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Língua PortuguesaLíngua Portuguesa Língua PortuguesaLíngua Portuguesa 38 Sequências discursivas 118. (Enem-2017) Garcia tinha-se chegado ao cadáver, levantara o lenço e contemplara por alguns instantes as feições defuntas. Depois, como se a morte espiri- tualizasse tudo, inclinou-se e beijou-a na testa. Foi nesse momento que Fortunato chegou à porta. Estacou assom- brado; não podia ser o beijo da amizade, podia ser o epílogo de um livro adúltero [...]. Entretanto, Garcia inclinou-se ainda para beijar outra vez o cadáver, mas então não pôde mais. O beijo rebentou em solu- ços, e os olhos não puderam conter as lágrimas, que vieram em borbotões, lágrimas de amor calado, e irremediável desespero. Eortunato, à porta, onde ficara, saboreou tranquilo essa explosão de dor moral que foi longa, muito longa, deliciosamente longa. (ASSIS, M. A causa secreta. Disponível em: . Acesso em: 9 out. 2015.) No fragmento, o narrador adota um ponto de vista que acom- panha a perspectiva de Fortunato. O que singulariza esse pro- cedimento narrativo é o registro do(a) A) indignação face à suspeita do adultério da esposa. B) tristeza compartilhada pela perda da mulher amada. C) espanto diante da demonstração de afeto de Garcia. D) prazer da personagem em relação ao sofrimento alheio. E) superação do ciúme pela comoção decorrente da morte. 119. (Enem-2017) Doutor dos sentimentos Veja quem é e o que pensa o português António Damásio, um dos maiores nomes da neurociência atual, sempre em busca de desvendar os mistérios do cérebro, das emoções e da consciência Ele é baixo, usa óculos, tem cabelos brancos penteados para trás e costuma vestir terno e gravata. A surpresa vem quando começa a falar. António Damásio não confirma em nada o clichê que se tem de cientista. Preocupado em ser o mais didático pos- sível, tenta, pacientemente, com certa graça e até ironia, sempre que cabível, traduzir para os leigos estudos complexos sobre o cérebro. Português, Damásio é um dos principais expoentes da neurociência atual. Diferentemente de outros neurocientistas, que acham que apenas a ciência tem respostas à compreensão da mente, Damásio considera que muitas ideias não provêm necessaria- mente daí. Para ele, um substrato imprescindível para entender a mente, a consciência, os sentimentos e as emoções advém da vida intuitiva, artística e intelectual. Fora dos meios científicos, o nome de Damásio começou a ser celebrado na década de 1990, quando lançou seu primeiro livro, uma obra que fala de emoção, razão e do cérebro humano. (TREFAUT, M. P. Disponível em: . Acesso em: 2 set. 2014. Adaptado.) Na organização do texto, a sequência que atende à função sociocomunicativa de apresentar objetivamente o cientista António Damásio é a A) descritiva, pois delineia um perfil do professor. B) injuntiva, pois faz um convite à leitura de sua obra. C) argumentativa, pois defende o seu comportamento incomum. D) narrativa, pois são contados fatos relevantes ocorridos em sua vida. E) expositiva, pois traz as impressões da autora a respeito de seu trabalho. 120. (Enem-2016) Galinha cega O dono correu atrás de sua branquinha, agar- rou-a, lhe examinou os olhos. Estavam direitinhos, graças a Deus, e muito pretos. Soltou-a no terreiro e lhe atirou mais milho. A galinha continuou a bicar o chão desorientada. Atirou ainda mais, com paciência, até que ela se fartasse. Mas não conseguiu com o gasto de milho, de que as outras se apro- veitaram, atinar com a origem daquela desorientação. Que é que seria aquilo, meu Deus do céu? Se fosse efeito de uma pedrada na cabeça e se soubesse quem havia mandado a pedra, algum moleque da vizinhança, aí… Nem por sombra imaginou que era a cegueira irremediável que principiava. Também a galinha, coitada, não compreendia nada, ab- solutamente nada daquilo. Por que não vinham mais os dias luminosos em que procurava a sombra das pitangueiras? Sentia ainda o calor do sol, mas tudo quase sempre tão escuro. Quase que já não sabia onde é que estava a luz, onde é que estava a sombra. (GUIMARAENS, J. A. Contos e novelas. Rio de Janeiro: Imago, 1976. Fragmento.) Ao apresentar uma cena em que um menino atira milho às galinhas e observa com atenção uma delas, o narrador explora um recurso que conduz a uma expressividade fundamentada na A) captura de elementos da vida rural, de feições peculiares. B) caracterização de um quintal de sítio, espaço de descobertas. C) confusão intencional da marcação do tempo, centrado na infância. D) apropriação de diferentes pontos de vista, incorporados afetivamente. E) fragmentação do conflito gerador, distendido como apoio à emotividade. 121. (Enem-2016) A partida de trem Marcava seis horas da manhã. Angela Pralini pa- gou o táxi e pegou sua pequena valise. Dona Maria Rita de Alvarenga Chagas Souza Melo desceu do Opala da filha e encaminharam-se para os trilhos. A velha bem-vestida e com joias. Das rugas que a disfarçavam saía a forma pura de um nariz perdido na idade, e de uma boca que outrora devia ter sido cheia e sensível. Mas que importa? Chega-se a um certo ponto – e o que foi não importa. Começa uma nova raça. Uma velha não pode comunicar-se. Recebeu o beijo gelado de sua filha que foi embora antes do trem partir. Ajudara-a antes a subir no vagão. Sem que neste houvesse um centro, ela se colocara do lado. Quando a locomotiva se pôs em movimento, surpreendeu-se um pouco: não esperava que o trem seguisse nessa direção e sentara-se de costas para o caminho. Angela Pralini percebeu-lhe o movimento e perguntou: — A senhora deseja trocar de lugar comigo? Dona Maria Rita se espantou com a delicadeza, disse que não, obrigada, para ela dava no mesmo. Mas parecia ter-se perturbado. Passou a mão sobre o camafeu filigranado de ouro, espetado no peito, passou a mão pelo broche. Seca. Ofendida? Perguntou afinal a Angela Pralini: — É por causa de mim que a senhorita deseja trocar de lugar? (LISPECTOR, C. Onde estivestes de noite. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980. Fragmento.) A descoberta de experiências emocionais com base no cotidia- no é recorrente na obra de Clarice Lispector. No fragmento, o narrador enfatiza o(a) A) comportamento vaidoso de mulheres de condição social privilegiada. B) anulação das diferenças sociais no espaço público de uma estação. PG18EA445SD00_QE_2018_MIOLO.indb 38 26/02/2018 16:41:36