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Professor Dr. Gustavo Meireles Costa TOXICOLOGIA CLÍNICA E ANÁLISES TOXICOLÓGICAS REITORIA Prof. Me. Gilmar de Oliveira DIREÇÃO ADMINISTRATIVA Prof. Me. Renato Valença DIREÇÃO DE ENSINO PRESENCIAL Prof. Me. Daniel de Lima DIREÇÃO DE ENSINO EAD Profa. Dra. Giani Andrea Linde Colauto DIREÇÃO FINANCEIRA Eduardo Luiz Campano Santini DIREÇÃO FINANCEIRA EAD Guilherme Esquivel COORDENAÇÃO DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO Profa. Ma. Luciana Moraes COORDENAÇÃO ADJUNTA DE ENSINO Profa. Dra. Nelma Sgarbosa Roman de Araújo COORDENAÇÃO ADJUNTA DE PESQUISA Profa. Ma. Luciana Moraes COORDENAÇÃO ADJUNTA DE EXTENSÃO Prof. Me. Jeferson de Souza Sá COORDENAÇÃO DO NÚCLEO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Prof. Me. Jorge Luiz Garcia Van Dal COORDENAÇÃO DE PLANEJAMENTO E PROCESSOS Prof. Me. Arthur Rosinski do Nascimento COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA EAD Profa. Ma. Sônia Maria Crivelli Mataruco COORDENAÇÃO DO DEPTO. DE PRODUÇÃO DE MATERIAIS DIDÁTICOS Luiz Fernando Freitas REVISÃO ORTOGRÁFICA E NORMATIVA Beatriz Longen Rohling Carolayne Beatriz da Silva Cavalcante Caroline da Silva Marques Eduardo Alves de Oliveira Jéssica Eugênio Azevedo Marcelino Fernando Rodrigues Santos PROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO Bruna de Lima Ramos Hugo Batalhoti Morangueira Vitor Amaral Poltronieri ESTÚDIO, PRODUÇÃO E EDIÇÃO André Oliveira Vaz DE VÍDEO Carlos Firmino de Oliveira Carlos Henrique Moraes dos Anjos Kauê Berto Pedro Vinícius de Lima Machado Thassiane da Silva Jacinto FICHA CATALOGRÁFICA Dados Internacionais de Catalogação na Publicação - CIP C837t Costa, Gustavo Meireles Toxicologia clínica e análises toxicológicas / Gustavo Meireles Costa. Paranavaí: EduFatecie, 2023. 81 p.: il. Color. 1. Toxicologia. 2. Drogas – Toxicologia. I. Centro Universitário UniFatecie. II. Núcleo de Educação a Distância. III. Título. CDD: 23. ed. 615 Catalogação na publicação: Zineide Pereira dos Santos – CRB 9/1577 As imagens utilizadas neste material didático são oriundas dos bancos de imagens Shutterstock . 2023 by Editora Edufatecie. Copyright do Texto C 2023. Os autores. Copyright C Edição 2023 Editora Edufatecie. O conteúdo dos artigos e seus dados em sua forma, correção e confiabilidade são de responsabilidade exclusiva dos autores e não representam necessariamente a posição oficial da Editora Edufatecie. Permitido o download da obra e o compartilhamento desde que sejam atribuídos créditos aos autores, mas sem a possibilidade de alterá-la de nenhuma forma ou utilizá-la para fins comerciais. https://www.shutterstock.com/pt/ 3 Professor Dr. Gustavo Meireles Costa • Graduação em Farmácia – (UNIPAR); • Habilitação em Análises clínicas – (UNIPAR); • Especialista em Análises Clínicas (Faculdade Integrado de Campo Mourão); • Especialista em Manipulação de Produtos Farmacêuticos e cosméticos (UNI- PAR); • Mestre em Ciências Farmacêuticas (UEM - Universidade Estadual de Maringá); • Doutor em Ciências Farmacêuticas (UEM - Universidade Estadual de Maringá); • Professor de Graduação na Universidade Paranaense. Ampla experiência em Farmácia comercial e sistema público, assim como expe- riência como docente na área de saúde. CURRÍCULO LATTES: http://lattes.cnpq.br/7199566856196424 AUTOR 4 Seja muito bem-vindo(a)! Prezado (a) aluno (a), se você se interessou pelo assunto desta disciplina, isso já é um bom início de uma grande jornada de estudos que caminharemos juntos a partir de agora. Juntos construiremos nosso conhecimento sobre os conceitos fundamentais de toxicologia clínica. Na unidade I, começaremos com a relevância do histórico da toxicologia, bem como alguns termos relevantes abordados ao longo dos materiais, como a diferenciação entre droga, agente tóxico, veneno, antídoto, dose leta 50 e intoxicação. Ainda veremos nesta unidade sobre toxicocinética, que estuda sobre a absorção, distribuição, metabolização e excreção dos agentes tóxicos. Na unidade II, ampliaremos nosso conhecimento sobre toxicologia clínica. Aborda- remos tópicos mais detalhados e específicos, como toxicodinâmica, mecanismos molecula- res e bioquímicos de agentes tóxicos, bem como o local específico de sua ação, avaliação de risco e toxicidade. Na unidade III, exploraremos a toxicologia de medicamentos e drogas de abuso. Entre os tópicos mais relevantes, destacam-se a anfetamina, cafeína e os depressores do sistema nervoso central, como barbitúricos, benzodiazepínicos, etanol, ópio e seus deriva- dos (morfina, heroína). Também abordaremos substâncias como a nicotina (presente no cigarro), euforizantes (como a cocaína) e depressores (álcool, inalantes) e alucinógenos (maconha, haxixe, LSD, cogumelos, etc.). Na unidade IV, focaremos especificamente na toxicologia ocupacional e ambiental, que diz respeito à exposição a substâncias químicas no ambiente de trabalho e na vida cotidiana. Essa exposição pode resultar em efeitos tóxicos, afetando a saúde das pessoas que trabalham e vivem em ambientes específicos. Além disso, discutiremos a intoxicação por metais pesados, um grupo de elementos que se situa entre o cobre (Cu) e o chumbo (Pb) na tabela periódica. Os principais metais pesados que não são naturalmente encontra- dos no organismo são o cádmio, mercúrio, chumbo, cromo e arsênio. Esses metais podem causar intoxicações graves e, em casos extremos, levar à morte. Aproveito para reforçar nosso convite a você para se juntar a nós nessa jornada de conhecimento. Temos diversos tópicos abordados em nosso material e esperamos contri- buir para o seu crescimento pessoal e profissional. Muito obrigado e bom estudo! APRESENTAÇÃO DO MATERIAL 5 UNIDADE 4 Toxicologia Ocupacional e Ambiental Toxicologia de Medicamentos e Drogas de Abuso UNIDADE 3 Toxicodinâmica, Avaliação de Toxicidade e Avaliação de Risco UNIDADE 2 Introdução ao Estudo da Toxicologia e Toxicocinética UNIDADE 1 SUMÁRIO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Plano de Estudos • Introdução ao estudo da toxicologia; • Toxicocinética. Objetivos da Aprendizagem • Contextualizar história da toxicologia; • Relatar conceitos básicos; • Diferenciar divisão e finalidades da toxicologia; • Citar áreas de atuação; • Explicar toxicocinética dos agentes tóxicos. Professor Dr. Gustavo Meireles Costa INTRODUÇÃO INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA AO ESTUDO DA TOXICOLOGIA E TOXICOLOGIA E TOXICOCINÉTICATOXICOCINÉTICA1UNIDADEUNIDADE INTRODUÇÃO 7INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA TOXICOLOGIA E TOXICOCINÉTICAUNIDADE1 Neste tópico, abordaremos a importância do histórico da toxicologia, bem como alguns termos cruciais que surgiram ao longo dos materiais. Isso inclui a diferenciação entre droga, agente toxicante, veneno, antídoto, dose letal 50 e intoxicação. Vamos também explorar as várias aplicações e áreas de atuação dentro da toxi- cologia, como a toxicologia ocupacional, alimentar, de medicamentos e cosméticos, e a social, que se concentra nos efeitos prejudiciais resultantes do uso não médico de drogas ou fármacos, causando danos tanto ao próprio indivíduo quanto à sociedade. Em relação à toxicocinética, esse conceito engloba o processo que um agente tóxico percorre pelo corpo, incluindo absorção, distribuição, metabolização e excreção. A absorção, por exemplo, é a passagem do agente do local de administração para a cor- rente sanguínea, principalmente mediante transporte por meio de difusão simples. Esse processo de absorção pode sofrer influências, como variações de pH, área de superfície e características da droga, entre outras. A distribuição refere-se à passagem do agente tóxico, uma vez absorvido, para outros compartimentos do corpo, podendo ser influenciada por fatores como ligação a proteínas, características do agente e o potencial depósito em órgãos ou tecidos, como o tecido adiposo. A metabolização é o processo pelo qual o corpo transforma a droga, principalmente por meio de enzimas hepáticas do citocromo P450, convertendo moléculas lipossolúveis em hidrossolúveis, preparando-as para a excreção. Esse processo de metabolização envolve duas fases: a Fase I, que introduz um grupo funcional, como o OH, e a Fase II, que envolve a conjugação. Por fim, a excreção é o processo de eliminação do agente tóxico, principalmente via renal, de compostos polares (hidrossolúveis), preferencialmente por secreção, que envolve a passagem do agente do capilar para o néfron. Bons estudos! INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA TOXICOLOGIA1 TÓPICO 8INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA TOXICOLOGIA E TOXICOCINÉTICAUNIDADE 1 Histórico A contextualização histórica da toxicologia acompanha a evolução histórica da civilização, pois desde a época mais remota, o ser humano possuía conhecimento sobre os efeitos tóxicos de venenos animais e de uma variedade de plantas tóxicas. Sendo assim, a Toxicologia é uma das ciências práticas mais antigas. O poder de sedação e paralisante dos venenos, principalmente de plantas, era uma das práticas mais frequentes utilizadas como instrumento de caça ou frente a inimigos. O Papiro de Ebers, um dos documentos mais antigos (1500 a.C.), registra uma lista de mais de 800 ingredientes ativos, incluindo metais como tipo chumbo e cobre, venenos de animais e diversos vegetais tóxicos. Outros estudiosos, como Hippocrates (460 – 364 a.C.); Theophrastus (370 – 287 a.C.); Dioscorides (40 – 90 d.C.), contribuíram muito para a identificação de novos agen- tes tóxicos e terapêuticos. Na antiguidade, o veneno foi muito utilizado com fins políticos. Provavelmente, o exemplo mais conhecido foi do uso de execuções do estado como o de Sócrates (470 – 399 a.C.), condenado à morte pela ingesta do extrato de cicuta. A primeira classificação de venenos, com animais, vegetais e minerais, foi intro- duzida primeiramente por Dioscorides. O ópio, a cicuta, o acônito e os digitalis estavam entre os agentes tóxicos obtidos do reino vegetal, enquanto os venenos de víboras, sapos e salamandras estavam entre os agentes do reino animal. Entre as substâncias de origem mineral citavam-se o chumbo, cobre e o antimônio. O mesmo recomendava o uso de emé- ticos em caso de envenenamento e nas picadas de cobras. 9INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA TOXICOLOGIA E TOXICOCINÉTICAUNIDADE 1 Mitridates (120 – 63 a.C.) foi, provavelmente, o primeiro a realizar experiências toxicológicas. O rei no século II a.C. temia ser envenenado, realizava testes em seus es- cravos com vários tipos de venenos na tentativa de encontrar seus antídotos. Dentre seus experimentos, teve como resultado Mithridaticum, sendo uma mistura contendo gordura de víbora e enxofre, utilizada como tônico e poderoso antídoto. Avicena (980 – 1037) contribuiu à Toxicologia com a introdução às discussões sobre mecanismos de ação de venenos, com inclusão de neurotoxicidade e efeitos metabólicos. Sendo uma das recomendações a utilização da pedra de bezoar (concreções biliares de bode) como antídoto e preventivo de doenças. A eficácia da pedra de bezoar foi testada por Paré, com a permissão do rei Carlos IX, em um pobre prisioneiro, condenado à morte, que recebeu, concomitantemente, o bicloreto de mercúrio e o antídoto universal. A vítima acabou morrendo após terrível sofrimento (LARINI 1994; OGA, 2008). Conceitos básicos A Toxicologia é a ciência que estuda os efeitos nocivos decorrentes das interações de substâncias químicas com o organismo sob condições específicas de exposição. Sendo assim, é a ciência que investiga a partir de experiências a ocorrência, natureza, incidência, os mecanismos e os fatores de risco dos efeitos deletérios de agentes químicos. Os efeitos tóxicos podem variar desde os considerados leves, como exemplo a irritação dos olhos, até mais sérias, como exemplo dano hepático ou renal, podendo levar à incapacitação permanente de um órgão, sendo muito grave como exemplo a cirrose ou o câncer. É difícil conceituar efeito nocivo, ou seja, a partir de que ponto determinado efeito biológico passa a ser considerado prejudicial. Conforme a National Academy of Sciences (Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos), um efeito é considerado nocivo se: • Resulta de uma exposição prolongada, causando transtornos na capacidade funcional e/ou na capacidade do organismo de compensar uma nova sobrecarga. • Diminui a capacidade do organismo de manter sua homeostasia, ou seja, o equilíbrio interno, seja por meio de efeitos reversíveis ou irreversíveis. • Aumenta a suscetibilidade a efeitos indesejáveis de outros fatores ambientais, como agentes químicos, físicos, biológicos ou sociais. Agente tóxico ou toxicante Define-se como agente químico capaz de causar dano a um sistema biológico, alterando seriamente uma função ou levando a morte sob certas condições de exposição. O conceito de toxicante abrange aspectos tanto qualitativos quanto quantitativos. No que diz respeito ao aspecto quantitativo, isso significa que praticamente todas as substâncias https://www.nasonline.org/ 10INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA TOXICOLOGIA E TOXICOCINÉTICAUNIDADE 1 podem ser perigosas em doses específicas, mas podem ser seguras em doses muito baixas. Um exemplo disso é o cloreto de vinila, que é um potente hepatotóxico em concentrações e doses elevadas, tendo efeitos carcinogênicos em exposições prolongadas em doses mais altas, porém, aparentemente, não apresenta efeitos nocivos em doses muito baixas. Quanto ao aspecto qualitativo, é importante observar que uma substância prejudi- cial para uma espécie ou linhagem pode não representar perigo para outra espécie. Por exemplo, o tetracloreto de carbono, que é altamente hepatotóxico para várias espécies, incluindo seres humanos, é relativamente seguro quando utilizado em frangos. Essa compreensão da toxicologia nos lembra que os efeitos tóxicos das substân- cias podem variar significativamente com base na dose, na duração da exposição e na sensibilidade de diferentes espécies, destacando a importância da avaliação de riscos e da consideração de contextos específicos ao lidar com substâncias tóxicas. Veneno O termo “veneno” é atualmente utilizado para descrever uma substância química ou uma mistura de substâncias químicas que pode causar intoxicação ou morte em doses relativamente baixas. Além disso, é um termo comumente empregado na linguagem popu- lar. Alguns autores o usam de maneira específica para se referir a substâncias de origem animal que desempenham funções importantes em autodefesa ou predatórias, como o venenode cobras e abelhas. Droga Refere-se a qualquer substância capaz de modificar ou afetar o sistema fisiológico, ou estado patológico de um organismo, independentemente de ser usada com a intenção de beneficiar o receptor. Isso a diferencia de “fármaco”, que pode ser definido de maneira mais simplista como qualquer substância de estrutura química definida e/ou identificada que possui a capacidade de modificar ou explorar o sistema fisiológico ou patológico e tem um efeito benéfico ou em benefício do organismo receptor. Um exemplo disso é a Cannabis sativa (maconha), que é considerada uma droga de abuso psicoativa, enquanto o seu principal constituinte, o tetraidrocanabinol, é conside- rado um fármaco. No entanto, na linguagem popular, a palavra “droga” é frequentemente utilizada de forma mais ampla para se referir a fármacos, matérias-primas de medicamentos e até mesmo substâncias tóxicas. Antídoto Define-se como um agente capaz de antagonizar os efeitos tóxicos de substância. 11INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA TOXICOLOGIA E TOXICOCINÉTICAUNIDADE 1 Toxicidade Capacidade e/ou propriedade de agentes tóxicos são de promover injúrias às estruturas biológicas através das interações físico-químicas, chamadas de toxicidade. Portanto, a toxicidade pode ser definida como a capacidade e potencial do agente tóxico de provocar efeitos nocivos em um sistema biológico ou organismo. Toxicidade dificilmente pode ser definida como um evento/alteração molecular único; sendo que na maioria das vezes envolve uma cascata de eventos, iniciada com exposição, seguida de distribuição e biotransformação e finalizando com interações com macromoléculas como exemplo o DNA ou proteínas. A medida que esta toxicidade se torna complexa, pode ser classificada em aguda ou crônica, podendo variar de órgão para órgão, idade, genética, condições fisiológicas ou estado de saúde do organismo. Dose Letal 50 – DL50 Define-se como a quantidade de uma determinada substância química que quando é administrada em dose única sendo a mesmo por via oral, expressa em massa da substân- cia por massa (m/m) de animal, tem a capacidade de produzir a morte de 50% dos animais. Ação Tóxica Maneira pela qual um agente tóxico exerce sua atividade sobre as estruturas em um determinado tecido. Toxicidade deve e pode ser diferenciada de risco, termo que designa a probabilidade estatística de uma determinada substância química provocar efeitos nocivos em condições definidas de exposição. Sendo assim, uma determinada substância pode apresentar elevada toxicidade (avaliada pelo teste da DLSO) e baixo risco, ou seja, baixa probabilidade de causar intoxicação nas condições em que é utilizada. Intoxicação Define-se como a manifestação dos efeitos tóxicos. Sendo este um processo pato- lógico causado por substâncias químicas endógenas ou exógena, sendo característico de desequilíbrio fisiológico, ou seja, perda da homeostase, em consequência de alterações bioquímicas no organismo. Esse processo pode ser evidente a partir do surgimento dos sinais e sintomas ou mediante exames laboratoriais. Xenobiótico Define-se como o termo utilizado para descrever substâncias químicas estranhas ao organismo. Agentes poluentes da atmosfera e metais do tipo chumbo e mercúrio são considerados xenobióticos, estes mesmos são considerados quando possuam papel fisio- lógico conhecido. Em Toxicologia também é considerado xenobiótico a substância química estranha quantitativamente ao organismo, como exemplo pode-se citar o manganês, ele- mento normalmente presente e necessário ao organismo, sendo que em certas condições 12INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA TOXICOLOGIA E TOXICOCINÉTICAUNIDADE 1 de exposição elevada pode provocar intoxicação grave, sendo irreversíveis em alguns casos em trabalhadores (LARINI 1994; OGA, 2008). Vários eventos são envolvidos na intoxicação sendo considerados complexos, partindo desde a exposição do organismo ao toxicante até o aparecimento de sinais e sintomas, podem ser descritos em quatro fases ditas fases de intoxicação. • Fase de exposição: o estágio em que as superfícies externas ou internas do organismo entram em contato com o toxicante. Nesta fase, é fundamental considerar a dose ou concentração da substância, a via de introdução (como o toxicante entra no corpo), a frequência e a duração da exposição. Todos esses fatores estão condicionados à disponibilidade do xenobiótico, ou seja, à fração da substância que está disponível para ser absorvida pelo organismo. • Fase toxicocinética: essa fase abrange todos os processos envolvidos na rela- ção entre a absorção e a concentração do agente tóxico nos diferentes tecidos do organismo, envolvendo a distribuição da substância no corpo. Esses processos incluem a cinética da absorção, distribuição, armazenamento, biotransformação e excreção das substâncias químicas. Em conjunto, essas etapas desempenham um papel fundamental na compreensão de como o agente tóxico se move sendo processado pelo organismo. • Fase Toxicodinâmica: essa fase envolve a interação das moléculas do toxican- te com sítios de ação específicos ou não nos órgãos, sendo os principais alvos os receptores. Essas interações podem levar ao desequilíbrio da homeostase, resultando em efeitos adversos no organismo. Em outras palavras, nessa fase, as substâncias químicas tóxicas se ligam a receptores ou alvos nos órgãos, o que pode perturbar o equilíbrio normal do funcionamento do organismo. • Fase clínica: essa fase compreende nas evidências surgidas, ou seja, sinais e sintomas; ou ainda alterações patológicas detectadas mediante algumas evidên- cias de diagnóstico (OGA, 2008). Divisão e finalidades da toxicologia Esta ciência abrange uma vasta área de conhecimento na qual diversos profissio- nais das mais diferentes áreas atuam. Ela pode ser dividida de acordo com os diferentes campos de trabalho, Toxicologia Analítica ou Química; Toxicologia Clinica ou Médica; e Toxicologia Experimental. • Toxicologia Analítica: Trata da detecção do componente químico ou de algum outro parâmetro rela- cionado à exposição ao toxicante em substratos tais como Ruídos orgânicos, alimentos, água, ar, solo, entre outros, possuindo como principal objetivo prevenir ou diagnosticar as intoxicações. Também de extrema importância o monitora- mento terapêutico ou acompanhamento de pacientes submetidos ao tratamento prolongado com alguns tipos de medicamentos, outra aplicação importante é no 13INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA TOXICOLOGIA E TOXICOCINÉTICAUNIDADE 1 controle antidopagem em competições esportivas. O diagnóstico ambulatorial de intoxicação, aguda ou crônica, auxiliando o melhor tratamento, assim como também no acompanhamento do paciente intoxicado. Exames toxicológicos que visam o controle da farmacodependência devida ao uso de drogas psicoativas, ilícitas ou não vêm crescendo constituindo outra importante aplicação das análises toxicológicas. Análises em outros substratos como a água, alimentos, ar entre outros. • Toxicologia clínica ou Médica O atendimento do paciente exposto ao toxicante ou do intoxicado, para prevenir ou diagnosticar a intoxicação e aplicar a terapêutica correta e específica, é com- petência de profissionais dedicados a esta. • Toxicologia Experimental Área cuja finalidade é desenvolver estudos para elucidar os mecanismos de ação dos agentes tóxicos sobre o sistema biológico e para avaliação dos efeitos de- correntes dessa ação. A avaliação da toxicidade de substâncias é feita, utilizando diferentes espécies de animais, seguindo rigorosas normas preconizadas pelos Órgãos Reguladores do país (LARINI 1994; OGA, 2008). Áreas de atuação Na área da Toxicologia, as diversas áreas de atuação são diferenciadas com base na origem do agente tóxico e na forma como esse agente afeta o sistema biológico. Pode-se citar várias outras áreas de toxicologia importantes como: Ambiental: área da Toxicologia que se dedica ao estudo dos efeitos nocivos causa- dos por agentes químicos doambiente, como contaminantes, e como eles interagem com o organismo humano, resultando em alterações na homeostase, como exemplos pode-se citar os contaminantes do ambiente, água, solo, ar. Ocupacional: área da toxicologia que tem como princípio se dedicar ao estudo dos indivíduos expostos a agentes nocivos e prejudiciais à saúde do trabalho presentes neste âmbito e como eles interagem estes agentes nocivos nesta população específica. Alimentos: área dedicada a estudar os efeitos nocivos que substâncias químicas nocivas tendem a provocados quando estas estão presentes em alimentos, para definir as condições em que os alimentos podem ser consumidos sem causar danos e/ou prejuízos ao organismo. Medicamentos e Cosméticos: área com que se dedica a estudar os efeitos nocivos e prejudiciais produzidos pela interação de medicamentos ou cosméticos com o organismo decorrentes de uso inadequado, indevido e/ou abusivo ou da suscetibilidade de características individuais. Social: estuda os efeitos nocivos decorrentes do uso não médico de drogas ou fármacos, ou seja, não prescritos com fins medicinais que causam prejuízos ao próprio indivíduo e à sociedade (LARINI 1994; OGA, 2008). TOXICOCINÉTICA2 TÓPICO 14INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA TOXICOLOGIA E TOXICOCINÉTICAUNIDADE 1 A toxicocinética trata do estudo da relação entre uma determinada quantidade de um agente tóxico que atua sobre o organismo e a concentração que é encontrada do mesmo no plasma, relacionando os processos de absorção, distribuição e eliminação do agente, em função do tempo. O efeito tóxico é geralmente proporcional à concentração do agente no sítio molecular de ação, denominado também tecido alvo. A rigor, o conhecimento da concentração do toxicante no sítio de ação permite avaliar melhor o dano ali causado (OGA, 2008). 2.1 Mecanismo de transportes por meio da membrana Existem várias maneiras de categorizar os transportes, porém, por questões didáti- cas, segue a figura abaixo para melhor compreensão. FIGURA 1 - MECANISMOS DE TRANSPORTES POR MEIO DA MEMBRANA Fonte: Silverthorn (2010). 15INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA TOXICOLOGIA E TOXICOCINÉTICAUNIDADE 1 2.1.1 Transporte passivo Difusão simples: é um mecanismo dependente do gradiente de concentração e das características físico-químicas dos agentes químicos. Pode ser definida como o movimento de moléculas de uma área de maior concentração para uma de menor concentração dessas mo- léculas. Um exemplo disso é a abertura de um frasco de perfume, onde a fragrância se difunde para o ambiente externo. Isso ocorre porque as moléculas aromáticas do perfume se deslocam da área onde estão mais concentradas (no frasco) para onde estão menos concentradas. A difusão é um processo passivo, no qual as moléculas movem-se de áreas de maior para menor concentração. A difusão é rápida em curtas distâncias, especialmente para moléculas lipossolúveis ou lipofílicas, com baixo peso molecular, que podem difundir através da membrana sem a necessidade de auxílio de proteínas, devido à semelhança com a membrana (OGA, 2008; SILVERTHORN, 2010). Difusão Facilitada: conhecido como “transporte passivo”, envolve a passagem de substâncias por meio de carregadores ou carreadores, que são frequentemente proteínas permeases. O transporte passivo ocorre sem consumo de energia, sendo realizado a favor do gradiente de concentração. As substâncias transportadas por esse processo são de natureza hidrossolúvel ou hidrofílica. Diferentemente do transporte ativo, em que é necessária energia para mover as substâncias contra o gradiente de concentração, o transporte passivo permite que as substâncias se desloquem a favor do gradiente. Um exemplo desse processo é o trans- porte de glicose, realizada por esse mecanismo para diferentes compartimentos teciduais. 2.1.2 Transporte ativo O transporte ativo é um processo caracterizado pelo transporte de moléculas ou substâncias contra os seus gradientes de concentração, ou seja, de um local onde sua concentração é mais baixa para áreas onde sua concentração é mais alta. O processo natural seria criar um equilíbrio uma vez que o organismo humano trabalha com homeostase deixando as concentrações próximas, idênticas ou parecidas em todo o sistema, o transporte ativo gera um estado de desequilíbrio, criando uma diferença de concentração maior e mais evidente. Para o sistema conseguir transportar as moléculas contra o seu gradiente de con- centração, ele deverá utilizar energia principalmente de fonte externa, ou seja, isto requer o gasto de energia, utilizada principalmente de ATP requer gasto de energia externa, assim como remar contra a maré. A energia para o transporte ativo vem direta ou indiretamente das ligações fosfato ricas em energia do ATP. O transporte ativo pode ser dividido em dois tipos: Primário: caracterizado pelo uso direto de ATP (trifosfato de adenosina) como fonte de energia. Muitos desses transportadores ativos primários são denominados de “ATPa- 16INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA TOXICOLOGIA E TOXICOCINÉTICAUNIDADE 1 ses”. Vale ressaltar que o sufixo “-ase” indica uma enzima, e o radical “ATP” é o substrato sobre o qual a enzima atua. A função dessas enzimas é hidrolisar o ATP em ADP (difosfato de adenosina) e fosfato inorgânico (Pi), liberando energia durante o processo. A maioria das ATPases são denominadas de “bombas”, indicando um transporte ativo primário. Um exemplo clássico é a bomba sódio-potássio, também conhecida como bomba Na/K-ATPase. Essa bomba é possivelmente a proteína de transporte mais impor- tante em células animais, pois mantém os gradientes de concentração de íons de sódio (Na+) e potássio (K+) através da membrana celular. O transportador está localizado na membrana celular e opera bombeando três íons de sódio para fora (ou seja, para o espaço extracelular) e dois íons de potássio para dentro da célula (espaço intracelular) a cada molécula de ATP consumida. Esse processo desempenha um papel fundamental na manutenção do equilíbrio eletrolítico e no potencial de membrana celular. Secundário: caracterizado por utilizar o ATP indiretamente, uma vez que aproveita o gradiente de concentração de sódio, que é mais alto no líquido extracelular (LEC) em com- paração com a menor concentração no líquido intracelular (LIC), como uma fonte potencial de energia que a célula pode explorar para outras funções. Por exemplo, os neurônios podem usar o gradiente de sódio para transmitir sinais elétricos, e outras células, como as epiteliais, podem utilizá-lo para absorver nutrientes, íons e água. Os transportadores localizados na membrana celular empregam a energia potencial armazenada nos gradientes de concentração para transportar moléculas ou substâncias. Esses transportadores são chamados de “transportadores ativos secundários”. O transporte ativo secundário usa a energia cinética, ou seja, o movimento de uma molécula que se deslo- ca a favor de seu gradiente de concentração para impulsionar outras moléculas contra seus gradientes de concentração. As moléculas transportadas podem seguir na mesma direção (simporte ou cotransporte) ou em direções opostas (antiporte ou contratransporte) através da membrana celular. Esse processo desempenha um papel crucial em várias funções celulares e é essencial para a manutenção do equilíbrio eletrolítico e do transporte de nutrientes. 2.1.3 Transporte vesicular Macromoléculas podem se locomover para o interior ou dentro e para o exterior ou fora da célula com a ajuda de vesículas originadas a partir da membrana. As células pos- suem e utilizam dois processos básicos para interiorizar partículas, moléculas e substâncias grandes: fagocitose e endocitose. Alguns pesquisadores consideram a fagocitose um tipo de endocitose, mas o mecanismo e o processo dos comparados dois processos são 17INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA TOXICOLOGIA E TOXICOCINÉTICAUNIDADE 1 diferentes. O material deixa a célula, ou seja, exteriorizadopelo processo conhecido como exocitose, um processo parecido com a endocitose, mas que ocorre na direção oposta. 2.1.3.1 Endocitose 2.1.3.1.1 Pinocitose A endocitose é um tipo de transporte ativo ou processo que utiliza energia dire- tamente do ATP. Este transporte pode ser não seletiva, permite que o líquido extracelular adentre a célula, um processo chamado de pinocitose – ou pode ser altamente seletiva, permitindo que apenas as moléculas específicas entrem na célula. 2.1.3.1.2 Fagocitose Processo mediado pela actina pelo qual uma célula engole uma bactéria ou outras partículas em uma vesícula grande ligada à membrana, chamada de fagossomo. Engloba- mento de substâncias sólidas, como exemplo fagocitose de microrganismo ou substancias que precisam ser inativas. 2.1.3.2 Exocitose Processo vesicular oposto da endocitose. Neste caso, as vesículas intracelulares movem-se em direção à membrana celular, fundindo se com ela, liberam, posteriormente, o seu conteúdo no líquido extracelular. As células usam a exocitose para exportar grandes moléculas lipofóbicas, como as proteínas (OGA, 2008; SILVERTHORN, 2010). 2.2 Cinética de agente Tóxico A cinética pode ser entendida como os processos de absorção (dependente dos mecanismos de transportes), distribuição, metabolização e eliminação/excreção. Absorção: é processo que pode ser definido como passagem de substâncias do local de contato, como exemplo ingerir um alimento ou substância (fármaco) por via oral, sendo o contato no estômago e/ou intestino para sua absorção dependente de caracterís- ticas para a circulação sanguínea. As principais vias de exposição de agentes tóxicos ao organismo são a dérmica, oral e a respiratória. Outras vias, como exemplo a intramuscular, intravenosa e a subcutânea constituem meios normais de introdução de agentes medica- mentosos que é dependente da dose e das condições fisiológicas ou de doença do paciente, podem produzir efeitos adversos acentuados, com lesões graves em diversos órgãos. Absorção oral: uma das vias mais comuns de entrada de agentes tóxicos e administração de medicamentos, bem como uma importante via de exposição, é o trato 18INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA TOXICOLOGIA E TOXICOCINÉTICAUNIDADE 1 digestivo. A ingestão pode ocorrer acidentalmente, como a ingestão de água ou alimentos contaminados, ou de forma voluntária, como em casos de suicídio ou quando indivíduos dependentes ingerem drogas. A via oral é também a principal rota de administração de me- dicamentos, e muitos desses medicamentos podem causar efeitos adversos no organismo. A absorção de substâncias pode ocorrer tanto no estômago quanto no intestino. A absorção em cada local é influenciada pela variação de pH, irrigação e características anatômicas, bem como pelas propriedades físico-químicas do agente tóxico. Vários fato- res podem contribuir para a absorção de nutrientes e xenobióticos no intestino, sendo um exemplo clássico a presença de microvilosidades altamente irrigadas, que proporcionam uma maior área de superfície para a absorção. A barreira no processo de absorção de substâncias é formada pela mucosa do trato digestivo e pelos epitélios capilares, facilitando a absorção de substâncias lipofílicas por difusão passiva. De maneira simplista, compostos lipossolúveis, não ionizados, de baixo peso molecular e com características de acidez ou basicidade semelhantes ao pH do local de absorção serão absorvidos com maior eficácia. Por exemplo, uma droga, medicamento ou xenobiótico com caráter básico será mais bem absorvido no intestino devido ao seu pH mais alcalino, enquanto o oposto ocorrerá com drogas de caráter ácido, que serão mais bem absorvidas no ambiente ácido do estômago. Compostos altamente apolares são me- lhor absorvidos devido à sua semelhança com a membrana celular, enquanto compostos altamente polares serão absorvidos com maior dificuldade (RANG, 1993; OGA, 2008). 2.2.1 Distribuição Xenobióticos são transportados pelo sangue e pelo sistema linfático, sendo distri- buídos para diferentes tecidos do corpo. A distribuição depende do fluxo sanguíneo e linfá- tico nos vários órgãos. Alguns fatores podem afetar a distribuição, como a taxa de ligação às proteínas plasmáticas, especialmente a albumina, diferenças de pH em compartimentos distintos e o coeficiente de partição entre óleo e água de cada substância. O equilíbrio de distribuição é alcançado mais rapidamente nos tecidos mais bem irrigados, que possuem um maior fluxo sanguíneo, como o coração, o cérebro e o fígado. Por outro lado, em órgãos com menor fluxo sanguíneo, menor irrigação e circulação mais lenta, como ossos, unhas, dentes e tecido adiposo, a absorção de substâncias, como dro- gas e fármacos, é mais lenta. Na fase inicial da distribuição, os órgãos altamente irrigados recebem uma grande quantidade de xenobióticos. No entanto, com o decorrer do tempo, órgãos menos irrigados podem acumular uma maior quantidade do agente, dependendo das características da 19INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA TOXICOLOGIA E TOXICOCINÉTICAUNIDADE 1 droga, como a lipossolubilidade. Por exemplo, algumas drogas têm maior afinidade com sítios ativos e maior poder de retenção em órgãos menos irrigados do que nos órgãos intensamente irrigados. Isso é conhecido como “tecido de depósito”, e um exemplo disso é a acumulação de drogas lipossolúveis no tecido adiposo. 2.2.2 Biotransformação É toda alteração que ocorre na estrutura química da substância no organismo, prin- cipalmente no tecido hepático. A biotransformação de xenobióticos é realizada por enzimas inespecíficas que também metabolizam substâncias endógenas que precisam passar por biotransformação para renovação. O metabolismo das substâncias ocorre principalmente no fígado, com destaque para o sistema conhecido como citocromo P450 (CYP). Algumas enzimas P450 estão presentes fora do fígado e desempenham papéis importantes em diversas vias de síntese, incluindo a biossíntese e o metabolismo de xenobióticos. O processo de biotransformação envolve duas reações bioquímicas conhecidas como reações de fase I e de fase II, que geralmente ocorrem sequencialmente, mas não de forma invariável. As reações de fase I são catabólicas e incluem processos como oxidação, redução ou hidrólise. Frequentemente, essas reações tornam os produtos quimicamente mais reativos e, por vezes, mais tóxicos ou carcinogênicos do que a substância inicial. Já as reações de fase II são sintéticas (anabólicas) e envolvem o processo de con- jugação. Isso resulta em produtos mais polares e inativos. Geralmente, as reações de fase I introduzem um grupo funcional relativamente reativo, como hidroxila (OH), na molécula. Pos- teriormente, esse grupo funcional serve como ponto de ataque para a reação de fase II, onde é adicionado um substituinte, como o glicuronídeo. Em resumo, ambas as etapas reduzem a lipossolubilidade da substância, aumentando assim sua eliminação renal (RANG, 1993). FIGURA 2 - AS DUAS FASES DO METABOLISMO DAS SUBSTÂNCIAS Fonte: Rang (1993). https://www.google.com/search?sca_esv=579833118&sxsrf=AM9HkKkN-PDEeAcbR17etrfBh4adbyM-pA:1699291185725&q=glicuron%C3%ADdeo&spell=1&sa=X&ved=2ahUKEwjfzPr78K-CAxU1rpUCHSMCCMMQBSgAegQICBAB 20INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA TOXICOLOGIA E TOXICOCINÉTICAUNIDADE 1 2.2.3 Excreção Excreção é o processo em que uma substância é eliminada do organismo. A maioria das substâncias como fármacos e agentes tóxicos são excretados por diferentes vias, sendo a principal por vial renal, uma das maneiras mais comuns de excreção é metabolizar essas substâncias em produtos mais hidrossolúveis, mais polares após sua biotransformação principalmente no fígado. As vias de excreção mais importantes ou representativas são a urinária, a fecal e a pulmonar. A urina tem como função excretar substâncias principalmente polares e hidrossolúveis, enquanto por via fecal estas substâncias são carregadas e não absorvidas no trato digestivoe também os produtos excretados pela bile. A via pulmonar possui a capacidade e responsabilidade de excretar gases e vapores. 2.2.3.1 Renal Os rins exercem papel importante excretando substâncias polares e hidrossolúveis, sendo basicamente três os mecanismos envolvidos na formação da urina e na excreção de substâncias: filtração glomerular, reabsorção tubular e secreção tubular. Os capilares glomerulares possuem grandes poros, por onde passam todos os elementos contidos no sangue, com exceção de macromoléculas e como, por exemplo, elementos figurados do sangue e proteínas. Os xenobióticos ligados às proteínas não são filtrados devido ao tama- nho e alto peso molecular, possuindo, portanto, maior permanência no organismo. O primeiro processo é a filtração, após o mesmo as partículas hidrossolúveis são excretadas com a urina, enquanto as moléculas lipossolúveis são reabsorvidas pelo túbulo proximal, caindo novamente na circulação. A excreção de substâncias de natureza ácida ou básica sofre grande influência do pH da urina, uma vez que substâncias na forma mole- cular ou não iônicas são mais facilmente reabsorvidas pelo túbulo proximal. Como exemplo pode-se citar a alteração de pH urinário de acordo com do xenobiótico, ou seja, droga com pH básico será melhor excretado em pH ácido (forma ionizada) e o inverso também ocorre, sendo assim pH distintos de droga e urinário facilita a excreção. Alguns agentes tóxicos podem ser excretados por processo denominado secre- ção tubular, ou seja, consiste na passagem ou transporte dessas substâncias do sangue diretamente para o néfron na formação da urina nos túbulos proximal por mecanismo de transporte ativo, transporte que gasta diretamente o ATP. A principal maneira de excreção renal é por secreção tubular de ânions orgânicos (ácidos) e cátions orgânicos (bases) (RANG, 1993; OGA, 2008). 21INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA TOXICOLOGIA E TOXICOCINÉTICAUNIDADE 1 A intoxicação é um problema de Saúde Pública de relevância global. De acordo com dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), em 2012, estima-se que 193.460 pessoas tenham perdido a vida devido a intoxicações não intencionais em todo o mundo. Além disso, cerca de 1.000.000 de pessoas morrem a cada ano por suicídio, e um número significativo desses casos está relacionado ao uso de substâncias químicas, com os pesticidas sendo responsáveis por 370.000 dessas mortes. Nos Estados Unidos, em 2014, os Centros de Controle de Intoxicação registraram 2.165.142 atendimentos relacionados a casos de exposição humana. No Brasil, embora não se tenha um quadro completo da extensão do problema, o Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) registrou 376.506 casos suspeitos de intoxicação entre 2010 e 2014. Desse total, o estado de São Paulo contribuiu com 24,5% (92.020 casos). No município de São Paulo, durante o mesmo período, foram registrados 21.407 casos, representando 23% do total notificado no estado de São Paulo e 5,7% do total do Brasil. Esses números tornam o município de São Paulo o maior notificador de casos de intoxicação no país. Fonte: Zucoloto et al. (2017). A absorção de organofosforados no corpo depende da sua solubilidade nos tecidos e pode resultar em di- ferentes tempos para o aparecimento dos sintomas de intoxicação. Por exemplo, a inalação de vapores do produto no ambiente pode levar ao aparecimento rápido dos primeiros sintomas em questão de minutos, enquanto a ingestão oral ou exposição dérmica pode resultar em um início mais tardio dos sintomas. Em casos de exposição dérmica localizada, os efeitos tendem a se limitar à área exposta, com reações exacer- badas se houver lesões cutâneas ou dermatite. Por exemplo, sudorese intensa e contrações musculares localizadas no membro afetado, visão borrada e cons- trição da pupila no olho exposto, ou chiado e tosse no caso de exposição pulmonar a pequenas quantidades. A absorção prolongada e insidiosa de organofosforados pode levar a uma resposta aguda a doses baixas do produto. No caso dos carbamatos, a exposição dérmica se torna crítica em ambientes com temperaturas elevadas. Em estudos experimentais, quantidades significativas de alguns carbamatos e seus metabólitos foram encontradas no leite de mães expostas a eles. Além disso, é possível encontrar resíduos de carbama- tos em produtos comestíveis quando eles são usados como inseticidas em frutas e vegetais. Tanto os inseticidas organofosforados quanto os carbamatos podem ser absorvidos pelo corpo através das vias oral, respiratória e cutânea. A absorção oral é a principal via em casos de intoxicações agudas aciden- tais, tentativas de suicídio e é a via mais comum em atendimentos de emergência. A via dérmica é a mais comum em casos de intoxicações ocupacionais, seguida da via respiratória. Fonte: Araújo (2010). 22INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA TOXICOLOGIA E TOXICOCINÉTICAUNIDADE 1 Estamos chegando ao término da primeira unidade desta apostila de Toxicologia Clínica e Análises Toxicológicas. É relevante destacar algumas das discussões que foram propostas ao longo deste percurso. Nossas conversas se iniciaram com os tópicos de introdução à toxicologia e uma contextualização histórica sobre o tema, juntamente com algumas definições básicas ne- cessárias para o desenvolvimento e aprimoramento que se desdobraram ao longo desta unidade. Esses tópicos cobriram conceitos fundamentais que servirão como alicerce para a sequência da Unidade I. A seguir, ao adentrar na próxima etapa da Unidade I, intitulada “Introdução à Toxi- cologia”, explorei conceitos abrangendo drogas, venenos, antídotos, agentes toxificantes, intoxicação, dose letal 50 e outros. Também foi introduzida uma visão geral sobre as áreas de atuação e aplicação da toxicologia. Como ponto final desta unidade, apresentamos a toxicocinética dos agentes tó- xicos, que trata do processo de absorção, distribuição, metabolismo e excreção dessas substâncias no organismo. O principal objetivo desta unidade é prepará-lo, caro aluno, para os temas que serão abordados nas próximas unidades. Passemos, então, à unidade II CONSIDERAÇÕES FINAIS 23INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA TOXICOLOGIA E TOXICOCINÉTICAUNIDADE 1 Caro (a) aluno (a), para entender um pouco mais sobre toxicocinética, leia o artigo abaixo: RODRIGUES, D. S. et al. Toxicologia Básica. Governo do Estado da Bahia, Se- cretaria da saúde do estado da Bahia – SESAB - CIAVE, 2009. Disponível em: https://www. saude.ba.gov.br/wp-content/uploads/2017/08/Apostila_CIAVE_Ago_2009_A4.pdf. Acesso em: 30 jun. 2023. LEITURA COMPLEMENTAR https://www.saude.ba.gov.br/wp-content/uploads/2017/08/Apostila_CIAVE_Ago_2009_A4.pdf https://www.saude.ba.gov.br/wp-content/uploads/2017/08/Apostila_CIAVE_Ago_2009_A4.pdf MATERIAL COMPLEMENTAR 24INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA TOXICOLOGIA E TOXICOCINÉTICAUNIDADE 1 FILME/VÍDEO • Título: Entenda o que é toxicologia e suas fases. • Ano: 2022. • Sinopse: Introdução à toxicocinética. O vídeo aborda a toxico- cinética e seus conceitos básicos sobre absorção, distribuição, metabolismo e excreção de um agente tóxico. • Link do vídeo: https://youtu.be/Osb6h0Y2_GQ. LIVRO • Título. Farmacologia. • Autor. RANG & DALE. • Editora. MODERNA. • Sinopse: A informação farmacológica essencial de que você precisa – para seu estudo inicial de química farmacêutica com alguns conceitos introdutórios. Conteúdo de confiança sobre todos os aspectos relevantes da farmacologia, começando com uma abordagem molecular de receptores e ações de fármacos por meio de usos clínicos de grupos-chave de fármacos. Possibilita um do- mínio de difíceis com quadros de pontos-chave, quadros de usos clínicos e ilustrações coloridas em toda a obra. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Plano de Estudos • Toxicodinâmica; • Avaliação de Toxicidade; • Avaliação de risco. Objetivos da Aprendizagem • Conhecer os mecanismos gerais de toxicodinâmica; • Descrever sobre avaliação da toxicidade; • Explicar a relação dose/resposta; • Citar tipos de testes toxicológicos; • Descrever sobre a avaliação de risco. Professor Dr. Gustavo Meireles Costa TOXICODINÂMICA, TOXICODINÂMICA, AVALIAÇÃO DE AVALIAÇÃO DE TOXICIDADE E TOXICIDADE E AVALIAÇÃO DE RISCOAVALIAÇÃO DE RISCO2UNIDADEUNIDADE INTRODUÇÃO 26TOXICODINÂMICA, AVALIAÇÃO DE TOXICIDADE E AVALIAÇÃO DE RISCOUNIDADE 2 Neste tópico, será abordada uma introdução à toxicologia com ênfase na toxicodi- nâmica, o que é fundamental para profissionais que atuam na área e para compreender as diversas vertentes da toxicologia. Exploraremos os mecanismos moleculares e bioquímicos dos agentes tóxicos, bem como o local específico de sua ação, como as interações de agentes tóxicos com receptores. Além disso, discutiremos a avaliação da toxicidade, um conceito fundamental na to- xicologia. Todas as substâncias podem ser consideradas agentes tóxicos, dependendo das condições de exposição, como a dose administrada ou absorvida, o tempo e a frequência da exposição. A toxicidade de uma substância em um organismo vivo está relacionada à sua capacidade de causar danos graves ou a morte, sendo essencial a interação do agente químico com o organismo. Por último, abordaremos a avaliação de risco, com o conceito de “perigo” repre- sentando a capacidade de uma substância causar efeitos adversos, e o conceito de “risco” relacionando-se com a probabilidade de ocorrência de eventos prejudiciais devido à expo- sição a agentes químicos ou biológicos. Esses conceitos são cruciais para a compreensão e gerenciamento de riscos na área da toxicologia. Bons estudos! 27TOXICODINÂMICA, AVALIAÇÃO DE TOXICIDADE E AVALIAÇÃO DE RISCOUNIDADE 2 TOXICODINÂMICA1 TÓPICO 1.1 Mecanismos gerais toxicodinâmica Para o entendimento da toxicodinâmica, se faz necessário a compreensão dos mecanismos moleculares e bioquímicos de agentes tóxicos bem como do local específico de sua ação é suma importância para aplicação de medidas preventivas e terapêuticas de intoxicação. Os mecanismos gerais serão descritos a seguir. 1.2 Interações de agentes tóxicos com receptores Os receptores são elementos proteicos sensíveis que fazem parte de um sistema de comunicações químicas com a propriedade de coordenar as funções de todas as células no organismo. Possuem como características básicas estarem localizados principalmente em membranas celulares, denominados receptores de membrana, mas podem também es- tar inseridos no citoplasma ou no núcleo, constituídos principalmente por macromoléculas, especialmente proteínas. Na fisiologia, a estimulação de receptores é realizada por uma molécula denomina- da agonista, cuja ação é promover efeitos biológicos característicos. As respostas desen- cadeadas pelos órgãos podem ser rápidas ou lentas, dependendo da estrutura molecular e dos mecanismos de transdução envolvidos. Como exemplo, podem-se citar os receptores nicotínicos da acetilcolina, que promovem a abertura de canais de sódio e despolarizam o sarcolema no músculo esquelético para a contração. O receptor GABA, neurotransmissor do SNC, é um inibidor desse sistema, cujos mecanismos podem ser explicados pelo bloqueio de canais de cálcio e sódio, e a abertura de canais de cloreto. O receptor do glutamato, um neurotransmissor excitatório do sistema nervoso central, desenvolve respostas rápidas ao ativar canais iônicos constitutivos, enquanto 28TOXICODINÂMICA, AVALIAÇÃO DE TOXICIDADE E AVALIAÇÃO DE RISCOUNIDADE 2 os receptores de hormônios muscarínicos da acetilcolina e adrenérgicos (Noradrenalina e Adrenalina) causam efeitos relativamente lentos quando comparados, pois levam à ativação de segundos mensageiros necessários para a transdução do sinal. Esses receptores estão acoplados a proteínas G, levando à ativação de enzimas como a Fosfolipase C ou a adenilato ciclase, que formarão os segundos mensageiros IP3 e DAG (Fosfolipase C) e AMPc (Adenilato Ciclase) para exercerem seus efeitos no sistema nervoso autônomo (LARINI 1994; OGA, 2008). A ligação entre o receptor e o ligante é normalmente reversível, o ligante, pode ser uma substância endógena que interage como determinado receptor para produzir uma resposta fisiológica normal, ou pode ser uma substância exógena que promova ativação (atividade intrínseca) no caso chamado de agonista ou bloqueio uma resposta (sem ativida- de intrínseca) sendo esta substancia chamada de antagonista da resposta. Como exemplo pode ser relatado o caso da atropina e a escopolamina que se ligam a receptores muscarínicos no sistema nervoso central e autônomo, bloqueando a ação da acetilcolina, chamados de antagonistas colinérgicos. Já para os receptores nicotínicos da acetilcolina situados nos gânglios são bloqueados pelo hexametônio, enquanto os situados na placa terminal da junção neuromuscular são bloqueados pelo decametônio e d-tubocurarina. Em todos esses exemplos, os ligantes exógenos bloqueiam a ação da acetilcolina que é um neurotransmissor fisiológico normal nesses sítios de ação. A d-tubocurarina, um alcaloide extraído de várias plantas, é um potente bloqueador da musculatura estriada, sendo encontrada juntamente com outros alcaloides, cuja mistura é conhecida como curar, sendo utilizada como veneno nas flechas pelos índios. Na junção neuromuscular, esses compostos atuam como antagonistas competitivos de acetilcolina, ou seja, impedem que a acetilcolina se ligue em seu receptor, suas moléculas se ligam aos receptores nicotínicos da placa terminal, mas são incapazes de desencadear o processo de despolarização. Os músculos estriados, portanto, tomam-se mais flácidos, progressivamente, os pri- meiros a serem afetados são os músculos frágeis da face, evoluindo para os mais potentes, dos membros e do tronco. Os músculos respiratórios são os últimos a serem afetados e os primeiros se recuperarem após a suspensão da ação do curare (LARINI 1994; OGA, 2008). A nicotina é oriunda do cigarro, em concentrações baixas, consegue estimular os receptores de acetilcolina pós-sináptico, situados nos gânglios, chamados de agonistas simpáticos e parassimpáticos, nas placas terminais das junções neuromusculares e nas suprarrenais. No plano ganglionar, a nicotina provoca efeito estimulante em todos os órgãos autonômicos (involuntários), tais como o coração, vasos, e trato gastrointestinal. Assim po- de-se explicar seu efeito nocivo, como, por exemplo, em portadores de hipertensão arterial. Em concentrações altas, a nicotina pode causar despolarização persistente de membranas das fibras pós-sinápticas e depressão dos órgãos inervados (OGA, 2008). 1.3 Interferências nas funções e membranas excitáveis 29TOXICODINÂMICA, AVALIAÇÃO DE TOXICIDADE E AVALIAÇÃO DE RISCOUNIDADE 2 Na fisiologia, é primordial para o bom funcionamento dos tecidos a manutenção e estabilidade das membranas excitáveis. Substâncias químicas podem alterar a funciona- lidade e função das membranas por diversos mecanismos. Por exemplo, o fluxo de íons através de axônios neurais pode ser bloqueado por substâncias que atuam como bloquea- dores de canais de íons, seja por meio de ligantes ou voltagem. Isso ocorre no bloqueio dos canais envolvidos na liberação de acetilcolinanas terminações do axônio neural, que medeia as contrações musculares esqueléticas. Nesse caso, o processo de transmissão da informação nervosa para as fibras musculares envolve uma série de eventos físico-químicos, incluindo a entrada de íons de sódio (despolarização) e saída de potássio (repolarização) através das membranas. A te- trodotoxina, derivada de gônadas, fígado e pele de peixe, tem a capacidade de bloquear os canais de sódio localizados nas membranas axônicas, impedindo assim as trocas iônicas e a liberação de acetilcolina. No Brasil, há uma espécie de peixe chamada baiacu, facilmente reconhecível por inflar-se quando ameaçado. Esse peixe também contém tetrodotoxina, e a intoxicação resulta em fraqueza muscular que evolui para paralisia completa e, em última instância, morte, devido ao bloqueio dos canais. As toxinas botulínicas, produzidas pelo microrganismo Clostridium botulinum, li- gam-se de forma irreversível aos terminais colinérgicos do axônio, bloqueando a liberação de acetilcolina. O botulismo é causado pela ingestão de alimentos enlatados contaminados com o microrganismo e se caracteriza por uma paralisia progressiva do sistema nervoso autônomo parassimpático, com sintomas como boca seca, turvação da visão e dificuldade de deglutição, seguida por paralisia respiratória (LARINI, 1994; OGA, 2008). 1.4 Inibição da fosforilação oxidativa Há muitas substâncias químicas capazes de causar diversos efeitos adversos que interferem na oxidação de carboidratos e na síntese de ATP. Essa interferência pode ocorrer ao interromper ou bloquear o fornecimento de oxigênio aos tecidos. Um exemplo disso é a oxidação do ferro na hemoglobina, que leva à formação de metemoglobina quando exposta a nitritos, resultando na incapacidade de transportar moléculas de oxigênio. Consequentemente, os tecidos podem sofrer bloqueios na utilização de oxigênio devido a substâncias como cianeto, sulfeto e azida, que têm afinidade com o citocromo oxidase. As consequências da depleção de ATP são diversas e incluem interferências na integridade da membrana, no funcionamento das bombas iônicas e na síntese de proteínas. Uma depleção significativa de energia leva à perda das funções celulares. O desa- coplamento metabólico aumenta o consumo de oxigênio e a produção de calor, podendo manifestar-se como hipertermia, estimulação respiratória e circulatória, náuseas, sudorese e, em casos extremos, coma. 30TOXICODINÂMICA, AVALIAÇÃO DE TOXICIDADE E AVALIAÇÃO DE RISCOUNIDADE 2 1.5 Complexação com biomoléculas 1.5.1 Componentes enzimáticos Dentre os agentes tóxicos que podem atuar inibindo as enzimas estão os inseti- cidas organofosforados. Esses inseticidas fosforados inativam as enzimas colinesterases (anticolinesterásicos) e, como consequência, reforçam ou intensificam os efeitos da es- timulação dos nervos colinérgicos pela acetilcolina endógena. A regeneração enzimática é um processo lento, o que torna essa inibição irreversível. A função da enzima depende da nova síntese proteica ou de novas enzimas, e os efeitos tóxicos resultam do acúmulo de acetilcolina nas terminações nervosas, uma vez que essa enzima é responsável por quebrar a acetilcolina na fenda sináptica. O monóxido de carbono é um gás liberado durante a combustão incompleta da matéria orgânica e se liga à forma reduzida do ferro na hemoglobina, reduzindo o transporte de oxigênio para os tecidos, além de se combinar com o citocromo oxidase. 1.5.2 Proteínas Os metabolitos resultantes da biotransformação da ração de fase 1 são interme- diários eletrofílicos que interagem com centros nucleofílicos de macromoléculas celulares, como proteínas, RNA e DNA. Essas interações podem desencadear ou iniciar processos tóxicos, como carcinogênese, mutagênese e necrose. Vale ressaltar que inibidores e induto- res das enzimas da fase 1 podem contribuir para a toxicidade de xenobióticos. Um exemplo disso é o Paracetamol, que é oxidado na reação da fase 1 por enzimas do citocromo P-450 e, na fase 2, é conjugado com sulfato ou ácido glicurônico. A depleção de glutationa (conju- gação da Fase 2) é evidenciada, simultaneamente ao aumento da hepatotoxicidade, após a administração de doses elevadas de paracetamol em ratos (LARINI, 1994; OGA, 2008). 1.6 Perturbação de homeostase cálcica O cálcio desempenha um papel crucial como segundo mensageiro na regulação de várias funções intracelulares vitais para as células, incluindo a ativação e inativação de várias enzimas, organelas intracelulares, microfilamentos e outros processos. Um exemplo disso é a perturbação da organização do citoesqueleto quando o cálcio intracelular aumenta, devido à dissociação dos microfilamentos de actina e à ativação de fosfolipases e protea- ses. Quando as fosfolipases são ativadas de forma não fisiológica devido ao aumento de cálcio, essas enzimas começam a degradar fosfolipídios de membrana, o que pode resultar em dano e morte celular. Uma alteração na homeostase do cálcio intracelular pode ocorrer devido ao influxo excessivo de cálcio, ao aumento na liberação de cálcio intracelular e à inibição do efluxo através da membrana plasmática. A interferência nesses processos é um mecanismo im- portante pelo qual alguns agentes tóxicos atuam, como é o caso do peróxido, aldeídos, alcanos e alcenos, halogênios e alguns íons metálicos (LARINI 1994; OGA, 2008). 31TOXICODINÂMICA, AVALIAÇÃO DE TOXICIDADE E AVALIAÇÃO DE RISCOUNIDADE 2 AVALIAÇÃO DE TOXICIDADE2 TÓPICO 2.1 Introdução à avaliação da toxicidade Na Toxicologia, toda substância pode ser considerada um agente tóxico, sendo que as condições de exposição desempenham um papel fundamental. Isso inclui a dose adminis- trada ou absorvida, o tempo e a frequência de exposição (doses únicas ou múltiplas) e a via de administração (respiratória, oral, dérmica e parenteral). A toxicidade de uma substância para um organismo vivo é definida pela sua capacidade de causar danos graves ou morte, e a ocorrência desses danos depende da interação do agente químico com o organismo. A medida dos danos causados a um indivíduo depende da relação entre a intensi- dade do efeito, a concentração da substância e a duração da exposição. Além disso, ela é influenciada pela idade e pelas condições de saúde (imunocompetente ou imunocompro- metido) do indivíduo ou organismo exposto. Substâncias altamente tóxicas têm a capacida- de de promover efeitos tóxicos em pequenas quantidades ou concentrações plasmáticas, enquanto substâncias de baixa toxicidade só produzirão efeitos em doses elevadas para atingir concentrações plasmáticas significativas. Algumas substâncias, mesmo com baixa toxicidade aguda, podem causar danos crônicos, como efeitos carcinogênicos ou teratogê- nicos, com doses que não produzem efeitos tóxicos agudos. 2.2 Relação dose-resposta e concentração-resposta Dose é o termo utilizado para quantificar a quantidade de uma substância admi- nistrada a um organismo vivo, geralmente expressa em relação ao peso corporal. A via de administração desempenha um papel importante na quantidade que pode ser absorvida, e 32TOXICODINÂMICA, AVALIAÇÃO DE TOXICIDADE E AVALIAÇÃO DE RISCOUNIDADE 2 essa quantidade muitas vezes difere da dose administrada. Por exemplo, a via oral pode ser afetada pelo efeito de primeira passagem, enquanto a via retal possui características distintas. A concentração de um agente químico determina ou sugere as quantidades e concentrações às quais os organismos vivos estão expostos. Na exposição a um agente químico, a dose/concentração necessária para causar dano varia amplamente, dependendo de diversos fatores, incluindo as propriedades físico- -químicas das substâncias, como sua capacidade de atravessar membranas, determinada pela lipossolubilidade (LARINI, 1994; OGA, 2008). A relação dose/resposta ou concentração/resposta, representada por uma curva teórica do tipo Gaussiana, raramente é encontrada na prática. Essa curva é frequente- mente usada para calculara dose letal 50 (DL50) ou a concentração letal 50% (CL50). Esses índices servem para indicar a dose ou concentração de um agente químico, obtida por meio de cálculos estatísticos, que pode causar a morte de 50% de uma população de organismos em condições experimentais previamente definidas. É importante ressaltar que outro valor derivado dessa relação é a dose ou concentra- ção limite, ou seja, a quantidade mínima, que não necessariamente é pequena, necessária para produzir uma resposta detectável em uma população de teste exposta. Esses índices são usados para classificar e comparar a toxicidade de várias substâncias químicas. TABELA 1 - CRITÉRIOS DE CLASSIFICAÇÃO DE TOXICIDADE Categoria DL50 oral para ratos (mg/kg) Muito tóxico Menor que 25 Tóxico De 25 a 200 Nocivo De 200 a 2000 Fonte: Oga (2008). 2.3 Tipos de testes toxicológicos É importante realizar uma série de testes toxicológicos para cada substância nova a ser produzida ou utilizada em larga escala. A escolha dos testes a serem empregados depende do uso da substância e do efeito tóxico que estruturas semelhantes à substância em questão possam produzir. A lista de testes deve incluir os seguintes tópicos: • Informações preliminares; • Toxicidade aguda; • Toxicidade subcrônica; • Toxicidade crônica; • Mutagênese e carcinogênese; 33TOXICODINÂMICA, AVALIAÇÃO DE TOXICIDADE E AVALIAÇÃO DE RISCOUNIDADE 2 • Reprodução; • Toxicocinética; • Efeitos locais na pele, olhos e sensibilização cutânea; • Ecotoxicidade (LARINI, 1994; OGA, 2008). Esses testes são fundamentais para avaliar os potenciais riscos de uma substância e sua segurança em relação à exposição humana e ao meio ambiente. Eles desempenham um papel crucial na regulamentação e na tomada de decisões sobre o uso seguro de subs- tâncias químicas. Informações preliminares Essas informações são cruciais para a caracterização da substância que será sub- metida aos estudos de toxicidade, uma vez que a toxicidade está diretamente relacionada à sua estrutura química. É fundamental que essa estrutura esteja bem caracterizada. Além disso, é importante conhecer as impurezas presentes, pois muitos dos efeitos tóxicos po- dem ser atribuídos a essas substâncias e não à substância em teste. As propriedades físico-químicas da substância também são de extrema importância e devem ser determinadas, pois influenciam o tratamento da substância para a aplicação dos testes toxicológicos. Algumas dessas propriedades incluem o odor, a cor, os pontos de fusão e ebulição, a pressão, a densidade, a viscosidade, a solubilidade e a volatilidade. Es- sas informações auxiliam na compreensão do comportamento da substância em diferentes condições e ambientes, o que é essencial para avaliar seus riscos potenciais. Estudos de toxicidade aguda A toxicidade aguda pode ser definida como os efeitos adversos que ocorrem em um curto período após a administração de uma determinada substância, seja em dose única ou em doses múltiplas dentro de 24 horas. A dose única é útil na determinação da potência de uma substância em casos de envenenamento ou ingestão acidental, enquanto as doses múltiplas são úteis para avaliar efeitos acumulativos ao longo do tempo. Essa distinção é importante para compreender os efeitos imediatos e a possível acumulação de toxicidade de uma substância. Estudos de toxicidade subcrônica Os testes de toxicidade subcrônica são realizados para obtenção de informações sobre a toxicidade de substâncias químicas, após exposições repetidas. Estes estudos devem ser considerados no mínimo a duração de 21 dias, sendo que o tempo mais comum 34TOXICODINÂMICA, AVALIAÇÃO DE TOXICIDADE E AVALIAÇÃO DE RISCOUNIDADE 2 são testes dentro de 90 dias. Objetivos destes testes de toxicidade subcrônica são de esta- belecer os níveis nos quais não são observados os efeitos tóxicos, identificar e caracterizar os órgãos afetados e a magnitude após, exposição repetitivas. Estudos de toxicidade crônica Os testes ou estudos de toxicidade crônica são conduzidos para avaliar os efeitos tóxicos após uma exposição prolongada a doses cumulativas de uma substância específica. Esses estudos desempenham um papel crucial na avaliação do potencial carcinogênico da substância, desde que a dose seja adequadamente escolhida. Os estudos de toxicidade crônica seguem, em grande parte, o mesmo protocolo dos estudos de toxicidade subcrônica, diferindo principalmente no tempo de exposição, que é realizado por no mínimo 3 meses ou mais. Isso permite avaliar os efeitos tóxicos que podem se desenvolver ao longo de um perío- do mais longo de exposição, simulando condições de exposição crônica em seres humanos. Estudos de mutagênese e carcinogênese O termo Mutagênese é referido às propriedades em que as substâncias químicas apresentam a capacidade de provocar mudanças e/ou alterações no material genético das células, sendo que estas podem ser transmitidas às novas células no processo de divisão. Dependendo da célula afetada, essas mutações podem acontecer desde a inviabilidade de desenvolvimento da célula ovo, podendo levar à morte do embrião ou feto até o desenvol- vimento de anormalidades congênitas que podem ser transmitidas hereditariamente. O objetivo principal é descobrir se as mudanças genéticas são perigosas para o material genético e como elas podem ser transmitidas para as gerações futuras. Os testes de mutagenicidade são, na maioria das vezes, usados para prever o surgimento de câncer, ou seja, como triagem/prevenção potencial carcinogênico. Estudos de toxicocinética Estes estudos fornecem informações sobre a absorção, distribuição, armaze- namento, biotransformação e excreção de uma substância. Estudo é importante porque mostra como as substâncias afetam diferentes espécies de animais e como afetam o com- portamento humano. Sabe-se que muitas substâncias são metabolizadas de maneiras di- ferentes, sendo que seus efeitos tóxicos se devem aos seus produtos de biotransformação. Estudos de efeitos locais sobre a pele, olhos e sensibilização cutânea Dependendo da exposição humana, é necessário realizar uma avaliação dos efei- tos diretos de uma substância sobre os olhos e a pele, seja devido ao uso de cosméticos ou 35TOXICODINÂMICA, AVALIAÇÃO DE TOXICIDADE E AVALIAÇÃO DE RISCOUNIDADE 2 exposições acidentais. Os critérios considerados devem estar relacionados à capacidade da substância de causar irritação na pele, independentemente de esta estar intacta ou não. No caso da pele, os parâmetros a serem avaliados incluem eritema, edema, corrosão e formação de escaras. No que diz respeito aos olhos, é fundamental observar possíveis alterações na íris, conjuntiva, córnea e cristalino. A avaliação de sensibilização cutânea fornece informações sobre a capacidade de uma substância específica induzir reações alérgicas ou de sensibilidade cutânea quando em contato repetido com a pele. Esses testes costumam ser realizados em cobaias subme- tidas a doses repetidas ao longo de um período de uma a duas semanas. Estudos de ecotoxicidade Os termos usados em toxicologia ambiental ou ecotoxicidade descrevem o estudo dos efeitos adversos em organismos vivos causados pela liberação de substâncias quími- cas no meio ambiente. Existe uma distinção entre esses dois termos, preferencialmente utilizando ‘ecotoxicidade’ para se referir apenas ao estudo dos efeitos tóxicos no ecossis- tema e seus componentes. No ambiente, muitas substâncias potencialmente tóxicas estão presentes em concentrações que, isoladamente, não causariam danos. No entanto, sua interação com outros agentes químicos pode resultar em danos. As condições climáticas também desempenham um papel significativo na exposi- ção a substâncias potencialmente tóxicas, e, portanto, a avaliação deve variar conforme a região específica e as substâncias liberadas nela. Por exemplo, o aumento da temperatura e as enchentes têm efeitos diferenciados em diversas regiõese, portanto, não podem ser aplicados uniformemente a todas as situações. Para avaliar o risco ambiental de uma determinada substância, vários fatores devem ser considerados, incluindo aspectos químicos, biodegradação, testes de toxicidade aguda, testes de toxicidade crônica, persistência na atmosfera, bioacumulação em microrganismos e plantas, bem como efeitos físicos, como radiações (LARINI, 1994; OGA, 2008). 36TOXICODINÂMICA, AVALIAÇÃO DE TOXICIDADE E AVALIAÇÃO DE RISCOUNIDADE 2 AVALIAÇÃO DE RISCO3 TÓPICO 3.1 Introdução à avaliação de risco Na toxicologia, o conceito de “perigo” se refere à capacidade de uma substância causar efeitos adversos, enquanto o ‘risco’ representa a probabilidade de um evento nocivo ocorrer devido à exposição a um agente químico e/ou biológico. A avaliação de risco é um processo sistemático que identifica e quantifica o perigo, a exposição e o risco associados. Essa avaliação é uma caracterização dos efeitos adversos após a exposição hu- mana a um agente químico específico. Seu objetivo principal é minimizar o risco que uma substância química possa representar para a saúde humana. O processo de avaliação de risco envolve um delineamento analítico que define os tipos de dados e metodologias a serem empregados na avaliação. Além disso, é fundamental detalhar as incertezas e os problemas associados ao processo de avaliação. 3.2 Identificação do perigo Nesta fase, o foco está na identificação do perigo, investigando a capacidade do agente químico em questão de causar efeitos adversos e determinando a natureza desses efeitos na população presente em um ecossistema específico. Geralmente, essa etapa envolve a utilização de cobaias em estudos clínicos ou epidemiológicos, visando avaliar a toxicidade aguda, subaguda, crônica, carcinogênica e outros efeitos adversos. 3.3 Caracterização do perigo A caracterização de perigo ou a avaliação da relação dose/resposta são fundamen- tais para estabelecer uma relação quantitativa entre a exposição a um agente e a incidência de uma resposta adversa. Quando os dados de exposição humana a um agente tóxico não são suficientes para prever uma resposta, é necessário recorrer a dados obtidos em ensaios com animais para estabelecer essa relação dose/resposta. 37TOXICODINÂMICA, AVALIAÇÃO DE TOXICIDADE E AVALIAÇÃO DE RISCOUNIDADE 2 Nesse processo, existem dois tipos de extrapolação necessários. O primeiro é a extrapolação quantitativa, que envolve a utilização de doses elevadas usadas em expe- rimentos em uma determinada população. O segundo é a extrapolação qualitativa, que abrange a transferência dos resultados obtidos em animais para a população humana. 3.4 Avaliação da exposição O objetivo da avaliação da exposição é medir a frequência, intensidade e duração da exposição humana a um determinado agente no meio ambiente. Essa avaliação visa descrever a magnitude da exposição, as vias de exposição, a duração, o tamanho, a natu- reza, a classe da população exposta e as incertezas associadas ao processo. A etapa da avaliação da exposição compreende três fases distintas: • Caracterização da fonte de exposição; • Identificação dos meios de exposição, que podem incluir água, solo, ar, contato direto ou alimentos, bem como das vias de exposição; • Quantificação da exposição. 3.5 Caracterização e manejo do risco A caracterização do risco é a etapa final dessa avaliação e envolve a previsão da frequência e magnitude dos efeitos adversos em uma população exposta ou em indivíduos selecionados. A função primordial da caracterização do risco é integrar os dados obtidos nas fases de identificação do perigo, caracterização do perigo e da exposição. Isso resulta na geração de evidências sobre o risco da exposição a um agente químico em determinadas condições, que, por sua vez, serve como base para tomar decisões futuras. A avaliação de riscos se estabeleceu como uma ferramenta fundamental com o propósito de embasar decisões, controlar e prevenir a exposição de populações e indivíduos a agentes prejudiciais à saúde presentes no meio ambiente, seja por meio de produtos, processos produtivos ou resíduos. Trata-se de um conjunto de procedimentos que permite avaliar e estimar o potencial de danos resultantes da exposição a determinados agentes ambientais. Embora tenha suas raízes nos processos de produção, produtos e resíduos radioativos e químicos, essa avaliação pode ser aplicada a outras situações, incluindo aquelas que envolvem agentes biológicos. Quando se trata de processos produtivos, o conceito de risco está relacionado à probabilidade de eventos ou falhas de componentes. Nesses casos, a avaliação de riscos serve como uma ferramenta para identificar perigos, calcular probabilidades de ocorrência, desenvolver cenários e analisar as consequências de acidentes industriais, especialmente em instalações cujos eventos podem resultar em emissões de poluentes no meio ambiente. Ela também é usada como uma ferramenta para o licenciamento ambiental de instalações. Em situações envolvendo produtos ou resíduos perigosos, o conceito de risco está ligado a estabelecer relações entre a exposição a agentes específicos e os potenciais danos à saúde de seres humanos e outros organismos vivos. A avaliação de riscos aprofunda a compreensão dos problemas ambientais que podem ter impactos indesejáveis na saúde. Ela começa quando dados ambientais e de saúde indicam a presença de agentes perigosos (químicos, físicos ou biológicos) no ambiente, cujos efeitos sobre a saúde precisam ser avaliados quantitativa e qualitativamente. Fonte: Freitas (2002). 38TOXICODINÂMICA, AVALIAÇÃO DE TOXICIDADE E AVALIAÇÃO DE RISCOUNIDADE 2 A atual ênfase dada à Avaliação de Risco, uma metodologia introduzida nos últimos 15 anos, tem sido atribuída ao interesse mundial em se definir uma metodologia ampla, na qual se possa incluir os vários aspectos relacionados à toxicidade das substâncias, unindo causas e efeitos de uma maneira quantitativa. Os esforços para identificar fatores de risco já vêm de longo tempo, dos quais a menor tolerância pública à exposição a substâncias potencialmente prejudiciais e o aumento das enfermidades congênitas têm motivado o estudo dos possíveis fatores ambientais asso- ciados à etiologia destas alterações (Vega, 1985). A metodologia de Avaliação de Risco tem sido amplamente utilizada em problemas de poluição ambiental, como ferramenta importante no processo do gerenciamento ambiental (Oli- veira et al., 1987 ; Hoffman et al., 1991 , Johnson, 1989 ; Blaylock et al., 1993). A metodologia proposta pela Agência de Proteção Ambiental Americana (U.S. EPA, 1989 ) incorpora, para os poluentes não-radioativos, o conceito de dose, há muito tempo utilizado na área de radioproteção. De maneira genérica, dose pode ser definida como a quantidade de uma substância incorporada ou absorvida pelo organismo (WHO, 1978), ou no caso da radiação, a energia média depositada pela radiação ionizante no elemento de matéria m (ICRU, 1980). Logo, na avaliação da dose é fundamen- tal a quantificação da exposição a um contaminante ou radiação. Atualmente, no Brasil, o controle da qualidade do meio ambiente em relação aos poluentes não-radioativos é realizado comparando-se as concentrações encontradas nos corpos d’agua com as concentrações máximas permitidas pela legislação (CONAMA, 1986). Este tipo de aborda- gem não considera a quantificação da exposição da população, isto é, os hábitos populacionais, o tipo de uso ‘efetivo’ que a população faz do ambiente, assim como as taxas de ingestão. Tais fatores são específicos para cada região ou grupos populacionais, que variam significativamente, devendo, portanto, ser quantificados. VEIGA, L. H. S.; FERNADES, B. Gestão e avaliação de risco em saúde ambiental [online]. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 1999. 155 p. Disponível em: https://books.scielo.org/id/ffk9n/pdf/brilhante-9788575412411-06.pdf. Acesso em: 30 jun. 2023. https://books.scielo.org/id/ffk9n/pdf/brilhante-9788575412411-06.pdf