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RAMA, Angel - Os processos de transculturação na narrativa latino-americana

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tedizle l'an~&ón yh Wsitadorzs, das quak quatro se constituem, a esia al- 
hiiz, em unia re@o crítica da sociedade peiuana em q u m todos os seus ei- 
tratos na época conternpoi%?ea. 
Tmto a namhma@+tica como a realistauítica, cujas Sasès foram for- 
---_u.-., 
muladas na década de 1930 nos maiores con,$omerados urbanos da Arnéiica 
Latina, particularmente no mais adiantado da época, Buenos fires, detenili- 
riam, pelo simples fato de expandir suas~~~o~~~ses~u~n~ - pai;! o 
quê dispunham dos circuitos de diisâo.,@dos estab,elecidos - . nas2i-jprias ci- 
dades onde foram sendas essas proposF estéticas, o cancelamento do m o 
.- -.-. .- 
Wuento n a d v o regionaüsta que predominam nainaioria das áreas do coii- 
tinenie e dentro do qual haviam se expressado, de coniuni acordo, eirito área 
de médio e escasso descnvo!viniento educativo como as mais avançadas. 
Em uni DI-imeii-o nioniento, o reeioilaiisino assumiu uma atitude d e __ 
i~~siya.f.chadaquçp~sglava o e@~nfa~en~qpac!~+ e, poimto, o endu: - ~. .~. . 
recimento de posições. Houve uma disputa entre "crioulista*" e "modeinis- 
#: 
* Reíistir n'elire~atuia Ii~n.ozme~ica~,n, n. 5 , alitil 1974, Maiacaibo, Venezuela, 
Univrrsidadt.de Zulia, Escola de Lrri;rr. ," 
RODRIGO
Text Box
RAMA, Ángel. Os processos de transculturação na narrativa Latino Americana. In: AGUIAR, Flávio & VASCONCELOS, Sandra Guardini T. (orgs). Ángel Rama: Literatura e Cultura na América Latina. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2001, p.209-238.
td" (variguardiism), que se abre com o texto de quem, por sua idade e obiii, 
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 
era mestre indiscutível, orado Quiroga, intitiilado "Ante e1 Tribunal", e 
que depois é divulgado rias r e ~ t a s da época1. Eni seguida, pode ser obsei- 
vddo na versão sanrica que ofereceu Leopoldo Marechal em Adjil Bueno- 
sayes (1948) ou na teorização a que foi submetida por Alejo Carpentier em 
TientosyDjfrencias (1964), para explicar sua renúncia ao movimento nai- 
, rativo no q"d se inic~ou'. 
Em parte, essssexo mesmo efeito queprovocava a tercein posição es: ... 
tética daqueles anos, .... representada pela ~ - ~ _ s o c i a l , : i q - ~ + s < e m s y .. 
período beligerante, que correspondeu à chamada "década rosada" . . . . . . . . do an& . . . . . . - . . . . . . . . . .. - ....... 
cismo universal. Porque, embora tradiizisre níveis menos evoluídos h moder- - ...- ~- 
nidade, jávinha marcada pelaurbaniio e por uma adesão primária a esque- 
mas importados, como os do realismo sollalista. Paradoxalmente, isso a asso 
ciavanão só ao realismo crítico, como também ao Fantástico portenho, contra 
o qual militou, buscando identificá-lo com um pensamento conservador. 
Essa p e n a previsível não ocorreu. Foi registradador outro lado, uma 
I_- ---- 
transnutação do regionalismo que salvou seus princípios dominantes, em 
. ... - -, . - - -- .... . 
particular os que serviam para claborar os assuntos runk e que por isso man- ...-........... .. . 
b h a m es t r~~~.~n-~~g .o .m.eLem~~ps ,_-ad ic i~na i s e m e s gcaicos - d a 
. . . . . . 
vida __ latino-americana -__-__._ - Dentro do mpardismo', o próprio Caipentier, que 
de fato ficou cá e lá em relação a ambas as correntes, há de ser sensível ao 
manejo artístico de tais supostos arcaísmos e, por sua vez, Borges, em sua 
resposta ao livro de Américo Castro (La Pecu/iar?dadLingü15tica Rioplaten- 
se), soube avaliá-los corretamenre nesse plano da língua. 
Mas o desafio era apresentado ao regionalismo. Aceitando+, este sou- 
be resguardar um imporiante conjunto de d o r e s literários e de tradições 
1. "Ante ei tribunal". E1 Hogar, Uuenor hires, 11 de set. de 1931, incluido eni 
Ho~acio Quiroc~. Sobre Literacu~x, Montevidéu. Arca, 1970. 
2 N e j o Carprntier, Tjrri~u~yDifirencias, Mexico, Universidud Nacional Au- 
tónonia de Mbxico, 1964; edição anipliada, Montevidéu, Arca. 1973. 
* Vanyardismo: conjunto de tendéncks inovadoras na m e r nas Iru-as do século 
XX. wis como o cubisrno c o ulnaírnio, que influenciou os paíscs duAn16zica 
Latina de hia hiip.ânica e que no Biasil corresponde ao Modernismo (N.T.). 
os vnoccssos or r a ~ ~ s c u ! ~ u ~ ~ ç & o NA NARRATIVA LRTINO-AMERICANA 2 ! 1 
locais, para o que precisou transportá-lo às novas estruturas literárias, apa- 
rentadas, emboia não semelhantes, com as q u i s abasteciam a narrativa ur- 
bana ein siias niiiltiplas tei~diiicias rrnowidoiai. Um grupo de escntoi-esviu. 
-. -, ........ 
com lucidez, que se o regionalismo fosse co~igelado em sua disputa com o 
vanguardismo-e o realismo-critico, ............ entraria em agonia de morte. Esta intel-- ----. 
romperia um r ico fluxo de formas literárias (o quc seria a perda menor; con- 
sideimndose sua condi(-ão perenemente trarisformável), mas também acar- ... -. ...... - . 
retaria a extinçáo de urnconteudo gbrai muito mais amplo, que só por . . ............ . . . 
intermédio da literatura alcangra sobrev&$~cia, rancekndese suaação efi- 
... ..... . . . . . . 
.... caz, integradora, sobre a meio nacional, que . . . . . . . . . . . . . aparentemente n io podia ser . . . 
cumprida por .....S. canais I pelo ... menos _ _ _. em .. seu nível artístico. 
Dentro da estrutura global da sociedade 
..mo>:entuava . . . _ . . . v*culaxidades ___-..--- cull~&~g~ehavkauid~fojad~ _,&e;is 
ou sociedades internas, conhib&do para definir s e u r i 3 diferencial. ........ Por 
-... ..+ 
isso mostrava propensão pela conserva@o daqueles dementosdo passado que 
haviam contribuído para o processo de siiguknização cultural, procurando 
msmia-10s ao futuro como modo de preservar a configuraçáo adquirida. O 
elemento ~ran'içio, incluído como um dos vários traços de toda definição de 
"cultura", era realçado pelo regionabmo (com evidente esquecimento das m e 
diiicações que em sua época ele introduzira na herança recebida) tanto no 
campo dos valores como no das expressóes fiteránd. 
Valores e expressões são_;iMiidados pelas novassoz.nw: fato normal, 
~ ~ 
...... . . ---->.L 
pois entre valores e comportamentos existe um estreito vínculo, mas, como 
também é habitual nesses processos, são as segundas qne parecem ceder ao 
embate, são as estruturas literirias que visivelmente registram uma transfor- 
3. Urna enumeracio crítica das defini~órs dc "cultura" como transmissão de 
heranca social rnconwd-sc em A. L. Iúaeber e Clyde Iüuckhohn, Cu/lurr. a 
Cririo1 Revirw o f Concrpu and Definiuons, Nova York, Random House, 
Vinuçe Books. Dentre clns, a de A. R. Radcliff-Urown abarca largamente 
esse aspecto: "thr pi-ocess by which in a çiven social group or social class, lan- 
çuagc, beliefs, idças, aesthetic tastes, %noii.ledge, skills and usagei of niany 
kinds are handed ("wddiuon" rneans 'Iianding on") froni peoon to person 
and from one generatian to another" ('White's View of Science of Culrure", 
Alnelican An~ropolog;~~, LI, 1949). 
I ' 212 A N G L L RAMA 
maçio, procurando. no eutanto, resgizrdar os mesmos dores, embora na ' 
verdade situando-os eni __I.._. outra perspectiva cognitiva~,Qregionalismo lanç- j 
f se _ à _ incorporação d novai)irriculações literárias, as &ais busca, js vezes, no i 
. -5; . - - .... . 
panorama univeisal, ................ em ora o faça com mais freqüência no contexto urba- ; I . . . . . . . . . . . . . ...... ............ . . . . . . . . . . . . . . ! 
no latinrrarncricano mais próximo, evihndo com isso que ocorra a substitui- ; 
ção drástica de suas bases. Consegue, em vez disso, quevoltem ase expandir 1 
pelas fronteiias nacionais e continentais e contiuuerri servindo seu obstina- j 
1 do projeto de conservação e desenvolvimento das culturas locais. 
1 Para resgiiardar uma mensagem que até o momento fora trarismitida 
com relativa faciiidade aos conglomerados urbanos, em parte porque estes 
viiiam Sua ampiiaqio pela iinigraçio interna, que os foi constituindo e levava .~. .i 
:i 
para as cidades enormes contribuições de culturas rurais, foi preciso adequá-ia is novas condições estéticas que ali foram sendo idealizadas. Estas respon- $1 
1 dem tanto aos traços peculiares daevoluçio urbana, que h r v e e desintegra 
I .- aiculturas rurais, quanto à maior submissão às pulsões externas registmdas .i1 
t 
dentro da cidade, tomando-as obedientes aos modelos estrangeiros, mais 5 - 
F. 
prestigiosos por virem glorificados de suposta "universalidade". 7 - .. 
Essas operações literánas, que acontecem dos anos de 1930 em dian- 
te - criadores isolzdos sem contato.entresi,-mas situadosem-foniuntuiasse- I - 
melh&t~:;'~õdémser hculadas ....... aos -- mu&los ~ processos . de aculturação . 
desenvol~dosno conhente e situam-se dentro de suas coordenadas. Os tex- 
.- - . . . . . . . . . . 
tos resultantei estarão impregnados de sua problemáticae nos oferece60 um 
repertório de soluções propostas. 
No vaiado panorama ,- aculmmte ..... ahd, testemunho da dùiâmica das m 
dedades latincmnericanas contempotâneas, um extenso capítulo é ocupado 
pelos confiitos das sociedades regionais que ..... se d e p m . . . . . com a modemiza@o . .................. 
incorporada por';iteimédi~ de cidades e portos, prodamada transmisson do 
.. - . - . . ..... - - ~ 
progresso e que as eficesurbanas dominantes &<imenam. Como foi possí- . -. - ................. 
velcomprovar em inúmeros exemplos, esse processo de aculturação não res- 
ponde a um mero intercâmbio civiiivado entre culturas, mas é a única opção 
que se impõe para poder solucionar um choque de for- culturais muitc dís 
pares, uma das quais viria a ser previsivelmente desmída no confronto, sen- 
OS PROCESSOS DE TRANSCVLTURACÁO NA NARRATIVA LATINO.AMERICANA 213 
do simplesmente \rericida em termos de uni pacto. Os regionalistas respondem 
< . , , -..-~--- --,_. 
a esse coufüto: tentarão evitar a rupmn, que se aproxima, entre os diferentes 
. . . 
setores internos que compóem a culliiia latinwainericana, devido à desigual 
evolução experimenmda e aos divems ingredientes origináiios, enquanto as 
sistem a uma aceleraç50 modernizadora. 
A cultura modernizada das cidades, respaldada nas fontes externas, 
____------I .. 
transiere pata o interior da na@ um sistemade dominaçio (aprendido de sua 
. -. ...... ---~ ...... 
própriadependência de sistemas culturajs mundii), apelando para os novos 
inshumentos eficazes recente lhe proporciona, ou seja, nio 
o associa à sua s p suU3. Em termos cultu- ........ 
rais, permite-lhe, pelo menos por um tempo, o conxmdoiismo folclórico, que 
já é uma maneira de sufocar uma culturd ao dificultar sua uiafividade e atua- 
liza&, e esse é um primeiro passo no caminho da homogeneiza& cultural 
segundo as nonnas urbanas, ainda que dentro de uma siaiaçáo de dependê= 
cia deformadora pela reshiçio que opóe ao poder de tomar decisões nas re- 
giões internas. Para estas últimas, onde se assentam sociedades de múltiplas 
configurações culturais com predominância da de tipo rural, os centros das 
capitais apreseniam um diiemaque é igualmente fatal em qualquer um de seus 
temos: ou rehxeder e morrer ou mon-er ime&mente4. 
-.- ....... ............. I,.-,--_ 
Nem bem foi proposta, comprovamos o aparecimentc.de criadoresli- 
terános quecons~oem as pontes indispensáveis para resgatar as dturas ie-. . - .- . 
giona&M.aejm. d e u m p ~ d p ~ p r e ~ i s t o e original ~. ~ as con~buiçóes &'sT 
ticas damo.de rn idadec~ além . . . . disso, e o mais . . . . . . . 
à!iv., que-eJaprojeta, os próprios conteúdos cuiturais region,% em busca dc ...... . . . . . -..~. - ......... 
4. Vitcorio Lanternari ronsidci3i esse impacto modernizador um fator de dc- 
sintegra* cularnl ("Désintégiation culturelle et prowus d'acculturation", 
em Cahiers hternationaox de SocioloSje, vval. XI, jul.dez. 1966): 'Um ter- 
ceiro fator de desintepacáo cu!tural depeiidr do processo de modernização 
dos países dependentes e pode inrerferir no processo de urbanização e 
de migragão. Como assinalou L. Wirth, para muiias sociedades, o sacrifi- 
cio de sua inlegridade cultural aparece como o pesado tributo pago ao 
progresso. O processo sociológico i. piiraielo ao da modernização". Sobre 
a inflexão urbana do processo, ver o artigo de Ralph Beals: 'Urbanism, UF 
baniration and Acculturation", eni A~nrri'~anABrl?ropolo,nisr, LIII, 1951. 
ANGEL RAMA 
soluçóes artísticas que não sejam contraditórias com a herança que (levem 
. . 
transmihr. Essa é a novidade registrada no colnportarnento de alguns gru- 
pos regionalistas: um exame revitaliiado das tradiçóes locais, que Coram se 
esclerosando, para encontnrformulaçóes que permitam absorver a influên- 
cia externa e dissolvê-la como um simples fermento dentro de estiutuix ar- 
. . . . 
tísticas mais amplas nas quais se.continue traduzindo a problemática . .- e os 
. . . . . . . . 
sabores peculiares que vinham custodiando. 
Nas orig-ens da grande renovação das l e m latinoamericanas do século ', 
XX, houve coincidència entre todos os escritores e todas as correntes estéticas 
para manejar as contribuições de fora como meros fermentos a serem usados ........................ ........ ..A. II--- , 
na desco&sde anaio&.~.tgmas. Não é só Carpentier que, ao escutar as di i 
sonânjas da música de ~travinski, descobre e valoriza os ritmos .- africanos que 1 
I 
no povoado ............... nego - de Regl+.'p de .... ~ a ~ a , . ~ h m s e n d a oindasháséca- \ 
l k sem que ihes prestassem aten~áo. Foi esse mesmo impulsoque animou a i -" / . L- ..... . \.-. ............ ..... ?... I obra do principal modernista brasileiro: ~ á r i o de Andn.de. -- -.-.. . . 
...- " .............. .. .................. 
'MG serão aqueles escritores mais profundamente inseridos em cultu- 
! ras de sociedades entravadas e dominadas que, dispondo de estruturas cul- 
turais plenamente elaboradas com elementos autóctones ou acrioulados de 
ionga data, terão de encontrar equivalências originais e insólitas para as in- 
citaçóes externas, respondendo a elas a partir de uma penetração em suas 
culturas tradicionais. Porque o impact~ modernizador gera em primeiro lu- -.; . . . . . . 
gar uma retirada defensiva, um mergulho protetor no seio da culkra regi* 
na1 e materna, com um premente apelo a suas fontes nutritnai, mas também 
, .. du* com o desejo de reexaminar de forma crítica suas condiçóes peculiares, as 
forças de que dispõe, a viabilidade dos valores aceitos sem análise, a auten- 
ticidade de seus recursos expressivos. 
.. De tal processo de "reirnersão" e reconsideração de uma cultura terão de 
criar os rês tipos, por todos conhecidos, de respostas à proposiçio acultura- /r 
dora que lhe é formulada: h as pecu1iares.a ..... u m a , ~ e r a b i i d a d e c u l t u a l " p ' ~ ~ 
aceita propostas externas e renuncia quase sem luta às próprias; as da "n- 
~. . . . . - 
gidez ..... cuitug.que seinstala drasticamente nos produtosjá.4cq&or ma .... 
cultuia, rejeitando taia contribuiçio nova; as que caracterizam a "plasticida- 
OS PROCESSOS DE TRAHSCULTURAÇÃO NA NARRATIVA U(TINO.AMERICANC 2 1 s 
'? 
de cultural" com sua destreza para inteç-rar em iim produto as mdições e as 
. novirhde?. Dentro deste úihino tipo, tem especial r e l d c i a a atitude daquelrs ~. .~ 
que não se limitarn a um simcretismo por mera conjugação de contribuiçóes 
de uma e outra cultura, mas que compreendem que, sendo cadauma delas 
uma estrutura, a incorporação de novos elementos de procedência externa 
deve ser obtida m e d i t e uma reartinilação total da estnituracultud própria 
(regional), apelando para novas foniizações dentro de sua heianp. 
Da "reirnersão" nas fontes piúnigênias, surge uma inteiisiíicação de cer- 
tos valores peculiares, quz às vezes parecem proceder de estratos aparente- 
mente ainda mais primitiv~s,mas que ostentam uma capacidade significativa 
que os toma inwlneráveis à corrosáo das contribuições modernizadas. Para 
um criador literário, trata-se exclusivamente de puras operaçóes artísticas, 
mas nelas est& implícita uma prévia proposição cultural,resultado do con- 
fito que toda uma coletividade está vivendo. 
Os processos de acultuiaçào são 60 velhos quanto o contato entre as 
sociedades humanas, mas o conceito e seu manejo pela antropologia sáo 
muito recentes', e como surgiu dentro da problemática do colonialismo eu- 
5. As trEs categorias são enunciadas por V. Lanternari (op. cir.) que acrescen- 
ta: "Nos inumeráveis casos de aculturaçio. baseados na 'plasticidade cultu- 
ral', os elementos de ciisr e desintegração estão estreitamente associados, na 
realidade, aos elementos que expressam ou oiienram a reiritegragáo", 
6. Os problemas iniciais dr definição deram lugar ao 'Meniorandum of lhe 
Study o€ Acculturation" (Amrrican Anlhrop01ogi.t~ XXXVIII, 1936) de Rr- 
dfirld, Linton e Herskovis. Uma ampliação e sistemanZaGo pode ser encon- 
rr.ld3 c111 Mel\ille I lenkosirs. ~ n i , l : h ~ i i o n . The ~ < u d y of ~ b l r u i r Conoca, 
Ndva I'ork. I . I . Aucuçuns, 1938. Fora da órica antroooliicica r dentro <I., - - - . 
corrente filosófica de inspiração alemã, ver o ensaio de Jose Luis Romero, 
Bzsrspam una Morfologfa de /os Conractos Culrurales, Buenos Aires, Ins- 
titución Cultural Espariola, 1944. 
i-opeu (inglês) e solreu o contra-awque da descolonização, tingiu-se de in- 
Gerências ideológicas que náo podem ser desdenhadas, sobretudo tratan- 
d ~ s e de artes literjrias. 
Foi dentro da antropologia hispaneamericana que se questionou o 
termo "acultur+ção", a partir da proposiçio que, em 1940, iizera o cuba- 
no Fernando Ortiz do termo "transculturação", que, para ele, era "funda- 
mental e elementarmente indispensável para compreender a história de 
Cuba e, por razões análogas, a de toda a América em geral". 
Femando Ortiz discorreu sobre ele do seguinte modo: 
Entendemos que o vocábulo "trdnsculturaçio"expre.sa melhor as diferentes fasa do 
prorem uansitiva de uma cultuia a outra, porque erre náo conlre apenas em adquirt-uma 
cultura, que é o que a rigor indica o vocábulo angleamericano "acultun$o", mas implica 
tambémnecesrariamente a perda ou o desEpento & umaculmpreccdenh, o que pode 
ria ser chamada de uma parcial desculhmFão. e. além d k , +ifi<-a a conseqüente aia+ 
de novos fenômenos culturais que poderiam ser denominados nroculiunpio'. 
I De fato, essa concepfão do processo transíormador (aprovada entusias 
ticamente por Bronislaw Malinowski em seu prólogo ao livro8) traduz um pew 
pectivismo lahoamericano, inclusive no que pode ter de interpretaGo incoi-- 
r e d , já que nela se percebe a resistência, a se considerar a park passiva ou in- 
7. Fernando Ortiz, Conrrapunreo Cubano dei Tabaco y elAzúca,; Havana, 
Consejo Nacional de Cultura, 1963 (2" edição ampliada). 
8. Embora, como observaRalph Beals no uúgo "Acculturation" (in A L. Xi-o~ 
rber, ,4n~ropoiogy Today, Chicago, The University of Chicago Press, 1959), 
Malinowski não aplicou o conceito do antropólogo cubano em nenhuma de 
suas obrx posteriores. 
9. Uriia discussão terminológica em Gonzalo Açuirre Beltran, Elprocrso de 
Acoltu,-ación, México, Universidad Nacional Autónoma dc Mixico, 1957, 
conclui com esta síntese: "Voltando ao nosso propósito: adcu/luraçioin- 
dica união oii contato de cultura; só-cultumpio, separação de culturas, 
rejei~ão; e rmnssuirum~io, passagem de uma cultuia a outra". Por esu de- 
fin42o preferimos o ermo 'transculturação". Em prol da proposição de Eer- 
nmdo Orúz, a despeito das razões ideológicas que ele alega e que pei-tenceni 
aos habituais mecanismos de determinação semântica, milita sua evidente fe- 
licidade expressiva, sua sensibilidade para o espirito da língua, o que faz rle 
&c 
' , ..' OS PXOCESSOS DE TRANSCULTURRCAO Ni\ NARRATIVA LATINO-AMERICANA 2 1 7 , . . ! 
j ferior do contato de culturas, a destinada 5s maiores perdas. Nasce de uma !i 1 diipla comprnmçio: registra em sua cultura presente -já tianscultunda - um <. 
conjunto de valores idiossiiciáticos que é possível reenconuar, quando se re- 
, \ 
monta a datas tardias, dentro de sua hsrória; coimbom simultaneamente em 
seu seio a existéncia de uma energia criadora que atua com desenvoltuia tanto 
sobre sua heranca particular como sobre as incidências provenientes do exte- 
rior, e nessa capacidade panumaelaboração . o.riginal, . mesmo nas dinceis si- 
. . .- 
tuações a que tem sido submetida historicamente, encontrauma . . . prova da exiç 
tênia de uma sociedade específica, viva, criadora, difepte, que e&nula, mais 
que nas cidades estreitamente ~ o c i i d a s às pulsões univeisais, nas camadas re- 
conditas d& regiões&ternas. 
Como são dois os processos de transcultunção registrados ao mesmo -- . . . . - . 
tempo (um enue as metrópoles externas e as cidades latino-F-ekjuiase 
- _---_ - 
outroentre esias e suas regiões-internas), seria o s ~ d o o que tena de 
+- 
~ro~orc iona r as maiores earantias de uma consuucão com mais notas di- 
L...! . ~ .. ~~ 
ferenciais, além de especificamente americanas, naqueles . . . . casos . . . em . que . por 
-caus~dã~las t ic idade cultural" se conseguisse integrar, dentro das próprias 
- - ., . estmturas rearticuladas, as 'dtzções modernizadoras que as cidades teriam 
influenciado. Pode-se registrar, para situar o grupo humano que me- 
- Ihor conuibuiu para essa tarefa, que nesse período é produzida uma flo- 
~L .. 
. . nçáo de escritores provincianos que a absorção da cap id integra às cida- ~-.. 
des. Nesse meio, serão idealizadas diversas soluções estéticas que iecebem 
vários nomes ao longo do continente: no Sul, por exemplo, chegou a cha- 
mar-se "nativismo cósmico", uma metáfora p a n encruzilhada de culturas. 
É possível que a solução introduzida por Fernando O& tivesse agn- 
dado ao peruano José María Arguedas, que ao rcccber o Prêmio Inca Gar- 
seus livros, diferentemente do que ocorre com muitos textos de antropó- 
logos e sociólogos hispano-americanos, escritos eni uma "língua livre" 
povoadacle anglicismos, urnaexpei-iência lingüística criadora.Un1 exem- 
plo: é uni dos poucos que us;mi o termo 'desc~lmra~ão", que pertcnce i 
nornia da lingua, ao invés de "deculturaçáo", empregado pela maioria dos 
.' ano-opólogos. 
218 ÁNGEL RAMA OS PROCESSOS DE TRANSCULTURAÇAO NA NARRAIIVA LATINO~AIMERICANA 21s 
cilaso de laVega (1968), de seu país, se op6s hostilmeiite. em seu discurso, 
a ser considerado um "aculturarlo", no que entendia que a palam sugeria: 
perda de uma cultura própria e sua substituição pela do colonizador, sein 
possibilidade de voltar a expressar sua tradição singular. 
O cerco podia e devia ser destruido: o manancial das duas na+ podia e devia ser 
unirlo. E o camiiilio não tinha por que ser, nriii na possível que fosse, unicamrnte aquele 
que se exigia com autoritarismo de vericedarrs espolia<lores, ou seja: qur a nação vencida 
renuncie à sua alma, mesmo quesó apxentemente, de modo formal, r adote a dosvericedo 
res, isto i., se aciilture. Eu náo sou umaculuiia?o: sou um peruano que org~lhosameiite, 
como iim demônio feliz, fala Knya ciisti e de índio, espanhol e qukliua'". 
kAceitandO por ummomento a descrição. g u e & ~ q & $ ~ g f % ' dadas-- 
d i ~ e ~ a ç õ e s que.camRõem uma uanscuitura@o, tentemos ver c o m m a + -"- - - - , . - -" .._.- -- 
nifestam em uma o b n litem.de gênero nagrilo. Lembremos que isso im- . . . . .'IS 
plicaria, em primeiro lugar, uma "parcial desacuimação", que pode mostrar 
graus muito diferentes e afetar MíWS árex do exercício literário, embora 
comportando em todos . . os caso~p~~~qodngaó~,~m~eh~i~~aos.funU~- . 
namentos anteriores, que são abandonados por serem obsoletos. Seu alcan- 
ce não pode ser medido completamente, e muito menos serem apreciadas 
as diversas soluç6es a que se chega, se não&~mmg! ig .gdo~o~~me! i& 
que sqbr~vem.e.inclu~ive os que se acrescentam, todos provenientes da cul- 
tura original, de tal modo que a "desaculturação" não é avaliável sem sua 
paralela "r~culm.@o", ou seja, _ a intensifisic&e -- propostas intetn%,.iden= 
I '-. 
tificadoras de uma cultura. Só aanáiiie dessasduas briáveis permite medir 
... .~ . . -1 L-.....' 
o esforço de "neoculturação" por absorção de elementos euteinos de uma 
cultura niodemizada Seria composta, assim, uma figun em que as duas for- 
focos de ação g l s e ç o ~ j u p m k m d d i f e z . 
reafirmações e absorções, a que caberia 
acrescentar que esse processo, que no campo cultural teria uma alta porcen- 
10. O discurso, com o título de T o n o soy un aculturado", foi incluido, a pedido 
d o autor, como epíiogo a sua novela póstuma e inacabada E1 Zoii-o de Ami- 
bs y clZoriu de Aúajo, Buerios Aires. Losada, 1971. 
%em de detenninismo, mostraria no caiiipo literário unia margem mais ele- 
vada, proporcionalmente, de liberdade, que se manifesta na capacidade se- 
letiva que o ciiador continuaria inanjmdo. 
(TJ No nível lmgiiistico, o escritor oscila6 entre dois casos extremos- com 
m%tiplos estados intermediários que implicam, na opção de uma determina- 
da comunidade recepton, feita de forma tácita ou explícita -, que sáo repre - 
sentados em duas resoluções básicas: a acomodação nas línguas indígenas 
..- - autóctones ou o manejo dos dialetos regionais do espanhol, português ou fran- 
-. ~- cês, ou a adoção de uma língua estritamente literária, como fora a dos "me 
. .. 
= - .+ demistas" hiipan~americanos do século XIX, ou inclusive uma reconsuução 
L- ,- arcaica de modelos originais, como foi tentado por Enrique Larreta (ein La 
% .,? 
i- 
Gloria de Don Ramiro) e dentro do mguardismo foi registrado na obra de 
i EduardoUdea O comportamento normal foi representado por váiias han- 
?@ 
sações, embora a linha dominante tinha sido representada pelo reconhecimen- 
..E to da necessidade de uma iíngua l i t e m , específica daciaçj,arií~a,,_que. . "-. *& desenvolvesse um _.+. discurso --.-.--- lingiktico hqmologante, . .~ no qual% pode perceber 
g; a absorçáo de um traço da modemidad- Em relação 2.s tendências regiona- e. _I------ :-. 
E: &tas antenores, os ksculhwdores r e g i s m igualmente a perdatusq d e ~* 
íd ..= linguagens . . . ~ dialetais, rurais ou urbanas, . e, claro, das línguas indígenas,rm,es- 
~ ~ z; - -. 
.~- .-. mo -- no campo lexicosáfco .._ 
.. . abandonam - . muitos osco com os quais os"criou- 
= . .. listas" salpicavam.se.us escritos, limitandme @ p a i a e d e uso corrente que 
d k i a m objetos concretos ou aos neologismos amplamente aceitos..Compen- 
. -. . . .. . . . . . 
sam isso com uma ampliação significativa do campo semântico regional e da 
. . ~ .. . , . , i . ~ 
ordem suitatxa,~apo~@,de in~enir! .ca,fegião.~~d+a, .. equivalêndas lingúís- 
tias espanholas para o quíchua que, p ro~e lmen te . iniciabq poy-gued- 
acabarmiconsolidando uma.hgua.wiificial e lite&%., cujas.últi-rias.m.w$cs 
Qçbes estão nos romwces.de Manuel Scom. Na área lingüística brasileira, a 
obn monumentalde João Guimaráes Rosa representa a aphorada elabon- 
ção das conuibuições dialetais, elevadas a unidades de uma estrutunção que 
é minuciosamente regida por princípios de composiGo artística. 
Se há visível renúncia a línguas e dialetos regionais, há siiultaneamen- 
te um esforço para recupeiá-10s dentro do discurso literáno: para isso, ape- 
lase pai-a a contribuição que pode oierecer o conhecimento das leis do si* 
terna. Estas são aplicadas, estendidas e desenvolvidas sobre um material liii- 
çuístico que pode ser diferente daquele que Ihes deu origem e que é subrne- 
tido à reelaboração de acordo com elas. Nesse nível, a conttibuição otiçinal 
dos transculturadores consiste na unilicação lingüística do texto literário, 
respondendo aos princípios de unificação artística, mas u b d o , eni subs- 
tituição a uma língua liteiária composw. e aprendida, a sua própria. 
No mesmo instante em que se renuncia aos vocabuláriose glossá.rio~ 
qpe habitualmente -. aco_mpaabavarno~omancere@on.al'~~ta,.~~q~~se res- 
uinge o uso do léxico loc-, tqb+,e.acentua a aten$"_peb f q~~~as .$n - 
&ti& e inclusiv~~.eh.rno.d~essuprã-~gmentais, q " g a t ~ : j . . . .. 
eram exclusividade da fala dos perpagensp-m&mme se opunha,&~ 
.-- ..... . - . * . , . . . . --. 
do próprio texto, à língua do escritor, invadindo a totalidade textual e a sub 
mergindo em uma mesma tonalidade. Quer se mte de um longo monólo- 
go, quer do manejo da consciência de um personagem, quer dietamente de 
uma confirmaçio do contar narrativo sobre o contar espontâneo e popular, 
o discurso aíima-se como uma unidade lingüística na qual épossível que, 
L- .-" .. .. - 
ao contrário do que oco& ante+, o ~ . f i . i o g ~ & ~ > ~ a g e ~ v : n h ~ a ser . . . . . _ _ - 
para nósestgturas intelectualizadas. . 
Em resumo, é . . p . ~ u ~ ~ r quese r ~ i n & g ~ p r i a c o r n u n i d a d e l m - 
~ - 
giiística, falando a partir dela, com uso d e s e m b a d o de snis recursos idio -- 
máticos. Como, no c~ concreto dos transculturadores, essa comunidade é .. ...+ 
de tipo ma l , confmando às vezes com as de tipo indígena, é a partir de seu 
sistema lingüístico que trabalha o escritor que não procura imitar de fora 
uma fala regional, ___-_____.-.____ nlas sim elaborá-la de _ dentro l._-.X.__. com fmaíidad~li terbeas- 
Desde o momento que náo se sente fora, mas dentro dela, reconhecendo isso 
. . .. -. .. , . . . . . _ A 
sem sentir vefponha .~ o" . .- h"milhação,já .~ ... . náo p o i q r ~ p : e .i=%- 
te suas irregularidade3 ;?-~iações e m ~ l a ç ã o auma~riposranoxnaüca-,, 
dêmica, q~e~inclusive ... começa a não . perceber, .. om~nãoas.percebeaquele 
que fala. Por outro lado, seráde seu interesse trabalhar as possibilidades que 
seu . . própno.comporramento . lirigüístico lhe apresenta para consmiir, a partir 
. .~. .- .. . . 
dele, uma ~ iíngua literária, espe&& da criação artisaca. Se o principio de uni- 
. . ... . 
OS PROCESSOS DETRANSCULTURAc&O NA NARRATIVA LATINO-AMERICANA 2 2 1 
ficação textual e de língua literária pode responder ao espírito racionaiiia- 
dor-da modernidade, a perspectiva liii~uístiçü a partir da qual assume isso 
restaura a ?:@o. regional, que assim se torna capaz de englobá-lo e impor-llie 
suariqueza p l u ~ ê m i c a . -~ I/ ;<rx,., r.. 
3:: No nível da cqmposifáo ~ ~. litg.Gria, a distância . entre . . as proposw exxe- 
m i era ainda maior, visto que o romance regional havia elaborado suas for- 
mas sobre os modelos naiiahios do nahlialisnio do s i d o XIX, adequandcws 
.. - - . 
a suas necessidades expressivas, e se depara então com o leque de recursos . . 
vanguardistc que precisamente passatão a fecundaranarrativa fantástica e 
também a realist~iítica .~ das cidades, . .. dotando? . be,u~~çlmfleza, umapet-- 
-- .. 
cep&ido real eum contás;.o . . emocional - muito maiores, embora tambéniem 
~ . . 
~ o n c o r d â n ~ c o m .. .. . . -. . e ... uma cosmom~frãsmXiítãda. . - . ... -. .~ .. . . .- Aconcorrência apresenta- 
.%~ .' vase como impossível, sobretudo considerando-se 9ue o regionalismo . . . ~ 
L. 
- . . ..... *.- . . . 
*<.i -,. . .- respondia auma -- concepfáo . . . . racionaiiidora, . ...... muito ri@&, filha d.osoc~lc- :z ; ~. z*: gismo e do psicologismo do século -- X R , só que renovados superficiaùnente --.._. .*~ ~ -.. * : !:~ 
-, ~- ~eWuiSi;keição filosófica dos anos lSOD.(BG@ojn). 
g ; -. . - . 
- , ., . 
~ i ~ h b k m aqui a volta ao manancial de cultura hadici~g~&deeforne- . 
- cer . . respostas: em vez do f~m~n4~oo.mon91ogo,~~~.~or na linhado suem] 
ofconsciousnesrque salpicou imitativarnente muig,namtiva modernizada, 
c o r n @ ~ ~ r ~ o n > g ~ i f u _ ,gé~~<z .@-~~!~#L.QUXI.@ ~ . m ~ n & g ~ d i s + - u ~ 
si!,odC~kde ScrWo: Vereda), ciij-fontes çsuo uão só nalire~tt!n~l@i- . ...- 
ca, conio 113s do nsmi esponcãneo; ou eiicon?i~-sc a soluçãu para O rt:ld- 
. -- . . . . ,, _. . - - , 
ro el>isódico e dividido por nieio do t:uii~~i. rlispersiwo <i= 'comadres", s i i ~ 
.-. . . - 
vozes susnirantq./~edr~Páramo),.também compostode fontesomh, embora 
possa ser rastreado até em textos do Renascimento. Ao propor-se o árduo~ . ... 
problema de resolver estilistiCamente um romance noqual o.plano.doveros 
símil po~safuncionarcon~tiguamente ~o.pl+~.do_fan@@~,,+bsq~doo . .~ .~ -- 
em suafunçio referencial convincente, García Márquez declarau que encon- 
I___/,i____ _~.. .' . ~ . ., -. ' 
trou a soluçao ouviido uma vizinha explicar com simplicidade um fato um 
. - . . 
11. Ver G;abriel García Márquez e Má,-io Vaigas Llasa, La Norda en Aniérica 
Latina: DiiIogo, Lima, Carlos Millo Banes, Edicioncs UNI, 1968. TamEni Er- 
nato Gonzala Bemiejo, CosasdeEs~rjtors, Montevidçu. Murcha, 1972. 
222 ANGEL RAMA 
i;iiiLo iiidlito, e ir apontantlo pala uin sUtciii;i iiarraiivo qiie tinha sido ela- 
bora<lo no seio da cultura à qual pertenceoonio um recuiopeculiar da nar- 
........ 
ração o d , emboili também . . . . tenha tido expressáo em numerosos textos, des- . . . . . . 
de os romanLes de aventum aos folhetins, que náo casualmente constituem 
a alimaitação literária dos niembros dessa cultura. . 
As perdas, nesse nível da composiçio, foiam muito amplas: naufr-,* 
. . . 
gou grande ... parte ....... do repertório narrativo region&ta, quesó há de sob^ 
....... *.. 
' 
viver nos e p w e naljnha da narrativa social. Mas náo foram acompa- . . . . . . . . . . . . . . . . . . ........~.... -- - 11 ..' '' ....-..-..... 
nhãaaaaadoção das fomas vanguardistas (embora circunsíancialmente ............................... . . . . .- ..... ... 
possam ser rastreadas até alguns tcxtos dos transculturadores), porquea. . . . . . . . . - 
estas se opôs a grande quantidade de es:mturas pertencentes à tradição 
%, ...... .- -. . _ ..-... __.> . >-- ' .. . . . . . . . . 
analfabeta, que também não emm, necessariamente, as q u e j á , e s p m . . . . . . fi- . . . . . . . . . . . . . . 
xadas pelos moldes folclóricos. 
r . . _Mas.se+~cu~ível SI dicados que as opemóes narrativas da uans- 3 ' dl t~~raçao _ p r o p o r ~ o n m ~ m Y l s . - ' m ' consideráveis, a ponto de .mPe- 
..~:_am@%"as ~5pp-~.~?k$~~~.~:.~p~i81.@d0a~~~~pii~~r- 
reno em q u e ç i a m f o ~ - . . ~ 
O m3ardisino contestou o d$~~.!og~coi~jgnai que manipulava 
~ -. ~ - ' .... 
pela literamra e que, seja com l i a , q e m referencid, seia com remusao a - - ... -..,. .... 
simbolos, o i o m k i ~ r.igiondapGcava a . . . . . . fundo. Daí kfat6'tii o wguardii- 
mo enco& nanina& fantastica a área m& permeável para reveiar seus 
significados, embora esta, às vezes, como obserwra em certa oportunidade 
Cortázar", possa vir a sei- cáo rígida e logicista como um romance realista. 
Também pôde estender seus efeitos ao reaiismocríaco por ineio do ewme 
das margens imprecisas da consciència, dos cstados oníncos ou & coiiio(;ões 
mímicas, mas sobretudo pela incorporaçáo dos mecanisrr.os do chamado 
"ponto de vista", que dissolviam a suposta objetividade naintim. Por outro 
lado, combateu frontalmente a estmtura conceituai a que estava apegado o 
romance sociai. 
12. Julio Cortárar, Uló,noRound, Msxico, Siglo XXI, 1969. 
..... -. . 
:=*. .aL.., OS PROCESSOS OE TRANSCULTURACAD N A NARRATIVA L4TINO.AMERICANA .... .. 223 . . . .... 
~- ~ 
.... ., I~~mcio~i~ilisni« c i(lealhiiio viaja150 Ikido a I:itlo, enibora náo iiecessaiia- . mente, como ilustrou a principal figura do wigu~rdismo latin-americano, 
Jorge Luis Borçes, que, i10 entanto, seviu obrigado a ilisti-eá-10s nos livros: 
raros textos orientais, eruditos tratados filosóficos, às vezes foijados, debates 
. . engenhosos sobre o tempo e, em especial, o quese entendia pormito ein - ~ - termosda literatura européia culta de então, c que se parecia demais com 
..~,.. . - -~ ~.~ . . as reelaboraçóes de antigos textos literários quejá haviam racionahdo ini- ~. . ... :. : 
& - tos, mas de uina perspectiva atual. Coin isso, ocorria a inversão simétrica 
.u. .. .. - 
.-- que Horkheimer-Adorno detectaram ao observar que o I!uminismo, ao se 
..-.: ,>. .*. :. . craiismuiar eiii mito denuo do inacionalismo coiltemporâneo, resgatava a 
ãni 
s&*: ~. 
d. 
transmutação do mito em Iliiminismo originariainente, como pontos de 
f - ~ ggg : apoio da civüização burguesalS. 
.g& i : ~:. 
3. 
. & & ~ a ~ l ~ e p i o n a l i s t a & ~ u & ~ l e ~ 
.~ . 
.- - . , ...... mo emergente seja mais aparente que de raiz. Ao retroceder, as culturas - ., ._;. ____.___-__-_C_- . - - - - - . - - - . - - - - 
i ? e ~ ~ ~ ~ n . a _ e ~ ~ b e ~ e c e ~ c ~ ~ a t o ~ r n a s f o n t e ~ , s e m p ~ ~ , até se ~ . . ~ .... ,- ......... ~ . , , - poderia dizer que inextinguíveis, dacriação mítica, sobre a s qnais foram 
S. :. I 
~. -. 
' I' erguendo seus edifícios qrposcitivos. O reexame cdico das condiçóes pe- - . . . . ....... 2 
.'i culiares, a quejá aludimos, proporciona aqui a abertura de um universo 
i 
. . . . 
~~ 
de ferozes energias que se encai?.@uamM.m reprimidas pela própria litetatu- 
. . 
ra regionaiiita no que esta ánha de descendente do discurso racionaliia- 
. . . . . . . . . . . . . . . . . - -. 
do do século MX. Talvez fõsse possível falar de um universo diipersiiio, as 
........... 
sociativti, de incessante invenção comlacionadora, por baixo dos níveis em 
que já operava um pensamento cientifico de nítida tendência sociologizan- 
te, que não podia surgir com e m intensidade primitiva dentro do regime 
de empréstimos e racioriaiizações dos conglomerados urbanos e que a pró. 
pria literatura regionalista só soubera utilizar sob a forma de mesquinhas 
criações Folcl~ricas. ,.~ . 
Os ~scul turadores descobri rã^:^ mitoj~orém, essa descoberta não 
., 
1 será feita de acordo com as espécies da narrativa culta da época, ou seja, 
13. Mar HOI-khcinier e Theodor M'. Adorno, DiaIeX-02 desAufijii-unç. Philo- 
I sop/iirc/ie Firizn~ente. Amsterdá. 1944. Ti?dução de H. A. Miirena para o 
espanhol, Uuenos Aires, Sur, 1969. 
como formas literáriasjá congeladas sobre as quais tentar novas variaçfies .~. . 
a luz do irracionalismo que mitifica o discurso racional preexistente, mas 
sim como um repertório quase fabuloso de elementos que não haviani sido 
explorados nem utilizados livreniente pela literatura narrativa do reçiona- ~. 
lismo, emboravivesse ao lado dele. Contudo, mais importante ainda que 
a recuperação de elenientos eni estado de incessante emergência é a des- 
. - 
cob& cios mecanismos mentais geradores do mito, o retomo a essa cama- 
da aparentemente sepultada, mas de enorme potencialidade, na qual se 
&sí&senvolvem as ações míticas. Os narradores dessa linha reconhecerão e 
aceitará" as redes &lógicas com que tecem os mitos, recuperarão as per- 
cepções sensíveis sobre os objetos e suas relações associativas, que Ihes dão 
base, transportarão os enfoques culturais à realidade para poder vê-la por 
meio da elabora60 mítica, tornando sua novamente a "ciência mítica". 
I Portanto, a resposta à desacultumção que nesse nível dos significados 
o inacionalismo~nguardista promove, parece em primeiro lugar simples- 
mente confirmar a proposta modernizadora, rendendose a ela. Porém, .. .- .. na . 
realidade, sxera-a com uma riqueza imprevkível a que poucos escritores da 
................... _^.-. - - _ _ .... _._ . ...... 
"modernidade" foram . .~ capazes de chegar: ao manejo dos "&tos literários" - . . . . . . . . . . . 
oporá o pensar mítico". 
Em qualquer um desses ~ ê s ní~e?~,*teticamente - . ~ definidos, pode-se 
. . . . . . . . . .__- -.--.. 
comprovar que os produtõs resultantes do c&tato ~ @ & . ~ . % e ~ h o n a r - 
................. , , ._. -.__ . . - 
raiivo . . ..! &.o podem . se ..--------- parecer c o m . a s c r i a ç õ e & . m g d ~ ~ ~ 
com . . . . . o . regionalrimo . ou com .anarrati-soc/al, ~pmoq~aiscompart i ihava 
~ e ~ & ~ ~ s , , Convém, no entanto, anotar que o sucesso do pmcesso ~ . . ~ ~ . . ~ .. deiivou, . - 
pacciaimeng, ,@ el&ofo.çõ,~ intermedi*.a.q~ech.egag.aAm.& 
rica Latina, ou seja, do."acrioulamento!' das mensagens~stiC.as.européias 
\ i e de sua . , . hibridação, ........... a o 1 ~ n ~ ~ & - ~ ~ t . e ~ ~ ~ p ~ ~ g d d ~ s SS \I,.. . -,.. - 
Provavelmente, o contato d i r e t o e n g ~ ~ c u l ~ r a s regionais . e as ...... con- - ... -- - 
tribuições imperativas da modemidade teria sido mortal para as primeiras, ~. 
considerando a distância existente enwe amhas, que para certos mos, como - . . . . 
o da polaridade ~. . europe+o-indigenismo, . . . . . . . . . se apresentavacomo simplesmente 
abiimal. A mediçáo veio facilitar uma organização cultuial que, após ímpr* 
L! 
.:i 
! OS PROCESSOS OE TRA~SCULTURAÇÀO NA NARRATIVA LATINO-AMERICANA 225 
. . ~* 
.m 
B Os escritores que em suas obras desenvolvem processos de transcul- .......... . . . . . . . . . . . . 
turaçáo respondem . . . . . . . . . . . às circunstâncias e especificida+zsd~_dturas :.. .... dentro i/ da quais se formaram isppp-i&s.; i~posicões <xcrcid,? sobre elas ___ ... * pela cultura modernizada e, portanto, ao tipo de conflito que é gerado -. ~ .... ....- 
i bas peripécias, conseguii;r impor-se reunindo um acúinulo secular de esror- 
-- ... 
I &s: trata-se, para o caso do Brasil, de uma cultura nacional e, para o setor 
Í de faia espanhola, de um conçlomerado em desenvolvimento que já podia 
entre ambas. . 
Partimos do pressuposto de que a cultura da modemidade é uma só 
e a mesmaem todos os pontos da América Latina, porque assim foi reconbe- 
cida, unitariamente, por sua procedência extrínseca, pelos que a recebem, 
embora nos conste que há wriações notáveis dependendo de sua procedên- 
cia ter sido ptincipaimente européiaou principalmente no-americana; de 
seu impacto ter atingido maiores ou menores níveis de intensidade, o que 
teve a ver com as diferentes intermediações promovidas pelas culturas nacio- 
nais de acordo com seu grau de integraçáo e desenvolvimento; das épocas 
em que se deu o processo e dos sistemas de vinculação entre as cidades e o 
interior. Assim, a intermediição mediadora dos núcleos urbanos brasileiros 
foi maior do que a de seus equivalentes de Buenos Aires, que funcionaram 
como adaptadores das pufsões externas; mas, por suavez, estes foram capa- 
zes de uma reelaboração muito maior do que a feita pelos núdeos de Cara- 
-~ 
- 
ser chamado de cultura latino-americana. Graças a elas, o diálogo entre o , 
. 
regionalista e o modernista se entabula por meio de uma estrutura semicon- ' i i , 
I - ' soliddda: a do sistema ligrário latineamcricano, entendido como um cam- j 
po de integraçáo e mediação, com uma funcionalidade capaz de auto-rep- 
laçã8 em uma margem conside6vel. Era pai2 oreforçar que co~itnbuírani. i 
as ações transculturadom. I 
1 
228 ANGEL RAMA 
cas, que assumiram a funçáo de simples reitonas. Do rtiesmo riiodo, a situa- 
ç2o teve diferentes consequèncizs, conforme a época: na década de 1930, eiii 
seu início, as áreas culturais da América Latina permaneciam incomunicá- 
veis e deviam enfrentar o impacto exteino com seus isolados redutos n a d e 
nais;vinte anos depois, já estavam funcionando circuitos de integrdçáo que, 
no caso daIiteramra, permitiram divulgar a versão poitenha da moderniza- 
çáo m e d i t e livros e revistas. Por último, seria preciso riconhecer as diie- 
renças nos impactos e em suas transmissóes dentro do corpo nacional. No 
caso do México, foi muito forte a incidência externa na cultura dli capi- 
tai, mas além de se tratar de uma formulaçáo já transculturada ativamen- 
te, realizou uma transmissão interna frágil por causa da rigidez das encra- 
vadas estrnmm culturais regionais. Na região andiia se regisuam um caso 
semelhante, mas com comunicaç&sintemas mais raras, porém com efeitos 
mais desmtivos. 
A suposta unidade da cultura modemizadora op-, por outro lado, 
a pluralidade das culmras regionais, às quais pertenceram os diversos escri- 
tores do pmcesso: isso nos dotou de uma série eqdente de soluçiies que, em- 
bom manifestuidw em um esquema conflibloso semelhante, mbém mpon- 
deram às singularidades que justamente tentavam salvaguardar. Avariedade 
dos resultados comobora o triunfo da luta oravada, visto que nos repôs a carac- 
! teríshca ~ n y ~ d d o m a p a d a u a l latirioamenw~em um n m níxc1.ee.m- 
uma nova instância de sua incorporacão àes tn i tu~identaL-- 
Nesse mapa cmzams;,$as $h-, orientadoras que o organizam: uma 
i que ....... poderíamos con~ider~orizontal~talmanifestase no espaptempo o G p - -5 
I . .... do pelas sociedades (comunidades edígenar;, regiões agropecuálias, cidades, ._ ---- , espaços nacionais etc.) e outriyerticd,kue as atravessa segundo configura- 2,. ~. 
~ õ e s socioeconômicas, impòndo.ã<é&dena@6 ... do mesmo espaçotemps.de 
qualquer uma dessas sociedades, segundo a pirâmide socid, o tipo deocu- 
-. . . . . .- .......... 
pação e trabalhos etc. Embora náo caibãmçar aqui esse n:apa, convém aler- 
tar sobre a equipara@o que & faz de sociedades e culturas, visto que se apela, 
fundamentalmente para cuímm rurais, nascidas de práíicas agropecuárias - . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 
e formadas dentro de estruturas sociais pouco desenvolvidas, com um peso 
uatlicioiiil capaz tlc iiiil,iegii;ii- os dil~:i(:riLes grupos sociais que as coinpóerii 
e iiicliisive deteiniuinr os iiiodos de vida de pequenas cidades regionais". Isso 
aproxima uin lugarejo do intefior do México, um mineiro do Brasil, uiili; 
torâneo da Colômbia ou um sermo do Peru dentro de normas culnirais s e 
melhantes, emboiíi em cada caso haja elementos específicos que os distin- 
guem uns dos outros e sobi-etudo haja também diferencas notórías no tipo 
de contlitos cultuiais que vivem. 
Poderíamos classificá-los em três categorias, levando eni conta seus 
graus de intensidade e suas capacidades, historicamente demonstradas, 
para enfrentar urna iiiudaii$a c o - r + ~ ~ ~ ~ ?e, o de soluçáoa 
mais incerta, está ligado ãvelha e esclerosadacompartimentaçáo . . . . . . entre as 
. . . . . . . . . . - . . . . . . 
culhras indigenas autóctones e as de dominação provenientes . . . docohqu& 
tador espanhol, que, como se sabe, atingem seu ponto de máximarigidez 
na região andiia (Peru, Boiívia, Equador), embora também se manifestem, 
dentro de formas un1 pouco moderadas, em outras zonasde indiieniqáo , 
(México, Guatemala, Paraguai). Distingue-se pela Xgidez cultural: das 
partes em confronto, o que impediu a integração. Mas ao mesmo tempo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 
serviu para conservar em estado de latência uma herança ind(gena.,que se .. - 
apón na Iíngua e nas crenças e se estende agíltiplos p r ~ d u ~ o s de a,ne e 
literatura folclóricos, embora sempre restrita, sem possibilidade de expan: ... ....... 
dirse criativamente. /" 
+ 8 É de tipo diferente o confiito proposto entre regiões interiores, es- 
quecidas, que tiveram conjunturas favorávek em outra época para elabo- 
14. \iCr a tipologia proposta por Chai-ler Wagley e Manin Hams ("ATipology o€ 
Latin American Subculrures", America" Anllirop~Io~y, LVII (3): jun., 1955) 
que, apartir dadistinGa entre sociedade e culmra, estabelecem nove tiposdr 
suhculriiras que se ordenam eni xis grupos: 1. Indicçnas bibak 2. Indígenas 
modeirias; 3. camponesas; 4 e 5. P!annção de ençenhoe plantação de Fábrica; 
6, citadiiias; 7., 8. r 9. Classe alta ii~erropolitana. classe niídia metropolitana e 
proletaiiado urbano. Como adrniten~ os autores, várias se sobrepóem nas 
difrrentes coordenadrs a que respondem (raciais, sociais). o que exigiria n o 
vas subdivisões assim como o registro de outros tipos equivalentes, como a 
subculnira da pecuáiia. A ausència niais nocivel é adas culiuras de populações 
marginais que não podem ser equipadas com o proletariado urbano. 
I 228 ANGEL RAMA 
~a rçuhras i cas ,que no entanto cão pudeixm.fazi-Ias progredir por di- 
I 
..- 
versas razões e que se tornaram zelosaspa~d.i.%.d~.uma tradição mestiça, -. . . - 
bem como de muitas formas arcaicas que nos c o n d u z e m ~ o s renio- 
, . . . . . . . . . . . . . . ,.. 
tos europeus e aos centros modem~ados~queês ' r egem~sóG-S , tE~ro - 
9,. 7 
tetoradofrouxo, que mesmo assim proporcionani a acnlturação:Um ter- 3 
1 : I ceiro tipo correspoiideria àquelas regiões que aparelitemente pertencem 
As mcsnias coníi~urações ~iil~urais de suas.capitais.nacionais, embora con- 
L/ .- - - . 
sçrvando em esu&.cmtcrionário e nas camadas babm da sociedade forms 
. . . . ... 
culrunis que nào se traduziram em criações arústicas fidedignas. E ~ a i i.~- 
-._<_I_- - 
gioes reconheceni progressivamente sua identidade e, ao mesmo tempo. o 
1 i estado de submissão às normas alheias sob o pretexto de educação unifi- 
I ! cadora nacional, na mesma medida em que ocorre dentro .delas um desen- 
volvimento econômico ou uma aceleração social ou um movimento centrí- 
peto que as afasta da direção das metrópoles. 
Não se pode dizer que algum desses conflitos seja novo. Uns são tão 
antigos quanto o chamado "trauma da conquista", que in- 
por excelência entre a cultura européia (hispânica) e as americanas autóc- 
. . __._L--1_.___ 
tones; outros, como o correspondeiiieãã@irr~ç30 exerc~c&~el-- _ ,..._.........i -.-.-.-- . ,. . ' . - 
quis liberal urbana sobre as comunidades regiopn.+.sf_ojadas no.soio-da . - 
.. . _ -, XI)I...-----~-.-- - ,.___..__._."-C-- 
--época colonial, . ,. tem . . - . na.0 menos de cem-igo_Poxtanto, trata-se da revivei 
c ê n t i ~ ~ k u l 6 ~ l i c i d a d e de atritos c"ltutais q u ~ ~ ~ b ~ è % ~ i ~ ~ f ~ t i i i i i i - 
ao se dar o impacto modernizador posterior à Primeira Guerra Mundial e 
que, em cidades e portos, anunciou o progresso e injetou a tecnologia Não 
foi senão uma reiteração de impactos já registrados na América Latina 
como conseqüência da expansãoeconômica mundii, embora em um ní- 
vel muito mais agudo. 
Portanto, se, salvo suas bases mais intensas, essa reiteração do conflito 
L ... 
não é novidade, por outro lado, a qualidade das respostas que lhe foram ror- 
- .. . ~ . . . ~ .~ .. . 
i muladas o é. 
! O aparecimento de teorizações do regionalismo, como as - que orga- 
nicamente se expressaram no . Primeiro . . . Congresso . ., - Regionaiiista . - realizado 
. . . . . . - . . 
no Recife (Brasil), em 1925, e cujo manifesto fora redigido por Gilberto 
OS PROCESSOS DE TRANSCULTURACAO NA NARRATIVA LATINO-AMERICANA 229 
~re~re ' : é uin indicadordo desenvolvimento de forças autônomas capazes _ .- 
de oporse à dominação culturalmente homog-eneizadov, que as urbes ,-r --C -o->- L.--- 
----, . . 
desencadeiam, tendo motivado no nível político e econõmico tendencias y7~ --.. ~ . -. - . -. 
separaustas que foram racionalizadas em termos ideológicos no plano pa- 
de10 da cultura. Em áreas aparentemente submersas, destinadas a ser de- 
voradas pelos processos de acnlturação, surgem grupos de pesquisadores, 
artistas e escritores que reivindicam os valores locais e se opõem à ind!s- ... . 
criminada _ submissão _. 2ue _ Ihes _. - - . é . exigida. ... O citado protesto de Arguedas 
não'será diferente do proposto porJosé Lins do Rego, no Brasil, dentro 
do gnipp s do Recife, embora sejam diferentes as soluçóes estéticas a que 
chegam. 
4- 
Se o aparecimento desses intelectuais testemunha um certo desen- 
volvimento regional de neoculturaçõe~,com perfisp+p.nos, capazes de 
diispo'rese surplusdestinado a manter uma camada social educada e es- 
. 
p<_i-zada que as dotará de interpretações teóricas e estéticas, também - -. - .- - - --- , . . 
testemunha uma intensificação dos co$flitos com asmefxópolesmodemi- 
zadas. Porque no mesmo momento em que chegaram a gerar um setor in: . .. ~ 
telectual mais c a p a c i t a d o , - s a p a z d e ~ ~ g m p ~ s d a r , . ç a p i ~ & , esces 
realizam um vert iginnogresz(dentro de suas eshuturas dependeiites), 
graças à incorporação da tecnologia ...... .. . ocidental.qw.~tomam&~d~igual -. do 
que antes a relação entrespartes, e maisexigente a demandade submis 
, . .. - . . . . - . . . . . . . . . . 
~õ l iõ i í i~~en&adora . A história contada ~ G d e IkStrausslQa cons 
tmção no Brasil de uma linha telegráfica até Cuiabá, paraconsegiiir a co- 
municação interiorna, e que foi inaugurada depois de árduas façanhas em 
1922, data da descoberta da radiotelegrafia (sem fio) que a tornava obso- 
leta, ilustra a aceleração do processo modernizador e os correspondentes 
deseqnilíbrios. 
15. Dcscle sru primeiro texto, O Mznifisro Reçion~IisIa, Recife: 1926, Gilberto 
Frkyre rem freqüentemente desenvolvido seu pensamento s o b o o tema. \ler 
uma das últimas versóes eni sua apresenta~ão do número da revista Dioge- 
nrs (Paris, 43: jul.-set, 1963) dedicado aos 'Problèmes d'Amérique Latine". 
16. Cl;iu<ir LéviStr~iuss, Trislrs Ti-qiqocs, Paris, Plon, 1955. 
230 ANCEL RAMA 
J 
A mudança de níveis e& que vinha se situar o enfrentamento roi pei. 
cebida porJosé.Carlos Mariátegui, levando-o a rever o conceito de região c 
o conteúdo ideológico que correspondi ao regionalismo. Para isso, tratou 
de dissociá-10s das propostas tradicionais em que se opunha administnçáo . . 
local a adminwção cenrrale se.debatia a questáo sob as espécie? de fede- 
raiiimo e unitarismo, como no ... século .=, demonstrando que nesse plano 
. . . . . . . . . . . . 
se tratava de um falso dilema que encobria outro, real, em que a região era 
um complexo s o u d t u d submetido e o regionalismo readquiria seu vigor . - 
ao redefmir-se como um moWn.e.nto.social, intijrpyete . . . de uma classe. Por 
... - 
isso, para ele "os n o p regionaüstas Go,sobretudo, indigenistas'"? Esse novo 
regionalismo, que no Peru contagiou uma geração inteira de intelectuais, 
que se agruparam na revista Amaut?, fundamentou-se na situação de isola- 
mento e de sujeição em que se encontravam várias regiões internas do país, 
com sociedades que ao longo de séculos tinham desenvolvido normas &tu- 
n i s próprias. 
Sua formulação teórica tornouse estritamente contemporánea da@ .. -< -.. .. -- 
sistemática que a modemidade começa a exerceFd--i& e a par- 
I_---.. ./.~ . .... ~ . .-*-- . -..> 
tir dos interesse2e __ nelas residiam, para wspor tar às regiões do interior .- . . -- ... , -. .- ---, , _--:;..:-v-- 
seus sistemas econômicos, que implicam a unificaçao .... sob sua égide e, po r 
............ -- ........ 
tanto, a total subve~sio.dosvalores . . . . . pelo menos ...... do modo como 
eram percebidos por Mariátegui. A h t a anos de seus textos programáticos, 
um escritõr e emólogo, ~ o s é ~a r í a&~uedas , podia comprovar que "o mo. 
vimento Arnau& coincide com a abernua das pi imei~~~@-&"'s que iriam .. ~ - . ~ 
se transformar nos reais e poderosos caminhos da modernidade, embora, 
considerando muitas de suas conseqüências, não fossem os mais satisfato- 
nos para o harmônico progresso regional. Porque essas conmbuições de uma 
nova tecnologia vinham dentro de um sistema econômico de exploiaçio, o 
17. José Carlos Mariáteyi, Tegionaii-mo y Cenuaiismo". In: - . Sicfe f i l - 
szvos de Iner~recauOn de Ia Realidad Pernana. Lima. 1928. 
18. J& ~ a i í a ~ r b e d a s , "Josi Sabogal y Ias Artes Populares en e1 Peni", FoIMoia 
Ameriano, Lima, 4 (4): 1956. 
si 
... -- * ~ . ..,. .., 
OS PROCESSOS DF TRANSCULTURACÃO NA NARRATIVA LATINO.AMERICANA 131 
~ - .. .... 
qual reforçavam e cujas expressões culturais aisumiam uma fuiição destmi- 
.. ~ donsemelhante. Qualqiier análise inetbdica dos planos reçionaiistas de tipo 
económico pel-mite conipromr essa merção19. 
Ma? o conflito, em sua etapa inicial, contou com escritores que o iii- 
.~ 
. s 
; . terpretaram de um lado a outro, quer p'o; me& de construçóes artísticas, . .- . -- . - .. 
w 
quer mediaite fnrm~lãçi5ei~tióricas, trama&.um campo .~ de íõF@ince- 
~. - ...* 
.- 
.:... 
lectuais que a América Latina nunca conseguira até então. Isso impediu - . -. --- ~ . -:g; 
'F.. que se pudesse instairar a política de terra am$ada, .. que. ............ -época da . Coii- s: .-- :<. .-. ...= -. .... .quista - .~ . haíiãprohp<do ..................... um a~têntico.g~nocídianil@dAPropiúandP que . .~ 
-. 
_il essepeodo ............ fosse revisto retrospectivamente......... .. - dotando-nos pela.prinnein 
vez da 'toz dos vencidos" e de um grupo de protetores que depois de qua- .. . 
7 tro séculos r e t o m a n m a ~ f - a ~ í g e n a P O ~ 
--- 
Dentro desses grupos intelectuais, coube tareíi relevante aos escritores, 
. herdeiros das estruturas que, nos primeiros trinta anos do século XX, os 
. . 
19.09 ~I;i<los mais recrntersobre os desequilil>rior ecoiiómicosrnvc as rcgiòrsda 
.'zj AniGiicu Launa. confoiniç C<iniiss>o Econóniica para América Larina. L, s+ " .. 
% gunoi? Déuda de1 Desarro!Io de Ias Naciones ~n>das, lb Sessio, Lima, abril a, 1969. Uma consideiação geid do problema enconm-se em Walter B. Stõni; :& E/ Desarro/io Regionalen Améjica Latinu; ExperienciaryPeispectiws, Buenos :g ~ : Aires, SIAP, 1972. 
-3 20. Uma abundante bibliografia representa o reina, des~cando-se as contribui- 
% çóes niexicanas de Angel Mal-ia Garibay e Miguel Leon Porma (La Wsión de 1 10s Vmcidor, MCIico, Jouquín Mortiz) conin redescobiidores da literatum e t , filosofia dos povos indígenas e as connibuiçóes andinas de Jesus Lara e Jose 
Maiia Aryedas. Unia antropóloga, Laurette Sejourne, tem oferecido unia ^ I 
L, .. > fundamentação recente para as alrg.~óes em favor dos índios ( A n u p a s Cu/- 
'-1 ruiasP,-ecoIo,nLinas, Madri, Siglo XXI). Na mesma linha há o livro de Nathan 
Î Wachtel, La visjón des vaincus. Lcs Indiensdu Péroodevanila conquéfeespag- - 1 
:.I riole, Pai-k, Gùiiniard. 1971. ConvCin ressaltar uma afimação de seu prólogo: "k preciso espcl-ar os tenipos contempor2neos, o íim dahegenioniaeuropéia r 
! 
os movimentos de descoloniza~ão, para que o Ocidente adquira conxiencii 
i de que as driiiais sociedadrs tarnbeni existem, ou seja, que tem sua históii;~ riarúcular, que não semr necessarian:ente os ~assosdo niodelo europeu. Coni - 
o avanço das cièncias ano-opolóçicas, sociollgicas, histórias, o mundochama- 
do de 'subdrsenvol\i<lo' (em rrlacão ao Ocidente) r m e en> suaoricinalidade . ., " ! rçoniplcxiil;i<ie: oçanipo <iascièncias hunianassofre uma raiiavolra no a i r o 
rutoccnu-isnin". 
232 ANGEL RAMA 
romancistas do regionalismo haviam consolidado. Começam tomando cons 
ciência dos problemas de suas culturas, fazendo que suas obras disponham 
de uma base crítica e de nítidas opções culturais. Entre eles houve os per- 
tencentes à maior criatividade artística do continente, embora seja possí- 
vel suspeitar que a problemática que atacaram agiu como um incentivo da 
criação e que quem venceu o desafio obteve um dividendo artístico propor- 
cional ao esforço realizado. 
A essa conscientização acrescenta-se a fidelidade ao meio natural e 
social, o que nesse momento passa a ser também uma opção artística. Nesse 
período a urbanização devora a literatura, forjando a inverossímil idéia de 
que na América Latina só existem grandes cidades caóticas, com públicos 
ávidos de se verem refletidos na literatura. Além disso, a crítica põe em cir- 
culação critérios __~_- ._ classiíicatórios que opõem nar@tiva& &n arrativa 
urbana, 550 só estabel%mdo_umagi,$$~~máh-~~~peficial (de esc- 
como sugerindo uma hierarquiade-tétic~ e axi? 
a qual seria superior a narrativa de temas urbanos. . Contra 
, 
. - . .... 
pmcipios, os escritores da kqsculturaç5.0 
e viiarejo - 
. . 
do sertio, os adormecidos povoados tropicais da costa caribenha, as aldeias 
empinadas da serra peruana ou os abandonados casarios do planalto me- 
xicano voltem a ser partes legítimas da América Latina, com autenticida- 
de e vigor. São os "particulares" que encadeiam a narração, os que voltam 
a ser animados pelos "particulares" da própria realidade. Evitando o este- 
reótipo foldorista ou crioulistasuperficial, esse apelo acrescenta uma cen- 
telha à escrita, como a que só nasce de uma apreensão viva do real. 
,-- 
i Essa fidelidade ao meio completa-se com uma fidelidade à cosmovisão 
: cultui-al, porque não se trata de ulilizar palavras que reflitam.objetos concre- 
j tos nem estruturas sintáticas que Gduzam !ocuções expressivas peculiares, . - . . . .. . 
?' m& dè re&%stniir, com abundante utilizaçãodo universo lingkstico de uma 
-7 , . ... 
cultura, a cosiovisão que esta conseguiu &ar e que é a que mantém uni- 
. . . ~ 
dos e tensos os elementos que compõem seu sistema. 
:. . . . 
Nesta área o 11úme:-o de escritores í aniplo, muitos são pouco conlie- 
cidos porque ficaram circunscritos a seus campos de trabalho, porém qua- 
tro são de menção inevitável, e sobre suas obras estende-se este discurso cií- 
tico: José Maria Arguedas (1911-1969), Juan Rulio (1918), João Guimarães 
-- 
Rosa (19081968), Gabriel García Márquez (1928), tendo os quatro leva- 
- do a fundo o projeto transculturante. impondo no estnto universo artis- 
.- .- 
7~ .- - - rico obras fundamentais que estio irrigadas pelos d o r e s desuasculturas - - .. . . , - .~ - regionais. - ---- 
'r 
j: A eles cabeiia acrescentar, por algumas conuibuiçóes parciais que p e - 
;P: 
. , ;. dem ser extraídas da pluralidade de orientações narrativas que os distin- 
I . - , ~** 3.. guem, o paraguaio Augusto Roa Bastos e o haitiano Jacques Stephan Alexis. - 
.-~ .. .+L+. -..e,,. Embora ambos tenham fnbalhado principalmente na narrativd s d , par- 1 .:=moi .+, ticipando juntos dos processos de moderniza@o, que em um caso responde- 
$9. ' . *&' 
. ..-. ~'."?. 
S.. 
ram ao wguardiimo portenho e em outro ao surrealiimo fi.ancês, não dei- 
.@: ::zs ..-. >;aram de aproveitar a lição das culturas populares de seus respectivos paí- 
-.. ses, integrando alguns de seus elementos em seus romances. , 
i? . -~ 
. g; Essa seleção crítica pode ser confirmada mediante outra, feita por 
-:;; um desses mesmos escritores. Trata-se de Jos6 hlaría Arguedas. que pode --- . .. 
-3 ~.-. ser considerado o melhor sismógrafo para registrar essas peculiaridades 
7c z * - culturais. Em seu polêmico "Primer Diano"', de seu romance póstunio E1 
~CZ.1 
,Z~. 
Zorro dehriba y elZorro de Abajo, fiz uma ardente proclamação de fé 
9 
I:. provinciana, opondc-se ao suposto universaliismo que caracterizaxia, segun- a; 
g do ele, outros escritores latino-americanos e descobrindo, corretamente, 
= ... 
'Si - que esse novo princípio, na circuiistância histórica que estava vivendo o .g i 
=. -. ~ continente, traduzia-se na adoção do "profissionalismo", coroando o prc- - e. 
3. x~ jeto que os "modernistas" hispano-americanos haviam adotado no fim do 
-, . . I 
.*i .. . 
século XIX. Arguedas declaia-se antiprof~sionaliista, como o já haviam fei- 
i. ". : * ' 21. O *Piirnçr Diano", escrito enwe 10 r 17 de maio de 1968, foi publicado ori~i. 
+ 
. t . . 
-S. 
nalniente eni Ainaru, 6 , abi:-jun., 1968. 
... 
.. . - 
234 ANGEL RAMA 
to, de um modo ou de outro, os escritores que ele considera seus iguais, 
os membros de sua família narrativan. Além de criticar o "universalismo", 
por se tratar de outro tipo de provincianismo, daqueles que não se ousa 
dizer o nome, - no que vem a coincidir sem saber com os europeus, que 
começam a abandonar a concepçáo eurocêntrica da culturaz3 que servira 
de base para a mta construção reinterpretativa do universo, cuja decre- 
pitude Paul Valéry anunciara muito antes -, Arguedas passa a estabelecer 
semelhanças e diferenças nesse modo obscuro, intuitivo, cerieiro, coloquial 
e até próximo com que observa a realidade. 
Escolhe como seus congêneres, entre os escritores latino-americanos, 
Juan 'ulfo, Gabriel García Márquez e Joáo Guimarãies R d ~ a (parcialmen- 
te também Juan Carlos Onetti), considerando, mais ,que semelhqças esti- 
Iísticas ou preferências temáticas . . . os . . . . componamenros - . . humanos em que per- -.-.. -.--- - 
cebe cosmovisóescultumi~m. Simultaneamente, estabelece disfincias 
. . . -. . . - -. . 
máximas com escritores como~ulio .. . . Cortázar e Catlos Fuentes, . ...-- em cujos 
"universalismos" seria possível dizer que vê um,perigo pessoa4;'urn que* 
tionameuto de seu equilíbrio interior e distâncias médiascpm , . Alejo . . . . Car- . .. 
pentier e Mario VargasLlcsa, noS quais reconhece inclinaçáo e interesse 
. - 
por seu meio provinciano, embora a partir de posições que $osao estri- 
tamente as de um integrante. - 
Não creio que se tenhaequivocado em uma sele* aque é possível che- 
gar, sob outro ângulo, mediante um estudo racional das obras de arte des- 
ses escritores, e é compreensível, embora não necessariamente c o m p d h á - 
vel que, visto que fala de dentro de sua circunstância cultural e em um pe- 
22. Nasescritores mencionados porAnpedas se observa um certo dismciamento 
do conceito de "profissional" liteiáiio. Se Guimarães Rosa viveu na diplonra- 
cia, longe da vida intelecnial, se García Márquez por vezes anunciava o aban- 
dono das leuas por faltade interesse e de assunto,juan Rulfo fez de tal atitude 
unia defini<%: nTo soy cscritorprofesional -ronindanienle-simple atíciona- 
do" (In: LosNarradoresAnreelPúb/ico, México, Joaquín Mortiz, 1966). 
23. Aessa conclusão chega Hans Magnus Enzensberger analisando expansão da 
Poesia Moderna". In: - 
J. renovaGo poética do século XX em seu cnsaio "E1 Lenyaj niverul de la 
. DriaIIcs Barcelona, Anagrama, 1969. 
OS PROCESSOS DETRANSEULTURAÇ.~~ NA NARRATIVA LATINO-AMERICANA 235 
nodo muito tenso de suavida, não possa reconhecer as conu~ibuições artíç 
tics válidas que eni seus respectivos cz.mpos davam os escritores de quem se 
dismciavaz". 
Nas principais o b m desses quatro escritores (Los Ríos Profundos, Pe- 
dl-o Páramo, C~ande Sertio: E~-co'ns, Ceni Anos de Solidáo) passamos por 
momentos dos diversos conflitos culturais, segundo a típologia indicada. Ar- . . 
guedas expressa o conflito andino que continua testeinunhando o drama 
que dá n-dscimento à América Hispânica ao sobrepor-se uma cultura cciden- 
tal sobre outra, autóctone, que foi se enrijecendo e . se ~ restringindo, situação- 
inicial que volta a se repetir ao longo dos séculos sem excessivas mriações, 
- . . 
com maior aspereza, como se fosse possível. Em outra etapa, mosua-nos o 
~ ~ . . . . 
..+ . conflito cultural mexicano, porque ali um setor majoritário da população, 
-, .-. I 
3 i;! com predominante assentamento iural, passou por um processo de miscige- . % - . . r 8 nação que reuniu de forma conuaditória elementosdos m o s indígena e w 
i- : panhol, porém forçosamente da p e n p e c h do trauma sofrido. Por intemié- 
g~ ': 
3 ~ " c , dio da política agráriada revolução mexicana (Cárdenas), esse setor pôde rez- --. 
g~ 
~- f? l i i r progressos relativos onde se afirmaram singularidades culturais novas, q ~?7 .- mas sua dependência e retraimento foram ampliados pela expansáo indus- -- 
~ : r $rial da burguesia urbana das últimas décadas. Outra é a situação das sub 
.r cultumque configuram o vasto continente bmileiro, das quais a comespon- ... .. 
dente ao serfio pode servir de exemplo: em um verdadeiro isolamento, mas 
aproveitando os ocasionais momentos de esplendor que, em decorrência das . 
vaiações da demanda econômica externa, são produzidos nas diferentes áreas 
latino-americanas (caso de Mias Gerais), puderam ser desenvolvidas neccul- 
turações originais mediante processos sincréticos dos quais participaram 
... 
diversas emias. As variações assindadas na demanda estrangeira foram abm- 
24. A infausta polêmica que seguiu ao texto de Argiiedas, cncre ele eJulio Cor- 
&r. vartia desse rauivoco: anibos uatavani de distintas cosmovisóes culm- . . 
tais. pl-ovnvelnienu as mais oposiis que esistiani dentro da Anicrica Latina, 
unia representando o centro de modemiza~ão, Uuenos Ai i rs , e a o u m unia 
cultuia indígena peiuana. Cuiiosaniente eiani dois homens, muito mais do 
que imaginavam, destinados a se coniprrenderem, pois há em Julio Cartazai- 
uma revisão incessante dos mesnios valores dr sua cultunorigináiia. 
I 236 ANCEL RAMA OS PROCESSOS DE TRANSCULTURAC*O NA N&RRAT!VA LATINO-AMERICANA 237 
doiiadas, ficando então para trás dentro da própria nação, e é a partir de 
! uma perspectiva cultural integrada, orgânica, porém arcaica em relação a 
I ouuris áreas do país, que enfrentam a nova onda de expansão modernizado- 
i ra estahelecida em São Paulo. Por último, seria necessário considerar a pe- 
! 
! 
1 culiar autarquia das I-egiões que compóem a área da Grande Colômbia*. Sua 
I : displicen~e submissão às imposições de suas metrópoles internas diimulou ~- 
! por nuito tempo as singulaiidades culturais de cada uma delas, assim coino . . 
i seus desenvolvimentos desiguais. Contqdo, não deixou de persistir um con- .-. 
! .~. flito entre a zona costeira (correspondente ao complexo fluvial-mineiro, ! .-. 
I ," - 
! negróide) e as zonas altas que se distinguem por um comportamento tipi- - 
i -- .*e. camente andiio, ou seja, de despótica domin*o hispânica sobre comuni- ,& . i :?s .. 
i 
dades indígenas não integradas, nesse caso drasticamente aculturadas. Ao .;$& . :: 
estender esses mesmos princípios de dominação às regiões do país caractc .-Ez : ~ >, 
1 rizadas pelo que se poderia chamar de conformação culturai antilhana, nas *.: ... '!W ,-- i quais as contribuiçóes &canas e multiplamente européias tinham colaboia- .=i: : 
4 1 !.it: do para neoculturnçóes diferentes, e, ao se produzir em I& regióes desenvol- : - . 
! 
vimentos paroais de $o econômico, gerou* uma resposta rebelde às preten- ! 
i z z ~ *Pi i 
sões hegemónicas, com reivindica60 de seus próprios valores culturais. r- ! 7 , 
! . - Tal instalação cultural não pode fazer das obras mencionadas meras 
4 =. 
i .. ilusmções amenas de conflitos regionais. Seus autores tmbalhamn com uma ... 
i I i ._ __ . ..+ . . ~ 
i intenção fundamentalmente artística, embora não tenham deixado de con- .- 
! . . . ~ ~ ~ 
tribuir ocasionalmente pari pmpósitos políticós ou sociais rei~dicatórios. -, .. . 
.. .~ 
A autonomia desÜas obras deve ser reconhecida sem reticências, mas .~ .. em ~ vez . 
de transportar seus textos, como é habitual nacritica literáiia, para o p l ~ 
a no da intertextualidade da literatura, seja latino-americana, ocideug,,ou 
universal, aqui se pretende mantê-ios ligados a uma intertextualidade que 
. . . . . - . 
náo E proporcionada pela cultura, mediante a multiplicidade de contribui- 
cães que váo dos elementos foldóricos aos repertórios da tradição oral ou a 
considerável massa de escrita em que a literatura uivial está no mesmo ní- 
* Grande Colômbia: república formada no Congresso de Angostun pelaVene 
auela, Colômbia e Equadoi-, eni 1819, deixando de existii. em 1830. 
vel dojornalismo, do romance e da poesia não Iiieiarquizados aliisticarnente, 
do discurso religioso ou político. Dado que toda operaçáo crítica iniplica ;i 
transferência da ohra para um deteminado canipo (necessariamente verbal), 
cujas coordenadas permitem revi-10 e interpretálo, a opção de um cmi- 
po cultural no qual náo se estabelecem prévias distinções estéticas ou axiolh 
gicas é tio válida, embora talvez mais legítima, quanto a opção retórica de 
inserir a obra em um circuito fechado, composto por criações de seu tem- 
po ou gênero. Essa intertexddade está intimamente enraizada nas percep 
ções culturais da sociedade que a criou e manifesta, de uma maneira deci- 
dida e espontânea e com elementos muim vezes fkigeis, que a camada baí- 
xa da sociedade possui sua cosmovisão. Ter reconhecido a existência e a im- 
portânciade'se material i: uma das particularidades deses escritores que te% 
temunham seu processo de enraizamento nas culturas internas, voltadas para 
suas origens e substâncias da América Latina, porque só um contam muito 
estreito com seu funcionamento podia permitir-lhes dar atenção a elemen- 
tos lingüísticas e literários carentes de valorizção artística. E ao mesmo tem- 
po, só uma percepção estética renovada que vinha da modernimção do con- 
tinence podia autorizá-los a recompor sobre aqueles elemento's um discurso 
superior que se confirmava e enfrentava os produtos mais hierarquizados de 
uma literatura universal. Por outro lado, era previsível que as análises do tex. 
to literário da críticaestmturai, como as tentativas paralelas aplicadas à li- 
teratura comum, deviam contribuir parao reconhecimentodo campo cul- 
tural como aquele no qual se estende a intertextualidade e se f ~ a m as coor- 
denadas que permitem situar as obras de arte, em especial osromancesZ. 
Essa constatação, portanto, não leva à substituição daleitura especi- 
fica literátia por uma leitura antropológica, embora esta possa m e r conm- 
25. Charles Grivei regirtia o pmbierna na inuoducio n froduction de liTnt2ret 
Ronmnrsque. Un Étai du rcxtr (187&1860), Li,, Erciide Constituuon de sa 
TIiCoi-ir, Haia-Paris, Moulon. 1973. Diz ele: 'Une culture. ce qui se dtrobe 
comme culmre, de même que ce qui n'accède pas àce uue, esgc'est I'évidenct., 
un insuumentsocialrment eff~cace: le mman, lievparex~llencçdeson eapo 
sitiou, assume à n'en pas douter rale opérauonnel de preiiiier pldn". 
238 ANGIL RAMA 
buições parciais à análise. As obras citadas podem servir a aiiaopólogos e s e 
ciólogos como documentos sobre as subculniras latinc-americanas em unia 
determinada circunstância históiiu, inas nesse caso serio simplesniente suh 
sidiárias de outro tipo de discuiso ciitico, que não é o que aqiii se adota. Este 
situa-se no plano ardstico para decifrar a que contribuição estktica se clie- 
ga por essa via, qual a originalidade e a especiíicidade latino-americana que 
se refletem nessas operações. 
Poi-que essas obras, seria possível dizer, instalam-se ria intra-redidade 
.' Iatineamericana, cumprem a ingente tarefã de abarcar elementos contrários 
a jas energias b i m canalizar hannonicamente, resgatam o passado e apos- 
i 
i tam eni uin futuro que acelere a expansão da nova cultura, autêntica e in- 
I tepdora. Sáo, portanto, obras que nos revelam o universo original dacul- 
i cura Iat inmencana em uma nova etapa de sua evolução. 
Nascidas de uma violenta e diástica imposição colonizadora que cega, 
não ouviu as vozes humanistas de quem reconhecia a valiosa aiteridade que 
descobriam na América; nascidas da rica, vaiiada, culta e popular, enérgica 
e deliciosa civiiização hispânica no ápice de sua expansáo universal; nascidas 
das esplêndidas línguas e suntuosas .... literanim da Espanha e Portugal, as l e 
-. --- .. -~ . . . . . . . 
tras l a t i n o - a m e r i c a n a s n ~ ~ resignaram com suas origensejamais se re- ....... -.-. . . . . 
c o ~ i c i l m m . c q m s ~ g . p ~ & ~ é ~ o ,.. 
Conhibuíram com brio -e não lhes faltaram razões - para a lenda n e 
gra, sein se deter muito no fato de que prolongamm o pensamento dos es- 
panhóis, que originalmente a fundaiam. Quase desde o início procuraram 
- . 
se reinstalar ........ em ouuas linhagens culiuiais, evitando o Vaqueduto" espanhol, - -- .. 
que na colõnia e12 representado pela Itália, ou o dassicismo e, d d e a in- 
. - .... .. 
* I'ul>lica<lo em T,-il~sc!rlt~i,acióB M<ir;lo'i.;i rn America &uni. México, Siçlo 
XXI, 1982, pp. 11-96.