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OAB EXAME DE ORDEM DIREITO AMBIENTAL Capítulo 02 1 CAPÍTULOS Capítulo 1– Princípios do Direito ambiental Capítulo 2 (você está aqui!) – Tutela Constitucional do Meio Ambiente e Responsabilidade Ambiental Civil e Administrativa. Capítulo 3 – Política Nacional do Meio Ambiente. Capítulo 4 – Licença Ambiental. Capítulo 5 – Código Florestal. Capítulo 6 – Unidades de Conservação da Natureza. Capítulo 7 – Política Nacional de Recursos Hídricos e Os Recursos Minerais. Capítulo 8 – Tutela Processual Coletiva do Meio Ambiente e Tutela Penal e Processual Penal do Meio Ambiente. 2 SOBRE ESTE CAPÍTULO A apostila de número 02 do nosso curso de Direito Ambiental tratou sobre Direito Ambiental da Constituição Federal e Responsabilidade ambiental. Agora, vamos as nossas considerações: “Direito Ambiental na Constituição Federal” não teve recorrência nos últimos três anos no exame de ordem! No entanto, por sabermos que a FGV costuma ser bastante imprevisível e este assunto ser bastante cobrado em diversos concursos públicos, achamos melhor acrescentá-lo na sua apostila para que assim, possam ser abrangidos o máximo de conteúdo possível. Dessa forma, acrescentamos também algumas questões que abordaram o referido tema. Não deixe de responde-las, ok? 😉 “Responsabilidade Ambiental” apareceu 4 VEZES nos últimos 3 anos, sendo considerado um assunto de alta recorrência no Exame de Ordem. Nem preciso falar que o estudo deste assunto é essencial, não é mesmo? Então, mãos à obra! As questões 06 a 09 tratam sobre o tema em questão. A banca costuma seguir o padrão já conhecido, trazendo um caso hipotético, no qual será cobrado do aluno o conhecimento sobre a letra seca da lei. 3 SUMÁRIO DIREITO AMBIENTAL .............................................................................................................................. 5 Capítulo 2 .................................................................................................................................................. 5 2. Direito Ambiental na Constituição Federal ................................................................................. 5 2.1 Breve histórico ........................................................................................................................................................ 5 2.2 Direito de terceira geração ............................................................................................................................... 6 2.3 Proteção do meio ambiente no art. 225 da CF/88 ................................................................................ 8 2.4 Ações constitucionais ....................................................................................................................................... 17 2.5 Domínio eminente dos bens pelo Estado ............................................................................................... 18 2.5.1 Recursos naturais ............................................................................................................................................... 18 2.6 Competências em matéria ambiental ....................................................................................................... 26 2.6.1 Competência legislativa privativa ................................................................................................................ 26 2.6.2 Competência legislativa exclusiva ............................................................................................................... 27 2.6.3 Competência legislativa remanescente .................................................................................................... 28 2.6.4 Competência legislativa concorrente ........................................................................................................ 28 2.6.5 Competência material exclusiva .................................................................................................................. 30 2.6.6 Competência material comum ..................................................................................................................... 32 3. Responsabilidade Ambiental ........................................................................................................ 34 3.1 Responsabilidade civil ...................................................................................................................................... 34 3.1.1 Responsabilidade civil por dano ambiental ........................................................................................... 35 3.1.2 Responsabilidade civil do Estado por dano ambiental ..................................................................... 40 3.2 Responsabilidade administrativa ................................................................................................................. 42 3.2.1 Poder de polícia ambiental ............................................................................................................................ 43 3.2.2 Infrações e sanções ambientais ................................................................................................................... 43 4 3.2.3 Decadência e prescrição administrativa ................................................................................................... 52 QUADRO SINÓTICO .............................................................................................................................. 54 QUESTÕES COMENTADAS ................................................................................................................... 58 GABARITO ............................................................................................................................................... 71 QUESTÃO DESAFIO ................................................................................................................................ 72 GABARITO QUESTÃO DESAFIO ........................................................................................................... 73 LEGISLAÇÃO COMPILADA .................................................................................................................... 75 JURISPRUDÊNCIA ................................................................................................................................... 76 MAPA MENTAL ...................................................................................................................................... 85 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................................................... 87 5 DIREITO AMBIENTAL Capítulo 2 2. Direito Ambiental na Constituição Federal 2.1 Breve histórico Antes da Constituição Federal de 1988 o meio ambiente era visto apenas como um recurso que poderia ser explorado economicamente. Naquele momento histórico, a abundância da natureza e a sua aparente infinidade não preocupava a sociedade com a necessidade de sua preservação. Era uma visão utilitarista do meio ambiente, que vigorou até meados dos anos 70 em todo o planeta. Uma série de fatores começaram a influenciar a sociedade para a necessidade de proteger o meio ambiente. Descobertas científicas, movimentos populares e tragédias ambientais provocadas pelo homem deram início a uma crise ambiental e, com ela, surgiram os primeiros princípios ambientais. Foi em 1972, na Conferência de Estocolmo, que teve início a visão protecionista do meio ambiente. Essa percepção influenciou diversos ordenamentos jurídicos, inclusive o brasileiro que, em sede infraconstitucional, criou a Secretaria do Meio Ambiente – SEMA, em 1973, e a Política Nacional do Meio Ambiente – PNMA, em 1981. Mas foi apenas com a Constituição de 1988 que a proteção domeio ambiente ganha status constitucional. Com a sua constitucionalização, os princípios ambientais são elevados ao patamar dos direitos fundamentais. 6 Dentre as vantagens de constitucionalizar a tutela do meio ambiente, destacamos a possibilidade do controle de constitucionalidade de atos normativos que sejam hierarquicamente inferiores e que eventualmente causem danos ambientais. Além disso, com a previsão constitucional, a proteção ambiental passa a ser uma obrigação do Poder Público, que deve atuar sempre observando como diretriz o princípio do desenvolvimento sustentável. Vale lembrar que a forma como o meio ambiente está tutelado pela Constituição de 1988 pressupõe um direito e uma obrigação ao mesmo tempo. O meio ambiente ecologicamente equilibrado é um direito de todos, mas também é um dever de todos a sua proteção. Quando a Constituição Federal, em seu art. 225, afirma que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado”, estabelece que se trata de um direito transindividual, de titularidade coletiva. Por isso, podemos afirmar que qualquer pessoa, residente ou não no Brasil, é titular do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é visto como um direito fundamental material. Apesar de não está no rol do Título II da CF/88, que trata especificamente dos direitos fundamentais, alguns direitos, como o agora estudado, possuem matéria de direito fundamental, ou seja, influenciam diretamente na estrutura do Estado e da sociedade, é o que a doutrina chama de fundamentalidade material. 2.2 Direito de terceira geração Os constitucionalistas classificam os direitos fundamentais em gerações, ou dimensões. A primeira geração de direitos fundamentais surgiu com a constituição norte-americana de 1787 e com a constituição francesa de 1791, contrapondo o absolutismo e fundando o constitucionalismo liberal. Nesse contexto, os direitos fundamentais eram estabelecidos como limites ao Estado, protegiam o individualismo e a propriedade privada, chamados de “liberdades clássicas”. A segunda geração de direitos fundamentais surgiu através da constituição do México de 1917 e da constituição da Alemanha de 1919. Nesse contexto, o liberalismo econômico havia fracassado, e para reorganizar a economia e as relações empregatícias, o Estado foi chamado a 7 intervir. Os direitos de segunda geração são os direitos de igualdade – direitos sociais, culturais e econômicos. Quando os direitos de liberdade e de igualdade já estavam consolidados, surge a noção de sociedade de massa. A coletividade é colocada em evidência e novos direitos dotados de humanismo e universalidade passam a ser exigidos. São os direitos de terceira geração, chamados de direitos de fraternidade ou de solidariedade. Tais direitos se destacam porque não visam a proteção de interesses individuais, mas sim dos interesses da humanidade. O meio ambiente ecologicamente equilibrado é um exemplo de direito humano1 de terceira geração, pois trata-se de um direito coletivo difuso. Mas o que isso significa? Primeiramente precisamos entender que existem várias formas de direitos coletivos, ou seja, direitos que possuem uma coletividade em um dos polos da relação jurídica. Eles podem ser direitos difusos, direitos coletivos propriamente ditos, ou direitos individuais homogêneos. O que os diferencia? Basicamente possibilidade de determinar os seus titulares, de dividir o objeto da tutela e a forma como os polos da relação jurídica estão ligados. O Código de Defesa do Consumidor nos oferece as seguintes definições: Art. 81. Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de: I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato; II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base; III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum. Portanto, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado enquadra-se como um direito difuso por ser indivisível, com titulares indeterminados (toda a coletividade), ligados por uma circunstância de fato, e não de direito. 1 Vide questão 4 desse material. 8 2.3 Proteção do meio ambiente no art. 225 da CF/88 A Constituição Federal de 1988 inaugurou na história das constituições brasileiras um capítulo específico para a tutela do meio ambiente (Capítulo VI, inserido no Título VIII – Da Ordem Social). É de extrema importância para o nosso estudo entender as disposições ali escritas, pois elas devem guiar todo o raciocínio dentro da matéria, então leia o texto da Constituição com atenção: Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. § 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético; III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade; V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente; 9 VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente; VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade. § 2º Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei. § 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. § 4º A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais. § 5º São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos Estados, por ações discriminatórias, necessárias à proteção dos ecossistemas naturais. § 6º As usinas que operem com reator nuclear deverão ter sua localização definida em lei federal, sem o que não poderão ser instaladas. § 7º Para fins do disposto na parte final do inciso VII do § 1º deste artigo, não se consideram cruéis as práticas desportivas que utilizem animais, desde que sejam manifestações culturais, conforme o § 1º do art. 215 desta ConstituiçãoFederal, registradas como bem de natureza imaterial integrante do patrimônio cultural brasileiro, devendo ser regulamentadas por lei específica que assegure o bem-estar dos animais envolvidos. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações; O art. 225 da CF/88 dispõe de diversos aspectos e princípios que devem ser observados em todo o estudo do direito ambiental. Primeiramente, temos a definição do bem jurídico 10 tutelado: o meio ambiente ecologicamente equilibrado; depois, podemos extrair da norma que ele se trata de um bem difuso, pois pertence a “todos” e é “de uso comum do povo”; ainda, extraímos o caráter de direito fundamental do meio ambiente ecologicamente equilibrado quando a própria Constituição o define como “essencial à sadia qualidade de vida”; também vislumbramos que é um dever do Poder público defender e preservar o meio ambiente ecologicamente equilibrado e isso deve guiar todas as ações do Estado; que o dever de defesa e preservação do equilíbrio ambiental imposto à coletividade pressupõe do direito de informação ambiental e de participação democrática da sociedade nos assuntos referentes ao meio ambiente, principalmente naqueles ameaçadores; por fim, surge o princípio da solidariedade intergeracional quando o legislador constituinte estabelece que o meio ambiente ecologicamente equilibrado é um direito das presentes e futuras gerações, ou seja, a geração atual deve cuidar do equilíbrio ambiental para si pensando na manutenção desse equilíbrio no futuro. § 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: A seguir, o legislador constituinte elencou diversas obrigações do Poder Público para efetivar a proteção ambiental. O fato de a Constituição atribuir expressamente ao Poder Público diversas obrigações para que possa assegurar o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, não retira da coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações, em suas interações normais. Ou seja, interações sociais que firam esse direito devem ser condenadas de acordo com o caput do art. 225 da CF/88. I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas2; Em primeiro lugar, cabe diferenciar preservação de restauração. A primeira compreende um conjunto de ações para proteger o meio ambiente, que ainda não foi degradado; enquanto 2 Vide questão 5 desse material. 11 a restauração consiste em ações para restituir o meio ambiente já degradado ao mais próximo possível da sua condição original. Portanto, de acordo com o §1º, I, do art. 225 da CF/88, incumbe ao Poder Público proteger o meio ambiente e, caso ocorra um dano, restituí-lo da forma mais completa possível. Processos ecológicos essenciais são os processos vitais, que tornam possíveis as relações entre os seres vivos e o meio ambiente, como as cadeias alimentares, o ciclo da água, do oxigênio, a produção de alimentos, de energia... Por sua vez, o manejo ecológico das espécies e ecossistemas significa que o Poder Público deve administrar a biodiversidade das espécies vivas e dos seus respectivos ecossistemas. II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético3; A Lei 13.123/15 define patrimônio genético como “informação de origem genética de espécies vegetais, animais, microbianas ou espécies de outra natureza, incluído substâncias oriundas do metabolismo destes seres vivos”. A Lei 11.105/05 define normas de segurança e de fiscalização das atividades que envolvem organismos geneticamente modificados (OGM) e seus derivados. Para tanto, cria o Conselho Nacional de Biossegurança e a Política Nacional de Biossegurança. A Lei 9.985/00, por fim, cria a área ambientalmente protegida, importante instrumento de preservação da diversidade e da integridade do patrimônio genético do país. III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção4; 3 Vide questões 3 e 5 desse material. 4 Vide questões 2 e 3 desse material. 12 A Constituição institui como obrigação do Poder Público a definição de espaços territoriais que devem ser protegidos devido à relevância dos seus atributos ambientais. Essa reserva de território deve ser feita em todas as unidades da Federação por meio de lei ou decreto do Poder Executivo, entretanto, uma vez estabelecida, a sua redução ou supressão só pode ser feita através de lei. Evidente é o intuito do legislador constituinte: facilitar a criação de áreas ambientalmente protegidas e dificultar a sua supressão. IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade5; O estudo prévio de impacto ambiental, que chamaremos de EIA, é uma forma de avaliar o impacto que determinada atividade pode causar ao meio ambiente. Ele serve para subsidiar o procedimento de licenciamento ambiental de obras e atividades (públicas ou privadas) potencialmente causadoras de significativo dano ao meio ambiente, portanto, o estudo é realizado de forma prévia. Além da realização do EIA, a Constituição exige que a ele seja dada publicidade, prestigiando o princípio da informação. Com isso, qualquer interessado pode tomar providências administrativas e judiciais caso encontre alguma irregularidade na atividade. V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente6; Esse dispositivo constitucionaliza a gestão dos riscos em matéria ambiental. Portanto, qualquer atividade potencialmente danosa para a vida, para a qualidade de vida e para o meio ambiente, deve ser controlada pelo Poder Público para afastar ou diminuir os seus riscos. 5 Vide questões 2 e 3 desse material. 6 Vide questões 3 e 5 desse material. 13 O Estado, através do seu poder de polícia, deve fiscalizar e orientar a produção, comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias potencialmente danosas, sempre ressaltando o bem-estar da coletividade. É o que estudamos como princípio do limite. VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente7; A educação ambiental é um dos mais importantes instrumentos para envolver a sociedade com a responsabilidade pela preservação do meio ambiente. Para tanto, foi instituída a Política Nacional de Educação Ambiental, pela Lei 9.795/99, que conceitua a educação ambiental como “processos por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade”. VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade8; Há diversos diplomas legais que, com base no dispositivo da Constituição, visam a proteção dos animais e das plantasno ecossistema equilibrado, inclusive tipificando como crime a conduta danosa a esses bens. Por exemplo, a Lei de Crimes Ambientais, em seu art. 32, define como crime “praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos”; e em seu §1º, o mesmo artigo tipifica a realização de experiencia dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando há recurso alternativo. É para cumprir esse preceito constitucional que a Lei 11.794/08 estabelece regras para os procedimentos científicos e de aprendizagem que utilizam animais. Fica reservado o uso de animais vivos, em experiencias que possam causar dor ou angústia, aos casos inevitáveis. Nesses 7 Vide questão 5 desse material. 8 Vide questões 3 e 5 desse material. 14 casos, é preciso desenvolver a pesquisa sob sedação, analgesia ou anestesia adequada e que o animal seja sacrificado antes de recobrar a consciência – morte por meios humanitários. Nesse contexto, o STF já se ocupou de analisar a constitucionalidade de diversas normas estaduais que regulamentavam atividades com animais vivos. A decisão que mais se destacou foi a que trata da farra do boi, prática catarinense, com contexto religioso, em que o participante fazia “pegas e correrias de boi” para depois sacrificar o animal e oferecer à comunidade como hóstia. A controvérsia girava em torno do direito à manifestação cultural, protegido constitucionalmente (art. 215), e o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, neste caso, representado pela proteção da fauna, também previsto constitucionalmente. Para o Supremo, a farra do boi não se tratava apenas de uma manifestação cultural, mas sim de uma prática violenta e cruel para com os animais (RE 153.531/SC). As manifestações culturais no Brasil não podem ser exercidas de forma absoluta, elas encontram limites, e o limite no caso era a crueldade contra os animais. Portanto, por maioria, a Corte deu provimento ao recurso, proibindo a realização da farra do boi. O mesmo entendimento foi adotado quando o Supremo julgou a ADI 4883 e declarou a inconstitucionalidade de uma lei estadual do Ceará que regulamentava a prática da vaquejada. Para o STF, “a crueldade intrínseca à ‘vaquejada’ não permite a prevalência do valor cultural como resultado desejado pelo sistema de direitos fundamentais”. Entretanto, o desfecho da declaração de inconstitucionalidade da vaqueja foi outro. Os que consideram a atividade como legítima manifestação cultural protestaram e viram ser aprovada a Emenda Constitucional nº 96/17, que acrescentou o §7º ao art. 255 da CF/88. A alteração do texto constitucional passa a reconhecer práticas desportivas que utilizam animais e que sejam manifestações culturais como não cruéis. Portanto, atualmente atividades como a vaquejada e o rodeio não podem ser consideradas inconstitucionais de acordo com o disposto no inciso VII do §1º do art. 225 da CF/88 e a decisão do STF ficou sem efeito. 15 § 2º Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei; Trata-se do princípio do poluidor-pagador, que exige do sujeito que gerou o dano ambiental a responsabilidade quanto à todas as consequências que a sua atividade causou. No §2º do art. 225, a Constituição destaca a exploração dos recursos minerais porque essa atividade gera relevantes impactos ao meio ambiente e tem uma expressiva importância econômica e social. § 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados; O dispositivo trata da tríplice responsabilização do poluidor. A Constituição permite que, em decorrência de um único dano ambiental, o seu causador, pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, possa ser responsabilizada penal, administrativa e civilmente de forma simultânea e independente. A responsabilidade civil do ente público por dano ambiental pode ser, inclusive, decorrente da sua omissão ou da sua atuação insuficiente, e, nesses casos, como veremos mais adiante neste capítulo, solidária9. § 4º A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se- 9 Vide questão 1 desse material. 16 á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais10; Com esse dispositivo, a Constituição Federal quis enfatizar a importância ambiental desses ecossistemas, transformando-os em patrimônio nacional. Mas, atenção: a previsão constitucional não transforma esses biomas em bens da União. O que podemos extrair do §4º é que a Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira, por serem patrimônio nacional, não admitem qualquer tipo de internacionalização. As áreas não são bens da União, mas o status de patrimônio nacional garante aos biomas um regime especial de utilização, que deve ser voltado para a preservação dos respectivos atributos naturais e para a manutenção do equilíbrio dos ecossistemas. § 5º São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos Estados, por ações discriminatórias, necessárias à proteção dos ecossistemas naturais; As terras devolutas são aqueles territórios que não pertencem legitimamente a nenhum particular e as, incorporadas no patrimônio público, não são afetadas a qualquer uso. Em regra, são bens públicos dominicais e, por isso, alienáveis. Entretanto, as terras devolutas necessárias à proteção do meio ambiente possuem tratamento jurídico diferenciado pela CF/88: são bens da União e devem ser consideradas como bens públicos de uso especial, pois estão afetados à uma destinação pública específica – a proteção dos ecossistemas naturais e, portanto, bens indisponíveis. § 6º As usinas que operem com reator nuclear deverão ter sua localização definida em lei federal, sem o que não poderão ser instaladas11; Toda a atividade nuclear brasileira está centralizada exclusivamente na competência da União, devendo ser usada para fins pacíficos e mediante aprovação do Congresso Nacional (com exceção dos radioisótopos, cuja produção, comercialização e utilização podem ser autorizadas sob o regime de permissão). 10 Vide questão 2 desse material. 11 Vide questão 2 desse material. 17 § 7º Para fins do disposto na parte final do inciso VII do § 1º deste artigo, não se consideram cruéis as práticas desportivas que utilizem animais, desde que sejam manifestações culturais, conforme o § 1º do art. 215 desta Constituição Federal, registradas como bem de natureza imaterial integrante do patrimônio cultural brasileiro, devendo ser regulamentadas por lei específica que assegure o bem-estar dos animais envolvidos12. Como já demonstrado nos comentários do inciso VII do §1º do art. 225 da CF/88, o legislador constituinte derivado passou a entender que práticas desportivas que utilizem animais, como por exemplo, a vaquejada, são permitidas desde que configurem manifestações culturais registradas como patrimônio público cultural brasileiro de natureza imaterial. Para harmonizar tais práticas com a proteção do meio ambiente prevista no inciso VII do §1º do art. 225 da CF/88, a atividade deve ser regulamentada por lei específica que tenha como fim evitar a crueldade contra os animais usados. 2.4 Ações constitucionais O sistemaprocessual civil que existia na época da promulgação da Constituição de 1988 não era preparado para tutelar direitos transindividuais. Suas características individualistas eram incompatíveis e insuficientes para assegurar direitos difusos como o meio ambiente ecologicamente equilibrado. Para privilegiar o princípio do acesso à justiça, surge em nosso ordenamento jurídico a jurisdição civil coletiva, com o intuito de atender as peculiaridades das ações que tratam de interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos. Para tanto, a Constituição de 1988 estabelece expressamente a Ação Civil Pública e a Ação Popular como instrumentos para garantir a proteção dos direitos transindividuais. Ação Civil Pública: é um instrumento processual que serve para condenar o agente causador de dano ambiental a cessar ato lesivo ao meio ambiente, recuperar as áreas degradadas e/ou pagar reparação pecuniária. A Ação Civil Pública – ACP – está 12 Vide questão 2 desse material. 18 regulamentada pela Lei 7.347/85. Nesta lei, temos um rol taxativo de legitimados a propor a ACP, mas entre eles não encontramos o cidadão. 13 Ação Popular: é o instrumento processual utilizado pelo cidadão para fazer um controle de legalidade e de lesividade de atos, e proteger interesses transindividuais, entre eles, o meio ambiente. É uma forma de exercer a democracia direta e, portanto, o seu titular deve ter capacidade eleitoral ativa. Por isso, a pessoa jurídica não é legitimada a propor Ação Popular (Súmula 265, STF). As ações em destaque serão abordadas de forma aprofundada neste curso em capítulo próprio da tutela processual do meio ambiente. 2.5 Domínio eminente dos bens pelo Estado O Poder Público exerce um domínio eminente sobre todos os bens situados no território brasileiro. Não se trata de um domínio patrimonial, é um poder que decorre da soberania do Estado, que o permite submeter, de forma geral, à sua vontade todos os bens situados em seu território, sejam eles públicos, privados ou não sujeitos ao regime normal de propriedade, como a água. É por esse domínio eminente dos bens pelo Estado que os recursos ambientais podem sofrer intervenções do Poder Público, mesmo que ele não seja o proprietário. 2.5.1 Recursos naturais De acordo com a Política Nacional do Meio Ambiente, prevista na Lei 6.938/81, são recursos ambientais: a atmosfera, as águas interiores, superficiais e subterrâneas, os estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo, os elementos da biosfera, a fauna e a flora. O Estado exerce a função de gestor e assegurador desses recursos ambientais, que são classificados como patrimônio público em sentido amplo, tendo em vista o seu uso coletivo. Quanto à sua destinação, os recursos naturais podem ser classificados como bens públicos de uso comum do povo, de acordo com a divisão de bens públicos do art. 99 do Código Civil. 13 Vide questão 09 e 08 19 Portanto, os bens naturais podem ser utilizados por todos, igualmente, sem necessidade de autorização da Administração Pública; são afetados e indisponíveis. Exemplos: rios e mares. Alguns bens naturais são classificados como bens de uso especial, quando possuem destinação pública específica, como por exemplo, as terras ocupadas por índios. Não podemos confundir o termo “bem de uso comum do povo” usado no caput do art. 225 da CF/88 com a classificação do CC/02. O intuito do legislador constituinte ao usar essa expressão foi de intensificar a ideia de que o meio ambiente ecologicamente equilibrado é um bem transindividual. A doutrina administrativista tem uma percepção diferente. Por ela, é permitido que os bens de uso comum do povo sejam desafetados, o que é impossível de acontecer com os bens naturais, devido à titularidade difusa dada pela Constituição. Ademais, como visto, os bens naturais eventualmente afetados podem ser classificados administrativamente como “bens de uso especial”, mas não perdem a característica de bem de uso comum do povo no sentido dado pela Constituição. Quanto à titularidade, os recursos naturais podem ser classificados em federais, estaduais, distritais ou municipais. Vale lembrar que ao dar a titularidade dos recursos naturais aos entes federados, a Constituição não está dando a propriedade ou o domínio desses bens. A União, os estados, o Distrito Federal e os municípios atuam como gestores responsáveis pela preservação e adequada utilização desses bens. A Constituição enumera os bens da União em seu art. 20, nos seguintes temos: Art. 20. São bens da União: I - os que atualmente lhe pertencem e os que lhe vierem a ser atribuídos; II - as terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras, das fortificações e construções militares, das vias federais de comunicação e à preservação ambiental, definidas em lei; III - os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos de seu domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outros países, ou se estendam a 20 território estrangeiro ou dele provenham, bem como os terrenos marginais e as praias fluviais; IV - as ilhas fluviais e lacustres nas zonas limítrofes com outros países; as praias marítimas; as ilhas oceânicas e as costeiras, excluídas, destas, as áreas referidas no art. 26, II; IV as ilhas fluviais e lacustres nas zonas limítrofes com outros países; as praias marítimas; as ilhas oceânicas e as costeiras, excluídas, destas, as que contenham a sede de Municípios, exceto aquelas áreas afetadas ao serviço público e a unidade ambiental federal, e as referidas no art. 26, II; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 46, de 2005) V - os recursos naturais da plataforma continental e da zona econômica exclusiva; VI - o mar territorial; VII - os terrenos de marinha e seus acrescidos; VIII - os potenciais de energia hidráulica; IX - os recursos minerais, inclusive os do subsolo; X - as cavidades naturais subterrâneas e os sítios arqueológicos e pré-históricos; XI - as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios. § 1º É assegurada, nos termos da lei, à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios a participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais no respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva, ou compensação financeira por essa exploração. § 2º A faixa de até cento e cinquenta quilômetros de largura, ao longo das fronteiras terrestres, designada como faixa de fronteira, é considerada fundamental para defesa do território nacional, e sua ocupação e utilização serão reguladas em lei. Por ser um tema de direito constitucional, vamos tratá-lo de forma objetiva aqui na matéria de direito ambiental, revisando e destacando os pontos que interessam à nossa disciplina, ok? As terras devolutas indispensáveis à preservação ambiental. As terras devolutas são aquelas que não são de propriedade particular e aquelas que, incorporadas ao domínio público, ainda não foram afetadas a qualquer uso. Em geral elas são classificadas como bens públicos dominicais. Em regra, os bens dominicais são disponíveis, 21 entretanto, quando as terras devolutas são indispensáveis para a preservação ambiental, há uma exceção quanto a sua disponibilidade: o art. 225, §5º da própria CF/88 estabelece a indisponibilidade das terras devolutas necessárias à proteção dos ecossistemas naturais. Concluindo, as terras devolutas indispensáveis à preservação ambiental são bens da União, excepcionalmente classificadas como bens públicos de uso especial devido à destinação pública que receberam da Constituição. Os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos de seu domínio,ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outros países, ou se estendam a território estrangeiro ou dele provenham, bem como os terrenos marginais e as praias fluviais. Para classificar os cursos d’água como bens da União, devemos observar a sua extensão e o critério da segurança nacional. Para aferir no caso concreto se o bem é federal, estadual ou distrital, a Agência Nacional de Águas – ANA – definiu 5 critérios na Resolução n. 399/04: 5. CRITÉRIOS TÉCNICOS PARA IDENTIFICAÇÃO DOS CURSOS D’ÁGUA 5.1. Cada curso d’água, desde a sua foz até a sua nascente, será considerado como unidade indivisível, para fins de classificação quanto ao domínio. 5.2. Os sistemas hidrográficos serão estudados, examinando-se as suas correntes de água sempre de jusante para montante e iniciando-se pela identificação do seu curso principal. 5.3. Em cada confluência será considerado curso d’água principal aquele cuja bacia hidrográfica tiver a maior área de drenagem. 5.4. A determinação das áreas de drenagem será feita com base na Cartografia Sistemática Terrestre Básica. 5.5. Os braços de rios, paranás, igarapés e alagados não serão classificados em separado, uma vez que são considerados parte integrante do curso d'água principal. Por esses critérios, os trechos de rios que compõem os cursos principais das bacias hidrográficas que transpassam ou compõem limites estaduais, são bens da União (STJ, informativo 398). 22 As ilhas fluviais e lacustres nas zonas limítrofes com outros países; as praias marítimas; as ilhas oceânicas e as costeiras. Entretanto, própria Constituição estabelece que não são bens de União as áreas que sejam de domínio do estado membro ou que sejam sede de Município (salvo as áreas afetadas ao serviço público e unidade ambiental federal). A Lei 9.985/00, que trata do Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC), estabelece que as ilhas oceânicas e costeiras são ambientalmente relevantes porque se destinam prioritariamente à proteção da natureza. Ainda, define que outra destinação dessas ilhas deve ser precedida de autorização de órgão ambiental competente, tendo em vista que a estabilidade da fauna e da flora desses ambientes insulares é frágil. As praias marítimas são as áreas periodicamente cobertas e descobertas pelas águas, acrescida da faixa de areia/ cascalho/ pedregulhos... até o início da vegetação natural ou, não existindo, até o início de outro ecossistema. Por serem bens de uso comum do povo, as praias marítimas devem ter acesso livre, salvo quando a sua área for de interesse para segurança nacional ou protegida por lei. Os recursos naturais da plataforma continental, da zona econômica exclusiva e o mar territorial. Em 1982 ocorreu a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, na Jamaica. Nessa convenção foram estabelecidos os princípios gerais para a exploração dos recursos naturais do mar e os conceitos de plataforma continental e de zona econômica exclusiva. O Brasil ratificou a Convenção em 1988 e regulamentou o direito do mar com a Lei 8.617/93. O mar territorial brasileiro é um bem da União por ser de interesse para a segurança nacional, pois a soberania do Brasil se estende por ele, por seu espaço aéreo, por seu leito e por seu subsolo. O mar territorial compreende uma faixa de doze milhas marítimas de largura (mais ou menos 22km), medidas a partir da linha de baixa-mar do litoral continental e insular. Lembre-se que a soberania nacional na área de mar territorial e seus respectivos espaços sobrejacentes e subjacentes não é absoluta, como no caso do território interno. Devemos 23 sempre lembrar do direito de passagem inocente para os navios de qualquer outro Estado soberano. Mas o direito de passagem inocente pode ser exercido de qualquer forma? Claro que não! O Estado que possui o mar territorial que é área para a passagem inocente tem o direito de regulamentar essa prática para a segurança da navegação, para a proteção de instalações ou equipamentos, para a proteção do meio ambiente e para prevenir infrações. A Zona Econômica Exclusiva, que vamos chamar apenas de “ZEE”, compreende uma faixa das doze às duzentas milhas marítimas, contadas a partir das linhas de base que servem para medir a largura do mar territorial. A ZEE dá ao país direitos de soberania para fins de exploração, aproveitamento, conservação e gestão dos recursos naturais, vivos ou não, das águas sobrejacentes, do leito do mar e do seu subsolo. Por força da Constituição, os recursos naturais encontrados na ZEE são considerados bens da União, a quem também cabe regulamentar matérias como a investigação científica na ZEE, a proteção e a preservação do mar marítimo, as ilhas artificiais, qualquer instalação ou estrutura. O fato de o Brasil ter soberania para explorar e aproveitar os recursos naturais da ZEE brasileira não retira o direito dos demais Estados ao gozo de liberdades como a navegação e o sobrevoo. Por fim, devemos conceituar a plataforma continental como o leito e o subsolo das áreas submarinas além do mar territorial, em toda a extensão do prolongamento natural do território terrestre ou até uma distância de duzentas milhas marítimas das linhas de base. A União, por força do art. 20, V, da CF/88, tem o direito exclusivo de autorizar e regulamentar perfurações na plataforma continental, mas é importante destacar que é reconhecido a todos os Estados o direito de instalar cabos e dutos na plataforma continental brasileira. Potenciais de energia hidráulica. 24 Os recursos naturais com potencial energético são em regra bens da União, tendo em vista a sua relevância econômica. Mesmo que esteja localizado em curso d’água estadual, a área de potencial de energia hidráulica será sempre bem da União, que tem competência para explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, os serviços e instalações de energia elétrica e o aproveitamento energético dos cursos de água. Recursos minerais, inclusive os do subsolo. O nosso ordenamento jurídico estabelece uma separação jurídica entre a propriedade do solo e a propriedade dos seus recursos minerais. Esses últimos não integram o patrimônio do particular proprietário da superfície. É a União a titular da propriedade mineral para efeitos de exploração econômica e/ou de aproveitamento industrial. Art. 1.230, do Código Civil – A propriedade do solo não abrange as jazidas, minas e demais recursos minerais, os potenciais de energia hidráulica, os monumentos arqueológicos e outros bens referidos por leis especiais. Parágrafo único. O proprietário do solo tem o direito de explorar os recursos minerais de emprego imediato na construção civil, desde que não submetidos a transformação industrial, obedecido o disposto em lei especial. Vale ressaltar que, todavia, o proprietário do solo em que se encontram os recursos minerais da União tem direito à participação nos resultados da lavra. Cavidades naturais subterrâneas e os sítios arqueológicos e pré-históricos. As cavidades naturais subterrâneas são espaços subterrâneos acessíveis pelo ser humano, popularmente conhecidos como caverna, gruta, lapa, toca, abismo, furna ou buraco. Inclui-se no conceito de cavidades naturais subterrâneas o seu ambiente, conteúdo mineral e hídrico, a fauna e a flora e o corpo rochoso, desde que tenham se formado por processos naturais, independentemente das dimensões e tipo de rocha encaixante. Os sítios arqueológicos são locais onde se encontram vestígios de ocupação humana no passado. Ambas as áreas são de interesse público nacional, que constituem o patrimônio cultural brasileiro, o que justifica a titularidade da União. Terras tradicionalmente ocupadas pelos índios. 25 O dispositivo aduz às terras ocupadas permanentemente pelos índios, utilizadas para suas atividades produtivas, imprescindíveisà preservação dos recursos ambientais necessários para o seu bem-estar e necessidades de reprodução e conservação da cultura, segundo os seus usos, costumes e tradições. As terras ocupadas tradicionalmente pelos índios são de titularidade da União, mas são caracterizadas como posse permanente do povo indígena, cabendo a eles o usufruto exclusivo do solo, rios e lagos nelas existentes. Muito importante destacar que o STF entende que a Constituição de 1988 reconheceu os direitos dos índios sobre as terras que tradicionalmente ocupam, e não simplesmente outorgou as eles esse direito. Ou seja, isso quer dizer que o ato de demarcação de terras indígenas tem natureza declaratória e não constitutiva. Trata-se de um direito originário, mais antigo do que qualquer outro, que prepondera mesmo diante de pretensos direitos adquiridos materializados em escrituras públicas ou título de legitimação de posse de pessoa não-índio, que são atos nulos e extintos pela Constituição. Por fim, vale lembrar que as terras indígenas são bens públicos de uso especial, pois têm destinação pública definida (estão afetadas). Isso implica na inalienabilidade, indisponibilidade e na imprescritibilidade desses bens. Quanto aos bens estaduais, a Constituição estabelece um critério nitidamente subsidiário e traça um rol exemplificativo no seu art. 26, os enumerando da seguinte forma: Art. 26. Incluem-se entre os bens dos Estados: 26 I - as águas superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes e em depósito, ressalvadas, neste caso, na forma da lei, as decorrentes de obras da União; II - as áreas, nas ilhas oceânicas e costeiras, que estiverem no seu domínio, excluídas aquelas sob domínio da União, Municípios ou terceiros; III - as ilhas fluviais e lacustres não pertencentes à União; IV - as terras devolutas não compreendidas entre as da União. Para Carvalho Filho, as regras do art. 26 devem ser estendidas ao Distrito Federal, tendo em vista a sua aproximação com os estados membros pela disciplina constitucional. Os municípios foram excluídos da partilha de bens constitucional! Mas isso não significa que eles não tenham titularidade de bens! As ruas, praças, jardins públicos, edifícios públicos municipais e unidades de conservação ambiental municipais são exemplos de bens de titularidade municipal. 😉 2.6 Competências em matéria ambiental A Constituição de 1988 adotou o federalismo cooperativo, estabelecendo uma repartição de competências entre os entes federados em uma relação de coordenação. Na repartição de competências legislativas, a CF/88 usa o critério da predominância de interesse, pelo qual à União cabe legislar sobre matérias de interesse nacional, aos estados cabe legislar sobre matérias de interesse regional e aos municípios cabe legislar sobre matérias de interesse local. A competência ambiental material, por sua vez, atribui aos entes federados o poder de execução da lei, de colocá-la em prática independentemente de provocação, e se subdivide em exclusiva e comum. 2.6.1 Competência legislativa privativa É a competência outorgada pela Constituição (art. 22) à União para legislar sobre determinados assuntos, entre eles: águas, energia, regime de portos, navegação lacustre, fluvial e marítima, jazidas, minas e outros recursos minerais, populações indígenas, sistema de geologia nacional e atividades nucleares de qualquer natureza. 27 Segundo o parágrafo único do art. 22 da CF/88, essas matérias de competência legislativa privativa da União podem ser delegadas para os estados da federação mediante autorização por meio de lei complementar. Ademais, não custa nada lembrar que o fato de a competência legislativa ser privativa da União, não significa que só ela tenha o poder de fiscalizar. Guarde essa informação. 😉 2.6.2 Competência legislativa exclusiva A competência legislativa exclusiva é aquela que, diferentemente da competência privativa, não pode ser delegada a outro ente. Os estados federados possuem sua competência legislativa exclusiva prevista nos §2º e §3º do art. 25 da CF/88. Art. 25. Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem, observados os princípios desta Constituição. (...) § 2º Cabe aos Estados explorar diretamente, ou mediante concessão, os serviços locais de gás canalizado, na forma da lei, vedada a edição de medida provisória para a sua regulamentação. § 3º Os Estados poderão, mediante lei complementar, instituir regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões, constituídas por agrupamentos de municípios limítrofes, para integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum. Quanto aos municípios, apesar de não terem sido expressamente contemplados por competências legislativas exclusivas em matéria ambiental pela Constituição, podemos extrair do art. 30, I da CF/88 que esses entes podem legislar sobre assuntos de interesse local, desde que comprovado o interesse restrito ao âmbito territorial do município. Esse “interesse local” não significa ausência de interesse regional ou nacional. Para detectar se a matéria é de competência do município devemos usar o critério da predominância de interesse. 28 2.6.3 Competência legislativa remanescente De acordo com o art. 25, §1º da Constituição Federal, são reservadas aos Estados as competências que não lhes sejam por ela vedadas. É o que chamamos de competência remanescente ou reservada, que visa preencher eventuais lacunas na repartição de competências entre os entes. Em razão da competência remanescente temos, por exemplo, a competência dos estados para legislar sobre o transporte intermunicipal. 2.6.4 Competência legislativa concorrente A competência legislativa concorrente está prevista no art. 24 da Constituição Federal. Nele são elencadas matérias legislativas que cabem a todos os entes da federação. No contexto ambiental, destaca-se: Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: I - direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e urbanístico; (...) VI - florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição; VII - proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico; VIII - responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico; IX - educação, cultura, ensino e desporto; IX - educação, cultura, ensino, desporto, ciência, tecnologia, pesquisa, desenvolvimento e inovação; (...) No âmbito da legislação concorrente, como todos os entes possuem competência legislativa, é preciso estabelecer algumas regras para evitar conflitos. A mais importante é a prevista no §1º do art. 24 da CF/88, que limita a competência da União a estabelecer normas gerais sobre essas matérias, que devem ser observadas pelos estados, DF e municípios. Normas 29 gerais são aquelas que estabelecem conceitos, princípios e procedimentos básicos para serem observados nas normas dos demais entes. A inércia da União em editar a norma geral faz surgir a competência legislativa supletiva ou plena para os estados e para o DF, como dispõe o §3º do art. 24 da CF/88, que passam a poder editar normas gerais e normas específicas sobre os assuntos concorrentes. Se após exercida a competência legislativa supletiva pelo estado ou pelo DF, a União editar a norma geral, ela irá suspender a eficácia da lei estadual/distrital no que for lhe for contrária. Atenção: a lei geral editada pela União supervenientemente não irá revogar a lei geral supletiva editada pelo estado ou pelo DF! NÃO EXISTE HIERARQUIA ENTRE LEIS DE ENTES FEDERATIVOS DISTINTOS! Inclusive, ambas as leis podem coexistir, desde que a lei editadaa partir da competência legislativa supletiva não contrarie a norma geral editada supervenientemente pela União. E os municípios? Bem, o art. 24 da CF/88 não atribui nenhuma competência legislativa aos municípios, por isso, a doutrina majoritária não considera que eles tenham competência concorrente. Mas o art. 30, I e II da CF/88 afirma que cabe ao município “legislar sobre assuntos de interesse local” e “suplementar a legislação federal e a estadual no que couber”! Isso não é uma competência concorrente implícita??? Não! O inciso I é uma competência exclusiva do município, enquanto o inciso II trata-se do que a doutrina chama de competência legislativa suplementar. A competência legislativa suplementar ou complementar pode ser vista como um desdobramento da competência concorrente, e está prevista no art. 24, §2º da CF/88 da seguinte forma: “a competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência 30 suplementar dos estados”. Portanto, os estados e o DF podem suplementar as normas gerais editadas pela União, claro, sem confrontá-las. Também podemos afirmar que os municípios possuem competência legislativa suplementar com base no art. 30, II da CF/88, desde que a norma trate de interesse local. Com isso, preenchemos eventuais lacunas na divisão constitucional de competências legislativas. 2.6.5 Competência material exclusiva O art. 21 da CF/88 elenca várias competências materiais exclusivas da União. O critério utilizado pelo constituinte para definir quais assuntos seriam incluídos nesse rol foi o interesse geral. Entre esses assuntos destacamos, em matéria ambiental: Art. 21. Compete à União: (...) IX - elaborar e executar planos nacionais e regionais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social; (...) XII - explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão: (...) b) os serviços e instalações de energia elétrica e o aproveitamento energético dos cursos de água, em articulação com os Estados onde se situam os potenciais hidroenergéticos; (...) XIX - instituir sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos e definir critérios de outorga de direitos de seu uso; XX - instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico e transportes urbanos; (...) XXIII - explorar os serviços e instalações nucleares de qualquer natureza e exercer monopólio estatal sobre a pesquisa, a lavra, o enriquecimento e reprocessamento, a 31 industrialização e o comércio de minérios nucleares e seus derivados, atendidos os seguintes princípios e condições: a) toda atividade nuclear em território nacional somente será admitida para fins pacíficos e mediante aprovação do Congresso Nacional; b) sob regime de permissão, são autorizadas a comercialização e a utilização de radioisótopos para a pesquisa e usos médicos, agrícolas e industriais; c) sob regime de permissão, são autorizadas a produção, comercialização e utilização de radioisótopos de meia-vida igual ou inferior a duas horas; d) a responsabilidade civil por danos nucleares independe da existência de culpa; (...) XXV - estabelecer as áreas e as condições para o exercício da atividade de garimpagem, em forma associativa. Notou alguma coisa no inciso XII acima citado? Observe que ele autoriza a exploração dos serviços e instalações de energia elétrica e o aproveitamento energético dos cursos de água diretamente pela União ou mediante autorização, concessão ou permissão. Trata-se, portanto, de uma possibilidade de delegação do exercício dessa competência. Ok, mas e daí? Daí que esse inciso especificamente deixa de ser classificado como uma competência material exclusiva e passa a ser considerado uma competência material privativa da União que, como vimos, são aquelas matérias que podem ser delegadas. 32 2.6.6 Competência material comum Segundo o art. 23 da CF/88, algumas matérias são de competência de todos os entes federativos conjuntamente, ao mesmo tempo. No âmbito do direito ambiental, a competência comum basicamente visa a proteção ambiental e o exercício do poder de polícia em cooperação. Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: I - zelar pela guarda da Constituição, das leis e das instituições democráticas e conservar o patrimônio público; (...) III - proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos; V - proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação, à ciência, à tecnologia, à pesquisa e à inovação; VI - proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas; VII - preservar as florestas, a fauna e a flora; VIII - fomentar a produção agropecuária e organizar o abastecimento alimentar; IX - promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico; X - combater as causas da pobreza e os fatores de marginalização, promovendo a integração social dos setores desfavorecidos; XI - registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões de direitos de pesquisa e exploração de recursos hídricos e minerais em seus territórios; (...) Parágrafo único. Leis complementares fixarão normas para a cooperação entre a União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional. 33 Para regulamentar esse dispositivo, foi editada a Lei Complementar 140/11, que será aprofundada adiante, com o intuito de estabelecer uma gestão descentralizada das questões ambientais, harmonizar políticas públicas e ações administrativas entre as esferas de governo. 34 3. Responsabilidade Ambiental Como vimos, o art. 225, §3º da CF/88 estabelece que “as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”. Temos a previsão constitucional da tríplice responsabilização, que engloba o âmbito penal, administrativo e civil. Portanto, o poluidor – pessoa natural ou jurídica, de direito público ou privado, responsável direta ou indiretamente pela atividade que causou o dano ambiental – pode ser responsabilizado nas três esferas de forma independente. No presente capítulo abordaremos a responsabilidade civil e administrativa, deixando a responsabilidade penal por dano ao meio ambiente para um capítulo específico. 3.1 Responsabilidade civil Responsabilidade civil é um dever jurídico sucessivo de reparar, recuperar, compensar, ou simplesmente pagar por prejuízo decorrente da violação de um dever jurídico originário. A responsabilização visa restabelecer o status quo ante entre o agente e a vítima. Quando o dever de indenizar decorre de um contrato inadimplido, temos a responsabilidade contratual. Mas se o dever de indenizar surge a partir de uma lesão a um direito subjetivo da vítima, sem que preexista relação jurídica entre ela e o agente, temos a responsabilidade extracontratual (que decorre de uma lei ou de um preceito geral de direito). A responsabilidade civil extracontratual pode ser subjetiva ou objetiva. Por subjetiva entendemos aquela responsabilidade fundada na culpa do agente, seus pressupostos, previstos nos artigos 927 e 186 do Código Civil, são: ato ilícito (com dolo ou culpa) + dano + nexo causal. Quando falamos em culpa no direito civil temos que entendê-la como qualquer comportamento contrário ao direito, intencional ou não. Quanto ao dano, trata-se de um elemento essencial à responsabilização civil, pois sem ele não há o que indenizar, certo? Assim, 35 mesmo se a conduta do agente for dolosa ou culposa, se ela não gerar dano à vítima, nãofalamos em responsabilidade civil. Por fim, o nexo causal é a relação entre a conduta do agente e o dano causado à vítima. É uma relação de causa e efeito. Para a responsabilização de alguém, é preciso provar que ele deu causa ao resultado, não basta que o agente tenha praticado conduta ilícita e que a vítima tenha sofrido um dano, é preciso estabelecer uma relação casuística entre os dois. Já que estamos tratando do nexo causal, é importante lembrar a você que existem situações excludentes do nexo causal: caso fortuito ou caso de força maior; fato exclusivo da vítima; e fato de terceiro. A responsabilidade objetiva, por sua vez, exige apenas dois pressupostos: a dano e nexo causal. A teoria objetiva baseia-se no risco da atividade e, por isso, não se interessa com o elemento subjetivo (dolo ou culpa). Portanto, quando dizemos que a responsabilidade é objetiva, significa que, independente de dolo ou culpa, se houve dano e se esse dano decorreu de conduta lícita ou ilícita do agente (nexo causal), ele deve ser responsabilizado pelos prejuízos causados. A regra civil é que a responsabilidade seja subjetiva, sendo a teoria objetiva aplicada apenas em casos excepcionais, como é o caso da responsabilização por danos ambientais. Art. 14, §1º, da Lei 6.938/81 – Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente.14 3.1.1 Responsabilidade civil por dano ambiental O foco na responsabilidade civil ambiental é a integral reparação do meio ambiente degradado por meio de uma tutela específica. Por isso, em regra, cabe ao poluidor a obrigação de recuperar o meio ambiente, restaurando o seu status quo ante. Subsidiariamente, apenas se 14 Vide questão 7 36 o dano for irreparável, é que caberá ao poluidor indenizar os danos causados em dinheiro, revertido à preservação ambiental. Ademais, a recuperação do meio ambiente pode ser conjugada com a indenização pecuniária, pois o princípio da reparação integral visa a mais completa restauração do equilíbrio ambiental. Nesse sentido, se, em caso de dano, o poluidor reparar de forma completa e imediata o meio ambiente, não há o que se falar em indenização. Vale lembrar que a responsabilização do poluidor na esfera civil não visa puni-lo, mas apenas reparar o dano causado. Nesse sentido, o STJ afirma que “é inadequado pretender conferir à reparação civil dos danos ambientais caráter punitivo imediato, pois a punição é função que incumbe ao direito penal e administrativo” (REsp. 1.345.536/SE). Como vimos, a responsabilidade ambiental segue a teoria objetiva. Com isso, não é preciso comprovar a vontade de causar o dano (dolo) ou a negligência, imprudência ou imperícia (culpa) do poluidor. Basta que se constate do efetivo dano ambiental e a relação entre ele e a conduta do agente (nexo causal) para que exista a responsabilização. No âmbito da responsabilidade civil ambiental, não cabe ao autor da ação comprovar o dano e o nexo causal entre ele e a atividade do acusado. De acordo com o enunciado da Súmula 618 do STJ, “a inversão do ônus da prova aplica-se às ações de degradação ambiental”. Esse entendimento se baseia no in dubio pro nature, pois o aplicador do direito deve sempre interpretar os fatos em favor da tutela do meio ambiente ecologicamente equilibrado. A partir desse raciocínio, nas ações de responsabilização ambiental, transfere-se ao suposto infrator a atribuição de demonstrar que não praticou a atividade lesiva a ele imputada, ou que a atividade que ele praticou não é capaz de gerar dano ambiental. 37 Quanto às excludentes do nexo causal em sede de responsabilidade civil objetiva ambiental, a doutrina diverge. Alguns entendem que a teoria objetiva, baseada na teoria do risco, deve admitir a prova de excludente de responsabilidade. Para eles, a pessoa que assume o risco de uma atividade deve assumir os seus ônus, exceto os absolutamente imprevisíveis. Estes excluem o nexo causal e, consequentemente, a responsabilidade civil. Entretanto, o entendimento majoritário da doutrina, que é adotado pela jurisprudência, baseia-se na teoria do risco integral. Essa teoria criou uma espécie de responsabilidade civil objetiva agravada, que não admite as excludentes do nexo causal. Para os que defendem esse posicionamento, o dever de indenizar surge apenas com o dano, ainda que ele seja causado por culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro, caso fortuito ou de força maior, pois o simples fato de exercer a atividade potencialmente poluidora produz o dever de reparar seus eventuais danos. Portanto, para a teoria do risco integral, só se exclui a responsabilidade civil caso seja comprovado que o dano não existiu ou que o dano não está relacionado com a atividade que o agente exerce. É uma teoria extremamente rigorosa e, por isso, é adotada no Brasil apenas nos casos de dano ambiental e de dano nuclear. Além de ser objetiva e pautada na teoria do risco integral, a responsabilidade civil por dano ambiental também é solidária. A solidariedade é um artifício técnico usado para facilitar o cumprimento de uma obrigação, que poderá ser reclamada em sua totalidade por qualquer dos credores a qualquer dos devedores. 38 Para fins de solidariedade ambiental, equiparam-se como poluidores quem faz, quem não faz quando deveria fazer, quem faz mal feito, quem não se importa que façam, quem financia para que façam e quem se beneficia quando outros fazem. Assim, existindo mais de um agente poluidor, direto ou indireto, a responsabilidade solidária faz com que todos eles devam responder através de seus bens por todo os prejuízos causados pelo dano, independentemente do seu grau de culpabilidade. Portanto, a formação de litisconsórcio não é obrigatória, os responsáveis solidários podem ser acionados conjuntamente ou de forma individual. Como vimos, a responsabilidade objetiva ambiental requer apenas a comprovação do dano e do nexo causal entre ele e a atividade do poluidor. Entretanto, o STJ excetua essa regra, dispensando a comprovação do nexo causal, no caso de responsabilidade por degradação ambiental de imóvel rural. A preservação de área ambientalmente protegida é uma obrigação de natureza real, que adere ao título e se transfere ao sucessor. Visto isso, a responsabilidade de recuperar o meio ambiente degradado é do atual proprietário do imóvel rural, mesmo que ele não tenha causado o dano (mesmo sem nexo causal). Súmula 623 do STJ: As obrigações ambientais possuem natureza propter rem, sendo admissível cobrá-las do proprietário ou possuidor atual e/ou dos anteriores, à escolha do credor. 39 Não custa nada reforçar, tendo em vista a importância do tema, que o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é imprescritível. Diante do conflito entre a segurança jurídica do poluidor com a prescrição e a melhor tutela do bem jurídico ambiental, que é coletivo, indisponível, fundamental e antecede todos os demais direitos (pois sem ele não há vida), o último prevalece sobre o primeiro e a reparação do dano ambiental é considerada imprescritível. É possível a responsabilidade civil por dano extrapatrimonial em razão da degradação ambiental? É possível que um dano ao meio ambiente, direito difuso, cause dano moral individual? E dano moral coletivo? Todas das respostas são positivas. A degradação do meio ambiente pode causar um dano extrapatrimonial a um indivíduo, a alguns indivíduos ou à toda coletividade. Por exemplo, um dano ambiental pode causardificuldade ou impossibilitar o exercício de determinada profissão, isso gera dano moral aos respectivos profissionais. Com a crise ambiental e a sociedade de massa em que vivemos, é preciso dar um enfoque mais abrangente à responsabilidade civil. Normalmente a responsabilização extrapatrimonial está relacionada aos direitos de personalidade, vinculados a uma pessoa física e até mesmo jurídica. Entretanto, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, além de ter a sua face individual, apresenta-se como um direito difuso, transindividual. Se o indivíduo pode ser indenizado por dano moral, também deve ser admitido o dano moral da coletividade, caso contrário restaria um dano sem a respectiva obrigação de compensar. 40 Seguindo esse entendimento, o STJ demonstra que admite o dano moral coletivo em matéria ambiental na decisão do REsp. 1.114.839: “a reparação ambiental deve ser feita de forma mais completa possível, de modo que a condenação a recuperar a área lesionada não exclui o dever de indenizar, sobretudo pelo dano que permanece entre a sua ocorrência e o pleno restabelecimento do meio ambiente afetado (dano interino ou intermediário), bem como pelo dano moral coletivo e pelo dano residual (degradação ambiental que subsiste, não obstante todos os esforços de restauração)”. Ademais, na decisão do REsp. 1.367.923, o STJ deixou claro que existe um paradoxo na admissão de dano moral individual sem que fosse possível o mesmo tratamento à coletividade. E ainda, que a degradação do meio ambiente causa dano moral coletivo, mesmo que de forma reflexa. 3.1.2 Responsabilidade civil do Estado por dano ambiental De acordo com o art. 37, §6º da CF/88, “as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”. O Código Civil, nesse contexto, dispõe no seu art. 43 que “as pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis por atos dos seus agentes que nessa qualidade causa a terceiros, ressalvado direito de regresso contra os causadores do dano, se houver, por parte destes, culpa ou dolo”. Com fundamento na teoria do risco administrativo, o Estado tem responsabilidade objetiva pelo dano causado ao meio ambiente por seus agentes, no desempenho de suas funções ou em razão delas. 41 A teoria do risco administrativo não se confunde com a teoria do risco integral. Ambas adotam a responsabilidade objetiva, dispensando a comprovação de dolo ou culpa do agente. Entretanto, pela teoria do risco integral não é possível reconhecer as causas excludentes de nexo causal e, já na teoria do risco administrativo, admite-se que o Estado afaste a sua responsabilidade nos casos de fato exclusivo da vítima, caso exclusivo de terceiro, caso fortuito e força maior. No direito administrativo, aplicamos a teoria do risco administrativo quando estamos diante de um ato comissivo do agente público, mas ela convive perfeitamente com a teoria da culpa do serviço, que prevê a responsabilidade subjetiva do Estado nos casos de danos decorrentes da sua omissão. Na teoria da culpa do serviço é admitida a aplicação da culpa anônima, ou a culpa do serviço. Portanto, não é preciso indicar o sujeito que se omitiu por dolo ou culpa e gerou o dano a terceiro, basta que fique comprovado que o Estado não agiu, ou que agiu de forma insuficiente. No direito ambiental, entretanto, o STJ entende que a responsabilidade do Estado é objetiva, mesmo em dano causado de forma omissiva. O julgado ainda destaca a responsabilidade solidária do Poder Público nos casos em que figura como poluidor por omissão. A responsabilização ambiental do Estado nesses moldes se fundamenta na imposição constitucional do dever de defender e preservar o meio ambiente ecologicamente equilibrado para as presentes e futuras gerações (art. 225 da CF/88). Apesar disso, em razão do regime especial que rege os créditos públicos, a responsabilidade civil ambiental da Administração Pública quando se omite do seu dever constitucional é de execução subsidiária (mas não perde seu caráter de solidária). Ademais, a subsidiariedade da responsabilização estatal se justifica porque a sociedade não deve ser 42 duplamente onerada – com o dano ambiental e com o pagamento respectivo feito com dinheiro público. Em caso de dano ambiental com omissão do Estado, incumbe ao degradador principal recuperar o meio ambiente e/ou indenizar os prejuízos causados. Se eventualmente ele for insolvente, a Administração Pública será responsabilizada como devedora subsidiária e terá direito de regresso contra o responsável principal. Isso quer dizer que o Estado integra o título executivo como um “devedor reserva”, e só é chamado a pagar se o devedor principal não o fizer. 3.2 Responsabilidade administrativa Além da responsabilidade civil, o poluidor pode ser responsabilizado administrativamente pelos danos que causou ao meio ambiente. A Administração Pública deve fiscalizaras atividades, apurar eventuais infrações e impor as respectivas sanções ao degradador no âmbito administrativo, exercendo o seu poder de polícia ambiental. Como se trata de uma competência material comum aos entes federados, essa atividade é atribuída aos órgãos da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, dentro das suas respectivas competências. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO RESPONSABILIDADE OBJETIVA (TEORIA DO RISCO ADM.) RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA (POLUIDOR POR OMISSÃO) EXECUÇÃO SUBSIDIÁRIA 43 3.2.1 Poder de polícia ambiental Através do exercício do poder de polícia, o ente público interfere no interesse privado, limitando direitos individuais, para tutelar interesse público. Para tanto, são usadas normas limitadoras e sancionadoras. O poder de polícia ambiental se fundamenta no art. 225 da CF/88, que determina ser um dever do Poder Público e da coletividade a defesa e a preservação do meio ambiente ecologicamente equilibrado para as presentes e futuras gerações. A atuação do Estado é obrigatória, decorrente da natureza indisponível do meio ambiente. O Poder Público exerce o poder de polícia ambiental através do seu órgão ambiental competente, que deve atuar sempre nos limites da lei, observando o devido processo legal e, quando se deparar com um ato discricionário, agir sem abuso ou desvio de poder. A lei complementar 140/11 dispõe que qualquer pessoa que seja legalmente identificada pode representar infração ambiental ao órgão responsável pelo licenciamento ou autorização ambiental. Já a autoridade ambiental é obrigada a agir quando se deparar com a infração, promovendo a sua apuração imediata, sob pena de corresponsabilidade. 3.2.2 Infrações e sanções ambientais A infração ambiental administrativa é toda ação ou omissão que violar as normas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente. A aplicação das sanções administrativas ambientais independe de manifestação judicial, deve ser determinada e executada pela própria Administração Pública, pois as principais características do poder de polícia são a autoexecutoriedade e a coercibilidade. A responsabilidade administrativa ambiental é subjetiva, ou seja, diferentemente da responsabilidade civil, adotamos aqui a teoria da culpabilidade, avaliando o elemento subjetivo do poluidor (dolo ou culpa) para a sua condenação, além, é claro, do efetivo dano e do nexo causal entre ele e a conduta. Isso se justifica porque a responsabilização administrativa do 44 poluidor visa precipuamente a sua punição, ao contrário da responsabilização civil, que visa a reparação do dano causado. Por esse mesmo fundamento, as infrações ambientais administrativas são tipificadas. Ou
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