valor que exprimem um valor subjetivo como subjetivos, devemos notar que os 
predicados “objetivo” e “subjetivo” se referem aos valores expressos e não ao juízo como função 
do conhecimento. Como função do conhecimento tem um juízo de ser sempre objetivo, isto é, 
tem de formular-se independentemente do desejo e da vontade do sujeito judicante. [...]” p.15 
“A conduta de um indivíduo pode estar - mas não tem necessariamente de estar - em relação com 
um ou vários indivíduos, isto é, um indivíduo pode comportar-se de determinada maneira em face 
de outros indivíduos. Porém, uma pessoa pode ainda comportar-se de determinada maneira em 
face de outros objetos que não indivíduos humanos: em face dos animais, das plantas e dos objetos 
inanimados. [...]” p.16 
 “Inteiramente contraposto a um ordenamento social que estatui sanções (no sentido lato) é aquele 
que prescreve uma determinada conduta sem que ligue um prêmio ou um castigo à conduta 
oposta, ou seja, uma ordem social em que não tem aplicação o princípio retributivo (Vergeltung). 
Como exemplo de um tal ordenamento social refere-se geralmente a Moral que, precisamente por 
isso, se costuma distinguir do Direito, como ordem estatuidora de sanções. [...]” p.19 
“Para avaliar a possibilidade de uma ordem moral desprovida de sanções, tem de ter-se em conta 
que, quando uma ordem moral prescreve uma determinada conduta, prescreve ao mesmo tempo 
que a conduta de uma pessoa conforme à conduta prescrita seja aprovada pelas outras pessoas, 
mas que a conduta oposta seja desaprovada. Quem desaprova a conduta prescrita, ou aprova a 
conduta oposta, comporta-se imoralmente e deve ser, ele próprio, moralmente reprovado. [...]” 
p.19 
“[...] Sanções transcendentes são aquelas que, segundo a crença das pessoas submetidas ao 
ordenamento, provêm de uma instância supra-humana. Uma tal crença é um elemento específico 
da mentalidade primitiva. O primitivo interpreta os acontecimentosnaturais que imediatamente 
afetam os seus interesses segundo o princípio da retribuição: os que lhe são benéficos, interpreta-
os como recompensa, e os que lhe são desfavoráveis como castigo, pela observância ou não 
observância, respectivamente, da ordem social estabelecida. [...]” p.19-20 
 
“Completamente distintas das sanções transcendentes são aquelas que não só se realizam no 
aquém, dentro da sociedade, mas também são executadas por homens, membros da sociedade, e 
que, por isso, podem ser designadas como sanções socialmente imanentes. Tais sanções podem 
consistir na simples aprovação ou desaprovação, expressa de qualquer maneira, por parte dos 
nossos semelhantes, ou em atos específicos, determinados mais rigorosamente pelo ordenamento 
social, o qual também designa os indivíduos por quem esses atos são realizados ou postos num 
processo pelo mesmo ordenamento regulado. Nesta última hipótese podemos falar de sanções 
socialmente organizadas. [...]” p.20 
 “As normas de uma ordem jurídica regulam a conduta humana. E certo que, aparentemente, isto 
só se aplica às ordens sociais dos povos civilizados, pois nas sociedades primitivas também o 
comportamento dos animais, das plantas e mesmo das coisas mortas é regulado da mesma maneira 
que o dos homens. [...]” p.22 
 “Uma outra característica comum às ordens sociais a que chamamos Direito é que elas são ordens 
coativas, no sentido de que reagem contra as situações consideradas indesejáveis, por serem 
socialmente perniciosas - particularmente contra condutas humanas indesejáveis - com 8 um ato 
de coação, isto é, com um mal - como a privação da vida, da saúde, da liberdade, de bens 
econômicos e outros -, um mal que é aplicado ao destinatário mesmo contra sua vontade, se 
necessário empregando até a força física - coativamente, portanto. [...]” p.23 
 “O caráter social da Moral é por vezes posto em questão apontando-se que, além das normas 
morais que estatuem sobre a conduta de um homem em face de outro, há ainda normas morais 
que prescrevem uma conduta do homem em face de si mesmo, como a norma que proíbe o suicídio 
ou as normas que prescrevem a coragem ou a castidade. O certo, porém, é que também estas 
normas apenas surgem na consciência de homens que vivem em sociedade. A conduta do 
indivíduo que elas determinam apenas se refere imediatamente, na verdade, a este mesmo 
indivíduo; mediatamente, porém, refere-se aos outros membros da comunidade. [...]” p.42 
“A distinção entre a Moral e o Direito não pode referir-se à conduta a que obrigam os homens as 
normas de cada uma destas ordens sociais. O suicídio não pode ser apenas proibido pela Moral 
mas tem de o ser também pelo Direito; a coragem e a castidade não podem ser apenas deveres 
morais - são também deveres jurídicos. E também a concepção, freqüentemente seguida, de que 
o Direito prescreve uma conduta externa e a Moral uma conduta interna não é acertada. As normas 
das duas ordens determinam ambas as espécies de conduta. A virtude moral da coragem não 
consiste apenas no estado de alma de ausência de medo, mas também numa conduta exterior 
condicionada por aquele estado. E, quando uma ordem jurídica proíbe o homicídio, proíbe não 
 
apenas a produção da morte de um homem através da conduta exterior 9 de um outro homem, 
mas também uma conduta interna, ou seja, a intenção de produzir um tal resultado. [...]” p.43 
“[...] Tal como as normas do Direito, também as normas da Moral são criadas pelo costume ou 
por meio de uma elaboração consciente (v. g. por parte de um profeta ou do fundador de uma 
religião, como Jesus). Neste sentido a Moral é, como o Direito, positiva, e só uma Moral positiva 
tem interesse para uma Ética científica, tal como apenas o Direito positivo interessa a uma teoria 
científica do Direito. É verdade que uma ordem moral não prevê quaisquer órgãos centrais, isto 
é, órgãos funcionando segundo o princípio da divisão do trabalho, para a aplicação das suas 
normas. Esta aplicação consiste na apreciação moral da conduta de outrem regulada por aquela 
ordem. Mas também uma ordem jurídica primitiva é completamente descentralizada e não pode, 
portanto, distinguir-se, sob este aspecto, de uma ordem moral. [...]” p.44 
“Quando se entende a questão das relações entre o Direito e a Moral como uma questão acerca 
do conteúdo do Direito e não como uma questão acerca da sua forma, quando se afirma que o 
Direito por sua própria essência tem um conteúdo moral ou constitui um valor moral, com isso 
afirma-se que o Direito vale no domínio da Moral, que o Direito é uma parte constitutiva da ordem 
moral, que o Direito é moral e, portanto, é por essência justo. Na medida em que uma tal tese vise 
uma justificação do Direito - e é este o seu sentido próprio -,tem de pressupor que apenas uma 
Moral que é a única válida, ou seja, uma Moral absoluta, fornece um valor moral absoluto e que 
só as normas que correspondam a esta Moral absoluta e, portanto, constituam o valor moral 
absoluto, podem ser consideradas “Direito”. Quer dizer: parte-se de uma definição do Direito que 
o determina como parte da Moral, que identifica Direito e Justiça.” p.45 
 “Se supusermos que o Direito é, por sua essência, moral (tem caráter moral), então não faz 
qualquer sentido a exigência – feita sob o pressuposto da existência de um valor moral absoluto - 
de que o Direito deve ser moral. [...]” p.47 
“[...] Quando uma teoria do Direito positivo se propõe distinguir Direito e Moral em geral e 
Direito e Justiça em particular, para os não confundir entre si, ela volta-se contra a concepção 
tradicional, tida como indiscutível pela maioria dos juristas, que pressupõe que apenas existe uma 
única Moral válida - que é, portanto, absoluta - da qual resulta uma Justiça absoluta. A exigência 
de uma separação entre Direito e Moral, Direito e Justiça, significa que a validade de uma ordem 
jurídica positiva é independente desta Moral absoluta, única válida, da Moral por excelência, de 
a Moral. [...]” p.47 
“Se a ordem moral não prescreve a obediência à ordem jurídica em todas as circunstâncias e, 
portanto, existe a possibilidade de uma contradição entre a Moral e a ordem jurídica, então a 
 
exigência de separar o Direito da Moral e a ciência jurídica da Ética significa que a validade das 
normas jurídicas positivas não depende do fato de corresponderem à ordem moral, que, do ponto 
de vista de um conhecimento dirigido ao Direito positivo, uma norma jurídica pode ser 
considerada como válida ainda que contrarie a ordem moral.” p.48 
 “Como exemplo particularmente característico da sistemática da moderna ciência do Direito, 
referiremos a fundamental distinção entre Direito público e privado que já acima foi várias vezes 
mencionada. Como se sabe, até hoje se não conseguiu alcançar uma determinação completamente 
satisfatória desta distinção. Segundo a concepção dominante, trata-se de uma repartição das 
relações jurídicas. Assim, o Direito privado representa uma relação entre sujeitos em posição de 
igualdade - sujeitos que têm juridicamente o mesmo valor - e o Direito público uma relação entre 
um sujeito supra-ordenado e um sujeito subordinado - entre dois sujeitos, portanto, dos quais um 
tem, em face do outro, um valor jurídico superior. [...]” p.196 
“[...] a Teoria Pura do Direito relativiza a oposição, tornada absoluta pela ciência jurídica 
tradicional, entre Direito privado e público, transforma-a de uma oposição extra-sistemática, quer 
dizer, de uma distinção entre Direito e não-Direito, entre Direito e Estado, numa distinção intra-
sistemática; e precisamente porque, desse modo, também decompõe e destrói a ideologia que está 
ligada à absolutização da oposição em causa, comprova o seu caráter de ciência. [...]” p.197 
“O problema do Estado como uma pessoa jurídica, isto é, como sujeito agente e sujeito de deveres 
e direitos é, no essencial, o mesmo problema que se põe para a corporação comopessoa jurídica. 
Também o Estado é uma corporação, isto é, uma comunidade que é constituída por uma ordem 
normativa que institui órgãos funcionando segundo o princípio da divisão do trabalho, órgãos 
esses que são providos na sua função mediata ou imediatamente.[...]” p.203

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