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Indaial – 2021 Toxicologia e Segurança Pública Prof. Iverson Kech Ferreira 1a Edição Copyright © UNIASSELVI 2021 Elaboração: Prof. Iverson Kech Ferreira Revisão, Diagramação e Produção: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. Impresso por: F383t Ferreira, Iverson Kech Toxicologia e segurança pública. / Iverson Kech Ferreira – Indaial: UNIASSELVI, 2021. 191 p.; il. ISBN 978-65-5663-665-8 ISBN Digital 978-65-5663-660-3 1. Legislação. - Brasil. 2. Substâncias químicas. – Brasil. II. Centro Universitário Leonardo da Vinci. CDD 340 aPreSenTação Olá, acadêmico! Seja bem-vindo ao nosso estudo a respeito da toxicologia e segurança pública no Brasil, em que iremos diversificar as pesquisas, a partir do amplo tema da toxicologia e intoxicação, partindo para a abrangente temática das drogas. Os problemas com as substâncias químicas vão desde os simples e, aparentemente inofensivos produtos encontrados em diversas prateleiras de mercados e farmácias, até aos agrotóxicos presentes nos produtos que fazem parte de nossa alimentação diária. Mas essa adversidade sofre um expressivo aumento, quando produtos químicos passam a ser manuseados pelo tráfico de drogas e pelo crime organizado, a partir da produção de substâncias consideradas ilegais e extremamente contaminantes do organismo. Verdadeiros venenos são produzidos e comercializados, e pela sua qualidade altamente viciante, passam a ser um verdadeiro problema social e de saúde pública, que deve ser combatido pelas políticas públicas. Na primeira unidade, nós veremos como a toxicologia e sua formação científica determina o que é droga ou veneno, a partir de análises e métodos científicos diversos; os processos de intoxicação, e como o organismo humano reage aos componentes mais invasivos aos seus sistemas. É importante delimitar o que é droga licita e ilícita, portanto, como essa distinção é realizada e qual é a importância, se faz presente em nossos estudos neste ponto. Você analisará também a Lei nº 13.313/2006, considerada Lei de Drogas, abordando seus destaques mais essenciais que tutelam o corpo social e a saúde pública, contra o crime que se organiza em volta do tráfico de entorpecentes. Na segunda unidade, nós iremos analisar como são realizadas as políticas públicas sobre o tema das drogas no Brasil, e se conseguem refletir seus intentos e suas possibilidades às pessoas que mais as necessitam. Também será explorado como a Segurança Pública identifica e age nessas questões, e quais seus modelos mais influentes para o combate às drogas. Veremos o impacto que os entorpecentes e o vício podem causar no núcleo familiar, geralmente, trazidas para dentro dos lares por adolescentes: alguns cooptados pelo crime organizado, outros viciados pela droga que se distribui em nossa sociedade. As questões sobre o tráfico e a crescente onda de violência, usualmente interligados entre si, explodem nas comunidades mais carentes da sociedade, controladas por um poder que governa com mãos de ferro as comunidades consideradas de risco. Esse é o poder paralelo ao Estado, em crescente evolução. E será na terceira unidade que entenderemos como a segurança pública aborda o tráfico de entorpecentes, e como são realizadas as patrulhas e missões de segurança contra o crime, seja em âmbito nacional ou internacional. O narcotráfico é um perigo internacional, presente no mundo, que se exibe sem fronteiras, um difícil inimigo a ser combatido. Então, seja bem-vindo aos estudos e análises aqui apresentados! Uma boa leitura e excelentes estudos! Iverson Kech Ferreira Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novi- dades em nosso material. Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagra- mação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo. Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilida- de de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assun- to em questão. Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade. Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos! NOTA Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma disciplina e com ela um novo conhecimento. Com o objetivo de enriquecer seu conhecimento, construímos, além do livro que está em suas mãos, uma rica trilha de aprendizagem, por meio dela você terá contato com o vídeo da disciplina, o objeto de aprendizagem, materiais complemen- tares, entre outros, todos pensados e construídos na intenção de auxiliar seu crescimento. Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo. Conte conosco, estaremos juntos nesta caminhada! LEMBRETE Sumário UNIDADE 1 — TÓXICOS: ESPÉCIES E SEUS USOS .................................................................... 1 TÓPICO 1 — AS ESPÉCIES DE TÓXICOS ....................................................................................... 3 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 3 2 TOXICOLOGIA E TOXIDADE......................................................................................................... 4 2.1 INTRODUÇÃO À TOXICOLOGIA ............................................................................................. 4 2.2 TOXICIDADE .................................................................................................................................. 8 2.3 ESPECIALIDADES TOXICOLÓGICAS .................................................................................... 11 RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 15 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 16 TÓPICO 2 — OS PROCESSOS DE INTOXICAÇÃO .................................................................... 19 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 19 2 A INTOXICAÇÃO ............................................................................................................................. 19 2.1 CLASSIFICAÇÃO DOS EFEITOS TÓXICOS ............................................................................ 20 2.2 FORMAS DE INTOXICAÇÃO.................................................................................................... 21 RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 27 AUTOATIVIDADE ..............................................................................................................................28 TÓPICO 3 — AS DROGAS................................................................................................................. 31 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 31 2 DROGAS CONSIDERADAS LÍCITAS ......................................................................................... 32 3 DROGAS CONSIDERADAS ILÍCITAS ....................................................................................... 36 3.1 TRATAMENTO NORMATIVO DAS DROGAS NA LEGISLAÇÃO NACIONAL ............. 40 3.2 A CONSTITUIÇÃO DE 1988 E AS DROGAS ........................................................................... 41 3.3 A LEI Nº 11.343/2006 .................................................................................................................... 42 3.4 PROCEDIMENTO PENAL (ARTS. 48 E 49) ............................................................................ 53 LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................ 55 RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 59 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 60 REFERÊNCIAS ...................................................................................................................................... 62 UNIDADE 2 — AS DROGAS E OS REFLEXOS NA VIOLÊNCIA SOCIAL ............................ 65 TÓPICO 1 — POLÍTICAS, SEGURANÇA PÚBLICA E AS DROGAS ...................................... 67 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 67 2 POLÍTICAS PÚBLICAS E AS DROGAS ...................................................................................... 68 3 SEGURANÇA PÚBLICA E AS DROGAS..................................................................................... 82 RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 95 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 96 TÓPICO 2 — DROGAS NAS FAMÍLIAS ........................................................................................ 99 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 99 2 IMPACTO DAS DROGAS NAS FAMÍLIAS ............................................................................. 103 3 USO DE DROGAS NA ADOLESCÊNCIA ................................................................................. 107 RESUMO DO TÓPICO 2................................................................................................................... 110 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 111 TÓPICO 3 — FAVELIZAÇÃO E SEGREGAÇÃO ........................................................................ 113 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 113 2 QUESTÕES SOBRE O TRÁFICO DE DROGAS ....................................................................... 117 3 A VIOLÊNCIA DO TRÁFICO NAS FAVELAS E COMUNIDADES .................................... 121 LEITURA COMPLEMENTAR .......................................................................................................... 124 RESUMO DO TÓPICO 3................................................................................................................... 127 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 128 REFERÊNCIAS .................................................................................................................................... 131 UNIDADE 3 — A AMEAÇA DO TRÁFICO .................................................................................. 135 TÓPICO 1 — SEGURANÇA PÚBLICA E O TRÁFICO DE ENTORPECENTES ................... 137 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 137 2 DROGAS ILEGAIS E A SEGURANÇA PÚBLICA ................................................................... 138 2.1 INTELIGÊNCIA E INFORMAÇÕES ....................................................................................... 140 3 O PLANO NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA E A AÇÃO POLICIAL.................... 147 RESUMO DO TÓPICO 1................................................................................................................... 152 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 153 TÓPICO 2 — O NARCOTRÁFICO INTERNACIONAL ............................................................ 155 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 155 2 O BRASIL E O NARCOTRÁFICO INTERNACIONAL .......................................................... 156 3 MULAS PARA O TRANSPORTE ................................................................................................. 160 4 TRANSPORTE E DISTRIBUIÇÃO DA DROGA ...................................................................... 163 RESUMO DO TÓPICO 2................................................................................................................... 168 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 169 TÓPICO 3 — A SECURITIZAÇÃO DAS FRONTEIRAS NACIONAIS ................................. 171 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 171 2 REPRESSÃO DO TRÁFICO NAS FRONTEIRAS DO BRASIL............................................. 172 3 PROGRAMA DE PROTEÇÃO INTEGRADA DE FRONTEIRAS (PPIF) ............................ 175 4 ENAFRON ......................................................................................................................................... 177 5 A OPERAÇÃO ÁGATA .................................................................................................................. 179 LEITURA COMPLEMENTAR .......................................................................................................... 182 RESUMO DO TÓPICO 3................................................................................................................... 186 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 187 REFERÊNCIAS .................................................................................................................................... 189 1 UNIDADE 1 — TÓXICOS: ESPÉCIES E SEUS USOS OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de: • articular os diferentes conceitos de classificação de tóxicos e a intoxicação; • analisar a classificação dos efeitos tóxicos de substâncias venenosas; • distinguir as espécies de tóxicos permitidos e não permitidos por lei; • conhecer o conceito atual de intoxicação; • identificar a norma penal legal contra as drogas. Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade, você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado. TÓPICO 1 – AS ESPÉCIES DE TÓXICOS TÓPICO 2 – OS PROCESSOS DE INTOXICAÇÃOTÓPICO 3 – AS DROGAS Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações. CHAMADA 2 3 TÓPICO 1 — UNIDADE 1 AS ESPÉCIES DE TÓXICOS 1 INTRODUÇÃO Prezado acadêmico! Você, certamente, já ouviu falar das propriedades dos elementos diversos, percebendo que na maioria das vezes, elas se diferem por conta de sua natureza química, e qual a percepção do mundo perante determinados elementos. Então, como todos fazemos parte de um mesmo ecossistema, é considerável a nossa assimilação quanto aos efeitos maléficos causados tanto em nosso corpo ou na natureza, por algum componente que definimos como tóxico. Dessa forma, havendo contato com determinado veneno, o organismo sente e dará sua resposta; que pode muitas vezes ser fatal. E nem precisamos do contato direto com o veneno, desde que exista uma exposição aos seus componentes mais letais, algo que podemos não sentir a princípio. Veja que os produtos considerados tóxicos vão desde um simples invólucro contendo material de limpeza dos mais usuais, até produtos que são atirados ao próprio alimento que nos sustenta, como os agrotóxicos. Não são difíceis de encontrar casos, em que o uso de produtos químicos invasivos à saúde humana alcançou índices de envenenamento, e, muitas vezes, até a morte. Observe os casos das drogas sintéticas, aquelas produzidas em laboratórios, tanto lícitas quanto ilícitas: ambas possuem efeitos diversos no organismo, pois produtos químicos tendem a causar rejeição pelo corpo humano, quando utilizados em quantidades superiores ao que está habituado. E o crescimento do consumo de remédios e produtos que podem causar dependência, é uma constante no Brasil (OLSON, 2013). A partir do momento que esse uso se torna descontrolado, a princípio pelo próprio corpo que agora pede e insinua pela droga, em uma simbiose que denota a dependência, então há o efeito diverso daquele inicial planejado (OLSON, 2013). Importa definir toxicologia a partir de suas próprias funções, ligadas intermitentemente à advertência do uso de elementos que precisam ser estudados e analisados, antes do contato com o mundo externo. Vamos iniciar analisando toxicologia e toxicidade, bem como, o uso dos produtos diversos e alguns dos mais importantes sintomas quando há o contato com as substâncias consideradas tóxicas. UNIDADE 1 — TÓXICOS: ESPÉCIES E SEUS USOS 4 2 TOXICOLOGIA E TOXIDADE Há aqui uma diferença epistêmica de nomenclaturas. Note, prezado acadêmico, que muitas vezes a importância das definições científicas, analisadas por métodos rigorosos, levam o pesquisador a diversos caminhos em sua jornada de descobrimento. Em poucas palavras, a diferença entre toxicologia e toxidade é justamente a dose de um remédio que se experimenta. A toxicologia faz a análise prévia das prováveis adversidades de um produto no organismo, enquanto a toxicidade investigará a capacidade da substância usada em causar algum malefício ao corpo, ou mesmo, ao planeta. E essa interligação muito tênue possui uma característica importante de cuidado e preservação, enquanto há o estudo químico de produtos diversos, e até onde esse item pode chegar na grande biodiversidade do planeta, conhecida como vida. 2.1 INTRODUÇÃO À TOXICOLOGIA Considerada como uma ciência multidisciplinar, pois se entrelaça com muitos outros ramos de estudos científicos, como a química, biologia e a medicina, define-se toxicologia a partir de sua função prioritária, de estudar os efeitos adversos das inúmeras substâncias químicas sobre os organismos vivos. Assim, a busca por uma compreensão rigorosa acerca dos efeitos tóxicos de inúmeros produtos, e como se resolve a questão da intoxicação é uma constante nos estudos toxicológicos (SHIBAMOTO, 2014). O estudo das toxinas faz parte também de um ciclo evolutivo humano, pois segundo o toxicologista e professor da Universidade da Califórnia, Takayuki Shibamoto, tóxicos que uma vez “causaram doença e sofrimento devastadores à humanidade, são atualmente empregadas como instrumentos para o estudo de mecanismos básicos, e para o desenvolvimento de curas para doenças humanas diversas, como hemorragia pós-parto, psicose e câncer” (SHIBAMOTO, 2014, p. 5). A toxicologia, portanto, estrutura-se de forma estreita aos vastos campos de estudos da química e da biologia, em busca da compreensão específica dos efeitos tóxicos. Descoberto em cerca de 1500 a.C., o Papiro de Ebers é um dos documentos mais antigos encontrado no Egito antigo e preservado até hoje, possui 110 páginas e 20,3 metros de comprimento; mostrando entre outras coisas, como é possível utilizar plantas medicinais como medicamento, trazendo um depositório de ervas suficientes para o tratamento de algumas moléstias como a asma. Tratamentos curiosos também eram difundidos no documento, como amarrar um filhote de crocodilo no crânio, para curar a cefaleia, como vemos na figura a seguir: TÓPICO 1 — AS ESPÉCIES DE TÓXICOS 5 FIGURA 1 – OS TRATAMENTOS ANTIGOS E CURIOSOS FONTE: Baptista (2003, p. 54) Por consequência do uso de produtos tóxicos, descreve também o manuseio da cicuta como veneno propriamente determinado ao uso de ceifar vidas, bem como o acônito, utilizado em pontas de flechas dos guerreiros. Essa substância era conhecida à época dos caçadores gregos como toxikon, daí a origem da palavra toxicologia (OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2008). Também conhecidos naquela época, o ópio, chumbo e o cobre poderiam ser utilizados de alguma maneira, tanto que a cicuta já era utilizada na Grécia antiga como forma de envenenamento, causando a famosa e trágica morte de Sócrates em 399 a.C., sentenciado a beber o liquido fatal. Nessa época, a morte pela cicuta era uma forma de pena capital na Grécia (SHIBAMOTO, 2014). Reza a lenda, que por volta de 75 a.C. Mitríades VI, rei do Ponto, território hoje localizado na Turquia, desde criança tinha a obsessão por venenos e chegou a ingerir pequenas quantidades de inúmeros tóxicos, desejando obter imunidade contra eles, ao desenvolver resistência aos seus componentes. Ainda, segundo a lenda, isso funcionou, pois certa vez foi capturado pelo rei inimigo e considerou ingerir uma grande quantidade de veneno para não se fazer prisioneiro, mas não conseguiu o efeito desejado. Daí o termo que usamos hoje para designar o uso de doses significativas de toxinas no organismo, com a intenção de proteção contra intoxicação causada por venenos diversos: o mitridato (SHIBAMOTO, 2014). A Lex Cornlélia, criada pelo Imperador Cornélio, tinha o intuito de evitar o envenenamento, muito comum na época de 82 a.C., tentando diminuir os casos que se multiplicavam no Império Romano, de intoxicação e morte por venenos dos mais diversos. No entanto, o que se viu foi o alastramento do uso desses componentes nos anos que se seguiram, com Nero e Calígula. UNIDADE 1 — TÓXICOS: ESPÉCIES E SEUS USOS 6 Philip von Hoheiheim, conhecido como Paracelso (1493-1541), fundou a toxicologia, em um período às voltas com o surgimento do Renascimento, e é dele a importante frase que se utiliza até os dias de hoje, formação do conceito básico da toxicologia: “Todas as substâncias são venenos; não há nenhuma substância que não seja um veneno. A dose certa é que diferencia o veneno de um remédio” (SHIBAMOTO, 2014, p. 6). Por volta de 1850, o início de uma era de uso de medicamentos acompanhou a toxicologia experimental, e na década de 1900, com a radioatividade e o uso de vitaminas diversas, alavancou o estudo das poções retiradas de produtos químicos que passavam a ser descobertos, testados e analisados, abrindo o caminho para a evolução da toxicologia (PASSAGLI, 2018, p. 38). Podemos definir toxicologiacomo a ciência que estuda os efeitos diversos e nocivos que são decorrentes das interações e emprego de substâncias químicas no organismo, a partir da exposição com o produto considerado e analisado (SHIBAMOTO, 2014). Posta-se como grande desafio da toxicologia estabelecer a segurança na utilização de substâncias químicas diversas, pois a resposta dada pelos organismos, difere em muito um dos outros. A toxicologia, portanto, é a ciência que estuda e verifica os efeitos nocivos causados pelas substâncias químicas sobre os organismos vivos diversos (ZAKRZEWSKI, 1994). Seus objetivos essenciais vão desde a identificação dos riscos associados a alguma substância, e ao mesmo tempo, determinar em que condições de exposição aos organismos esses riscos são ou foram induzidos (SHIBAMOTO, 2014). Entretanto, ela não se vale apenas para a proteção dos seres vivos e dos ambientes, ao analisar os efeitos causados pelas substâncias que analisa, mas também estuda com intuito de desenvolver agentes químicos considerados nocivos como pesticidas e drogas clinicas mais invasivas. Através de suas análises há uma maior segurança para propiciar aos manejadores de produtos, diversos métodos de ação diante da alta nocividade dos produtos. Por interpretar os efeitos adversos das substâncias em organismos vivos, tanto animais quanto humanos, e também quais os efeitos produzidos no meio ambiente, as pesquisas e especializações dessa área são muito diversificadas (KAASSEN, 2013). Como são duas áreas que se envolvem em estudos sobre as propriedades químicas e suas ações no organismo, a farmacologia e a toxicologia se distinguem. Isso se dá, pois, a primeira irá analisar os efeitos considerados terapêuticos das substâncias químicas, e como elas podem ser utilizadas com maior eficácia em finalidades médicas diversas. Já a toxicologia, irá averiguar os efeitos adversos que os organismos vivos estão propensos a correr em caso de contato com os produtos químicos, ocorrendo o contrário então, da farmacologia (KAASSEN, 2013). Os profissionais de toxicologia estão mais relacionados a medir o risco e calcular a potencialidade de determinadas substâncias, através de ferramentas de avaliação de risco. TÓPICO 1 — AS ESPÉCIES DE TÓXICOS 7 Prezado acadêmico! Veja que interessante entrevista da Conselheira do Conselho Regional de Biomedicina, 5ª Região, de Porto Alegre (CRBM-5), Marina Venzon Antunes, sobre a área da Toxicologia e sobre a sua carreira! Toxicologia: à procura da dose perfeita 01-11-19 Você já deve ter ouvido que “a diferença entre o remédio e o veneno é a dose”. Pois essa é uma variação popular da frase “a dose faz o veneno” do cientista Paracelso (1493-1541). Seja qual for versão, as duas frases, de certa forma, resumem o conceito de toxicologia. A toxicologia estuda a interação entre os compostos químicos e os seres vivos. Ao observar esta relação, procura identificar em qual situação e em que quantidade a substância química (seja ela natural ou sintética) começa a causar danos ao organismo. Isso permite verificar não só quais são os efeitos adversos provocados por esta substância como também estabelecer o uso seguro da mesma, além de desenvolver formas de prevenção e de tratamento de contaminações. A toxicologia tem um carácter multidisciplinar, pois relaciona-se com diversas outras áreas tais como biologia, genética, fisiologia e farmacologia. Por isso, seu campo de atuação também é bastante facetado. Alguns exemplos de linhas de atuação são a toxicologia ambiental (que verifica o impacto de poluentes nos ecossistemas), a analítica (que identifica fármacos ou drogas de abuso no sangue, saliva, cabelo e unhas, e auxilia no desenvolvimento de tratamentos e prevenções de intoxicações), a ocupacional (que avalia exposição dos trabalhadores a substâncias químicas) e a forense (que procura a presença de agentes tóxicos em uma investigação criminal). A conselheira do CRBM-5 Marina Venzon Antunes conta sua experiência na área, e apresenta outras possibilidades de atuação para o biomédico habilitado em toxicologia. – Como está o mercado para o biomédico nesta área? Marina Antunes – É um mercado promissor. A demanda pela realização de exames toxicológicos tem crescido nos últimos anos, como na realização de exames toxicológicos ocupacionais e ambientais, além das análises toxicológicas em matriz capilar, que permitem uma investigação retrospectiva do consumo de drogas devido a sua grande janela de detecção, auxiliando na distinção entre história de consumo social ou abuso de substâncias de forma crônica. No Brasil, o Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN) prevê exame toxicológico realizado em cabelo, para aferir o consumo de substâncias psicoativas usadas nos últimos 90 dias por motoristas profissionais. – Quais características e habilidades o profissional deve ter para trabalhar nesta área? MA – Assim como o profissional biomédico que atua em outras áreas, o biomédico toxicologista deve, entre outros, prezar pela ética profissional, ser organizado, proativo, manter-se constantemente atualizado, ter visão crítica, estar atento às inovações, ser questionador. – Qual o papel da toxicologia na saúde? MA – A toxicologia tem um papel importante na promoção da saúde. Posso citar duas áreas em que atuo: no monitoramento terapêutico de fármacos, buscando individualizar o tratamento e, com isto, diminuir os riscos associados a terapia farmacológica; e também nas análises toxicológicas ocupacionais, monitorando e minimizando o risco de toxicidade em trabalhadores expostos às mais diversas substancias químicas no seu ambiente de trabalho. Além destas, os estudos de toxicidade experimental são extremamente relevantes, para levantar dados sobre potenciais riscos tóxicos de novas e já existentes substâncias. DICAS UNIDADE 1 — TÓXICOS: ESPÉCIES E SEUS USOS 8 – Por que o interesse pela toxicologia? O que te atraiu? MA – Durante a graduação realizei cursos e participei de congressos na área, que me despertaram o interesse pela rotina do diagnóstico em análises toxicológicas. Tive oportunidade de ingressar na pesquisa como acadêmica voluntária, o que foi essencial para me aproximar e reconhecer-me na área. Enxerguei na toxicologia a oportunidade de atuar no monitoramento terapêutico de fármacos, auxiliando na personalização do tratamento farmacológico, buscando minimizar o risco de toxicidade ou mesmo de falha terapêutica em pacientes com as mais diversas patologias. Profissionalmente, atuei como responsável técnica de laboratório prestador de serviços em análises toxicológicas na Feevale – universidade em que, atualmente sou professora e pesquisadora -, onde pude desenvolver habilidades relacionadas ao desenvolvimento e validação de métodos bioanalíticos. Esta é uma área de grande inovação tecnológica, desafiadora em que nos deparamos com alta tecnologia. – Em que pesquisa você está trabalhando no momento? MA – Atualmente, em conjunto com o Hospital Municipal de Novo Hamburgo, estamos realizando um estudo em que avaliamos o uso de substâncias psicoativas em vítimas de trauma, de forma a contribuir para o entendimento da realidade atual sobre o uso de álcool, drogas lícitas e ilícitas neste grupo de pacientes, levantando dados para fundamentar ações em saúde pública de prevenção primária e secundária, reduzindo a mortalidade, a morbidade e os custos desta doença. FONTE: <http://crbm5.gov.br/toxicologia-a-procura-da-dose-perfeita/>. Acesso em: 16 jul. 2021. Para que se avaliem os riscos, é importante então que se analise o potencial de toxicidade que foi ingerida ou absorvida pelo organismo. E isso significa o primeiro passo para os tratamentos diversos que podem salvar uma vida, em caso de envenenamento. 2.2 TOXICIDADE Se a dose certa é determinante para que se diferenciar o remédio ou o veneno, conforme nos é explicado por Paracelso, então podemosdefinir qual a quantidade excessiva de doses, ou o próprio potencial tóxico de uma substância, que indicam sua toxicidade. E isso interpreta também a força de sua letalidade perante o organismo afetado. Dessa forma, toxicidade é a medida do potencial tóxico de uma substância, analisada a partir de sua fórmula ou uso. Por ela é refletido o potencial do produto que pode causar severos danos ao organismo vivo, detectando a quais tóxicos o organismo foi exposto (SHIBAMOTO, 2014). Essa análise é realizada pela avaliação da toxicidade, que irá compreender todos os dados toxicológicos que uma substância química é composta, para enfim classificá-la a fim de fornecer informações sobre os objetos avaliados (OLSON, 2013). Essa avaliação se perfaz em uma importância ímpar, quando diversos componentes químicos possuem em suas fórmulas toxinas negativas, mas se trabalhadas, podem se transformar em toxinas positivas, podendo ser utilizadas medicinalmente no organismo humano. http://crbm5.gov.br/toxicologia-a-procura-da-dose-perfeita/ TÓPICO 1 — AS ESPÉCIES DE TÓXICOS 9 Vamos agora considerar que a exposição a uma quantidade pequena de um agente altamente tóxico pode ter pouca importância. Por exemplo, a bactéria causadora do botulismo, o Clostridium botulinum, é capaz de produzir quantidades fatais de toxina botulínica em produtos enlatados que foram esterilizados de maneira inadequada. Essa toxina bacteriana é uma das substâncias mais tóxicas conhecidas. No entanto, a mesma toxina é utilizada terapeuticamente, por exemplo, para tratar o colo espástico, e esteticamente na redução de rugas da pele (SHIBAMOTO, 2014, p. 5). O quadro a seguir demonstra as fases da toxicidade e suas classes que variam conforme o produto e sua maior qualidade tóxica: QUADRO 1 – CLASSE TOXICOLÓGICA FONTE: O autor CLASSE I Extremamente tóxico Faixa Vermelha CLASSE II Altamente tóxico Faixa Amarela CLASSE III Medianamente tóxico Faixa Azul CLASSE IV Pouco tóxico Faixa Verde A atividade de classificar mediante a potencial ameaça de intoxicação, demonstrando através de cores que representam a força do produto serve como uma advertência, que além de instrutiva, é também pedagógica, auxiliando na identificação dos produtos mais tóxicos aos menos tóxicos. Há também o comum símbolo encontrado em produtos de alta toxicidade, como agrotóxicos e até em domissanitários, identificados por uma caveira com ossos cruzados. Essa simbologia permite a interpretação dos produtos diversos, em qualquer lugar do mundo, e é regulada pela diretiva de rotulagem de substâncias perigosas realizada pela União Europeia, com intuito de padronizar mundialmente a mensagem. QUADRO 2 – SINALIZAÇÃO DOS PERIGOS UNIDADE 1 — TÓXICOS: ESPÉCIES E SEUS USOS 10 FONTE: Adaptado de https://bit.ly/3sdK4Ng Acesso em: 4 ago. 2021. De acordo com os níveis de exposição ao produto químico, a toxicidade pode ser aguda ou crônica. A toxicidade aguda pode ser causada a partir de um curto espaço de tempo de exposição ao produto, ou à administração de uma ou mais doses da substância num período de 24 horas (BRITO, 1994). Segundo Barros e Davino (2003, p. 57), “é considerada a dose única para determinar qual a potência da substância em casos de ingestão ou envenenamento acidental, e as doses múltiplas para avaliar os efeitos cumulativos”. Nesse sentido, é pela informação da dosagem inicial ou recomendada que se identificam os casos possíveis a partir de uma superdosagem, o que causa o envenenamento. A toxicidade crônica resulta de repetidos e diários usos de uma determinada substância, utilizando os dados de curto, médio e longo prazo. Esses estudos são realizados para que se determinem os efeitos tóxicos após exposição prolongada a doses cumulativas de alguma substância. O filme Erin Brockovich, uma mulher de talento, dirigido por Steven Sodenbergh, lançado em 2000, com Julia Roberts, conta a história de uma determinada técnica jurídica que descobre o que o cromo pode causar na saúde das pessoas. O cromo (Cr) é um elemento químico usado em metalúrgicas. Para prevenir a corrosão dos canos pelo tempo e pela passagem de água, uma empresa abastecedora de água de uma região utiliza o material de forma ilegal, em grandes quantidades que se dispersam junto com o líquido, utilizado pelas pessoas na comunidade. Muitas dessas pessoas estão doentes, e é aí que entra a personagem principal. Importante destacar o uso de materiais que em grandes quantidades podem ser considerados extremamente tóxicos, se consumidos. DICAS Para Shibamoto (2014), sempre haverá o risco quando se trata do manuseio e da estocagem de produtos químicos, principalmente daqueles em que suas substâncias podem causar danos aos organismos. Nesse sentido, o perigo é a capacidade que a substância tem em causar algum efeito adverso, sendo armazenado ou manuseado; então determina-se o risco, que é a probabilidade de o produto produzir danos, a partir de sua toxicidade (SHIBAMOTO, 2014). Por esse motivo são importantes os Equipamentos de TÓPICO 1 — AS ESPÉCIES DE TÓXICOS 11 Proteção Individual utilizados em empresas que lidam com produtos tóxicos, pois o ambiente pode se tornar um propício diluente para que as substâncias ajam no contato com o trabalhador, seja em sua estocagem (manuseio indireto), ou em seu manuseio direto. 2.3 ESPECIALIDADES TOXICOLÓGICAS Desenvolvida em vários ramos determinados pela sua especificação, a toxicologia evoluiu muito desde suas origens e segue em crescimento, tendo em vista as modernas tecnologias que suportam pesquisas em várias de suas áreas especializadas. Entre elas, destacamos as mais importantes ramificações da matéria, como a toxicologia clínica, que previne, diagnostica e compõe o tratamento de pessoas e animais expostos ao veneno, realizando sua função em clínicas e hospitais (SHIBAMOTO, 2014). Interligadas diretamente pelo seu objeto de estudo, a toxicologia de medicamentos se destina aos remédios indicados aos tratamentos de algumas doenças, mas que também tendem a causar efeitos colaterais e adversos em seus pacientes, por inúmeros motivos. Esses efeitos são pesquisados e relatados para a criação de novos fármacos que possam minimizar seus impactos nos tratamentos. A toxicologia ambiental engloba o uso de agentes tóxicos na natureza e qual a sua proporção intoxicante nos ambientes e nos organismos vivos. O impacto dos poluentes químicos diversos no ecossistema, que influencia a vida natural de diversos organismos componentes do ambiente é estudado pela ecotoxicologia, que é a ramificação da toxicologia ambiental. Muito importante por abranger estudos acerca da nossa segurança na ingestão de alimentos, é a toxicologia alimentar, que analisa os diversos efeitos adversos que são produzidos pelos produtos químicos dispersos em alimentos, como os agrotóxicos. Essa área determina os organismos contaminantes em alimentos produzidos ou processados pelo homem, enfocando nos efeitos tóxicos de produtos diversos que podem estar presentes nos alimentos. Para identificar e tratar de possíveis substâncias químicas presentes nos ambientes de trabalho, geralmente realizados por atividades que permitem/ requerem alguma exposição ao produto, há a toxicologia ocupacional, monitorando o ambiente bem como, o próprio trabalhador. Para o professor Shibamoto a toxicologia regulatória identifica uma área de estudos muito importante para a avaliação dos dados na tomada de decisões e realização de protocolos de segurança: UNIDADE 1 — TÓXICOS: ESPÉCIES E SEUS USOS 12 A toxicologia regulatória engloba a coleta, o processamento e a avaliação de dados toxicológicos epidemiológicos e experimentais para possibilitar a tomada de decisões baseadas na ciência e voltadas para a proteção dos seres humanos contra osefeitos danosos de substâncias químicas. Além disso, essa área da toxicologia auxilia no desenvolvimento de protocolos padronizados e de novos métodos analíticos para aprimorar continuamente a base científica dos processos de tomada de decisões (SHIBAMOTO, 2014, p. 5). Podemos avaliar, dessa forma, a toxicologia regulatória como uma forma importante para os estudos das normas legais, quando desenvolve a avaliação de informações diversas, que podem ser utilizadas pelo direito para avaliar a legalização de determinados produtos que podem ou não ser aceitos. Junto à toxicologia forense, formam o eixo de análises utilizadas pelo direito, na formação de suas estruturações legais. Outra área de imensa importância para o direito e para as investigações criminais é a toxicologia analítica, pois é por ela que se identificam as substâncias nocivas no organismo, por intermédio de exames diversos. Voltada a diagnosticar e indicar tratamentos e prevenções das intoxicações, esse ramo consegue qualificar e quantificar a substância absorvida pelo organismo, detectando também o melhor tratamento, auxiliando a justiça nos casos de ingestão de drogas, quando há overdoses que devem ser apuradas, ou crimes ocorridos sob a atuação de determinada substância no corpo. A toxicologia forense, envolve a busca por evidências que demonstram a presença de substâncias químicas em investigações criminais, por meio de análises biológicas na constatação do uso de drogas ou envenenamento, bem como, determina o uso ilegal de agentes tóxicos. Portanto, podemos determinar a toxicologia forense inserida no âmbito da toxicologia analítica, pois detecta a partir de suas análises a quantificação de substâncias tóxicas em um organismo. As substâncias mais tóxicas encontradas na tabela periódica, e que conseguem uma rápida transformação do organismo atingido por intermédio de sua ação, são os metais pesados. Consideram-se metais pesados aqueles que possuem um número atômico elevado, que identifica a quantidade de prótons no núcleo do átomo. Quanto mais prótons, mais mortal considera-se o elemento, isso porque o átomo corresponde à menor porção que um elemento químico pode ser dividido, e ainda, mantendo suas propriedades originais (AZEVEDO; CHASIN, 2003). Situados na tabela periódica entre o Cobre e o Chumbo, veja quais são os considerados mais mortais do mundo. Observe que quanto maior seu número atômico, mais perigoso é o metal. TÓPICO 1 — AS ESPÉCIES DE TÓXICOS 13 QUADRO 3 – METAIS PESADOS E CLASSIFICAÇÃO FONTE: <http://www.ufrgs.br/lacad/toximetaispesados.html>. Acesso em: 16 jul. 2021. http://www.ufrgs.br/lacad/toximetaispesados.html UNIDADE 1 — TÓXICOS: ESPÉCIES E SEUS USOS 14 Pelo fato da força invasiva dessas substâncias químicas, utilizadas em produtos de diversos usos e serventias, é necessária ampla e precisa atuação dos órgãos responsáveis pela fiscalização. E é através da Divisão de Controle e Fiscalização de Produtos Químicos (DCPQ) que a Policia Federal realiza e efetiva o controle e fiscalização da fabricação, produção, armazenamento, compra, venda, comercialização, importação e exportação, bem como do uso de produtos químicos diversos, que podem também ser utilizados na elaboração de materiais ilícitos, como as drogas de natureza sintética. A Portaria nº 240, de março de 2019, estabelece os procedimentos para o controle e fiscalização de produtos químicos, definindo também a atuação da Policia Federal, que desenvolverá o controle dessas substâncias. Como veremos, é a ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) que determinará o que se considera droga ilícita, que não tem seu uso permitido. Indicação de livro: o professor titular de toxicologia da Universidade de São Paulo (USP), Seizi Oga, lançou em conjunto com os professores Marcia Maria Camargo e José Antônio Batistuzzo, o livro Fundamentos de Toxicologia. Lançado em 2008 pela editora Atheneu, a obra já está em sua 4° edição, e é muito utilizada nas pesquisas acerca do tema, por profissionais e estudantes da área. DICAS No próximo tópico, nós iremos analisar os processos de intoxicação e a partir deles, determinar quais são os efeitos tóxicos mais influentes no organismo, causados pelos mais diversos componentes químicos utilizados, e que tem um grande potencial de intoxicação. 15 Neste tópico, você aprendeu que: • Todas as substâncias são venenos; não há nenhuma substância que não seja um veneno. A dose certa é que diferencia o veneno de um remédio, conforme nos ensinou Paracelso. • A toxicidade varia de acordo com os níveis de exposição ao produto químico, podendo ser classificada pela avaliação da toxicidade como aguda ou crônica. • São oito os ramos de especialização da toxicologia: toxicologia analítica, toxicologia forense, toxicologia ocupacional, toxicologia regulatória, toxicologia alimentar, toxicologia ambiental, toxicologia de medicamentos e toxicologia clínica. • Através da Divisão de Controle e Fiscalização de Produtos Químicos (DCPQ), a Policia Federal realiza e efetiva o controle e fiscalização da fabricação, produção, armazenamento, compra, venda, comercialização, importação e exportação e o uso dos produtos químicos diversos. RESUMO DO TÓPICO 1 16 1 Considerando as diversas áreas da toxicologia, cada uma influente na verificação das análises da intoxicação, são reconhecidas como especialidade toxicológicas para auferir métodos diversos, mas especializados. A respeito dessas áreas específicas de investigação, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) A toxicologia regulatória, inserida no âmbito da toxicologia forense, fornece subsídios para a regulação tanto do uso de substâncias diversas, quanto métodos para confrontar sua toxicidade medicinalmente. b) ( ) Toxicologia considerada como ocupacional é uma área de especialidade que corresponde aos estudos nos ambientes profissionais diversos, que podem ter contato com produtos químicos variados. c) ( ) Venenos de animais peçonhentos não são analisados pelas especialidades da toxicologia, uma vez essa área possuir sua própria definição em estudos medicinais especializados. d) ( ) Os alimentos, estudados pela toxicologia alimentar, enfocam seus estudos na estocagem dos produtos, que devem ser realizadas distantes de produtos consideravelmente tóxicos. 2 A simbologia padronizada pela União Europeia e utilizada em diversos países, entre eles o Brasil, determina um aspecto pedagógico e visual para a identificação dos produtos considerados tóxicos. Nesse sentido, analise as questões: ( ) Não há necessidade em simbolizar elementos radioativos, pois estes não são considerados a partir de sua toxicidade. ( ) A atividade de realizar a classificação serve como uma advertência, que além de instrutiva é também pedagógica, auxiliando na identificação dos produtos mais tóxicos aos menos tóxicos. ( ) Produtos domissanitários não possuem símbolos ou marcação diversa, uma vez que o rótulo já indica os seus perigos e riscos. ( ) A simbologia permite a analise interpretativa das substâncias, realizadas com intuito pedagógico e disciplinar. Assinale a questão que identifique a sequência CORRETA: a) ( ) F – V – F – F. b) ( ) V – F – V – F. c) ( ) F – V – F – V. d) ( ) F – V – V – F. 3 Assinale a alternativa CORRETA: I- Toxicidade aguda é resultante de repetições causadas em utilização diária e constante de determinada substância. AUTOATIVIDADE 17 II- A causa para a toxicidade aguda pode se dar em um curto espaço de tempo a que o indivíduo fica exposto ao produto. III- Os estudos de toxicidade crônica são determinantes para identificar os efeitos tóxicos após exposição prolongada a doses cumulativas do produto. IV- Tanto a toxicidade aguda ou crônica dependem do uso descomprometidoda substância tóxica em análise. Estão corretas as questões: a) ( ) Apenas a questão I está correta. b) ( ) As questões I e II estão corretas. c) ( ) As questões II e III estão corretas. d) ( ) As questões III e IV estão corretas. 4 A necessidade de estudar a toxicologia surgiu devido ao crescente número de materiais e produtos tóxicos existentes e criados pelo homem, capazes de causar malefícios tanto ao organismo humano, quanto à natureza que nos rodeia. Disserte sobre os ramos especiais da toxicologia e identifique a importância de cada um deles: 5 Explique por que a toxicidade varia de acordo com os níveis de exposição ao produto químico: 18 19 TÓPICO 2 — UNIDADE 1 OS PROCESSOS DE INTOXICAÇÃO 1 INTRODUÇÃO Prezado acadêmico! Neste tópico, nós iremos abordar quais são os processos mais inerentes à intoxicação, para que possamos seguir nossos estudos a respeito das drogas líticas e ilícitas. Nesse ínterim, entender como os componentes diversos passam a agir no organismo através dos contatos, que podem ocorrer de maneiras diversas, nos dão um grande respaldo quando o assunto exige o domínio de determinados conceitos técnicos da área médica e biológica. Por intermédio da classificação dos efeitos mais comuns no órgão humano, o médico passa a entender antes mesmo da realização de exames diversos, podendo assim agir preventivamente, tomando medidas ágeis para conter o mal causado pela substância venenosa, antes mesmo dos resultados mais conclusivos trazidos por exames especializados diversos. É grande a importância em determinar a forma com a qual a intoxicação foi causada, através de análises e investigações realizadas no pronto atendimento, que costuma ser o primeiro contato do paciente com o profissional de saúde. Seja bem-vindo a mais essa etapa de nossos estudos! Vamos lá! 2 A INTOXICAÇÃO Diante dos diversos produtos químicos utilizados pelas sociedades, a intoxicação passou a ser considerada, pela Organização Mundial da Saúde (OMS), um problema de saúde pública de importância global. O número de pessoas intoxicadas cresceu substancialmente, por determinados motivos, entre eles o uso incipiente de remédios diversos, os tóxicos utilizados por empresas alimentícias e de limpeza, e a comercialização criminosa de entorpecentes (AZEVEDO; CHASIN, 2003). Como vimos a toxicologia é considerada a “ciência dos efeitos adversos de substâncias químicas sobre os organismos vivos” (BRUNTON, 2018, p. 25), causados pelo contato com o material intoxicante. Entretanto, a partir das análises qualitativas percebeu-se que a intoxicação pode ser causada por inúmeros produtos, dispostos em qualquer lugar e de fácil acesso a todos. 20 UNIDADE 1 — TÓXICOS: ESPÉCIES E SEUS USOS Neste tópico, veremos a principal classificação dos efeitos tóxicos diversos causadas no organismo, bem como as formas mais comuns e analisadas pelos cientistas a respeito da intoxicação. 2.1 CLASSIFICAÇÃO DOS EFEITOS TÓXICOS Após a interação com o organismo, os produtos nocivos agem quimicamente, alterando as funções normais do corpo. Mas os efeitos que cada substância irá apresentar vai depender diretamente do organismo de cada um. Assim, a intensidade dos efeitos dependerá de aspectos subjetivos da pessoa exposta e do produto utilizado (AZEVEDO; CHASIN, 2003). Podem-se classificar os efeitos a partir da quantidade de veneno e da qualidade do organismo exposto, mas as características individuais do paciente se perfazem em importantes informações para determinar as possibilidades de efeitos mais fortes, causados pelo elemento tóxico. Entre elas, a idade, sexo, estado de saúde, peso, e informações genéticas e médicas diversas são capazes de informar a possibilidade de efeitos mais invasivos. Entretanto, outras informações necessárias fazem parte do método de análises e investigação médica, que intentam responder à quantidade de doses ingeridas/absorvidas pelo organismo da substância química, o tempo que durou o contato de exposição ao agente tóxico e qual a sua forma de entrada no organismo (SHIBAMOTO, 2014). Assim, obtemos quatro maneiras de classificar os efeitos tóxicos que avaliam situações das quais são dependentes os diagnósticos médicos, na confirmação do produto intoxicante em contato com o organismo e em seus efeitos mais drásticos, a partir da manifestação de suas ações deletérias. A classificação de acordo com o tempo de manifestação, pode ser evidenciada por seus efeitos (SHIBAMOTO, 2014): • Agudos: expõe a toxicidade através de sinais corpóreos, visíveis logo após a exposição à substância. • Crônico: após a exposição/intoxicação, os efeitos mais importantes são visíveis após um determinado período de tempo, mas não logo após o contato. • Efeito retardado: aqui há um período em que os efeitos se elaboram no organismo, em um pequeno intervalo considerado latência, para demonstrar seus efeitos principais. Os efeitos também variam de acordo com o tipo de substância utilizada, pois sua abrangência pode ser definida através do órgão atingido e manifestada pelo seu adoecimento. Ocorre que algumas substâncias agem localmente, no próprio local afetado no corpo, outras se distribuem pelo organismo, atingindo órgão diverso daquele local de entrada no corpo. TÓPICO 2 — OS PROCESSOS DE INTOXICAÇÃO 21 Assim é definida a classificação de acordo com a abrangência da atuação do produto (SHIBAMOTO, 2014): • Efeito local: ocorre no primeiro contato com o organismo, no caso de ações causadas por substâncias corrosivas que causem queimaduras ou vermelhidão local. • Efeito sistêmico: aqui há necessidade de o produto percorrer o organismo, atingindo algum órgão que defira do local do contato inicial. Os danos ao organismo também são definidos pela ação do produto, e por sua capacidade de invasão aos órgãos. Nesse sentido, são dois efeitos produzidos que demonstram a classificação quanto à reversibilidade: ou o órgão contaminado possui capacidade para regenerar-se, pois o dano não causou tamanho prejuízo, sendo então possível a sua reestruturação natural ou por via de remédios aplicados, ou então não é possível a regeneração do órgão afetado. Esses efeitos são considerados reversíveis e irreversíveis, dispostos na classificação dos efeitos tóxicos. Há também a classificação feita de acordo com a interação de vários agentes tóxicos com o organismo, que são considerados como (SHIBAMOTO, 2014): • Efeito aditivo: o efeito da combinação de dois ou mais produtos no organismo, é o mesmo da soma dos efeitos individuais dos agentes utilizados. • Efeito sinérgico: o efeito da combinação dos agentes é ainda maior que a soma do uso dos produtos tóxicos utilizados. • Efeito potencializador: um agente tóxico, na interação com outro produto, aumenta a toxicidade de ambas as substâncias utilizadas. • Efeito antagônico: esse efeito ocorre quando as substâncias interferem na ação uma da outra, invalidando-se e neutralizando-se, o que diminui o efeito ao final; geralmente ocorre quando as substâncias possuem um menor potencial de ofensividade ao organismo do paciente. 2.2 FORMAS DE INTOXICAÇÃO A intoxicação pode ser ocasionada por duas formas: de maneira endógena e exógena. Substâncias consideradas endógenas são produzidas pelo próprio organismo, e purificadas pelo fígado, eliminadas pelos rins, tanto pelo suor, quanto pela urina. A partir do momento que esses órgãos não conseguem realizar sua ação depurante, temos a intoxicação endógena. Significa que o organismo está produzindo em excesso algumas substâncias, como a ureia ou o líquido biliar (OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2008), causado por alguma disfunção desses órgãos e ocasionando a intoxicação. De outrolado temos a intoxicação exógena, motivada por produtos nocivos exteriores ao organismo, e pode ocorrer por diversos fatores, entre eles, pela inalação ou pelo contato direto com esses produtos (OGA; CAMARGO; 22 UNIDADE 1 — TÓXICOS: ESPÉCIES E SEUS USOS BATISTUZZO, 2008). Essas intoxicações formam uma das principais causas de atendimentos em emergências, pois a substância tóxica é capaz de desiquilibrar fisiologicamente o organismo, através de perturbações bioquímicas que causam sintomas diversos, podendo levar à morte. A intoxicação pode ser considerada exógena aguda, quando há percepção de sinais e sintomas clínicos que se demonstram alterados, devido à interação com a substância química (SANTOS; CASTRO; TRIGO; KASHIWABARA, 2014). Sintomas como a salivação e suor excessivos, hálito com forte odor, diarreia e vômito, queda de temperatura, lesões na pele e até mesmo a inconsciência, podem ser relatos que confirmam que uma pessoa pode estar passando por um período de reprovação do organismo ao produto a que foi exposto; e esse é o primeiro sintoma de uma intoxicação (OGA; CAMARGO; BATISTUZZO, 2008). O uso de drogas e o contato direto com produtos, são grandes destaques para a toxicologia, pois os agentes utilizados podem causar sintomas diversos em pessoas diversas de forma diferente (SANTOS; CASTRO; TRIGO; KASHIWABARA, 2014). Veja, prezado acadêmico, que com a pandemia mundial da Covid 19, o número de intoxicação aumentou, pelo uso prolongado de determinados produtos e pela própria quarentena, identificando as crianças como grandes personagens de envenenamento nesse período. Também destacamos algumas orientações, a fim de prevenção e cuidado com o armazenamento de produtos altamente tóxicos, como os domissanitários (produtos de limpeza): Anvisa alerta sobre aumento de intoxicação por produtos de limpeza A Agência pede mais atenção com as crianças Publicado em 18/05/2020 - 08:06 Por Agência Brasil* - Brasília A fim de reduzir os riscos à saúde causados pelo aumento da exposição tóxica por produtos de limpeza no país, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) divulgou a Nota Técnica (NT) 11/2020, que alerta a população sobre o crescimento dos casos de intoxicação. De acordo com a Anvisa, embora não haja informações que demonstrem o vínculo definitivo entre a exposição e os esforços de higienização e desinfecção para evitar a disseminação da covid-19, parece haver uma associação temporal com o aumento do uso dos produtos. O documento orienta também sobre o uso e o armazenamento adequados dos chamados saneantes domissanitários, ou seja, os saneantes de uso domiciliar que contêm substâncias ou preparações destinadas à higienização e à desinfecção. A nota foi elaborada com base nos dados dos centros de Informação e Assistência Toxicológica (CIATox). “Para se ter uma ideia do crescimento dos casos de intoxicação, de janeiro a abril deste ano os CIATox receberam 1.540 registros de intoxicação devido a produtos de limpeza envolvendo adultos, um aumento equivalente a 23,3%, comparado ao mesmo período de 2019, e de 33,68%, com relação a 2018”, informa a Anvisa. IMPORTANT E TÓPICO 2 — OS PROCESSOS DE INTOXICAÇÃO 23 Crianças No que se refere às crianças, foram registrados 1.940 casos, um aumento de 6,01% e de 2,7%, em relação a 2019 e 2018, respectivamente. De acordo com a Agência, os números mostram que os acidentes domésticos envolvendo exposição tóxica a substâncias químicas são mais frequentes com o público infantil e, portanto, há necessidade de dispensar mais cuidados às crianças. Orientações básicas 1- Mantenha os produtos de limpeza fora do alcance de crianças e animais. Esses produtos podem atrair a atenção principalmente de crianças pequenas, entre 1 e 5 anos de idade. 2- Evite o armazenamento desses produtos em recipientes diferentes e não etiquetados. 3- Supervisione as crianças, não permitindo que elas acessem os ambientes onde esses produtos são guardados. 4- Não deixe detergentes e produtos de limpeza em geral embaixo da pia, ou no chão dos banheiros. 5- Leia e siga as instruções descritas no rótulo de cada produto. 6- Evite a mistura de produtos químicos. 7- Garanta a ventilação quando manusear um desses produtos destinados à limpeza, higienização e desinfecção. 8- Inutilize as embalagens vazias. Isso porque elas sempre ficam com resíduos, ou seja, restos dos produtos. Jogue fora as embalagens vazias, preferencialmente valendo-se do sistema de coleta seletiva, de modo a separá-las do lixo orgânico. 9- Em caso de emergências toxicológicas, não provoque vômito. Tenha em mãos o número do Centro de Informação e Assistência Toxicológica, o CIATox: 0800-722-6001. FONTE: <https://bit.ly/3AZOA5t>. Acesso em: 12 jul. 2021. São consideradas substâncias mais comuns, encontradas nos exames em pacientes intoxicados e que se apresentam nas unidades de emergência médica: • Produtos químicos utilizados em limpeza doméstica e de laboratórios. • Venenos utilizados nas residências, como raticida e aerossóis diversos. • Entorpecentes e medicamentos em geral. • Alimentos deteriorados. • Gases tóxicos. Todos esses casos fazem parte da intoxicação exógena, que será visto no livro didático ao considerar o uso das drogas lícitas e ilícitas. Dentre as vias de intoxicação de substâncias externas ao organismo, é considerada principal a via respiratória, por apresentar possibilidades imensas para a entrada do produto nocivo ao corpo, levando a nocividade para todos os órgãos como pulmões e para a circulação sanguínea, afetando o cérebro (DALL’ACQUA; ROSSI; COUTO; MOREIRA, 2011). É pela via cutânea (pele), que os agentes nocivos podem encontrar a entrada ao nosso corpo, disseminando através do tato e do contato com o maior órgão do corpo humano, toda sua potencialidade. A via oral ou digestiva representa um grande risco à saúde por conta da ingestão de produtos diversos, na intoxicação alimentar ou no próprio uso de entorpecentes (DALL’ACQUA; ROSSI; COUTO; MOREIRA, 2011). 24 UNIDADE 1 — TÓXICOS: ESPÉCIES E SEUS USOS O processo de intoxicação é dividido em quatro partes: a fase de exposição, a toxicocinética, a fase toxicodinâmica e por último, a fase da exibição. Já a fase toxicocinética, é aquela onde há a resposta direta do organismo contra o tóxico invasor, fazendo funcionar toda a defesa até a eliminação dos componentes através das vias respiratórias, pela pele ou pelo trato intestinal. Essa é a primeira relação entre o organismo e a droga, numa tentativa de repelia do intoxicante (DALL’ACQUA; ROSSI; COUTO; MOREIRA, 2011). A fase toxicodinâmica representa o momento em que a substância, em sua interação com o organismo, provoca modificações nas estruturas moleculares, causando feridas ou comichão, inchaço ou vermelhidão em locais diversos da epiderme. Essa fase representa a intoxicação, caracterizando-a externamente. A quarta e última fase é conhecida por exibição, que é a confirmação do problema por intermédio dos resultados clínicos e das análises laboratoriais diversas, com a confecção dos exames necessários para identificar a causa da intoxicação (DALL’ACQUA; ROSSI; COUTO; MOREIRA, 2011). Para facilitar o desempenho dos profissionais médicos no atendimento e nas identificações das inúmeras causas que existem de intoxicação, alguns sinais e sintomas podem demonstrar o ocorrido, a partir de sua análise inicial e superficial (SHIBAMOTO, 2014). Isso é muito importante para que se possa dar o primeiro passo no tratamento, que requer a retirada dos componentes químicos do corpo o mais célere possível. As análises seguem o rigoroso método científico, determinando as interpretações para o problema, que mesmo após de determinada sua causa, ainda podem ser variadas (DALL’ACQUA; ROSSI; COUTO; MOREIRA, 2011). O quadro,a seguir, demonstra determinados sinais que podem evidenciar o tipo de intoxicação: QUADRO 4 – PRINCIPAIS SINAIS E SINTOMAS DE INTOXICAÇÃO Envenenamento por ingestão Envenenamento por contato Envenenamento por inalação Queimaduras, lesões ou manchas nos lábios Manchas na pele Respiração rápida Odores na respiração, corpo, roupas. Coceira Tosse Hálito com odor diferente Comichão e vermelhidão intensa Olhos irritados Suor excessivo Irritação nos olhos Visão turva Queixa de dor ao engolir Dores de cabeça Pigarro e salivação excessiva Queixa de dor abdominal Temperatura da pele aumentada Sintomas gerais variam conforme o veneno inalado. Náuseas, vômitos diarreia Dores nos olhos - Sonolência, falta de reflexos Dores atrás dos olhos - TÓPICO 2 — OS PROCESSOS DE INTOXICAÇÃO 25 Convulsões Dores no musculo do pescoço - Alterações na pulsação, respiração e temperatura corporal - - Aumento ou diminuição das pupilas - - FONTE: Adaptado de Klaassen e Watkins (2012). QUADRO 5 – ORIENTAÇÕES GERAIS FONTE: <https://bit.ly/3CUABPO>. Acesso em: 12 jul. 2021. No caso de intoxicação confirmada, a primeira ação deve ser ocupar-se da manutenção das funções de vida do paciente. Muitos acidentes acontecem envolvendo produtos domissanitários, mesmo dentro das casas, e as principais vítimas são as crianças pequenas (SHIBAMOTO, 2014). O quadro a seguir demonstra as orientações gerais em casos de intoxicação diversa: Orientações gerais Intoxicação pela pele Intoxicação por inalação Intoxicação por ingestão Remover a vítima para local arejado Lavar o local abundantemente Remover a vítima para local arejado Não provocar vômito Afrouxar as vestes Lavar os olhos durante 15 minutos e cobrir com pano sem pressionar Não realizar boca a boca Não oferecer água Não deixar a vítima sozinha, o perigo de asfixia aumenta Não esfregar o local Encaminhar ao médico Não oferecer leite Deixar a vítima confortável Não usar álcool ou medicamento a base de etileno Não oferecer líquido algum Transportar a vítima em posição lateral para evitar o engasgar com possível vômito Encaminhar para serviço médico A descontaminação deve ocorrer o mais rápido possível, por profissionais médicos, ao determinar a possível causa do envenenamento. Algumas técnicas como a indução de vômito, lavagem do conteúdo gástrico e sondagem nasogástrica, utilizam o carvão ativado e produtos laxativos (DALL’ACQUA; ROSSI; COUTO; MOREIRA, 2011), por esse motivo, o encaminhamento ao médico deve ser feito no primeiro contato com a pessoa intoxicada; uma vez que produtos desintoxicantes somente podem ser encontrados e manuseados por profissionais da saúde, nesses casos. 26 UNIDADE 1 — TÓXICOS: ESPÉCIES E SEUS USOS Segundo dados do IBGE, os medicamentos, os animais peçonhentos e os produtos domissanitários são os principais causadores da intoxicação no país, mas ainda existem outros produtos causadores de envenenamento, como os agrotóxicos (IBGE, 2012). O Brasil, segundo IBGE (2012), é o país que mais se utiliza desse produto no mundo, e são considerados como muito perigosos, na classificação que vai desde pouco perigosos a altamente perigosos. No tópico por vir, vamos nos concentrar no estudo das drogas, tanto aquelas consideradas lícitas, quanto ilícitas. E veremos qual é o tratamento normativo para esse tema que tanto traz discussões diversas, perfazendo-se em uma grande temática na atualidade. 27 RESUMO DO TÓPICO 2 Neste tópico, você aprendeu que: • A classificação, de acordo com o tempo de manifestação, pode ser por seus efeitos: agudos, crônicos e retardado. • Os danos ao organismo também são definidos pela ação do produto e por sua capacidade de invasão aos órgãos; esses danos são considerados reversíveis e irreversíveis, dispostos na classificação dos efeitos tóxicos. • Há uma classificação feita de acordo com a interação de vários agentes tóxicos com o organismo, que são considerados como: efeito aditivo, efeito sinérgico, efeito potencializador e efeito antagônico. • A intoxicação pode ser ocasionada de duas formas: de maneira endógena e exógena. • O processo de intoxicação é dividido em quatro partes: a exposição, a fase toxicocinética, a fase toxicodinâmica e a exibição. • Para facilitar o desempenho dos profissionais médicos no atendimento e nas identificações das inúmeras causas que existem de intoxicação, alguns sinais e sintomas podem demonstrar o ocorrido a partir de sua análise, ainda que inicial e superficial. 28 1 Quanto aos danos ao organismo, causados pela ação de produto invasivo com sua capacidade tóxica considerada danos, assinale a questão que indique a alternativa CORRETA: I- São irreversíveis os eventos causados por produtos tóxicos a partir de seus efeitos, entretanto, não dispõe de classificações próprias para essa indicação. II- São reversíveis aqueles danos causados por substância tóxica onde o órgão se determina pela sua incapacidade de regeneração. III- Efeito potencializador demonstra que a combinação de produtos potencialmente invasivos no organismo aumenta a toxicidade de todos os produtos utilizados. IV- O efeito antagônico prevê que os produtos utilizados, por seu menor potencial ofensivo, são anulados no organismo. Está CORRETA a questão: ( ) As questões II e IV estão corretas. ( ) As questões II e III estão corretas. ( ) As questões I e III estão corretas. ( ) As questões III e IV estão corretas. 2 Quanto ao tempo de manifestação dos sinais ou efeitos após a intoxicação, e, seguindo os ensinos das classificações referentes à análise, assinale F para Falso e V para Verdadeiro: ( ) Os efeitos podem variar conforme a substância utilizada, podendo a intoxicação atingir apenas determinado órgão ou todos os órgãos.. ( ) Os efeitos agudos consideram a toxicidade através da exposição, quando são visíveis após um período de tempo. ( ) Considera-se efeito agudo, aquele que expõe a toxicidade através dos sinais visíveis logo após à exposição. ( ) O efeito que retarda a aparecer no organismo demonstra um tempo de manifestação diferente, uma vez que logo após o contato é possível sua visualização, após o período de dormência. Assinale a alternativa que indica a assertiva CORRETA: a) ( ) F – V – F – V. b) ( ) F – V – F – F. c) ( ) F – V – V – V. d) ( ) V – F – V – F. AUTOATIVIDADE 29 3 A respeito dos principais sintomas de intoxicação, responda à questão CORRETA: ( ) Como não há um método de análises para a verificações de possíveis causas de intoxicação, é importante que a desintoxicação ocorra o quanto antes. ( ) O paciente envenenado por ingestão, usualmente apresenta queimaduras e manchas nos lábios. ( ) Manchas na pele não são capazes de demonstrar qual forma de envenenamento, mas sua avaliação é fundamental para o início do tratamento. ( ) O envenenamento por inalação é representado pela temperatura aumentada do organismo, como primeiro sintoma. ( ) Comichão e coceira indicam o sintoma essencial causado pela ingestão de produtos tóxicos, conforme estudamos acima. 4 Podemos observar que os produtos domissanitários são causadores de um número grande de intoxicação, principalmente pela sua facilidade de aquisição, sua maneira de estocagem e armazenamento e seu uso contínuo nas residências. As crianças são as principais vítimas desses produtos, bem como, pessoas que se utilizam deles não se atentando ao seu alto grau de invasividade no organismo humano. Como você acredita que podemos lidar melhor com esse problema? 5 Sabemos que pode ocorrer a intoxicação endógena e a intoxicação exógena, e que uma difere da outra. Disserte sobre as suas diferenças, apontando exemplos de cada uma: 30 31 TÓPICO 3 — UNIDADE 1 AS DROGAS 1 INTRODUÇÃO Acadêmico,no Tópico 3, iremos abordar o universo das drogas; e você já sabe, que todo fármaco produzido e vendido nas farmácias espalhadas mundo afora, é considerado droga. Tanto que antigamente costumava-se chamar as farmácias de drogarias. Mas não são apenas remédios, considerados drogas lícitas, que possuem uma interação com o organismo, podendo alterar algumas de suas funções. O álcool, o açúcar, a cafeína e a nicotina também são capazes de, dependendo da quantidade absorvida pelo organismo, causar disfunções em órgãos diversos. Mas ainda assim, novas drogas surgem, com efeitos psicoativos explosivos e muito tóxicos, podendo transformar não apenas o organismo, mas também, todos ao redor que convivem com seu uso. As drogas ilícitas, algumas tão fortes quanto as consideradas lícitas, portanto mais invasivas, e outras com seus componentes menos ativos, são usadas desde tempos antigos. Ocorre que na modernidade, a expansão dos produtos químicos e o uso de novas drogas com a propensão de recreação, são consideradas pelas normas legais como crime, e ainda assim, há o crescimento do envolvimento com essas substâncias químicas. Assim, importante passo que damos é reconhecer quais drogas são consideradas ilícitas ou lícitas, e qual autoridade possui a atividade de classificá- las. Somente com esse conhecimento podemos interpretar o que é considerado droga para a legislação atuante nessa matéria. Em um terceiro e último momento, veremos, neste tópico, como a legislação penal brasileira foi se alterando com o passar dos anos, até chegar à Lei nº 11.343/2006, que regula o caso das drogas. Estudaremos, então, os pontos mais importantes para a área da segurança pública, da norma em vigor nos dias atuais. Vamos lá! 32 UNIDADE 1 — TÓXICOS: ESPÉCIES E SEUS USOS 2 DROGAS CONSIDERADAS LÍCITAS A intoxicação por medicamentos é algo muito comum. Remédios vendidos em farmácias, indicados pelo médico responsável, possuem qualidades químicas que diferem entre si pela alta quantidade de componentes diversos, que agem no organismo através de doses referenciadas. Caso essas doses sejam maiores que a quantidade indicada, então podemos ter a intoxicação. Entretanto, o uso descontrolado de medicamentos é base da nossa sociedade atual, causa da sociedade contemporânea, fluída e fragmentada, a partir de seus medos, receios e angústias, das quais o sociólogo polonês Zygmunt Bauman versa em toda a sua obra escrita (BAUMAN, 1998). A automedicação passa a ser o carro chefe no consumismo de remédios, e mesmo o menos influente medicamento pode causar dependências (SHIBAMOTO, 2014), assim como outros produtos não considerados pela indústria farmacêutica, como o álcool e o cigarro. A junção entre fármacos e álcool, dependendo da dose e da quantidade de bebida ingerida, pode causar a morte. Então temos dois produtos legais perante a legislação, e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), detentores de fatores químicos causadores de instabilidades no organismo humano. Remédios são separados por tarjas, ou rótulos que os identificam como mais ou menos invasivos, a partir de sua fórmula, o que intenta assegurar o uso de medicamentos por quem realmente tem a necessidade da medicação. É função da ANVISA a definição e aplicação desses rótulos, que os identifica pelas cores: amarelas (identificadora dos produtos genéricos), tarja vermelha (indicadora da necessidade de prescrição médica) e tarja preta (receitas médicas específicas para o uso do medicamento). Existem ainda os remédios sem tarja, reconhecidamente os de uso popular sem necessidade de prescrição médica, menos invasivos, mas ainda assim, se usados em altas doses podem causar dependência ou intoxicação. No site https://www.gov.br/anvisa/pt-br, da ANVISA, você encontra informações sobre drogas e fármacos lícitos e ilícitos considerados pela agência, e também, as informações acerca das vacinas diversas produzidas no País. DICAS https://www.gov.br/anvisa/pt-br TÓPICO 3 — AS DROGAS 33 Lembre-se de que, como vimos, o que diferencia o remédio e o veneno é a dose usada. Portanto, medicamentos diversos, para inúmeros fins também podem causar um mal maior ainda, do que aquele que inicialmente pretendiam combater. Veja no quadro a seguir a identificação das tarjas diversas em medicamentos, definidas a partir de sua potencialidade no corpo humano: QUADRO 6 – TABELA DE TARJAS EM MEDICAMENTOS FONTE: Adaptado de <https://bit.ly/3yT9mmn>. Acesso em: 3 ago. 2021. Sem tarja Tarja vermelha Tarja preta Tarja amarela São os medicamentos isentos de prescrição: analgésicos, antiácidos, xaropes, antigripais, para cefaleia, entre outros. Estes possuem a inscrição “Venda sob prescrição médica”. São os anticoncepcionais, antifúngicos, hipertensão etc. Podem causar efeitos colaterais e contraindicações variadas. Conhecidos como psicotrópicos, somente devem ser vendidos com receituário especial, por causar dependência. Possuem ação sedativa, geralmente antidepressivos e estimulantes. Indica aquele remédio considerado genérico. Além dos remédios, outras drogas são consideradas drogas lícitas a partir de sua composição química, e são capazes de obter uma interação não saudável com o organismo. A Organização Mundial de Saúde (OMS), avalia e define que droga é toda substância natural ou sintética, capaz de causar dependência psicológica ou orgânica, a partir de seu uso. A organização também considera essa situação um problema da saúde (OMS, 2021). A rica e inigualável cana-de-açúcar que se transforma, após inúmeras melhorias, no açúcar branquinho e refinado que utilizamos à mesa, é um dos produtos mais tóxicos para o coração, aumentando o colesterol, alimentando células que vêm a possuir enorme possibilidade de se transformarem em cancerosas, entre outras situações, sendo um produto que se consome diariamente, causador de malefícios no caso de seu uso irregular (SHIBAMOTO, 2014). O álcool também é uma droga lícita, que possui um poder muito forte em sua relação de dependência com o usuário, e na causa de problemas de saúde e sociais diversos. Considerada uma droga com alto potencial ofensivo, a partir de sua disseminação pelo organismo, consegue causar disfunções em vários sentidos do ser humano. Dados da OMS, datados de 2018, nos demonstram que os jovens são grandes consumidores desse produto, e na tenra idade entre 15 e 19 anos, no mundo todo, 25,6% dessa faixa etária consumiram álcool de alguma forma. O número no Brasil, segundo a organização, é semelhante e segue a taxa de 26,8% 34 UNIDADE 1 — TÓXICOS: ESPÉCIES E SEUS USOS de jovens consumidores do produto. Os números impressionam, quando jovens dessa mesma faixa etária estão na estatística da organização como potenciais viciados na droga, perfazendo o número de 13,9% das pessoas dessa idade, enquanto no Brasil esse índice alcança os surpreendentes 15% (OMS, 2018). Esse número preocupa quando pessoas mais jovens podem apresentar reações contrárias a um saudável desenvolvimento cerebral, e seu uso precoce pode causar além de uma dependência prematura, consequências inibidoras da evolução dos lobos frontal e temporal, interligados diretamente à cognição e à memória. Dessa forma, o consumo nocivo do produto pode vir a causar déficits cognitivos interferindo na retenção das ideias, no aprendizado e na memória; o que interfere na tomada de decisões, no controle físico e psicológico, e no próprio uso do raciocínio. Veja no quadro a seguir, a porcentagem de álcool inserida nos produtos etílicos diversos. Esse número determina a capacidade, maior ou menor, de problemas causados no organismo, já nos primeiros contatos. QUADRO 7 – PORCENTAGEM APROXIMADA DE ETANOL EM