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AULA 6 ESTRATÉGIA DE NEGOCIAÇÃO E VENDAS Professor Sérgio Czajkowski Júnior 2 INTRODUÇÃO Estratégias de vendas na sociedade da informação – aspectos práticos Nesta aula, enfatizaremos aspectos mais pragmáticos vinculados às práticas de vendas que vêm sendo implementadas, por parte das organizações, na atual sociedade da informação, bem como conheceremos mais detalhes sobre temáticas vinculadas ao comportamento do consumidor e os seus respectivos impactos nas operações promovidas tanto no Ponto de Vendas (PDV)1 tradicional, constituído pelas lojas físicas, como também no ambiente digital/virtual (por meio do emprego da estrutura conferida pela rede mundial de computadores – a internet). Como exemplo, podemos citar que, na atual conjuntura, fortemente marcada por crescentes níveis de competição entre as organizações (Hitt; Duane; Hoskisson, 2011), é cada vez mais relevante que as estratégias de vendas praticadas pelos gestores estejam pautadas em saberes oriundos de disciplinas como a Administração Estratégica, visto que o mercado, após Revolução Digital, não mais comporta soluções amadoras – pautadas apenas pelo senso comum – e desprovidas de um maior embasamento técnico-científico e mercadológico. Para que tenhamos uma noção mais clara do processo que está em voga, nos dias de hoje, basta nos recordarmos das palavras de Peter Drucker (2002, p. 21): da mesma forma que, na geografia mental, advinda com a invenção da ferrovia (oriunda da Primeira Revolução Industrial), a humanidade foi capaz de dominar a distância, na atual conjuntura, moldada por tecnologias digitais e vinculadas, por exemplo, ao comércio eletrônico, os limites físicos foram sendo paulatinamente eliminados, fazendo com que, no mundo contemporâneo, exista uma economia interligada por completo. Isso resultou em apenas um único lócus destinado às práticas comerciais/financeiras (Castells, 1999, p. 402). Em outras palavras, diante dos atuais desdobramentos da Revolução Digital, a concorrência deixa de ser local, até mesmo porque não mais reconhece as antigas fronteiras geográficas. Dessa forma, as barreiras e os demais elementos limitadores de outrora foram dando lugar a um mercado cada mais vez ampliado e interconectado, visto que a conectividade, oriunda da Revolução 1 O PDV é o local (físico ou virtual) em que são realizadas as transações comerciais entre um cliente e uma organização. 3 Digital, muito embora “não possa mais ser considerada novidade, vem mudando muitas facetas do mercado e não mostra sinais de desaceleração.” (Setiawan; Kartajaya; Kotler, 2017, p. 25). Além disso, ao dedicarmos uma atenção ao processo de implementação desses princípios no dia a dia das empresas, observamos que um equívoco que ainda preexiste na mente de muitos gestores locais – e que precisa ser o quanto antes dissipado – é o de que o grande objetivo de uma organização na atual sociedade da informação é unicamente o lucro (compreendido como superávit financeiro). Na verdade, o lucro deve ser encarado apenas como a consequência mais perceptível de uma estratégia corretamente pautada pelas aspirações e pelos demais desejos dos nossos clientes, consumidores e colabores (cuja cooperação é imprescindível para que qualquer ação de sucesso seja levada em conta). Dessa forma, e a exemplo daquilo que será abordado com mais detalhes posteriormente, constatamos o advento de um novo tipo de consumidor, ultraconectado e dotado de níveis crescentes de expectativa e de exigência, e que, por conseguinte, demanda soluções cada vez mais personalizadas que precisam se concretizar em um tempo cada vez mais exíguo (Mckinsey, 2019). Portanto, se, em um passado não muito distante, os consumidores ainda se contentavam com serviços inábeis em lhes satisfazer por completo e/ou prestados por empresas incapazes de primar por valores como a ética e a responsabilidade social, observamos, hoje, que a existência de estratégias que não estejam devidamente pautadas em elementos como presteza e transparência estão condenadas ao malogro (Setiawan; Kartajaya; Kotler, 2017). Isso porque as pessoas, de modo geral, acessam a rede mundial de computadores almejando que as soluções oferecidas aos seus desejos e/ou necessidades sejam rápidas e assertivas (Palfrey; Gasser, 2011). Ou seja, em um mundo cada vez mais interconectado e no qual as próprias noções de tempo e de espaço ganham novos contornos (Castells, 1999, p. 403), nada mais escapa dos olhos e dos ouvidos dos e-consumidores (Setiawan; Kartajaya; Kotler, 2017), os quais se tornaram muito mais interconectados e demandantes. Em outras palavras, ao estudar este assunto, tenha em mente que uma estratégia de vendas, além de um estudo em torno das formas de apresentação de um determinado produto, seu preço e demais condições de pagamento, pressupõem um aprofundamento acerca das percepções dos (potenciais) 4 clientes. Esse processo ocorre porque, por mais que tenhamos à nossa disposição um conjunto crescente de dados e demais informações acerca dos padrões de compra/consumo dos nossos (potenciais) clientes, as organizações (tal como ficará mais claro no terceiro tema desta aula) ainda precisam enxergar seus targets com base em um prisma que valorize cada vez mais o estilo de vida (lifestyle) em detrimento de questões demográficas como sexo (gênero), renda mensal ou anual, grau de escolaridade, profissão/ocupação, estado civil, quantidade de filhos, entre outras, tal como acontecia no passado. Em paralelo, e seguindo a linha de raciocínio que prima por uma análise cada vez mais criteriosa dos clientes, autores como Philip Kotler e Gary Armstrong (2015) são partidários da tese de que de nada adianta uma empresa desenvolver planejamento estratégico bastante denso e pautado em dados coletados de pesquisas de mercado caso ela não dedique uma atenção para o momento da verdade, leia-se a: hora da compra2 (tal como será abordado no segundo tema desta aula). Em outras palavras, uma estratégia mercadológica (a qual também contempla ações de vendas) por si só não se sustenta caso não esteja devidamente amparada por uma visão mais aprimorada do processo de compra posto em prática pelos clientes. Ainda, cabe reforçar que este estudo também contempla a necessidade de os profissionais que atuam com vendas vislumbrarem o processo de integração entre os ambientes tradicional e digital como um desafio não só inevitável, mas como uma postura que deve ser sabiamente inserida nas ações estratégias das organizações, por meio do emprego de práticas de omnichannel, as quais serão esmiuçadas posteriormente. Por fim, diante do exposto nesta pequena introdução e a fim de contemplar os objetivos inicialmente propostos, esta aula encontra-se subdividida em cinco temas, intitulados: • Estratégias de vendas e comportamento de compra na sociedade da informação – quem é o nosso novo consumidor? • Etapas do processo de compra (produto x solução): buyology aplicado às estratégias de vendas. 2 Philip Kotler e Gary Armstrong (2015) justificam o seu ponto de vista com base na constatação de que os objetivos mercadológicos, originalmente dispostos no planejamento estratégico de uma organização, literalmente caem por terra diante da existência de um site confuso e/ou de um aplicativo que apresenta uma baixa usabilidade – fatores que se tornam ainda mais graves em um contexto marcado por clientes dotados de níveis crescentes de ansiedade e desprovidos de maiores taxas de resiliência (diante de qualquer tipo de frustração). 5 • Estratégias de vendas e processo de segmentação: dos modelos demográficos para as plataformas focadas no lifestyle. • Vendas on-line x vendas off-line. • Estratégias de venda multicanal (omnichannel): o case das Casas Bahia. TEMA 1 – ESTRATÉGIAS DE VENDAS E COMPORTAMENTO DE COMPRA NA SOCIEDADEDA INFORMAÇÃO: COMO DESCOBRIR O PERFIL DO NOSSO NOVO CONSUMIDOR? Quando tentamos construir uma imagem um pouco mais assertiva e coerente em torno do perfil de compra do nosso “novo consumidor”, advindo do contexto do pós-Quarta Revolução Industrial3 e que, de alguma forma, precisa ser impactado pelas nossas estratégias de vendas, em primeiro lugar, e seguindo a orientação do professor Michael Solomon (2016), devemos ter ciência de que o mercado, hoje em dia, se encontra segmentado em uma quantidade crescente de grupos de consumidores, cada qual contando com características e peculiaridades cada vez mais específicas e que nem sempre podem ser facilmente mapeadas por metodologias mais tradicionais. Ou seja, na contemporaneidade, o próprio processo de pesquisa precisa ser repensado com base em características mais relevantes da atual sociedade da informação. Em paralelo, e diante da existência de uma conjuntura fortemente marcada por uma aceleração do tempo, acrescida pelo surgimento cada vez mais intenso de novas tecnologias, “as empresas têm de entender que nenhuma vantagem competitiva é permanente” (Hitt; Duane; Hoskisson, 2001, p. 4); pois em um contexto cada vez mais dinâmico e inserido em uma economia globalizada, “os concorrentes às vezes imitam as ações competitivas bem-sucedidas de uma empresa em apenas alguns dias” (Hitt; Duane; Hoskisson, 2001, p. 9), de tal sorte que a preocupação com os clientes precisa ser constante, perene e ininterrupta. Diante dessas constatações, autores como Michael Solomon (2016) acreditam que os departamento de Business Intelligence (BI – Inteligência de 3 Ao nos referimos à Quarta Revolução Industrial, estamos mencionado o que Rodrigo Nejm e José Carlos Ribeiro (2013, p. 302) acreditam sobre os ambientes digitais, que “têm se apresentado como arenas e territórios simbólicos propícios ao desenvolvimento e à exploração de práticas e processos comunicativos particulares, que ampliam o leque de experiências existenciais e sociais dos indivíduos”. Dessa forma, a exemplo do que acontece nos estudos focados no varejo mais tradicional (ainda vinculado prioritariamente ao PDV físico), as compras realizadas no universo virtual também são dotadas de questões simbólicas/subjetivas, as quais necessitam de um olhar mais apurado por parte dos gestores que atuam com estratégias de vendas. 6 Mercado/Negócios) das organizações precisam investir pesadamente em recursos como o big data, a Inteligência Artificial (IA) e o netnomarketing (emprego de pesquisas etnográficas e comportamentais em profundidade, no meio virtual/internet), pois, por mais contraditório que possa parecer: em nenhum outro momento da história tivemos tantas informações em torno dos padrões de consumo das pessoas, ao mesmo tempo que nunca foi tão difícil se estabelecer com precisão quais são as reais expectativas dos nossos (potenciais) clientes. Para que possamos comprovar tal tese, podemos mencionar que Solomon (2016) menciona com dois exemplos práticos bastante simples e didáticos, os quais ilustram tal preocupação (aliada à necessidade de rompermos com antigos e desgastados estereótipos que constituímos em torno de certos padrões de consumo e que podem resultar em erros estratégicos bem graves por parte das organizações contemporâneas). A título de ilustração, Solomon (2016) salienta que: pesquisas de mercado realizadas por empresas de doces e confeitos sediadas nos Estados Unidos, nos anos 2000, demonstraram que: “diferentemente dos americanos, os europeus preferem chocolate amargo ao chocolate ao leite, que eles imaginam ser um alimento para criança”, ou seja, com exceção da marca Milka (já consolidada no mercado europeu), outros produtos que faziam sucesso com os jovens norte-americanos tiveram muita dificuldade em se consolidar na Europa. Outra pesquisa em torno dos padrões alimentares de diferentes povos também relevou, por exemplo, que, enquanto os norte- americanos preferem bolos com pedaços de chocolate, os australianos os preferem com passas; e os moradores de Hong Kong, com pedaços de coco. Tais pesquisas permitiram que as empresas norte-americanas promovessem uma tropicalização de seus produtos, o que resultou em um incremento de suas margens de lucro4. Pinho, Silva e Meneses (2019, p. 271), ao ressaltar a importância de os gestores compreenderem com a maior precisão possível a percepção que os seus clientes têm em torno dos seus produtos, utiliza os consumidores brasileiros e nipônicos como exemplos. No Japão, a título de ilustração, a marca Diet Coke foi alterada para Coke Light “face à tendência claramente mais reduzida naquele país 4 Nesse caso, a indústria que contratou a consultoria promotora do estudo em torno das preferências alimentares dos norte-americanos, dos australianos e dos moradores de Hong Kong, foi capaz de criar sabores específicos para cada uma das regiões, o que não só aumentou o grau de satisfação dos seus clientes, como também resultou em uma maior lucratividade. Em paralelo, também aconteceu uma personalização das embalagens, de tal sorte que os produtos comercializados em Hong Kong fossem anunciados em inglês e em mandarim. 7 para problemas de obesidade”, o mesmo acontecendo no Brasil. Após uma pesquisa realizada nos anos 2000, concluiu-se que as brasileiras, em especial, não tinham muito apreço por produtos rotulados como dietéticos (os quais eram percebidos como sendo mais indicados para pessoas com problemas metabólicos ou que já estivessem acima do peso ideal). Nesse caso em específico, não foi necessário acontecer uma mudança sensível na constituição/composição de um produto que fará parte de uma estratégia global, a qual se limitou a apenas um pequeno detalhe capaz de modificar a percepção dos consumidores. Pinho, Silva e Meneses (2019) também defendem que, até mesmo quando optamos pela construção de uma estratégia unificada para os países que adotam a língua portuguesa, é muito importante que todo o processo sempre se paute em pesquisas de mercado. Os autores reforçam que mesmo o idioma português sendo a terceira língua mais falada no mundo ocidental e a primeira no Hemisfério Sul, existem diferenças regionais e culturais que são determinantes para o sucesso de uma estratégia. Os portugueses, por exemplo, evitam ao máximo o emprego de palavras em inglês e outros estrangeirismos, porquanto defendem que tais expressões, sempre que possível, devem ser traduzidas e/ou adaptadas para a língua portuguesa, não sendo à toa que adotam termos como sítio (em vez de site) e correio eletrônico (em vez de e-mail), palavras que soam estranhas para os brasileiros. Dessa forma, caso uma empresa brasileira deseje impactar consumidores lusos, o mais aconselhado é que toda a comunicação presente em suas embalagens, no seu site ou no seu aplicativo seja feita apenas em português. Figura 1 – Pesquisa de mercado Créditos: solarseven/Shutterstock. https://www.shutterstock.com/pt/g/solarseven 8 TEMA 2 – ETAPAS DO PROCESSO DE COMPRA (PRODUTO X SOLUÇÃO): NEURO-BUYOLOGY APLICADO ÀS ESTRATÉGIAS DE VENDAS Quando estudamos o processo de compra dos nossos (potenciais) clientes, seja no meio virtual/digital, seja nos meios tradicionais (PDV físico), devemos ter ciência de que tal ação não é algo que pode ser compreendido sem que, em um primeiro momento, rompamos com uma série de premissas que ainda se pautam na crença de que os seres humanos seriam racionais e, por conseguinte, plenamente conscientes dos motivos que os fazem adquirir algo. Segundo Martin Lindstrom (2009), autor do livro Buyology e um dos primeiros autores a defender a relevância de estudos que envolvam a neurociência e o neuromarketing, as nossas compras são motivadas, em boa parte dos casos, por pensamentos, sentimentos e desejos subconscientes, os quais não podem ser controlados pelas pessoas(muito menos mapeados por completo pelos cientistas e demais pesquisadores por meio das metodologias existentes) e os quais são os grandes responsáveis pelas decisões de compra, pois funcionam tal como se fossem gatilhos em nosso cérebro e nos impulsionam a agir (em muitos casos, sem a existência de um planejamento ou de justificativas plausíveis). Lindstrom (2009, p. 11), logo no início do seu livro, comenta que, nos anos 1950, quando as empresas ainda dispunham basicamente de três meios de comunicação de massa para fazer com que uma mensagem chegasse até os seus clientes: o rádio, as revistas e os jornais, era muito mais fácil fazer com que uma dada informação não só fosse absorvida, como também memorizada de forma perene pelas pessoas. Hoje em dia, contudo, graças à evolução das Novas Tecnologias Digitais da Comunicação e da Informação (NTDIC)5, em conjunto com o incrementos nos níveis de estresse (fruto, em grande parte, da aceleração da vida moderna), somos literalmente “bombardeados por dúzias, se não centenas, de mensagens de publicitários e anunciantes. Marcas e informações sobre marcas chegam até nós constantemente, em alta velocidade e de todas as direções.” (Lindstrom, 2009, p. 14). Ou seja, com o advento e a subsequente consolidação do mercado digital, os gestores que desenvolvem estratégias de vendas precisam atualizar os seus 5 As NTDIC correspondem às novas plataformas de interação que surgiram com o advento da Quarta Revolução Industrial, também conhecida como Revolução Digital. 9 processos de coleta e o emprego das informações, oriundas das pesquisas de mercado. Se isso não acontece, corre-se o risco de, mesmo dispendendo um volume imenso de verbas em prol do envio de mensagens para os mais diversos targets, os gestores perceberem que, em vez de essas mensagem serem canalizadas para a memória dos seus (potenciais) clientes e consumidores, acabarem parando no “depósito de lixo industrial do nosso cérebro, cheio de anúncios de fraldas esquecidos na mesma hora e de outras situações de consumo igualmente pouco memoráveis.” (Lindstrom, 2009, p. 14). Em outras palavras, segundo Lindstrom (2009), ou uma peça é realmente impactante ou estará condenada ao ostracismo. Para que tenhamos uma percepção mais aprimorada do processo de compra, devemos nos pautar no entendimento de autores como Samara e Morsch (2005), segundo os quais todos os consumidores buscam, de alguma forma, a satisfação de suas necessidades ou de seus desejos. Embora adquiram produtos, o que os clientes realmente desejam são os benefícios do produto, benefícios que sejam capazes de gerar soluções para as demandas existentes. Ou seja, quando pensamos nas propostos aventadas por Lindstrom (2009) e que podem ser perfeitamente transpostas para as estratégias de vendas, devemos ter ciência de que, para os nossos clientes, um produto simboliza simplesmente a possibilidade de um desejo (em muitos casos inconsciente) ser satisfeito. Dessa forma, em vez de as empresas despejarem um montante considerável de recursos na mera divulgação dos atributos dos seus produtos, devem canalizar esses mesmos investimentos para as soluções oferecidas (tal como é feito por aplicativos de grande sucesso como o Airbnb, que revolucionou o mercado de hospedagem devido ao oferecimento de uma gama de benéficos capazes de resultar na solução demandada pelos seus clientes). Figura 2 – Estratégias do Airbnb Créditos: mirtmirt/Shutterstock. https://www.shutterstock.com/pt/g/d8nn 10 Cientes desse tipo de informação, as organizações que atuam com vendas devem buscar atingir os seus propósitos e objetivos (inclusive os financeiros), por meio da sua capacidade em satisfazer, de forma adequada, as principais expectativas dos seus (potenciais) clientes. Ou seja, tal como mencionamos anteriormente, para que uma dada empresa alcance o sucesso desejado, é importante que ela entregue, no mínimo, aquilo que é esperado pelos seus clientes, atingindo, assim, a satisfação deles. Contudo, se uma organização se mostra incapaz de compreender as percepções dos seus clientes, não há razão lógica para que eles continuam a comprar produtos dela, ainda mais diante de um mercado como o atual, caracterizado por um número crescente de concorrentes. Ainda segundo os princípios destacados por Lindstrom (2009), salientamos que o processo de decisão de compra, a exemplo do que é apresentado no fluxograma a seguir, é subdividido em cinco etapas. • Reconhecimento do problema impulsionador da compra – qual é a demanda existente? • Busca de informações de como tal problema pode ser devidamente sanado6. • Avaliação das alternativas existentes – quais empresas, produtos, marcas etc. são capazes de satisfazer a demanda, por hora existente, pelas condições concebidas como justas (relação entre custo e benefício). • Decisão de Compra – a consolidação da compra em si (a chamada hora da verdade por muitos autores). • Comportamento pós-compra – avaliação do quanto a opção escolhida foi a melhor diante das opções existentes. Figura 3 – Cinco etapas da decisão de compra 6 Nesse ponto, as empresas que atuam em mercados já consolidados devem tomar um cuidado extra devido à quantidade crescente de informações disponíveis no meio virtual (internet). 11 Por fim, quando transpomos esse fluxograma para as estratégias adotadas pelas empresas, é importante sempre frisarmos que os nossos clientes não decidem comprar um determinado produto – ainda mais se custa mais caro – apenas e tão somente por um impulso qualquer. Tal como Solomon (2016, p. 57) salienta, nenhum consumidor acordou “subitamente e desejou um televisor novo. Ele passou por várias etapas entre o momento em que sentiu a necessidade de um televisor novo e quando realmente levou um para casa.” Ou seja, mesmo quando estamos diante de uma compra por impulso (ou de baixo envolvimento), ela é fruto de um processo prévio, o qual necessita ser devidamente estudado pelos gestores. TEMA 3 – ESTRATÉGIAS DE VENDAS E PROCESSO DE SEGMENTAÇÃO Ao estudarmos o processo de comercialização de uma determinada mercadoria, também precisamos, tal como comentamos anteriormente, nos amparar em ciências como a Psicologia, a Sociologia e a Antropologia, que dão base para a disciplina de comportamento do consumidor. Isso objetiva que sejamos capazes de compreender de forma mais precisa, embasada e assertiva como se dá o processo de compra e de venda, o qual se mostra intimamente vinculado às percepções que os indivíduos desenvolvem ao longo de suas vidas, seja no ambiente virtual (digital) ou não. Diante dessa constatação, também é importante frisarmos que, hoje em dia, o mais comum é que as empresas trabalhem com grupos cada vez mais segmentados de clientes, justamente para que possam executar ações mais pontuais e com menor dispêndio de recursos – até mesmo porque, ao se trabalhar com grupos mais homogêneos, é possível diminuir os possíveis ruídos, bem como maximizar as chances de êxito. Créditos: Ivanko80/Shutterstock. https://www.shutterstock.com/pt/g/Ivanko80 12 A expressão “segmentação de mercado” consiste no “processo de dividir mercados em grupos de consumidores potenciais com necessidades e/ou características similares e que provavelmente terão comportamentos de compra semelhantes.” (Weinstein, 1995, p. 18). Tal conceito, que era aceito por unanimidade até os anos 1980 e 1990, passou a ser revisto a partir do final da década de 1990, pois, muito embora a leitura promovida por Weinstein não esteja, por completo, errada, o autor parte da premissa de que boa parte os membros de um mesmo grupo apresenta a mesma posição/situação em termos de demanda (satisfeita, insatisfeita ou reprimida), ou seja, acredita-se que pessoas dotadas das mesmas características socioculturais buscam os mesmos benefíciosnos processos de compra e/ou possuem a mesma predisposição para adquirir um determinado produto, o que nem sempre é válido. Hoje em dia, a leitura mais aceita por parte dos autores é a de que, quando uma organização utiliza estratégias de segmentação de mercado, “ela direciona seu produto, serviço ou ideia apenas para grupos específicos de consumidores, e não a todos – mesmo que isso implique não atrair para o produto outros consumidores não pertencentes ao mercado-alvo.” (Solomon, 2016, p. 6). Para tanto, a prioridade deixa de ser o fato de os consumidores já serem, ou não, possuidores de certos bens e dá lugar a uma leitura que valoriza os seus traços socioculturais, dentro daquilo que os autores denominam de Psicografia. A Psicografia, segundo a leitura de Solomon (2016, p. 488), envolve: o “uso de fatores psicológicos, sociológicos e antropológicos para determinar como o mercado é segmentado de acordo com a propensão dos respectivos grupos – e seus motivos – para tomar determinada decisão sobre um produto, uma pessoa ou uma ideologia ou, em outros contextos, manter uma atitude ou usar uma mídia.” Dessa forma, ao adotarmos modelos baseados na Psicografia, devemos ter consciência de que a prioridade, nesses casos, volta-se à compreensão do chamado lifestyle (estilo de vida), o qual “vai além da demografia para ajudar as empresas a compreenderem e alcançarem diferentes segmentos de consumidores.” (Solomon, 2016, p. 488). Ou seja, se no passado as organizações, em seus planejamentos estratégicos, priorizavam as informações demográficas (diante da prevalência de variáveis como idade, sexo, renda, classe social, estado civil, ocupação, etnia, quantidade de filhos, entre outras), hoje em dia ocorre uma maior valorização dos 13 traços socioculturais e da personalidade (independente, impulsivo, iniciador, conservador, econômico, moderado etc.) dos (potenciais) consumidores. Por fim, é importante frisarmos que as pesquisas psicográficas mais modernas, e que conferem uma leitura mais assertiva dos comportamentos de compra, procuram extrapolar os critérios meramente demográficos e agrupar os consumidores “de acordo com uma associação entre três categorias de variáveis – atividades, interesses e opiniões – conhecidas como AIOs.” (Solomon, 2016, p. 490), as quais origem às chamadas tribos urbanas. Figura 5 – Tribos urbanas Créditos: Macrovector/Shutterstock. Em 1988, Michel Maffesoli escreveu um artigo denominado “Le temps des tribus: le déclin de l'individualisme dans les sociétés postmodernes”, no qual defende que as tribos urbanas seriam constituídas por indivíduos que teriam uma série de comportamentos em comum, principalmente no que diz respeito à questão estética (mas que não obrigatoriamente partilhariam dos mesmos valores ou ideologias). Além do mais, hoje em dia, graças ao advento da pós-modernidade, é muito comum que um indivíduo pertença a mais de uma tribo urbana simultaneamente, ou seja, o mesmo indivíduo pode ser vegano e praticante de CrossFit, por exemplo. 14 TEMA 4 – VENDAS ON-LINE VERSUS VENDAS OFF-LINE Com o avanço da internet, até mesmo as empresas mais tradicionais e já devidamente consolidadas no mercado nacional e internacional precisaram se adaptar, em um curto espaço de tempo, às novas tendências observadas na conjuntura pós-Revolução Digital. Isso porque, hoje em dia, a prática de negócios digitais (on-line) deixou de ser apenas uma tendência e se tornou uma realidade para a maior parte das organizações de sucesso, até mesmo porque as NTDIC favorecem a promoção de transações financeiras, bem como facilitam a venda de bens e serviços pela internet (Kotler; Keller, 2012, p. 470) – fatores que trazem benefícios tanto para os clientes quanto para os gestores que atuam com estratégias de vendas. No caso mais específico do e-commerce, é muito importante que o incremento substancial de transações on-line não resulte em uma promoção de soluções que se afastem por completo das práticas já consolidadas no varejo tradicional. Nesse sentido, ao promoverem soluções aos seus clientes, os profissionais de vendas podem operar por meio de três modalidades de canais de distribuição: • tradicional (pelo PDV físico); • on-line (pelo e-commerce, por exemplo, que pode se dar nos sites ou aplicativos); • híbrida (que mescla características das duas primeiras). Diante dessas três opções, é de suma importância lembrarmos que os gestores que atuam em organizações já consolidadas no mercado tradicional e desejam trabalhar com e-commerce precisam, contudo, estudar com muito cuidado o mercado e a forma de se obter a melhor trade-off possível, diante dos diversos canais existentes. Isso se deve porque, em países como o Brasil, o que se observou, nos últimos tempos, foi um otimismo um tanto exacerbado por parte dos gestores locais, os quais viram nas plataformas digitais a solução para todos os seus problemas. A exemplo do que podemos observar com base no gráfico e na tabela a seguir, constituídos por dados oriundos de pesquisas feitas, nos últimos anos, pelo instituto Nielsen/Ebit (2019), mesmo tendo ocorrido um crescimento bastante robusto do comercio on-line do Brasil nos últimos anos (o qual continuará em ascensão para os próximos anos), as compras on-line não representam nem 5% 15 (4,8% no ano de 2018) do total de vendas feitas no varejo. Dado não muito diferente apresentado pelo Instituto Euromonitor (2017 citado por Mckinsey, 2019, p. 59), que assevera que tal percentual oscila na base dos 6%, ao passo que outras economias em desenvolvimento, como a China e a Coréia do Sul, esse número figura na casa dos 20% e 19%, respectivamente. Ou seja, mesmo com um incremento da ordem de 13% ao ano, entre 2013 e 2018 (Mckinsey, 2019, p. 58), fazendo com que mercado saltasse de 28,8 milhões para 53,2 milhões de reais em um período de cinco anos (Nielsen Company, 2019), aproximadamente 95% dos processos de compra e venda, no Brasil, continuam a se processar no comércio tradicional ou nos modelos híbridos, a exemplo do que podemos observar a seguir. Figura 6 – Vendas no varejo e no e-commerce no Brasil Fonte: Nielsen Company, 2019. Observamos que o crescimento do comercio on-line, verificado nos últimos anos, mesmo diante das suas inegáveis vantagens, também gerou um novo desafio aos gestores: o de como “manter preços competitivos à concorrência na internet e, ao mesmo tempo, equalizados com os próprios preços no varejo tradicional.” (Mattar, 2012, p. 574), sob penas de acontecer uma canibalização entre os canais. Além do mais, mesmo diante das inegáveis vantagens, o comercio eletrônico ainda enfrenta desafios em solo brasileiro, visto que “o bem ou serviço virtual ideal é aquele que é produzido instantaneamente e sob medida, em resposta à demanda do cliente.” (Mattar, 2011, p. 594). Se o cliente deseja, por exemplo, comprar on-line, mas retirar na loja física, ou pesquisar na web e 16 posteriormente comprar no PDV tradicional, as empresas varejistas precisam encontrar forma de atender a esses interesses. Dessa forma, é imperativo que as empresas que desejam atuar no meio virtual conheçam em detalhes os hábitos de compra do seu público-alvo, de modo a garantir que a comunicação implementada no meio virtual não se choque com a existente nos canais mais tradicionais, muito menos acabe se mostrando inócua diante das estratégias dos concorrentes. Em paralelo, ao voltarmos o nosso olhar para as transações comerciais postas em prática pelas organizações, há a necessidade de as pautarmos em uma leitura assertiva do mercado, a qual não feche os olhos para as transformações que estão acontecendo a todo momento, mas que não queira romper por completo com os processos já consolidados no NTDIC físico. Em outras palavras, devido à necessidade de incorporaras novas tecnologias, sem se abandonar, por completo, os formatos mais tradicionais, muitos gestores já perceberam as vantagens dos modelos híbridos, que primam pela convergência, a exemplo do omnichannel, tema este que será apresentado no tema a seguir. TEMA 5 – ESTRATÉGIAS DE VENDA MULTICANAL – OMNICHANNEL: O CASE DAS CASAS BAHIA Em resposta às limitações em termos de expansão do comércio eletrônico em países como o Brasil, como também como forma de se atender às demandas de muitos clientes locais, os quais ainda não se sentem plenamente seguros em realizar compras que se processam integralmente no universo digital, muitas empresas locais iniciaram um processo de reintermediação ou integração dos seus canais de distribuição, passando a adotar um modelo misto de varejo real e virtual, capaz de agregar valor aos seus processos de comercialização (Kotler; Keller, 2012, p. 11). Como forma de se tentar superar os desafios por hora existentes, muitas organizações têm fomentado políticas denominadas de omnichannel e destinadas a conferir uma maior convergência entre as ações desenvolvidas pelas lojas físicas, virtuais, aplicativos de smartphone, redes sociais virtuais e demais ferramentais digitais (Mattar, 2012, p. 529), em prol de uma otimização dos canais de distribuição (físico e virtual). Isso porque, na prática, percebeu-se que a 17 inexistência de uma política clara de integração entre os canais pode gerar, em paralelo, uma reação de insatisfação por parte de muitos consumidores. Ao adotar uma postura omnichannel, as organizações permitem que os seus (potenciais) clientes tenham acesso às mesmas ofertas e produtos por meio dos meios on-line e off-line, os quais lhes conferem as mesmas facilidades (modalidades de parcelamento, por exemplo) e benefícios, como o preço final e a possibilidade de garantia estendida de uma dada mercadoria. Dessa forma, “com múltiplos pontos de contato entre empresa e consumidor e arranjos diversos na jornada de compra” (Pena, 2019, p. 27), os usuários passam a ter acesso 24 horas por dia, sete dias por semana, aos serviços do seu interesse, fazendo com que as chances de se gerar conversões ou de se concretizar novos negócios se ampliem. É também importante destacarmos que a adoção de um sistema de omnichannel possibilita, pelo menos em tese, uma sensível redução na competição entre os canais, permitindo, por exemplo, que um produto adquirido on-line venha a ser trocado, ou ainda substituído, em uma loja física, o que resulta em uma maior segurança aos (potenciais) clientes, ampliando, pelo menos em tese, as margens de conversão e subsequente fidelização. Nas palavras de Chianello (2019), o investimento na “integração multiplataforma é uma chance de se criar formas práticas para se relacionar e reter os consumidores, e também de aproveitar todos os canais e oportunidades para conhecê-los melhor.” Ou seja, as políticas de omnichannel também são capazes de aprimorar as informações que as organizações possuem sobre seus clientes, o que pode resultar na promoção de estratégias dotadas de maior efetividade. 18 Figura 7 – Omnichannel Créditos: HstrongART/Shutterstock. O desafio enfrentado está, em boa parte dos casos, na necessidade de serem promovidas alterações na cultura gerencial das empresas locais mais tradicionais e que ainda se ressentem em migrar com mais intensidade para as plataformas digitais. No caso do Brasil, um caso de grande sucesso, no passado, e que ilustra muito bem esse desafio, segundo Costa et al. (2008, p. 3), são as Casas Bahia, cuja habilidade em compreender as “as necessidades emocionais e os hábitos de compra dos clientes da baixa renda e a capacidade de viabilizar seu sonho de consumo por meio do acesso ao crédito resultou num modelo de negócios único no que diz respeito ao varejo.” Ou seja, a visão estratégica de Samuel Klein, naquele momento histórico – primeira década dos anos 2000 – não se limitou apenas às promoções pautadas em preços mais acessíveis, mas https://www.shutterstock.com/pt/g/HstrongART 19 principalmente em uma correta leitura dos desejos do seu público-alvo (público que passou a contar com linhas facilitadas de créditos, igualmente disponibilizadas pelas Casas Bahia). Tal modelo, como era de se esperar, teve um êxito muito grande, o que perdurou até o início da década seguinte. O que se observou, na prática, é que as casas Bahia, que posteriormente passaram a ser geridas pela GPA – pertencente ao grupo francês Casino – ao contrário de muitas de suas concorrentes, como a Magazine Luiza, que só reforçou as suas operações no meio on-line, não soube corretamente fazer a sua transição para o mercado eletrônico, o que resultou em uma sensível redução da participação das Casas Bahia no cenário digital (Kramer, 2019). Dessa forma, hoje em dia, o principal desafio dos Klein, que reassumiram a gestão da Via Varejo (que atualmente também controla as operação das Casas Bahia), será a reinvenção da empresa, cuja necessidade é conhecer a fundo as aspirações dos e-consumers (a exemplo do que fora feito na década anterior), no investimento em smart process. Isso pode otimizar os processos internos, bem como permitir uma maior integração entre os canais, em prol de políticas de omnichannel. Aliados a tais transformações, os atuais gestores necessitam romper com a crença vigente na organização de que, enquanto os clientes mais jovens preferem realizar transações on-line, as pessoas com mais idade ainda seriam mais afeitas às lojas físicas – postura esta que gerou uma cisão entre as operações on-line e off-line, as quais atuavam com estruturas e culturas distintas. Ainda segundo Jean Paul Rebetez (citado por Kramer, 2019), outras medidas interessantes a serem tomadas seriam a valorização de modelos menores de lojas, o emprego mais acentuado de estratégias, como o click & collect (retirada dos produtos nas lojas físicas) e uma atenção especial ao marketplace (a exemplo do que fora feito pela Magazine Luiza). Caso os Klein consigam aliar o seu conhecimento adquirido ao longo dos anos em torno dos hábitos de consumo das classes C, D e, as quais ainda não se inseriram por completo pelo universo digital, às novas tecnologias descritas acima, existe uma grande chance de a empresa voltar a crescer, tal como no passado. 20 REFERÊNCIAS BLESSA. R. Merchandising no ponto de venda. São Paulo: Atlas, 2011. CHIANELLO, C. Dados que transformam o PDV em centros de experiência de consumo. Revista Meio & Mensagem, São Paulo, fev. 2019. CASTELLS, M. A sociedade em rede. São Paulo: Paz e Terra, 1999. CASTELLS, M. The internet galaxy: reflections on the internet, business, and society. Londres: Oxford University Press. 2001. DRUCKER, P. A Administração na Nova Sociedade. São Paulo. Nobel. 2002. NIELSEN Company. Webshoppers. 39. ed. [S. l.]: Ebit, 2019. Disponível em: <http://www.medsobral.ufc.br/pdf/Webshoppers_39.pdf>. Acesso em: 12 jun. 2020. HITT, M. A; DUANE, I. R. HOSKISSON, R. E. 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