Prévia do material em texto
DESCRIÇÃO Tipos e formas de memória. Os mecanismos de formação da memória. As memórias de curta e longa duração. A modulação das memórias. PROPÓSITO Compreender as modificações no conceito do construto memória ao longo do tempo e como memória e aprendizagem se relacionam para sistematização da prática docente. OBJETIVOS MÓDULO 1 Diferenciar os tipos e formas de memória MÓDULO 2 Compreender os mecanismos de formação da memória MÓDULO 3 Identificar as memórias de curta e longa duração MÓDULO 4 Relacionar algumas variáveis ambientais na modulação das memórias INTRODUÇÃO Você conseguiria imaginar a sua vida sem memória? Pense bem na função da memória. Antes de iniciarmos uma abordagem mais técnica e conceituarmos diversos tipos de memória, podemos parar e refletir o que seria de nossa vida sem a memória. Bem, considerando a evolução filogenética da nossa espécie (Homo sapiens sapiens), sem a memória não estaríamos aqui hoje. Para chegarmos até o século XXI, gradualmente, evoluímos a nossa forma de pensar e de armazenar informações. Por esse motivo, desenvolvemos tecnologia de acordo com a necessidade do ambiente e sempre em um continuum histórico de acúmulo de conhecimento. Sem a memória, nada disso seria possível: Há 800.000 anos dominamos o fogo. 8.000 anos atrás dominamos a agricultura. Hoje, temos smartphones e amanhã teremos robôs. Pense na memória, didaticamente, como uma cola adesiva, dessas que usamos para colar papel, madeira etc. A memória une o passado com o tempo presente. Essa união nos permite, enquanto espécie, evoluir. A escrita, adquirida cerca de 5.000 anos atrás, nos permite contar nossa história até os dias de hoje. Sem memória não existe acúmulo de conhecimento. Sem acumularmos conhecimento, não existe história. Sem nossa história, não teríamos a cultura, a arte a literatura. Se na evolução da nossa história armazenamos informações na pedra (Arte rupestre há cerca de 40.000 anos) , no papiro (2.500 a.C.) e depois no papel (150 d.C) , no sistema nervoso, armazenamos informações nos neurônios. Sem esses neurônios, nada do que contamos até aqui seria possível. MÓDULO 1 Diferenciar os tipos e formas de memória O PASSADO, O PRESENTE E O FUTURO VIDA É MEMÓRIA. DEI PARA PENSAR QUE TUDO QUE HÁ DE MAIS VIVO EM MIM FOI AQUILO QUE JÁ SE FOI. AS PESSOAS MAIS IMPORTANTES FORAM AS QUE FICARAM. (MEDEIROS, 2002) Em nosso cotidiano e em nossa cultura, as pessoas com grande capacidade de memória são muito valorizadas. Ficamos impressionados quando aparece uma pessoa em um programa de televisão capaz de decorar listas intermináveis de palavras, ou quando estudamos com alguém que demonstra grande capacidade de retenção de conhecimento e alta velocidade da aquisição da informação. Algumas pessoas são capazes de ler um texto uma única vez e reproduzir com fidedignidade as informações ali contidas. Outras pessoas apresentam maiores dificuldades para aprender. Os problemas de aprendizagem nem sempre estarão na memória, podendo estar também na atenção, nos níveis de inteligência e, obviamente, na história de desenvolvimento dessa pessoa, em seu histórico escolar, estilo de vida, alimentação, sono, estilo de aprendizagem, dentre outras variáveis. VOCÊ SABIA Existem atletas de memória competitiva que revelam o grande potencial do cérebro humano nos chamados esportes mentais. Ao mesmo tempo em que a memória é um objeto de interesse e empolgação, sofremos quando percebemos que a memória de alguém se esvai nas areias do tempo. Um filme que retrata essa angústia é Para Sempre Alice, com a atriz norte-americana Julianne Moore. A história é sobre uma mulher bem-sucedida que, aos poucos, começa a esquecer algumas palavras e a se perder nas ruas, sendo diagnosticada com Alzheimer. Na doença de Alzheimer, o presente e o futuro se esvaem gradualmente da consciência, abrindo lugar apenas para evocação das memórias do passado, até que nem essas permanecem. Trata-se de uma doença neurodegenerativa progressiva que resulta em deterioração cognitiva global e da memória. Tipicamente, os primeiros sinais e sintomas dessa doença são em prejuízos da memória. Fonte: Shutterstock.com Se, de um lado, nos empolgamos com os atletas de memória competitiva, no outro, nos entristecemos com as doenças degenerativas que retiram o que há de melhor em nós, enquanto espécie, que é a nossa capacidade de memorização e o uso que fazemos dela. A vida como conhecemos depende de conseguirmos ligar o nosso passado com o presente e, assim, prospectarmos nosso futuro, fazendo planos e sonhando com o amanhã. Se perdermos essa capacidade, teremos uma outra vida que, seguramente, será bem diferente. Memória competitiva Doenças degenerativas O cinema demonstra, ludicamente, alguns conceitos que vamos trabalhar neste tema sobre memória. Os filmes, muitas vezes, apresentam fatos que não reproduzem tecnicamente o fenômeno por um viés científico, em prol de um bom roteiro que objetiva cativar ao expectador, juntando fatos científicos e ficção. O entretenimento faz parte da proposta desse tipo de arte, mas o problema de memória como o retratado em Como se fosse a primeira vez, com os atores Adam Sandler e Drew Barrymore, está muito longe de ser uma comédia romântica na vida real. Esse filme demonstra, mesmo de maneira suave, como um caso de amnésia anterógrada impacta a vida do paciente e de sua família. ATENÇÃO A pessoa não aprende novas memórias após o evento que ocasiona esse tipo de amnésia, podendo ser por traumatismos cranianos, infecções no sistema nervoso, acidentes vasculares encefálicos, tumores, consequências decorrentes de cirurgias no cérebro, dentre outras condições que impactam o bom funcionamento do sistema nervoso. ATIVIDADE OUTRO CASO APRESENTADO NESSE MESMO FILME É O PERSONAGEM TOM 10 SEGUNDOS. VOCÊ PODE ESTAR SE PERGUNTANDO: É POSSÍVEL ALGUÉM TER UMA MEMÓRIA TÃO CURTA? OU FOI APENAS UMA CONSTRUÇÃO DE UM PERSONAGEM? RESPOSTA Infelizmente, é possível. Nesse caso, o filme apresentou um exemplo de danos significativos no lobo temporal médio do cérebro. VOCÊ SABIA Em 1985, o musicista britânico Clive Wearing, de até então 47 anos, desenvolveu uma condição de amnésia anterógrada e retrógrada e só conseguia evocar informações por poucos segundos, consequência de uma encefalite por herpes. Ele não é capaz de reter novas informações e vive poucos segundos por vez. Esse maestro britânico, porém, ainda é capaz de tocar piano e ler uma partitura musical, ou seja, a memória procedural para a música está preservada. Sem a memória não há como juntar o passado com o presente, ou seja, não existe o tempo na vida desse musicista. Mas, quando ele está na frente de um piano, é capaz de tocar. Isso é incrível, não é mesmo? Mesmo com imprecisões científicas, os filmes nos dão pequenos exemplos que nos permite não apenas imaginar, mas visualizar essa traumática condição de perda de memória. No filme Como se fosse a primeira vez, esses casos em que o passado, o presente e o futuro não mais existem nos são apresentados com um toque de humor, mas não há qualquer diversão nesse quadro para a família e amigos que convivem com alguém com prejuízos importantes na memória. A memória humana é amplamente tratada pelo cinema e pela literatura (científica e não científica), pois é um tema realmente fascinante. Na vida real, observarmos diversas manifestações diferentes dos nossos sistemas mnemônicos, no plural, pois não temos apenas um sistema de memória, mas vários. javascript:void(0) Fonte: Shutterstock.com A escritora Martha Medeiros, na obra Divã, conta a história de uma mulher de 40 anos. Em psicoterapia, a personagem relata (Declara) algumas de suas memórias, como o primeiro namorado e tantas outras boas ou ruins, que ela guardou por toda sua vida. A personagem evoca essas memórias de forma consciente e voluntária, data os eventos de sua vida, declara os acontecimentos. Em psicoterapia, algumas memórias escondidas(Suprimidas) , por conta do seu conteúdo ansiogênico ou pelo estresse, vem à tona. Mesmo suprimidas, em algum momento, ela foi capaz de evocá-las. ATENÇÃO Há uma distinção entre supressão de memória e esquecimento, pois jamais iremos recordar algo que esquecemos. O senso comum usa a expressão esquecimento de forma coloquial, e não científica. Embora o maestro Clive Wearing, cuja história conhecemos há pouco, ainda seja capaz de tocar piano, algo que ele aprendeu antes da inflamação por herpes, essa memória não é evocada conscientemente, pois ele não é mais capaz de fazê-lo. Sua memória declarada dura apenas alguns segundos, ele não tem disponível na consciência o seu passado para evocar e declarar. O que sobrou, após a encefalite herpética, trata-se de uma memória musical e procedural, ou seja, é automática, sem que ele tenha consciência de como faz. Podemos de antemão compreender que estamos falando de memória, mas de tipos diferentes de memória. Vida é memória, sem dúvida. A qualidade dessa memória e o seu correto funcionamento determinarão a qualidade da vida. OS TIPOS DE MEMÓRIA: DECLARATIVAS (EXPLÍCITAS) E NÃO DECLARATIVAS (IMPLÍCITAS) Fonte: Eva Blue/Wikimedia Commons/licença (CC BY 2.0) Brenda Milner, nascida em 1918, completou incríveis 102 anos em julho de 2020. A neuropsicóloga canadense possui um legado que nos permite dizer que está nos alicerces da fundação da Neuropsicologia clínica, além de uma produção científica robusta na neuropsicologia. É mais conhecida por seu trabalho com o paciente Henry G. Molaison (o caso H.M). Portador de uma amnésia anterógrada, ele é um dos pacientes mais estudados na história da Neuropsicologia e da Medicina. H. M. doou o seu cérebro para estudo post mortem. O cérebro foi mapeado em 3D após sua morte no ano de 2008. Um caso clássico da literatura no estudo dos processos cognitivos básicos, que evidencia tipos diferentes de memória, ocorreu na década de 1950. Trata-se do caso conhecido como H. M. EXEMPLO Henry G. Molaison (H. M.) era um paciente que sofria de um quadro de epilepsia não responsiva aos tratamentos da época. H. M. foi então submetido a uma cirurgia e teve a remoção bilateral de parte do seu lobo temporal medial, incluindo a amígdala e grande parte do hipocampo. Após a cirurgia, H. M. perdeu a capacidade de consolidar memórias de curto prazo em memórias declarativas de longo prazo. Investigações conduzidas pela neuropsicóloga Brenda Milner demonstraram que ele podia aprender novos procedimentos e ações. Dia após dia, H. M. se saía melhor em tarefas que envolviam ações manuais, como diminuir o tempo para concluir as atividades. Muitas das vezes, o próprio se surpreendia com sua perícia, pois não se lembrava, conscientemente, de que vinha treinando a atividade há vários dias. Toda vez que Brenda Milner iniciava uma sessão com H.M., precisava se apresentar, explicar as instruções das tarefas, objetivos etc., pois Henry não lembrava o que já vinha sendo trabalhado. Casos semelhantes ao de H. M. são vastos na literatura. Lesões em determinadas áreas do cérebro permitem aos neurocientistas e aos neuropsicólogos investigarem funções cognitivas e a localização de epicentros dessas funções no tecido nervoso. Paul Broca (1824-1880) também contribuiu para a área através dos seus estudos sobre linguagem. Fonte: Professor Laszlo Seress/Wikimedia Commons/licença (CC BY-SA 1.0) O nome hipocampo vem do seu formato curvado que lembra um cavalo-marinho (do grego: hippos = cavalo; kampi = curva). O hipocampo é um epicentro para consolidar memórias de curto prazo em memórias de longo prazo declarativas. Lesões no hipocampo, seja por acidente vascular cerebral, seja por ablação para tratar quadros de epilepsia do lobo temporal ou outras condições médicas, resultam em amnésia anterógrada. O paciente não será mais capaz de consolidar novas memórias declarativas, mas mantém memórias declarativas consolidadas antes da lesão. ATENÇÃO A aquisição, a formação e a retenção de memórias não declarativas não são alteradas por lesões no hipocampo. Fonte: Images are generated by Life Science Databases(LSDB)/Wikimedia Commons/licença (CC BY-SA 2.1) Respectivamente, plano sagital e plano frontal do hipocampo. AS MEMÓRIAS EXPLÍCITAS E IMPLÍCITAS CLASSIFICAÇÕES DA MEMÓRIA Existem diversas classificações das memórias. De acordo com a sua função (Memória de trabalho) , com o tempo (Curto e longo prazo) e com o conteúdo (Declarativas e não declarativas) . (IZQUIERDO, 2002) Fonte: Shutterstock.com COMENTÁRIO Memória: A capacidade de aquisição, formação, conservação e evocação de informações. Somos aquilo que recordamos (IZQUIERDO, 2002). Aquisição é uma outra forma de dizer “aprendizagem”. Quanto ao tempo, a memória pode ser separada em: Curto prazo (ou de curta duração) Dura até seis horas, tempo necessário para serem consolidadas em sistemas de longo prazo. Longo prazo (ou de longa duração) Dura dias, semanas, meses ou anos. Quanto ao seu conteúdo, a memória pode ser classificada em: Declarativa: São memórias que evocamos conscientemente. Podemos declarar aquilo que sabemos, ou seja, dizer que essas memórias existem, quando, onde foram adquiridas e o que significam. EPISÓDICA OU AUTOBIOGRÁFICAS SEMÂNTICA Não declarativa (implícita): São memórias que não evocamos conscientemente. São os nossos hábitos, nossas habilidades motoras, como andar de bicicleta, dança, dirigir, nadar, soletrar, perícia nos esportes etc. HABILIDADES E PROCEDIMENTOS Quando estamos aprendendo a dirigir, ou a brincar com uma bola, no início, precisamos nos esforçar para lembrar o que fazer, mas, aos poucos, os nossos movimentos ficam automatizados. Tocar um instrumento musical, depois de aprendermos a evocação, não é um ato consciente, pois o músico simplesmente toca. PRIMING (PRÉ-ATIVAÇÃO OU DICA) Memórias evocadas através de dicas. Ouvir uma nota e lembrar da música, colocar as mãos nas teclas de um piano e começar a tocar. É o caso do maestro britânico Clive Wearing. Ele não tem consciência de que sabe tocar piano ou ler partituras, mas quando está com as mãos sobre o piano e uma partitura, ele irá tocá-lo e lê-las. Essas dicas também funcionam em pessoas com a memória preservada. ASSOCIATIVA Respostas emocionais condicionadas, adaptadas ou desadaptadas. O condicionamento clássico irá ampliar nossa capacidade de reagir ao ambiente precocemente no desenvolvimento. Trata-se do reflexo condicionado. Aprendemos a reconhecer nossa mãe (ou quem nos alimenta) pelo cheiro, com poucos dias de vida. Uma música pode trazer bem-estar, gerando endorfina, dopamina, serotonina e ocitocina. Porém, também pode estar envolvida com as respostas de luta e fuga (respostas ao estresse), gerando cortisol, javascript:void(0) javascript:void(0) adrenalina e noradrenalina. O condicionamento clássico também é responsável por algumas aprendizagens desadaptadas, por exemplo, quadros de fobia e transtornos da ansiedade. SAIBA MAIS Há também outros tipos de memórias, as memórias não associativas, de habituação e de potenciação. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. UMA PESSOA ANDA NA RUA, PROCURANDO UMA CASA, MAS SEM SABER MUITO BEM ONDE FICA. DE REPENTE, VÊ UMA ÁRVORE E SUBITAMENTE VIRA PARA A ESQUERDA E LOCALIZA A CASA. QUE TIPO DE MEMÓRIA FOI UTILIZADA? A) Reflexo condicionado B) Priming C) Memória de trabalho D) Semântica E) Não associativa 2. UMA PESSOA SOFREU UM ACIDENTE DE CARRO E FICOU PRESA NAS FERRAGENS. AO SER RESGATADA E, APÓS SAIR DO HOSPITAL, PERCEBEU QUE NÃO ESTAVA SE SENTINDO BEM EM LUGARES APERTADOS. GRADUALMENTE, O CASO FOI PIORANDO ATÉ CHEGAR AO PONTO DE NÃO CONSEGUIR IR AO BANHEIRO DE PORTA FECHADA. QUE TIPO DE MEMÓRIA FOI UTILIZADA? A) Associativa: reflexo condicionado B) Priming C) Memória de trabalho D) Semântica E) Não associativa GABARITO 1. Uma pessoa anda na rua, procurando uma casa, mas sem saber muito bem onde fica. De repente, vê uma árvore e subitamente virapara a esquerda e localiza a casa. Que tipo de memória foi utilizada? A alternativa "B " está correta. Priming é uma memória não declarativa evocada através de dicas. 2. Uma pessoa sofreu um acidente de carro e ficou presa nas ferragens. Ao ser resgatada e, após sair do hospital, percebeu que não estava se sentindo bem em lugares apertados. Gradualmente, o caso foi piorando até chegar ao ponto de não conseguir ir ao banheiro de porta fechada. Que tipo de memória foi utilizada? A alternativa "A " está correta. O reflexo condicionado é uma aprendizagem associativa decorrente de uma associação entre estímulos. MÓDULO 2 Compreender os mecanismos de formação da memória ONDE FICA ARMAZENADA A MEMÓRIA? É incorreto fazer uma analogia da memória humana com a de um computador que mantém os dados armazenados em um único local, chamado de disco rígido (Hard Disk – HD). Muitas pessoas ficam em dúvida se o hipocampo é o “HD” do ser humano. A resposta é não! ATENÇÃO As nossas memórias são armazenadas nos neurônios em diferentes partes do cérebro, não ficando localizadas em apenas um único lugar. O hipocampo é importante para a consolidação de novas memórias declarativas, mas não armazena, como um HD de um computador, todas as informações. As nossas memórias são o resultado de nossas experiências, da aprendizagem que pode ser definida como uma mudança razoavelmente permanente no repertório comportamental do organismo decorrente da experiência. Isso é o que chamamos de aquisição. Existem tantas memórias, quanto as experiências que uma pessoa vivencia ao longo de sua vida. Fonte: Shutterstock.com Áreas distintas do cérebro, circuitarias neuronais específicas e diferentes, armazenam diferentes partes da experiência e assim, diferentes partes da memória. A complexidade das experiências determinará a diversidade de circuitarias e áreas do cérebro envolvidas para armazenar uma memória. COMPLEXIDADE DAS EXPERIÊNCIAS javascript:void(0) Por exemplo: comportamento verbal (língua), funções executivas, sensopercepção, emoção, inteligência, as características da personalidade, sistema de crenças, nossas ideias, valores e atitudes, processos homeostáticos e motivacionais, pensamento. Adquirir, formar, conservar e evocar uma memória envolve diferentes áreas do cérebro e diversas circuitarias neuronais: Fonte: Jkwchui/Wikimedia Commons/licença (CC BY-SA 3.0) Boa parte do que chamamos de percepção, como aquilo que é resultante dos nossos órgãos sensoriais (visão, audição, olfato, paladar, tato e a propriocepção), é processada nos lobos parietais, temporais e occipitais. Diferentes partes do córtex cerebral são divididas em áreas que chamamos de lobos cerebrais. Abaixo, vamos analisar os principais centros das funções cognitivas e apontar alguns centros de armazenamento de informações mnemônicas. Fonte: Shutterstock.com Lobo Parietal: Atua na percepção, na integração da informação somatossensorial (tato, pressão, temperatura e dor), processamento visuoespacial, na atenção, orientação espacial, representação numérica. No giro pós-central, localiza-se o córtex somatossensorial primário. Algumas informações que usamos para refletir sobre nós mesmos e alguns aspectos da consciência ficam armazenadas em estruturas do lobo parietal. Fonte: Shutterstock.com Lobo frontal: Atua nas funções executivas (tomada de decisão, planejamento, solução de problemas, raciocínio), controle motor voluntário, cognição, inteligência, na atenção, expressão da linguagem, na motivação. Área de broca (parte motora da linguagem), córtex pré-motor e motor primário são subestruturas do lobo frontal. A memória motora da língua é armazenada em estruturas do lobo frontal. Lesões na área de broca resultam em uma afasia motora. Fonte: Shutterstock.com Lobo temporal: Atua nas memórias declarativas (hipocampo), audição, processamento e percepção de informações sonoras, reconhecimento de faces e objetos, capacidade de entender a linguagem, processamento visual de ordem superior e regulação das reações emocionais. Fazem parte do lobo temporal a amígdala, o córtex auditivo primário, a área de Wernicke e os giros temporais.. A memória das informações necessárias para compreensão da língua (Wernicke) é armazenada em estruturas do lobo temporal. A memória do medo, em parte, é armazenada na amígdala. Lesões na área de Wernicke resultam em uma afasia da compreensão da língua. Fonte: Shutterstock.com Lobo da ínsula: O lobo da ínsula está “escondido” entre os lobos temporal, frontal e parietal. Tem relação com a memória gustativa e está envolvido na coordenação das emoções. Fonte: Shutterstock.com Lobo occipital: Único lobo que podemos atribuir funções específicas. Visão de: cor, movimento, profundidade e distância. Fazem parte como subestruturas as áreas visuais primária e secundária. A memória das informações visuais fica nessa região. A FORMAÇÃO DAS MEMÓRIAS ONDE FICAM ARMAZENADAS AS MEMÓRIAS Nossas memórias são formadas durante nosso desenvolvimento a partir das nossas experiências. Essas experiências são codificadas pelo cérebro e armazenadas em novos engramas sinápticos devido à plasticidade neural. A plasticidade neural é a capacidade de o cérebro desenvolver novas conexões sinápticas em decorrência das experiências comportamentais que vivenciamos. O cérebro irá se moldar quando estimulado por essas experiências. Uma memória procedural, dos hábitos motores, por exemplo, não depende do hipocampo. O epicentro dessas memórias é uma estrutura do encéfalo chamada de cerebelo. Embora o cerebelo seja um epicentro dos nossos hábitos motores, ele não é o único responsável. Trata-se do nosso sistema vestibular que é um órgão gravitoceptor (ouvido interno – sistema auditivo). SISTEMA VESTIBULAR javascript:void(0) A labirintite (inflamação do labirinto, uma das estruturas desse sistema vestibular) resulta, dentre outros sintomas, em tontura. COMENTÁRIO O cerebelo e o sistema vestibular trabalham em conjunto para manutenção do nosso equilíbrio e do comportamento motor. As informações necessárias para que isso aconteça estão armazenadas nessas estruturas. No cerebelo, temos a memória dos nossos hábitos motores, mas existem conexões e circuitarias neuronais, entrando e saindo dele. Essas redes neurais também compõem o conjunto de neurônios que armazenarão as informações pertinentes aos hábitos motores. Fonte: Shutterstock.com A propriocepção é o nome técnico que expressa o conceito que acabamos de descrever, ou seja, nossa cinestesia. Graças ao trabalho do cerebelo e do sistema vestibular, conseguimos nos manter de pé e em equilíbrio, movermos nosso corpo de forma adaptada e ordenada para atingir a um objetivo, como levantar e pegar um copo de água, digitar, escrever etc. ATENÇÃO Receptores sensoriais proprioceptivos estão espalhados por todo o corpo, enviando sinais para a nosso sistema vestibular. Essa memória muscular é desenvolvida, gradualmente, nos primeiros anos de nossas vidas até a maturidade. Também podemos aprender novos hábitos motores adultos, tais como: dirigir, dançar, nadar. Uma vez aprendida, essa memória é mantida por toda a vida, caso não sofra nenhuma intercorrência, como ocorre no acidente vascular encefálico. Aquisição, formação, conservação dos hábitos motores, ou seja, aprendizagem do comportamento motor, não evocamos conscientemente. Uma memória implícita é automática. Isso significa que, depois de aprendermos, nós apenas dirigimos, dançamos, falamos, andamos etc. Fonte: Shutterstock.com Novas memórias são formadas a todo momento. Com exceção de crianças muito pequenas, pois antes dos quatro anos não existe a consolidação de memórias duradouras e fidedignas. Entre os quatro e os sete anos, gradualmente, esse processo de consolidar novas memórias declarativas é aprimorado. NÃO EXISTE A CONSOLIDAÇÃO DE MEMÓRIAS DURADOURAS E FIDEDIGNAS Isto se deve, possivelmente, ao fato de o cérebroestar em desenvolvimento e da neurogênese. javascript:void(0) ATENÇÃO Um outro dado relevante na formação das memórias declarativas de longa duração é que elas se beneficiam da língua. De forma gradual, após os 2 ou 3 anos são usadas a função cognitiva da linguagem para aquisição, formação, retenção e evocação de novas memórias declarativas. A INTEGRAÇÃO DAS MEMÓRIAS IMPLÍCITAS E EXPLÍCITAS EXEMPLO Um exemplo simples e didático que podemos usar para demonstrar a integração entre as memórias declarativas e não declarativas é pensar que vamos nos levantar para pegar um copo de água. Esse pensamento é uma função cognitiva de ordem superior e trata-se de uma atividade cortical dos lobos frontais. É voluntária. Podemos, também, evocar uma memória declarativa episódica para lembrar que colocamos uma garrafa de refrigerante na geladeira e, ainda, declarar para uma pessoa, ao nosso lado, nossas intenções. Tudo isso se trata da evocação de memórias declarativas, conscientes, voluntárias, mas, depois disso, a mágica acontece. Simplesmente, vamos nos levantar e executar vários comportamentos motores complexos para buscar o refrigerante e, ao mesmo tempo, continuar conversando ou pensando em preparar uma pipoca para acompanhar a bebida. Essa complexidade motora não é evocada conscientemente; ela é automática, ou seja, você simplesmente faz. Nesses casos, o processo consciente é apenas ter a intenção de agir. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. AO LONGO DO NOSSO DESENVOLVIMENTO, QUANDO CRIANÇAS, CODIFICAMOS E ARMAZENAMOS CONTEÚDO MNEMÔNICO EM DIFERENTES PARTES DO CÉREBRO. PARA QUE POSSAMOS APRENDER A FALAR, A COMPREENDER A FALA, A RECONHECER O TOM DA VOZ E UMA FACE ENFEZADA DE UM ADULTO NOS DANDO UMA BRONCA, ARMAZENAMOS ESSAS MEMÓRIAS EM ÁREAS ESPECÍFICAS DO CÉREBRO. UMA LESÃO NA ÁREA DE BROCA RESULTARÁ EM UMA AFASIA DE BROCA QUE IMPLICA EM: A) Dificuldades na compreensão da fala. B) Dificuldades na emissão da fala. C) Dificuldade em reconhecer faces amedrontadoras. D) Dificuldades emocionais. E) Dificuldades em formar novas memórias procedurais. 2. QUANDO BEBÊS, NÓS APRENDEMOS A ENGATINHAR; TENTAMOS FICAR DE PÉ, APÓS ADQUIRIRMOS O TÔNUS MUSCULAR E SUSTENTARMOS NOSSO PESO SOBRE AS PERNAS, E ENSAIAMOS OS PRIMEIROS PASSOS. ESSA APRENDIZAGEM MOTORA É UM TIPO DE MEMÓRIA. CONFORME SOMOS BEM- SUCEDIDOS EM NOSSAS TENTATIVAS, APRENDEMOS O QUE TEMOS DE FAZER PARA CONSEGUIR ANDAR. ESSE PROCESSO É NATURAL EM NOSSA ESPÉCIE EM INDIVÍDUOS SAUDÁVEIS E SEM COMPROMETIMENTOS QUE IMPEÇAM O ACONTECIMENTO DESSA APRENDIZAGEM. ESSA APRENDIZAGEM OCORRE, PRINCIPALMENTE, NA SEGUINTE ÁREA: A) Hipocampo B) Lobo temporal C) Córtex pré-motor D) Amígdala E) Cerebelo GABARITO 1. Ao longo do nosso desenvolvimento, quando crianças, codificamos e armazenamos conteúdo mnemônico em diferentes partes do cérebro. Para que possamos aprender a falar, a compreender a fala, a reconhecer o tom da voz e uma face enfezada de um adulto nos dando uma bronca, armazenamos essas memórias em áreas específicas do cérebro. Uma lesão na área de broca resultará em uma afasia de broca que implica em: A alternativa "B " está correta. A afasia de Broca é uma afasia motora, ou seja, dificuldade com a parte motora da fala, partido do princípio de que, para emissão da voz, é preciso uma ação coordenada de músculos e articulações da face. 2. Quando bebês, nós aprendemos a engatinhar; tentamos ficar de pé, após adquirirmos o tônus muscular e sustentarmos nosso peso sobre as pernas, e ensaiamos os primeiros passos. Essa aprendizagem motora é um tipo de memória. Conforme somos bem-sucedidos em nossas tentativas, aprendemos o que temos de fazer para conseguir andar. Esse processo é natural em nossa espécie em indivíduos saudáveis e sem comprometimentos que impeçam o acontecimento dessa aprendizagem. Essa aprendizagem ocorre, principalmente, na seguinte área: A alternativa "E " está correta. O cerebelo, nosso “pequeno cérebro”, é a estrutura do encéfalo responsável pelo equilíbrio, pelo controle do tônus muscular e pela aprendizagem motora. MÓDULO 3 Identificar as memórias de curta e longa duração Os efeitos das memórias procedurais implícitas, modificam o comportamento de uma pessoa com base na experiência, sem que ela tenha acesso consciente a essas informações. Basta que indivíduos saudáveis, sem prejuízos que impeçam um desenvolvimento biológico normal, recebam a estimulação ambiental para que essas memórias naturalmente sejam implementadas. Algumas dessas memórias não são desejadas, como é o caso das aprendizagens associativas por condicionamento clássico, que está na base de quadros de fobias e transtornos da ansiedade. Portanto, são aprendizagens desadaptadas que permanecem por anos, caso não exista uma intervenção, e são mantidas por reforço negativo. VOCÊ SABIA O indivíduo não tem controle consciente ou voluntário nessas aprendizagens, pois elas simplesmente acontecem em decorrência do contexto, do tipo de estímulos que o ambiente oferece. Um ambiente rico em oportunidades de práticas de esporte e dança, na infância e adolescência, proporciona conexões robustas no cerebelo; e isso resulta em uma inteligência corporal-cinestésica. Um ambiente empobrecido desses tipos de estímulo, dificilmente, resultará em um adulto com tal inteligência aflorada. Embora possa ser desenvolvida, essa inteligência não será com a mesma qualidade se adquirida na infância. As aprendizagens que resultam em memórias declarativas envolvem ativamente um esforço cognitivo e, novamente, o papel do ambiente em oferecer estímulos é fundamental. Fonte: Shutterstock.com No entanto, cada indivíduo tem um papel ativo na aquisição desse tipo de memória. Podemos com esforço treinar nossa atenção, nossas funções executivas e nossa memória. Os pais, os mediadores, os educadores, que ajudam a desenvolver nas crianças o controle inibitório, estão transformando os adultos do futuro em pessoas que pensam antes de agir. ATENÇÃO O controle inibitório, a nossa capacidade de planejamento e a flexibilidade mental podem ser desenvolvidos, isso chamamos de funções executivas. As funções executivas e a memória de trabalho são processamentos de ordem superior (cortical) que têm função gerencial ou executiva. MEMÓRIA DE TRABALHO (OU OPERACIONAL) E MEMÓRIA DE CURTA DURAÇÃO A memória de trabalho é nossa capacidade de processar informações, sendo semelhante à de curta duração, pois ambas se referem ao armazenamento temporário de informação e possuem capacidade limitada. Contudo, a memória de trabalho é ativa, enquanto a de curto prazo é passiva. Fonte: Shutterstock.com Uma memória de curto prazo, que dura cerca de seis horas ou menos, ou passa por um processo de reforço e se consolida em sistemas mnemônicos de longa duração, ou é esquecida. Fonte: Shutterstock.com A memória operacional, por sua vez, conserva a informação por um período para poder examiná-la e compará-la com o acervo de memórias de curto prazo e de longo prazo, implícitas e explicitas. A memória de trabalho mantém as informações por tempo o suficiente para que consigamos ter um comportamento integrado direcionado a um objetivo. Observa-se, por exemplo, a deterioração da memória de trabalho em indivíduos esquizofrênicos. SAIBA MAIS A função da memória de trabalho é verificar se a informação na memória de curta duração é nova ou não, se será útil, e se irá gerenciar o reforçamento até que se consolide em sistemas de longa duração. O córtex pré- frontal mantém esse sistema de gerenciamento através de conexões com outras estruturas vinculadas à memória. MEMÓRIA DE LONGA DURAÇÃO O sistema nervoso é composto por bilhões de células nervosas (neurônios e células de suporte, glia). O ser humano é um sistema formado por um conjunto de subsistemas, onde existem complexas redes neurais. Um neurônio comunica-se com outros através de uma linguagem eletroquímica, chamamos essa comunicação de sinapse. Os neurotransmissores,ou mensageiros químicos, são responsáveis em codificar e passar adiante (para outro neurônio) um conjunto de informações. ATENÇÃO A aprendizagem acontece quando essas redes neurais são fortalecidas pela repetição de sinapses, resultando, por exemplo, no comportamento. Nesses subsistemas, existem diversas redes neurais, diferentes tipos de neurotransmissores, formando camadas e camadas de informações, verdadeiros engramas sinápticos. Isso é a base da memória de longa duração. O FENÔMENO DA POTENCIAÇÃO DE LONGA DURAÇÃO Nas neurociências, estuda-se o fenômeno da potenciação de longa duração (long term potentiation – LTP), que evidencia a ideia de que, a nível celular, esse processo aumenta a eficiência dos neurônios, pré e pós-sinápticos, por meio de um aumento da neurotransmissão. O conjunto de sinalizações químicas a nível molecular que regula esse processo é complexo e não objetivamos abordá-lo neste tema. Fonte: Shutterstock.com EXEMPLO Precisamos aprender o equilíbrio, a andar, a manipular nossos efetores (mãos) em direção a um estímulo alvo. Precisamos desenvolver motricidade fina para manipular objetos com precisão e, posteriormente, aprendemos a segurar uma caneta para escrever. Por tentativa e erro, engatinhar, tentar levantar, cair e começar tudo novamente, vamos selecionando as conexões sinápticas mais bem-sucedidas, e essas serão reforçadas por uma potenciação de longa duração (long term potentiation – LTP), pois produziram resultado. AS MEMÓRIAS QUANTO AO TEMPO DE DURAÇÃO O ESQUECIMENTO Uma função tão nobre quanto armazenar é esquecer. Neste tema, estamos definindo o esquecimento como enfraquecimento de uma sinapse, mas como um construto, podemos encontrar definições diferentes em outras fontes. Para analisarmos a função do esquecimento, partimos de uma condição em que a pessoa não consegue esquecer. Trata-se de uma memória autobiográfica altamente superior (hipertimesia). É uma síndrome rara, fazendo com que a pessoa não se esqueça de nada ao longo da vida. Trata-se de uma supermemória autobiográfica. O que parece ser algo positivo, não esquecer, torna a vida dessas pessoas, muitas das vezes, pouco funcional, com baixa flexibilidade mental e capacidade adaptativa reduzida. Fonte: Shutterstock.com EXEMPLO Algumas evocações de memória são impulsivas. Lembrar-se do sabor do sorvete que você tomou na noite de 2 de fevereiro, do ano de 1982, pode ser pouco útil para as demandas da vida. Basta ter um priming para a lembrança brotar na mente. Um outro processo, diferente do LTP, é chamado de depressão de longa duração (LTD). Enquanto a LTP reforça sinapses, a LTD as enfraquece. Esse mecanismo de enfraquecimento seletivo das sinapses que não trazem resultados, e o processo de LTP reforçando as sinapses que trazem resultado no comportamento, formam a base da fisiologia da memória. A LTD é um processo que está na base do esquecimento, por este motivo, não evocamos o que esquecemos, pois simplesmente a sinapse não existe mais para ser evocada. LTP LTD Reforça sinapses. Enfraquece sinapses. Traz resultado ao comportamento. Não traz resultado ao comportamento. Base da fisiologia da memória. Processo na base do esquecimento. ATENÇÃO Não devemos nos confundir com a forma que o senso comum utiliza a expressão esquecimento que, fisiologicamente, é chamado de supressão de memória. O esquecimento em doenças neurovegetativas possui mecanismos diversos. Nestes casos, existe perda de neurônios e morte celular em áreas específicas do cérebro. A LTD não leva à morte celular, apenas enfraquece uma sinapse, e esse neurônio será reforçado a fazer uma conexão mais funcional. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. FUNES, O MEMORIOSO É UM CONTO DE JORGE LUÍS BORGES QUE DESCREVE UM RAPAZ QUE TINHA UMA EXCELENTE MEMÓRIA, MAS NÃO CONSEGUIA ARTICULAR ESSAS MEMÓRIAS DEVIDO A SUA BAIXA INTELIGÊNCIA. OU SEJA: SER UMA ENCICLOPÉDIA AMBULANTE, MAS NÃO CONSEGUIR ELABORAR ESSES CONHECIMENTOS. A MEMÓRIA NÃO É DEMARCADA APENAS POR SUA CAPACIDADE DE RETER INFORMAÇÕES, MAS TAMBÉM DE ESQUECÊ-LAS. O PROCESSO FISIOLÓGICO RELACIONADO AO ENFRAQUECIMENTO DE SINAPSES É DESCRITO COMO: A) Depressão de longa duração B) Potenciação de longa duração C) LTP D) Esquecimento seletivo E) Hipertimesia 2. A FUNÇÃO DE CONSERVAR A INFORMAÇÃO POR UM PERÍODO PARA PODER EXAMINÁ-LA E COMPARÁ-LA COM O ACERVO DE MEMÓRIAS DE CURTO E DE LONGO PRAZO, IMPLÍCITAS E EXPLICITAS, É CHAMADA DE: A) Executivo central B) Funções executivas C) Comparador de memórias D) Memória operacional E) Hipertimesia GABARITO 1. Funes, o Memorioso é um conto de Jorge Luís Borges que descreve um rapaz que tinha uma excelente memória, mas não conseguia articular essas memórias devido a sua baixa inteligência. Ou seja: ser uma enciclopédia ambulante, mas não conseguir elaborar esses conhecimentos. A memória não é demarcada apenas por sua capacidade de reter informações, mas também de esquecê-las. O processo fisiológico relacionado ao enfraquecimento de sinapses é descrito como: A alternativa "A " está correta. A Depressão de Longa Duração corresponde ao enfraquecimento de sinapses, o que culmina no processo de esquecimento. 2. A função de conservar a informação por um período para poder examiná-la e compará-la com o acervo de memórias de curto e de longo prazo, implícitas e explicitas, é chamada de: A alternativa "D " está correta. A memória de trabalho é a nossa capacidade de processar informações. MÓDULO 4 Relacionar algumas variáveis ambientais na modulação das memórias MEMÓRIAS IMPLÍCITAS Memórias implícitas (procedurais) são resistentes e não sofrem tanta influência do meio externo quanto as memórias declarativas. Uma memória declarativa pode ser suprimida por uma condição significativamente estressora e ficar suprimida por um tempo. Trata-se de um fenômeno chamado de amnésia global transitória, que pode durar poucos dias, não mais do que 24 horas. Enquanto a memória implícita não sofre modulação pelas emoções e o humor, a declarativa é muito suscetível. Uma memória implícita não sofre modulação do meio externo a ponto de prejudicá-la definidamente ou por um longo período. Memória declarativa Pode ser suprimida por condições do meio externo. Memória implícita Não sofre modulação do meio externo. EXEMPLO Um exemplo de modulação de uma memória de hábito motor é que podemos perder, momentaneamente, o controle das pernas, por um medo extremo, um comportamento de frozen (congelamento). Tão logo passe o perigo, a evocação automática dessa memória motora é reestabelecida. Esse comportamento de frozen é mais comum nos animais, mas pode acontecer com humanos. Por exemplo, ao tentar atravessar a rua, no meio dos carros, a pessoa calcula mal a distância e velocidade dos veículos, e um deles buzina a poucos metros. Diante da cena, a pessoa congela e não consegue evitar o atropelamento. Trata-se de uma falha no controle motor automático devido ao alto nível de estresse. O evento ocorre tão rápido que o cérebro não tem tempo de resolver o conflito entre o automatismo da memória de procedimentos e o controle motor voluntário. Hormônios do estresse (cortisol, adrenalina e noradrenalina) também podem realçar um aprendizado. Um único evento estressor significativo pode resultar em um reflexo condicionado e, muitas das vezes, desadaptado. Uma excitabilidade muito alta, mas positiva, gerada pelo “quarteto da felicidade” (endorfina, dopamina, serotonina, ocitocina), como estar em um show do seu artista preferido com quem você ama, pode fortalecer as memórias desse evento. ATENÇÃO A excitação grava os eventos no cérebro. Baixa excitabilidade ou ausência de uma emoção faz com que a memória seja fraca. Os prejuízos nas memórias não declarativas duradouras, tipicamente, serão decorrentes de acidente vascular encefálico (AVE), traumatismos cranianos, tumores, ablação cirúrgica, doenças que impactam o sistema nervoso ou por senescência (Processo naturaldo envelhecimento.) . Níveis de ansiedade podem prejudicar a consolidação da memória, ou seja, a codificação fica fragmentada, dificultando a evocação precisa do evento (memória episódica) ou do conteúdo (memória semântica). A ansiedade exacerbada não é desejada nem no momento da consolidação, nem na evocação. Estudantes relatam o fenômeno “deu branco” que se trata de uma supressão de memória decorrente da ansiedade de desempenho. As memórias também são influenciadas pelo contexto, trata-se do conceito de memória dependente de estado (ou estado dependente). Fonte: Shutterstock.com EXEMPLO Podemos citar alguns exemplos, como: estudar com música alta ou com muitos estímulos à volta, assistir à uma aula remota realizando outras tarefas concomitantemente, ou seja, no momento da evocação dessas memórias. Algumas pessoas podem enfrentar dificuldade com a evocação da informação em uma sala silenciosa. O ambiente influencia tanto na aquisição, quanto na evocação de uma memória. Um aspecto importante a se considerar sobre a modulação das memórias por outros eventos são as falsas memórias. Percepção de tamanho e outras memórias são modificadas ao longo do desenvolvimento. EXEMPLO Por exemplo, uma casa que parecia um castelo aos sete anos, pode ser pequenina aos 40 anos. Novos estímulos no ambiente no tempo presente, podem alterar uma memória consolidada no passado. Uma memória pode ser consolidada a partir de interpretações, por lembranças distorcidas e, muitas vezes, podem até contradizer a própria experiência. As falsas memórias podem ser adquiridas de maneira espontânea, criadas internamente como resultado da nossa interpretação dos eventos, ou sugerida, produzida por um agente externo, mas que apresenta características coerentes com os fatos. As memórias sofrem influência das emoções e podemos armazenar uma informação como positiva ou negativa, dependendo do nosso estado de humor no momento da aquisição. ATENÇÃO Eventos negativos ou positivos ocorridos na infância podem ser modificados pela memória com o passar dos anos. AS EMOÇÕES Fonte: Shutterstock.com As memórias com maior carga emocional positiva são mais bem consolidadas e evocadas. Uma emoção com carga emocional negativa é rapidamente consolidada em sistemas de longa duração. Evitar experiências traumáticas ou perigos no ambiente pode ser adaptativo, mas em outras ocasiões, pode resultar em uma aprendizagem desadaptada. O cérebro, em sua evolução filogenética na espécie humana, foi desenhado para nos aproximar de experiências positivas e nos afastar das negativas. Algumas vezes, a memória modulada por uma emoção negativa pode sofrer uma supressão e não ser facilmente evocada; outras vezes, pode desenvolver um reflexo condicionado (memória associativa), e esse não é evocado pela consciência, mas resulta em alterações na fisiologia do organismo. O reflexo condicionado traduz uma aprendizagem que modifica padrões do organismo, mas, muitas vezes, a pessoa não compreende os motivos. Transtornos de ansiedade e fobias são um resultado desse aprendizado. O reflexo condicionado também está na base do comportamento de luta e fuga e, quando necessário, isso é altamente adaptativo para fugirmos de um perigo ou nos mantermos alertas para enfrentar adversidades. ATENÇÃO Estruturas do sistema límbico e de memória estão diretamente conectados. Uma emoção é construída sob um aspecto subjetivo na experiência do indivíduo. Uma emoção só existe se tiver uma função, se alguém a percebe, sendo a própria pessoa que vivencia a experiência ou, nas inferências de quem nos observa, percebe nosso estado afetivo, emocional e de humor. VOCÊ SABIA As emoções são a principal fonte moduladora de memórias declarativas no cérebro. Temos duas rotas da emoção que fazem interseção com estruturas de memória: A ROTA CONSCIENTE DE UMA EMOÇÃO A informação sensorial chega ao tálamo, passa para o córtex sensorial e para o hipocampo. Esse processo é mais lento e depende de componentes cognitivos complexos. TÁLAMO Uma estrutura do cérebro que se configura como um centro de distribuição de informações do sistema nervoso. O tálamo recebe informações do sistema nervoso periférico, tronco cerebral, de outras javascript:void(0) estruturas do cérebro e envia para uma outra estrutura que é o alvo da informação, inclusive e, principalmente, o córtex cerebral. Tálamo Córtex sensorial Hipocampo A ROTA NÃO CONSCIENTE DE UMA EMOÇÃO A informação sensorial chega ao tálamo, em seguida, à amígdala e ao hipotálamo. Esta rota é adaptativa, pois é capaz de alterar a nossa fisiologia e o nosso comportamento, nos preparando para a luta ou para fuga, de forma não consciente. Tálamo Amígdala Hipotálamo Fonte: Shutterstock.com Anatomia do Cérebro ATENÇÃO O funcionamento do sistema límbico exerce uma influência direta em como consolidamos memória e influenciam igualmente no momento da evocação. O nosso sistema límbico é o principal modulador de memórias. FATORES QUE MODULAM AS MEMÓRIAS O SISTEMA LÍMBICO São as principais estruturas límbicas: amígdala, hipocampo, giro do cíngulo e hipotálamo. O sistema límbico é o responsável pelas nossas respostas emocionais. Nas estruturas do sistema límbico, teremos armazenadas as nossas memórias emocionais. Fonte: Shutterstock.com Amígdala Relaciona-se ao processamento do medo e algumas outras emoções, também no aprendizado e em respostas de luta e fuga. Memória de curto prazo e reconhecimento de emoções. Alterações na amígdala podem resultar em comportamentos agressivos, perda de controle emocional, alterações na memória de curto prazo e déficits no reconhecimento de emoções. A amígdala é onde as nossas memórias de medo ficam armazenadas. Fonte: Shutterstock.com Hipotálamo Regula diversas atividades fisiológicas do organismo. Diferentes funções autônomas são gerenciadas pelo hipotálamo. É um centro de homeostase. Fonte: Shutterstock.com Giro do cíngulo Regula dor, emoções e memória. Alterações dessa área já foram associadas a certo prejuízo no aprendizado, à expressão inapropriada de emoções, à ausência de medo e à dor. Fonte: Shutterstock.com Hipocampo Está relacionado com a memória de longo prazo declarativa, o armazenamento das memórias recentes, a orientação espacial, o reconhecimento de eventos inesperados no ambiente. Alterações nesta estrutura podem levar à amnésia anterógrada. O indivíduo não consegue, por exemplo, formar novas memórias dos tipos declarativas. Na doença de Alzheimer, o hipocampo é uma das primeiras áreas acometidas pela degeneração do sistema nervoso. ALGUMAS ESTRUTURAS DO CÉREBRO EMOCIONAL E SUA INFLUÊNCIA NA MEMÓRIA: CÓRTEX CINGULADO ANTERIOR Área cortical mais próxima ao que se chama de sistema límbico. Região que demonstra muita atividade quando executamos tarefas difíceis, experienciamos desejos intensos, amor ou raiva. Estudos demonstraram uma alta atividade desta área quando, por exemplo, uma mãe escuta o choro de seu bebê. CÓRTEX FRONTAL Informações de estruturas límbicas são enviadas ao córtex frontal para produzir sensações e percepções conscientes de uma emoção. O córtex pré-frontal tem função gerenciadora da memória de trabalho. COMPLEXO OLFATÓRIO Estruturas relacionadas ao olfato levam a informação diretamente às áreas límbicas, que não passa, necessariamente, pelo tálamo, como nos outros sentidos. Por esse motivo, o olfato, possivelmente, é capaz de gerar respostas emocionais intensas. Acredita-se que o complexo olfatório seja um centro emocional primitivo. TÁLAMO Centro distribuidor que recebe e envia informações de boa parte das sensações, tanto para áreas corticais. quanto para as áreas límbicas, como a amígdala. Devido ao tálamo, podemos experimentar alterações associadas a emoções de modo não consciente. HIPOCAMPO Está relacionado principalmente às memórias declarativas. Por isso, uma recordação de um evento triste pode atrapalhar um momento alegre.CORPO CALOSO Faz a comunicação do hemisfério esquerdo e direito do cérebro. HIPOTÁLAMO Atua na homeostase e alterações fisiológicas relacionadas às emoções. O hipotálamo pode modular a amígdala. AMÍGDALA Está relacionada principalmente às respostas associadas ao medo, mas também participa do processamento de outras emoções. As nossas memórias de eventos que resultam em medo ficam armazenadas na amígdala. VERIFICANDO O APRENDIZADO 1. A MEMÓRIA E AS EMOÇÕES SÃO ESTUDADAS, TANTO PELA PSICOLOGIA, QUANTO PELAS NEUROCIÊNCIAS. SOBRE A MEMÓRIA, MARQUE A ALTERNATIVA FALSA: A) A emoção e a memória se relacionam, pois são controladas por regiões similares do cérebro. B) A amígdala, estrutura do sistema límbico, relaciona-se com o processamento das emoções e memória. C) O hipocampo, estrutura do sistema límbico, relaciona-se tanto com o processamento das emoções quanto com a memória. D) O sistema límbico reúne um conjunto de estruturas que estão relacionadas ao processamento das emoções. E) A emoção e a memória não se relacionam, pois são controladas por regiões diferentes do cérebro. 2. RELACIONA-SE AO PROCESSAMENTO DO MEDO E ALGUMAS OUTRAS EMOÇÕES, TAMBÉM NO APRENDIZADO, RESPOSTAS DE LUTA E FUGA, MEMÓRIA DE CURTO PRAZO E RECONHECIMENTO DE EMOÇÕES. ALTERAÇÕES NESSA ESTRUTURA PODEM RESULTAR EM COMPORTAMENTOS AGRESSIVOS, CERTA PERDA DE CONTROLE EMOCIONAL, ALTERAÇÕES NA MEMÓRIA DE CURTO PRAZO E DÉFICITS NO RECONHECIMENTO DE EMOÇÕES. O TEXTO REFERE-SE: A) Ao hipocampo B) Ao lobo temporal C) Ao córtex pré-motor D) À amígdala E) Ao cerebelo GABARITO 1. A memória e as emoções são estudadas, tanto pela Psicologia, quanto pelas Neurociências. Sobre a memória, marque a alternativa falsa: A alternativa "E " está correta. As estruturas do sistema límbico são epicentros para controle emocional e modulam diretamente centros de memória. 2. Relaciona-se ao processamento do medo e algumas outras emoções, também no aprendizado, respostas de luta e fuga, memória de curto prazo e reconhecimento de emoções. Alterações nessa estrutura podem resultar em comportamentos agressivos, certa perda de controle emocional, alterações na memória de curto prazo e déficits no reconhecimento de emoções. O texto refere-se: A alternativa "D " está correta. A amígdala está relacionada às reações emocionais, às memórias de curto prazo e às memórias de medo. CONCLUSÃO CONSIDERAÇÕES FINAIS A vida com prejuízos na memória é em tons de cinza. A memória é colorida com sabores, cheiros, histórias, pessoas, momentos, que permanecem associados às lembranças e fazem com que consigamos significá- los e percebê-los a partir de nossa história. Isso gradualmente define quem somos, pois, sem memórias, não há possibilidade de saborear os momentos alegres ou tristes de nossa vida. Sem esses momentos, não teríamos propósito nem uma personalidade. Memória também é adaptabilidade. Gravamos em nossas estruturas neurais aquilo que foi aprendido. A aprendizagem ocorre para nos adaptarmos, pois não podemos fazer aquilo que não aprendemos, e não podemos comunicar o que não conhecemos. Sem memória, não fazemos, nem nos comunicamos. Sem memória nada somos. Vida é memória e memória é vida. AVALIAÇÃO DO TEMA: REFERÊNCIAS BEAR, M. F.; CONNORS, B. W.; PARADISO, M. A. Neurociências: Desvendando o Sistema Nervoso. 3. ed. Artmed, 2017. DAVIDSON, R. J.; BEGLEY, S. O Estilo Emocional do Cérebro. 1. ed. Sextante, 2013. EYSENCK, M. W.; KEANE, M. T. Manual de Psicologia Cognitiva. 7. ed. Artmed, 2017. IZQUIERDO, I. Memória. 2. ed. Artmed, 2011. MEDEIROS, M. Divã. Rio de Janeiro: Objetiva, 2002. OLIVEIRA, M. B.; OLIVEIRA, M. K. Investigações Cognitivas - Conceitos, Linguagem e Cultura. 1 ed. Artmed, 1999. REEVE, J. Motivação e Emoção. 4. ed. LTC, 2006. SCHULTZ, D. P.; SCHULTZ, S. E. História da Psicologia Moderna. 4. ed. Cengage Learning, 2019. STERNBERG, R. J. Psicologia Cognitiva. 7. ed. Cengage Learning, 2016. EXPLORE+ Para explorar os seus conhecimentos no assunto deste tema: Acesse: A página na internet do TED (Technology, Entertainment, Design) e aprenda um pouco mais sobre falsas memórias. Também nesse site, você poderá saber mais sobre o conectoma humano, com uma apresentação do neurocientista Sebastian Seung, a partir de um modelo ambicioso sobre as conexões do cérebro. Leia: Como vimos, a memória pode ser modulada por demandas ambientais, por mudanças nos códigos cognitivos. Podemos observar, por exemplo, como atividades motoras podem modificar padrões de respostas mais habituais no nosso cotidiano. Leia o artigo Modulações dos efeitos Simon e Stroop espacial por tarefas prévias de compatibilidade espacial, de Fraga-Filho et al., publicado na revista eletrônica Psico da PUCRS. Assista: Em busca da memória: a neurociência de Erik Kandel é uma viagem fantástica na vida desse neurocientista, ganhador do prêmio Nobel em 2007 por seus estudos sobre memória. Nesse documentário, o autor conta de forma brilhante a história de sua vida ao mesmo tempo que revela os mecanismos de memória que lhe permitem contar essa história. Você poderá encontrar no site do Youtube. Ao documentário Jogos de Memória (2019), de Claus Wehlisch e Janet Tobias, a respeito da memória competitiva. Se possível, procure esse documentário para assistir nas plataformas de streaming. Acesse também o site da World Memory Champions Ships e saiba mais sobre competições internacionais de memória. Ao filme Efeito Borboleta (2004), de Eric Bress e J. Mackye Gruber, uma excelente ficção científica, mas que nos faz pensar sobre as memórias de nossas vidas: será mesmo que seria bom nos livrarmos de algumas delas? CONTEUDISTA Roberto Sena Fraga Filho CURRÍCULO LATTES javascript:void(0);