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Educação Ambiental e Cidadania www.iesde.com.br Educação Ambiental e Cidadania Nathieli K. Takemori Silva Sandro Menezes Silva Educação Ambiental e Cidadania Autores Nathieli K. Takemori Silva Sandro Menezes Silva 2010 Sumário A questão ambiental no planeta Terra .................................................................................... 7 Recursos hídricos e cidadania I ............................................................................................15 Quantidade de água no planeta ................................................................................................................16 Usos múltiplos da água ............................................................................................................................18 As principais causas da contaminação da água .......................................................................................22 A eutrofização ..........................................................................................................................................22 As bacias hidrográficas ............................................................................................................................23 Conclusão ................................................................................................................................................24 Recursos hídricos e cidadania II ..........................................................................................27 Lei de Recursos Hídricos .........................................................................................................................27 Princípio do poluidor-pagador .................................................................................................................29 Tecnologias para o uso da água ...............................................................................................................30 Importância da Educação Ambiental no uso dos recursos hídricos .........................................................31 Conclusão.................................................................................................................................................31 Resíduos sólidos e cidadania................................................................................................35 Tipos de resíduos sólidos .........................................................................................................................36 Formas de disposição final dos resíduos sólidos .....................................................................................37 O lixo que machuca .................................................................................................................................41 Resíduos sólidos e cidadania II ............................................................................................47 A coleta seletiva .......................................................................................................................................48 Reciclagem...............................................................................................................................................51 Perspectivas futuras .................................................................................................................................54 Conclusão.................................................................................................................................................56 O uso do solo .............................................................................................................................59 Tipos de solos ..........................................................................................................................................60 Os ciclos biogeoquímicos ........................................................................................................................62 A degradação do solo e a qualidade de vida ............................................................................................63 A conservação dos solos e a produção de alimentos ...................................................................................65 O uso sustentável do solo.........................................................................................................................68 Efeito estufa....................................................................................................................................77 A atmosfera ..............................................................................................................................................77 Causas do efeito estufa ..................................................................................................................................79 Consequências ...............................................................................................................................................82 Medidas mitigadoras ................................................................................................................................83 A camada de ozônio ..................................................................................................................89 Radiação solar ..........................................................................................................................................89 O ozônio e sua função escudo de radiação ultravioleta ...........................................................................90 A destruição da camada de ozônio ...........................................................................................................90 A causa da destruição ...............................................................................................................................91 As consequências da destruição da camada de ozônio ............................................................................92 Medidas mitigadoras e Educação Ambiental ...........................................................................................94 A hipótese Gaia ....................................................................................................................97 A origem da hipótese Gaia .......................................................................................................................97 As evidências da hipótese ........................................................................................................................98 Ações humanas e a hipótese Gaia ............................................................................................................100 Perspectivas futuras .................................................................................................................................100 Matrizes energéticas .............................................................................................................103 Petróleo ....................................................................................................................................................104 Usinas hidrelétricas ..................................................................................................................................105 Biomassa ..................................................................................................................................................106 Energia solar fotovoltaica ........................................................................................................................107 Energia eólica ..........................................................................................................................................108 Energia nuclear ........................................................................................................................................108Uso racional das matrizes energéticas.............................................................................................................. 110 Perspectivas futuras .................................................................................................................................111 Avaliação de impactos ambientais .......................................................................................117 Impactos ambientais e licenciamento ambiental .....................................................................................119 Características do estudo de impacto ambiental (EIA) ............................................................................121 O relatório de impacto ambiental – RIMA ..............................................................................................123 A Carta da Terra ...................................................................................................................141 Princípios .................................................................................................................................................142 Uma nova ética ambiental através da Ecopedagogia ...........................................................149 Ecopedagogia ...........................................................................................................................................149 Ecopedagogia e a sociedade ....................................................................................................................149 Ecopedagogia: uma nova proposta ..........................................................................................................150 Desafios para a Ecopedagogia .................................................................................................................153 Antropocentrismo e uso dos recursos naturais .....................................................................159 A evolução do homem .............................................................................................................................160 A mudança de pensamento ......................................................................................................................161 Referências ...........................................................................................................................165 Anotações .............................................................................................................................171 Apresentação D esde que o homem surgiu no planeta, utiliza recursos da natureza para suprir suas neces-sidades básicas, relacionadas principalmente à alimentação, abrigo e obtenção de energia. Certamente, vem daí essa postura consumista em relação aos recursos naturais, que durante vários anos foram vistos como “infinitos”. O desenvolvimento social e cultural da espécie humana, até chegarmos nas características atuais, foi bastante rápido. Se a idade do planeta fosse condensada em apenas um ano, a espécie humana teria surgido aproximadamente às 23 horas e 45 minutos, do dia 31 de dezembro, ou seja, nossa existência é muita curta quando comparada a outras espécies com as quais dividimos a Terra atualmente. O antropocentrismo coloca o homem no centro do universo, postulando que tudo o que existe foi concebido e desenvolvido para a satisfação humana. Essa ideia de que tudo nos pertence tem sido a principal justificativa para essa “dominação” dos recursos pelo homem, prática usual há muito tempo. Ainda hoje essa corrente filosófica tem forte influência nas decisões do homem em relação ao uso dos recursos naturais. Porém, várias pessoas já passaram a considerar com maior atenção o pensamento biocêntrico, valorizando a natureza pelas suas características intrínsecas e não somente pela sua utili- dade prática, partindo do pressuposto de que todas as espécies têm direito à vida, independentemente do seu grau de complexidade. A inclusão da Educação Ambiental nos programas formais de ensino-aprendizagem é funda- mental, mas não pode ser a única iniciativa para mudar essa mentalidade. Ações diretas de mobili- zação e conscientização, além da difusão do pensamento biocêntrico, desde a educação infantil até à idade adulta, assim como a atualização de pais e professores sobre esse tema, também devem ser consideradas quando se planeja um programa de Educação Ambiental. Este livro traz várias informações pertinentes sobre esse assunto, com a intenção de servir como um apoio para os educadores que irão atuar na área. Inicia-se o curso apresentando a postura do homem em relação à natureza desde os tempos remotos até os dias de hoje, mostrando que tais rela- ções vêm sendo cada vez mais pautadas na ideia de recursos infinitos, postura que fica mais evidente quando se explora o tema recursos hídricos. Nesse tema, são enfocadas as principais características da água, os problemas referentes ao mau uso desse patrimônio e o que está sendo feito para minimizar os impactos decorrentes da ação humana sobre esse recurso. A questão dos resíduos sólidos, um dos maiores problemas na maioria das cidades brasileiras, é abordada neste livro de maneira a trazer informações sobre ações e posturas que os cidadãos podem ter para colaborar na minimização dos seus impactos sobre a natureza. Outro tema abordado é o solo, sua origem e principais características, a maneira como é utilizado e as implicações deste na manu- tenção da qualidade ambiental. Passa-se então ao tema atmosfera, enfocando o aquecimento global provocado pelo efeito estufa e a diminuição da camada de ozônio. Esses temas estão relacionados não só nas suas respectivas cau- sas, como também nas ações que devem ser tomadas para minimizar, e, quem sabe, frear os processos que ocasionam os efeitos nocivos. O tema matrizes energéticas é apresentado a fim de mostrar as várias formas de geração de energia, com ênfase principalmente nos efeitos positivos e negativos de cada forma, enfatizando a principal fonte de energia da atualidade, o petróleo, em contraposição aos efeitos benéficos das fontes energéticas renováveis, principalmente as menos poluentes. Também é apresentada a hipótese Gaia, que considera o planeta um superorganismo capaz de se autorregular. A hipótese é mostrada e explicada para que o leitor saiba que, apesar de amplamente conhecida, existem outras formas de pensamento em relação a essa questão, algumas inclusive con- frontantes com esta. A hipótese Gaia relaciona-se com o que se chamou de Carta da Terra, que, por sua vez, constitui o fundamento básico da Ecopedagogia, todas estas com forte influência do pensa- mento antropocêntrico, tema que encerra o conteúdo do livro. O objetivo principal do curso é fazer com que o próprio leitor reflita e avalie sua postura como cidadão frente aos principais temas ambientais contemporâneos, para que depois atue como um edu- cador mais consciente do seu papel transformador; afinal de contas, como podemos ensinar alguma coisa na qual não acreditamos? Como ensinar crianças e adultos a serem responsáveis pelo ambiente se nós, que temos essa responsabilidade, não nos sentimos assim e não agimos assim? Boa leitura e uma ótima autoavaliação! Nathieli Keila Takemori Silva Sandro Menezes Silva A questão ambiental no planeta Terra Nathieli K. Takemori Silva* Sandro Menezes Silva** O homem, desde as espécies ancestrais relacionadas, sempre dependeu de recursos naturais1 para sua sobrevivência, buscando na natureza, como todas as demais espécies animais, seus meios de alimentação, abrigo, proteção contra o frio, entre outras necessidades básicas. Consequentemente, sempre provocou um impacto sobre a natureza e, para ilustrar esses impactos, existem vários exemplos na história dos povos antigos, os quais foram responsá- veis pela exploração excessiva de algum recurso natural, visto pelaabordagem antropocentrista de questão ambiental. Os Anasazi, que viviam no deserto do Novo México, construíram os pue- blos, edificações que abrigavam as pessoas e que chegavam a quase 1 hectare de extensão, ocupando milhares de troncos de árvores retiradas da própria região da construção. Mas não era um deserto? Existem registros de que na ocasião em que os pueblos foram construídos, eram cercados não por um deserto nu, mas por uma floresta de árvores decíduas e pinheiros. Is to ck P ho to . Um outro exemplo são os Maori, que chegaram à Nova Zelândia há quase 1 000 anos e, num período relativamente curto, foram os principais responsáveis pela extinção do moa, uma espécie de ave não voadora que chegava a atingir 3 metros de altura e pesar mais de 200 quilos. Registros arqueológicos mostram restos de verdadeiros banquetes de churrascos de moa realizados pelos Maoris. O Bacharel e Licenciada em Ciências Biológicas pela Universidade Fe- deral do Paraná (UFPR), com Mestrado em Botâ- nica pela mesma univer- s idade. Licenciado em Ci- ências Biológicas pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), com Mestrado e Doutora- do em Biologia Vegetal pela Universidade Esta- dual de Campinas. 1 Recursos naturais. a) De-nominação que se dá à totalidade das riquezas mate- riais que se encontram em es- tado natural, como florestas e reservas minerais. b) São os mais variados meios de subsistência que as pessoas obtêm diretamente na nature- za. c) O patrimônio nacional nas suas várias partes, tanto os recursos não renováveis, como jazidas minerais, e os renováveis, como florestas e meios de produção. d) Fon- tes de riquezas materiais que existem em estado natural; tais como florestas, reservas minerais etc.; a exploração ilimitada dos recursos natu- rais pode levá-la à exaustão ou à extinção. e) Recursos ambientais obtidos direta- mente da natureza, podendo classificar-se em renováveis e inexauríveis ou não reno- váveis; renováveis quando, uma vez aproveitados em um determinado lugar e por um dado período, são suscetí- veis de continuar a ser apro- veitados nesse mesmo lugar, ao cabo de um período de tempo relativamente curto; exauríveis quando qualquer exploração traz consigo, ine- vitavelmente, sua irreversível diminuição. A questão ambiental no planeta Terra 8 principal predador do moa era a águia-gigante, espécie maior do que a maior ave relacionada atualmente vivente – a águia-real ou harpia – foi extinta na mesma época, muito provavelmente porque ficou sem seu principal item alimentar com a extinção do moa. H ei nr ic h H ar de r. A economia e a Terra (BROWN, 2003) Nos últimos séculos da civilização maia, uma nova sociedade evoluiu na Ilha de Páscoa, uma área com cerca de 166 quilômetros quadrados no Pacífico Sul, aproximadamente 3 200 quilômetros a oeste da América do Sul e 2 200 quilômetros da Ilha Pitcairn, a região habitada mais próxima. Assentada em torno de 400 d.C., essa civilização prosperou numa ilha vulcânica com solos ricos e vegetação viçosa, com árvores de 25 metros de altura e troncos de 2 metros de diâmetro. Registros arqueológicos dão conta que os ilhéus se ali- mentavam principalmente de frutos do mar, particularmente golfinhos – um mamífero que só podia ser capturado com arpões lançados de grandes canoas oceânicas, uma vez que não apareciam localmente em grande número. A sociedade da Ilha de Páscoa prosperou durante vários séculos, atingin- do uma população estimada em 20 mil. À medida que seus números cresciam, a derrubada de árvores superava a recuperação sustentada das florestas. Final- mente, desapareceram as grandes árvores necessárias para a construção das grandes e resistentes canoas oceânicas, privando os ilhéus do acesso aos gol- finhos e reduzindo, dessa forma, o suprimento alimentar da ilha. Os registros arqueológicos mostram que, a certa altura, ossadas humanas se misturaram às ossadas dos golfinhos, sugerindo uma sociedade desesperada que recorreu ao canibalismo. Hoje, a ilha é habitada por cerca de 2 000 pessoas. A questão ambiental no planeta Terra 9 Existem várias pesquisas e trabalhos mostrando que o impacto que a espé- cie humana provoca sobre os recursos naturais é proporcional ao seu grau de apro- priação tecnológica, e às necessidades geradas pelos padrões sociais constituídos em centenas de anos de história. Um marco importante nessa tendência foi a Revolução Industrial, ocorrida no final do século XVIII, a partir da qual houve um grande aumento na utilização dos re- cursos. Na medida em que os núcleos populacionais adensaram-se e se concentraram nas regiões que passaram a dominar as tecnologias disponíveis, a crescente necessida- de de matéria-prima para abastecer esses núcleos em crescimento foi um importante fator de degradação ambiental. As colônias dos países europeus situadas na Ásia, África e Américas serviram em grande parte para suprir essas necessidades, assim como para firmar a supremacia daqueles que detinham a tecnologia em detrimento de outros, que ainda dependiam de recursos naturais de forma mais direta. Esse modelo de crescimento foi chamado de modelo linear de desenvolvi- mento, do qual fazem parte o lucro imediato, o uso excessivo de matéria-prima, a produção de grande quantidade de descartes e resíduos do processo produtivo. As principais consequências do aumento da demanda por recursos naturais, decorrente do modelo de desenvolvimento linear, são: redução da biodiversidade; aumento de doenças tropicais; urbanização de cidades, principalmente na Ásia, África e América do Sul; grande uso de recursos naturais, com consequente escassez localizada de muitos destes; alta produção de resíduos com baixo nível de reciclagem. Com o desenvolvimento das tecnologias, o homem também adquiriu conhe- cimentos sobre os acontecimentos naturais no planeta, podendo hoje prever mu- danças climáticas, terremotos, maremotos e outros fenômenos naturais. Foi dessa maneira, também, que se descobriu os efeitos do modelo linear de desenvolvimen- to, por exemplo, o aquecimento global e a destruição da camada de ozônio. “Esta é a nossa diferença crucial em relação aos Maoris: eles não sabiam ler e escrever. Nós sabemos, e entendemos as consequências do que se passou, e fazemos cálculos e projeções para o futuro. Nós, como espécie, não temos a desculpa da ignorância para repetir os mesmos erros.” Fernando Fernandez A realidade é que não estamos começando a perder a natureza agora que descobrimos o efeito estufa, já perdemos boa parte dela antes mesmo de conhecê- -lo, sendo que a situação de nossos ecossistemas naturais é bastante trágica e não é mostrada de forma verdadeira por dados estatísticos. Uma coisa é certa! Crescimento populacional desenfreado e desenvolvimento econômico contínuo são situações incompatíveis com a qualidade de vida humana e a conservação da natureza. O crescimento populacional é um grande multiplicador de problemas A questão ambiental no planeta Terra 10 ambientais, pois gera desmatamento para os vários usos do solo, aumenta a pres- são de caça, o tráfico de animais e o extrativismo, aumenta a poluição, provoca mudanças climáticas, estimula atividades ambientalmente depredatórias e gera a degradação da qualidade de vida em geral. Pensando nisso, muitos de nós já começamos a pensar no futuro e em for- mas alternativas para diminuir os impactos que estamos causando no ambiente. As atitudes que foram tomadas até agora continuam sendo necessárias, porém são insuficientes. Ainda é preciso mais! A conservação deve ser ensinada em todos os lugares – escola, casa, tra- balho. As pessoas aprendem quando observam outros fazendo, assim como as crianças. Reeducar uma sociedade que cresceu depredando o ambienteonde vive é uma tarefa difícil, mas não impossível. É importante lembrar que, com uma população cada vez mais numerosa, mudar o mundo sozinho fica cada vez mais difícil. Obviamente ninguém está pensando nisso, mas se cada um fizer sua parte na construção de um mundo mais justo, ficará bem mais fácil. “Não há ato ecologicamente neutro; todos nós tornamos o mundo cada dia um pouquinho melhor ou um pouquinho pior com nossas ações.” Fernando Fernandez Uma nova maneira de pensar precisa ser desenvolvida. Livrar-se da ilusão de que os recursos são infinitos e de que o planeta consegue curar-se sozinho é o primeiro passo para a mudança de pensamento. O papel da Educação Ambiental precisa ser desempenhado desde a educa- ção infantil, sendo a postura ambientalmente correta dos educadores e da própria instituição de ensino imprescindível na educação das crianças. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação coloca a Educação Ambiental como tema transversal, para que ela possa ser abordada em todas as disciplinas e não ape- nas em ciências. É importante ressaltar que Conservação da Natureza é diferente de Cuidados com a Natureza, pois nem tudo o que é feito em favor do ambiente contribui efetivamente para conservar a natureza. Um exemplo disso é promover a limpeza da sala de aula, fazendo com que os alunos ajudem a mantê-la limpa e organizada. Isso desenvolve a percepção dos bens comuns, ou seja, que cada um é responsável pelo ambiente onde vive. No entanto, a postura de não produzir resí- duos sólidos é mais efetiva na conservação da natureza. Outra percepção a ser de- senvolvida é a de que os seres vivos não devem ser conservados apenas porque eles são úteis aos seres humanos, e sim por terem direito à vida tanto quanto nós temos. As “aulas” de Educação Ambiental precisam ser claras e objetivas, com o foco na informação e no desenvolvimento crítico dos consumidores. A questão ambiental no planeta Terra 11 “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as pre- sentes e futuras gerações.” Constituição Federal, artigo 225 Hoje, o que está em voga é o chamado mercado verde, no qual os con- sumidores optam por produtos que degradem menos o ambiente. Papel reci- clado, geladeiras e sprays sem CFC (clorofluorcarbono), produtos orgânicos, madeira certificada e uso de energia solar são alguns dos exemplos dessa área em plena expansão, porém ainda pouco explorada no Brasil. Encontra-se no mercado, também, tecidos produzidos a partir de PET (politereftalato de etileno) re- ciclado, plásticos biodegradáveis, tintas à base de silicatos de potássio, entre outros. Um fato importante que marca a maneira como os governos vêm tratando o ambiente aconteceu no final do século XX, quando 179 países passaram a discutir as questões ambientais do planeta, dando origem à Agenda 21. (Ver texto complementar.) “A Agenda 21 reúne o conjunto mais amplo de premissas e recomen- dações sobre como as nações devem agir para alterar seu vetor de desenvol- vimento em favor de modelos sustentáveis e a iniciarem seus programas de sustentabilidade.” Marina Silva, Ministra do Meio Ambiente, do Governo de Luiz Inácio Lula da Silva A situação ambiental pela qual passa atualmente o planeta não tem anteceden- tes na história geológica mais recente. A degradação dos ambientes naturais, a fragmentação de habitats, a sobre-exploração de algumas espécies, a poluição e a contaminação biológica são as causas mais importantes da perda de biodiversida- de. As desigualdades sociais contribuem significativamente nesse quadro, se con- siderarmos que grande parte da diversidade biológica do planeta encontra-se nos países mais pobres. Dessa forma, é necessário primeiramente acabar com essas desigualdades, o que só será possível através de mudanças culturais, econômicas, políticas e sociais. A cultura do “ter e possuir” já levou os Estados Unidos ao topo da lista dos países que mais poluem o ambiente. Como escreveu a jornalista Liana John (2004), o homem não precisa deixar a cidade, nem regredir para um tempo sem conforto ou tec- nologia para voltar a fazer parte da natureza. Ele precisa repensar suas ações, considerar as consequências de cada uma delas sobre o ambiente e os outros seres vivos. E usar o conhecimento em benefício do bem comum. A preservação é dever de todos A questão ambiental no planeta Terra 12 O que é Agenda 21 (BRASIL, 2004) A Agenda 21 é um plano de ação para ser adotado global, nacional e localmente, por organi- zações do sistema das Nações Unidas, governos e pela sociedade civil, em todas as áreas em que a ação humana impacta o meio ambiente. Constitui-se na mais abrangente tentativa já realizada de orientar para um novo padrão de desenvolvimento para o século XXI, cujo alicerce é a sinergia da sustentabilidade ambiental, social e econômica, perpassando em todas as suas ações propostas. Contendo 40 capítulos, a Agenda 21 Global foi construída de forma consensuada, com a con- tribuição de governos e instituições da sociedade civil de 179 países, em um processo que durou dois anos e culminou com a realização da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD), no Rio de Janeiro, em 1992, também conhecida por Rio 92. Além da Agenda 21, resultaram desse mesmo processo quatro outros acordos: a Declaração do Rio, a Declaração de Princípios sobre o Uso das Florestas, a Convenção sobre a Diversidade Biológica e a Convenção sobre Mudanças Climáticas. O programa de implementação da Agenda 21 e os compromissos para com a carta de princípios do Rio foram fortemente reafirmados durante a Cúpula de Joanesburgo, ou Rio + 10, em 2002. A Agenda 21 traduz em ações o conceito de desenvolvimento sustentável. A comunidade internacional concebeu e aprovou a Agenda 21 durante a Rio 92, assumindo, assim, compromissos com a mudança da matriz de desenvolvimento no século XXI. O termo Agenda foi concebido no sentido de intenções, desígnio, desejo de mudanças para um modelo de civilização em que predominasse o equilíbrio ambiental e a justiça social entre as nações. Além do documento em si, a Agenda 21 é um processo de planejamento participativo que resulta na análise da situação atual de um país, estado, município, região, setor e planeja o futuro de forma sustentável. E esse processo deve envolver toda a sociedade na discussão dos principais problemas e na formação de parcerias e compromissos para a sua solução a curto, médio e longo prazos. A análise do cenário atual e o encaminhamento das propostas para o futuro devem ser realizados dentro de uma abordagem integrada e sistêmica das dimensões econômica, social, am- biental e político-institucional da localidade. Em outras palavras, o esforço de planejar o futuro, com base nos princípios da Agenda 21, gera inserção social e oportunidades para que as socieda- des e os governos possam definir prioridades nas políticas públicas. É importante destacar que a Rio 92 foi orientada para o desenvolvimento, e que a Agenda 21 é uma Agenda de Desenvolvimento Sustentável, em que, evidentemente, o meio ambiente é uma consideração de primeira ordem. O enfoque desse processo de planejamento apresentado com o nome de Agenda 21 não é restrito às questões ligadas à preservação e conservação da natureza, mas sim a uma proposta que rompe com o desenvolvimento dominante, em que predomina o eco- nômico, dando lugar à sustentabilidade ampliada, que une a Agenda ambiental e a Agenda social, ao enunciar a indissociabilidade entre os fatores sociais e ambientais e a necessidade de que a degradação do meio ambiente seja enfrentada juntamente com o problema mundial da pobreza. Enfim, a Agenda 21 considera, entre outras, questõesestratégicas ligadas à geração de emprego e A questão ambiental no planeta Terra 13 renda; à diminuição das disparidades regionais e interpessoais de renda; às mudanças nos padrões de produção e consumo; à construção de cidades sustentáveis e à adoção de novos modelos e ins- trumentos de gestão. Em termos das iniciativas, a Agenda 21 não deixa dúvida. Os Governos têm o compromisso e a responsabilidade de deslanchar e facilitar o processo de implementação em todas as escalas. Além dos Governos, a convocação da Agenda 21 visa mobilizar todos os segmentos da sociedade, chamando-os de “atores relevantes” e “parceiros do desenvolvimento sustentável”. Essa concepção processual e gradativa da validação do conceito implica assumir que os prin- cípios e as premissas que devem orientar a implementação da Agenda 21 não constituem um rol completo e acabado: torná-la realidade é antes de tudo um processo social no qual todos os envol- vidos vão pactuando paulatinamente novos consensos e montando uma Agenda possível, rumo ao futuro que se deseja sustentável. 1. Forme um grupo de três pessoas e descreva o papel do homem na natureza durante a Pré-His- tória. Discorra sobre a forma como os povos primitivos tratavam o ambiente onde viviam. 2. Qual a diferença na relação homem-natureza do período pré-histórico para os dias de hoje? CAPRA, Fritjof. A Teia da Vida: uma nova compreensão científica dos sistemas vivos. 6. ed. São Paulo: Cultrix, 2001. Esse livro trata de assuntos relacionados aos sistemas vivos, trazendo uma nova linguagem para a sua compreensão. FERNANDEZ, Fernando. O Poema Imperfeito. 2. ed. Curitiba: UFPR, 2004. Esse livro é composto de crônicas sobre biologia, conservação da natureza e seus heróis. A abordagem é bem-humorada, porém comprometida com a conservação, levando o leitor a uma refle- xão profunda sobre o verdadeiro papel do homem na conservação da natureza. A questão ambiental no planeta Terra 14 3. Por que não podemos mais agir como antigamente? Qual a diferença entre o ambiente pré- -histórico e o atual? Recursos hídricos e cidadania I H á 150 anos, a possibilidade de escassez de água era algo impensável. O que não foi previsto era o aumento da população mundial, que triplicou no século XX. Mais pessoas, mais consumo. Com esse aumento, cresceu o consumo de água pela irrigação de lavouras e também pela indústria. O resulta- do foi um aumento de seis vezes no consumo total de água. Nosso país é privilegiado com 12% da água doce do mundo. Mesmo assim, algumas regiões, como a grande São Paulo, sofrem com a escassez desse recur- so. E não é por causa de falta de fontes, e sim por causa da poluição dos rios dos quais era captada a água para abastecer a cidade. Hoje, é preciso buscar água em fontes mais distantes. Isso também acontece no estado da Califórnia, nos Estados Unidos, que depende de neve derretida vinda do distante estado do Colorado para abastecer suas cidades. De acordo com o Banco Mundial, cerca de 80 países hoje enfrentam proble- mas de abastecimento. Os dados da ONU apontam que mais de 1 bilhão de pes- soas não têm acesso a fontes de água de qualidade. A escassez de água potável é uma das principais causas de conflitos entre países. A região de Golan, no Oriente Médio, por exemplo, possui vários aquíferos1 e está na mira de outros países que não possuem reservatórios desse recurso. O uso inadequado também compromete a disponibilidade de água. Nos últi- mos anos, a distribuição de água no Brasil aumentou em 30%. Entretanto, dobrou a proporção da água sem tratamento. Outro fator agravante é o desperdício, que chega a 45% do total de água distribuída pelos sistemas públicos. 1Camada porosa e perme-ável de rocha ou sedimen- to que contém grandes quan- tidades de água subterrânea e que permite fácil desloca- mento da água. Declaração Universal dos Direitos da Água (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 22 mar. 1992) Primeira – A água faz parte do patrimônio do planeta. Cada continente, cada povo, cada nação, cada região, cada cidade, cada cidadão, é plenamente responsável aos olhos de todos. Segunda – A água é a seiva de nosso planeta. Ela é condição essencial de vida de todo vegetal, animal ou ser humano. Sem ela não poderíamos conce- ber como são a atmosfera, o clima, a vegetação, a cultura ou a agricultura. Terceira – Os recursos naturais de transformação da água em água potá- vel são lentos, frágeis e muito limitados. Assim sendo, a água deve ser mani- pulada com racionalidade, precaução e parcimônia. Quarta – O equilíbrio e o futuro de nosso planeta dependem da preserva- Recursos hídricos e cidadania I 16 ção da água e de seus ciclos. Estes devem permanecer intactos e funcionando normalmente para garantir a continuidade da vida sobre a Terra. Esse equilí- brio depende, em particular, da preservação dos mares e oceanos, por onde os ciclos começam. Quinta – A água não é somente herança de nossos predecessores; ela é, sobretudo, um empréstimo aos nossos sucessores. Sua proteção constitui uma necessidade vital, assim como a obrigação moral do homem para com as ge- rações presentes e futuras. Sexta – A água não é uma doação da natureza; ela tem um valor econô- mico: precisa-se saber que ela é, algumas vezes, rara e dispendiosa e que pode muito bem escassear em qualquer região do mundo. Sétima – A água não deve ser desperdiçada, nem poluída, nem enve- nenada. De maneira geral, sua utilização deve ser feita com consciência e discernimento para que não se chegue a uma situação de esgotamento ou de deterioração da qualidade das reservas atualmente disponíveis. Oitava – A utilização da água implica respeito à lei. Sua proteção cons- titui uma obrigação jurídica para todo homem ou grupo social que a utiliza. Essa questão não deve ser ignorada nem pelo homem nem pelo Estado. Nona – A gestão da água impõe um equilíbrio entre os imperativos de sua proteção e as necessidades de ordem econômica, sanitária e social. Décima – O planejamento da gestão da água deve levar em conta a soli- dariedade e o consenso em razão de sua distribuição desigual sobre a Terra. Quantidade de água no planeta A água é um elemento químico simples e ao mesmo tempo essencial à vida dos seres vivos. O corpo humano, por exemplo, é 70% composto por água, pre- cisando dela para seu funcionamento. Da mesma forma acontece com os outros seres vivos, muitos deles sendo dependentes da água durante a vida toda, por exemplo, peixes e algas, ou apenas parte dela, como os anfíbios. Sem a água, a vida na Terra, pelo menos como ela é hoje, não seria possível. A Terra possui quase 1,4 bilhão de quilômetros cúbicos de água. Isso sig- nifica um ecossistema cerca de 200 vezes maior que o conjunto de ecossistemas terrestres. Apesar de representar três quartos do planeta Terra, não devemos es- quecer que a maior parte da água está nos oceanos, ou seja, água salgada, e apenas 2,5% é água doce. Os rios2, lagos3 e reservatórios de onde a humanidade retira a água consumida representam uma pequena quantia, apenas 0,26% do total. O restante da água doce está na forma de geleiras. 2Camada porosa e perme-ável de rocha ou sedimen- to que contém grandes quan- tidades de água subterrânea e que permite fácil desloca- mento da água. 3Camada porosa e perme-ável de rocha ou sedimen- to que contém grandes quan- tidades de água subterrânea e que permite fácil desloca- mento da água. Recursos hídricos e cidadania I 17 Se pegarmos uma garrafa com 1,5 litro de água e a dividirmos proporcio- nalmente, como a encontramos no planeta, a quantidade de água doce disponí- vel seria equivalente a uma única gota? (CAPELAS JÚNIOR, 2001, p. 28). IE SD E B ra si l S .A . Figura 1 – O ciclo da água. O ciclo hidrológico mantém a quantidade de água acumulada na superfície e no interiordo solo. Por isso, por muito tempo se pensou que a água fosse um recurso natural renovável e infinito. Porém, alterando-se o ciclo desse recurso natural, ele se torna um recurso finito. Com cerca de 6,5 bilhões de pessoas na Terra, era de se esperar que esse recurso, embora considerado renovável, tornar-se-ia escasso. O elevado grau de consumo, o desperdício e a poluição de fontes de água colocam em risco a nossa própria existência. A guerra milenar da água (INSTITUTO SOCIOAMBIENTAL, 2005, p. 245) No auge da idade do gelo, há 20 mil anos, caçadores e coletores de alimentos migraram para as regiões mais quentes da Terra, como a Mesopotâmia, dos rios Tigre e Eufrates, os vales dos rios Indo, na Índia, e Amarelo, na China. O controle dos rios começou há cerca de 4 000 anos, época em que as civilizações dessas Recursos hídricos e cidadania I 18 áreas realizaram obras para conter enchentes e proporcionar irrigação e abasteci- mento humano. Dominar o uso da água dos rios fez com que algumas civilizações se utilizassem disso como forma de exercer poder sobre outros povos e regiões geográficas. Um exemplo de conflito moderno pelo uso da água é vivenciado por is- raelenses e palestinos. Israel depende das águas subterrâneas que estão no território palestino e retira cerca de 30% da disponibilidade do aquífero, com- prometendo a capacidade de recarga desse reservatório. De um lado, Israel controla o uso do aquífero por parte dos palestinos, e do outro os palestinos reclamam a água que está em suas terras. Usos múltiplos da água A água que consumimos vem de rios, lagos, represas, açudes, reservas sub- terrâneas e, algumas vezes, do mar. A água do mar precisa passar por um proces- so de dessalinização, ou seja, um processo pelo qual a água e o sal são separados e a água passa a ser potável. A partir da captação, a água é utilizada para diversos fins. O abastecimento públi- co representa 10% do consumo, 23% é consumido na indústria e 67% na agricultura. Abastecimento público Utilizamos a água em várias atividades de nosso dia a dia. Higiene pessoal, alimentação, matar a sede, lavar roupa e lavar louça. Porém, sua distribuição está comprometida por causa do aumento da demanda, do desperdício, da poluição e da urbanização descontrolada – que atinge regiões de mananciais4. Antes de chegar até as casas, a água passa por um processo de tratamento. Após seu uso, a água deve passar novamente por um tratamento antes de ser lançada no ambiente. Infelizmente não é bem isso que acontece em muitos lugares. Gráfico 1 – Porcentagem de água que o brasileiro usa diariamente (P E G O R IN , 2 00 3, p . 4 1- 47 )Outras atividades 3% Higiene pessoal (lavar roupa e escovar os dentes) 12% Tomar banho 25% Cozinhar, lavar louça e beber 27% Descarga de banheiro 33% 4Locais onde há descarga e concentração natural de água doce originada de lençóis subterrâneos e de águas superficiais, que se mantêm graças à existência de um sistema especial de proteção proporcionado pela vegetação. Recursos hídricos e cidadania I 19 Nós, como cidadãos consumidores responsáveis, podemos ajudar mudando nossos hábitos e ensinando outras pessoas a fazê- -lo também – por exemplo, diminuir o tempo de banho, fechar o chuveiro en- quanto nos ensaboamos; não desperdiçar água lavando a calçada, pode-se apenas varrer (lavar só em caso de muita necessidade, afinal de contas, não tem como manter uma calçada limpa o tempo todo mesmo); lavar o carro usando um balde com água ao invés do jato de água; fechar a torneira enquanto escovamos os den- tes; e usar descargas com caixa-tanque no vaso sanitário. Quadro 1 – Gasto médio e possibilidades de economia em atividades diárias Atividade Gasto médio Uso racional Economia Escovar os dentes 12 litros em 5 minutos Fechar a torneira enquanto escova os dentes e usar água de um copo para enxaguar a boca. 350 mililitros 11,65 litros Tomar banho em chuveiro elétrico 45 litros em 15 minutos Fechar o chuveiro enquanto se ensaboa e diminuir o tempo de banho para cinco minutos. 15 litros 30 litros Lavar louça 117 litros em 15 minutos Limpar os restos de comida antes de lavar, encher a pia até a metade para ensaboar, manter fechada e enxaguar a louça em mais meia pia de água limpa. 20 litros 97 litros Regar jardins e plantas 86 litros em 10 minutos Usar regador ou esguicho tipo revólver, regar só o necessário e, de preferência, pela manhã ou à noite, quando a evaporação é menor. 50 litros 36 litros Lavar o carro 560 litros em 30 minutos Lavar só quando necessário e trocar o esguicho por um balde. 40 litros 520 litros Lavar a calçada 279 litros em 15 minutos Limpar com vassoura, o resultado é o mesmo. não há consumo de água 279 litros Obs.: como a pressão da água nos prédios é maior, o consumo em edifícios pode ser até três vezes a mais do que se gasta em uma casa. Os números acima se referem ao consumo em casa. (R O C H A ; D IL L , 2 00 1) Indústria O setor industrial utiliza muita água, representando cerca de 25% do consu- mo total do planeta. A água pode ser utilizada diretamente como matéria-prima na fabricação de bebidas, como os refrigerantes. Também serve para a transmis- são de calor, ou seja, para aquecer ou resfriar algo. Na culinária, também utiliza- mos a água como meio de transmitir calor quando utilizamos o banho-maria. Na indústria, o vapor de água é utilizado para aquecer os banhos de revestimento de peças metálicas, como a galvanoplastia. Nos alambiques, a água gelada é utilizada para condensar o destilado (por exemplo, cachaça). Na fábrica de papel, a água é utilizada para lavar a celulose5 e remover a lignina6. 5É o principal composto químico da parede celu- lar nas plantas e em alguns protistas. 6Composto químico que constitui a parede celular secundária de alguns tipos de células nas plantas vas- culares. Depois da celulose, a lignina é o polímero mais abundante em um vegetal. Sua presença dá maior sus- tentabilidade para a parede celular. Como posso ajudar? Recursos hídricos e cidadania I 20 Quadro 1 – Consumo industrial da água (dados aproximados) Atividade Gasto médio Produto 12 litros em 5 minutos Papel de celulose 33 a 216 Cerveja 4,5 a 12 Refrigerante 1,8 a 2,5 Uísque (EUA) 2,6 a 76 Álcool 1 000 a 12 000l/t de cana Cimento Portland 0,55 a 1,9 Amido de milho 13 a 18/t de milho (S IL VA , 2 00 5, p . 2 59 ) Geração de energia Após a descoberta da energia elétrica, o estilo de vida das pessoas mudou muito. Hoje, nos centros urbanos, não se imagina uma casa sem energia elétrica, apesar de existirem muitas ainda no mundo. São várias as formas de se conseguir a geração de energia elétrica e uma delas é através das usinas hidrelétricas, ou seja, utilizando-se a água. Em uma usina hidrelétrica, a água contida nas barragens é direcionada para passar pelas turbinas da usina, movimentando-as e assim gerando a energia elétrica. Apesar dos impactos ambientais causados durante a construção e operação de uma usina hidrelétrica, esta ainda é uma das formas mais limpas de se obter energia elétrica. Turismo e lazer Existem regiões do Brasil bastante conhecidas pelos seus atrativos turís- ticos relacionados à água. O litoral brasileiro tem pouco mais de 9 mil quilô- metros de extensão, e o turismo é um fator importante. Locais no interior do país, como a região do Pantanal, por exemplo, também são pontos turísticos. Outros exemplos são as águas termais de Minas Gerais, Goiás e São Paulo. Nada melhor do que um banho de mar, cachoeira ou rio. Algumas pessoas ainda preferem praticar esportes, como iatismo, remo, rafting, mergulho, surfe, entre outros.A prática do surfe inclusive deixou de ser apenas na água salgada dos oceanos. No Brasil, muitos surfistas estão pegando as ondas da pororoca7, principalmente no rio Amazonas. Hidrovias O transporte de produtos é sempre uma questão muito importante, princi- palmente em um país tão extenso como o Brasil. Diferentemente do transporte rodoviário, o transporte através de barcos e navios consome menos combustíveis e apresenta um custo de mão de obra mais baixo. 7O encontro das correntes contrárias junto à foz pro- voca uma elevação súbita das águas, formando uma onda com 3 a 6 metros de altura que corre rio adentro. Essas ondas chegam a durar mais de uma hora. Recursos hídricos e cidadania I 21 Um comboio fluvial (embarcação para transporte de carga em hidrovias) de 10 mil toneladas necessita de 12 homens em sua tripulação. Se a mesma carga fosse deslocada por transporte rodoviário, seriam necessários 278 cami- nhões e seus respectivos motoristas. Mesmo assim, os riscos existem da mesma forma para todas as instala- ções de infraestrutura. É importante ressaltar que uma hidrovia mal planejada e mal manejada também causa impactos ambientais. As embarcações preci- sam estar em perfeito funcionamento para não poluírem a água, com algum vazamento de óleo, por exemplo. Aquicultura Aquicultura é o cultivo de espécies animais que vivem na água. Entre eles estão os peixes, os crustáceos e os moluscos. Dessa maneira, abastece-se o mer- cado de alimentos e também o lazer, através dos pesque-pagues. Irrigação agrícola No mundo todo, a irrigação é a atividade que mais consome água. Infeliz- mente, as técnicas utilizadas no Brasil não são adequadas e acabam gerando mui- to desperdício. Apenas 40% da água é efetivamente utilizada, o restante é perdido na evaporação antes de chegar à planta ou através do uso incorreto das técnicas, ou seja, porque a irrigação não é feita em horário ou período adequado. Abastecimento em crise nas cidades (PEGORIN, 2003, p. 46) Bons e maus exemplos de como algumas capitais do país aproveitam a água que têm disponível. Recife: entre as capitais nordestinas, é a que mais dispõe de água doce. Mesmo cortada várias vezes pelos rios Beberibe e Capiberibe, convive com racionamentos periódicos há cinco anos por causa de falta de captação e o desperdício. Metade da água da cidade se perde em vazamentos. São Paulo: a poluição dos reservatórios e dos dois principais rios da cidade, Tietê e Pinheiros, provocam o caos quando as chuvas não são suficientes. Com a maior rede hidráulica do planeta (22 000km de canos), a cidade ainda desperdiça 40% de sua água. Rio de Janeiro: tem um único grande manancial para abastecimento de água, o Rio Paraíba do Sul, que já se encontra quase esgotado e com má qualidade. Como não são feitas obras para melhorar a falta d’água, as regiões de periferia são as que mais passam por crises. Recursos hídricos e cidadania I 22 Porto Alegre: apesar de ser chamado de rio, o Guaíba, que corta a capital gaúcha, é um lago. Antes poluído e quase sem vida, está desde 1989 passando por um programa de recuperação, que já conta com 69 estações de águas e aumentou de 5% para 27% o volume de esgotos tratados na cidade. Fortaleza: mesmo durante o período das secas, a capital cearense não sofre problemas de abastecimento de água porque sua perda em va- zamentos, 30%, está abaixo da média nacional. Ainda assim, os ma- nanciais hoje explorados pela cidade não são suficientes. As principais causas da contaminação8 da água Efluentes9 domésticos – Quando damos a descarga, a água que escorre pelos ralos de nossa casa, ou seja, a água que utilizamos todos os dias, passa pelas tubulações da casa e cai na rede de esgoto, quando existe. Esse esgoto deveria passar por um tratamento, para só então a água re- tornar ao ambiente. No entanto, no Brasil, apenas 20% do esgoto é tra- tado. O restante é despejado diretamente em rios e córregos, poluindo o ambiente e contribuindo para a proliferação de doenças. Efluentes agrícolas – As substâncias utilizadas na agricultura, como fertilizantes e defensores agrícolas, acabam contaminando rios, lagos e águas subterrâneas. Substâncias como nitrato de sódio, cálcio e potássio oriundos dos fertilizantes são altamente cancerígenos. Eles infiltram-se nos solos e através da chuva são carregados para rios, lagos e lençóis fre- áticos. Efluentes industriais – Quando a indústria não dá uma destinação cor- reta aos seus rejeitos, acaba poluindo as águas. Entre os rejeitos indus- triais estão os metais tóxicos, plásticos e substâncias químicas poluentes diversas, como pigmentos, ácidos e detergentes. Lixo – Se o lixo não tiver uma destinação correta, em local adequado, os poluentes gerados em sua decomposição natural afetam rios e águas subterrâneas. A eutrofização A palavra eutrofização deriva do grego eu (que significa bom, verdadeiro) e trophein (nutrir), ou seja, bem nutrido. Dessa maneira, o processo consiste no en- riquecimento das águas com nutrientes em um ritmo que não pode ser compensa- do pela sua eliminação definitiva através da mineralização total. Esses nutrientes podem vir de várias fontes, entre elas: esgotos domésticos, despejos industriais, 8Introdução de um agente indesejável em um meio onde este não existia previa- mente. 9Rejeitos no estado líquido. Recursos hídricos e cidadania I 23 drenagem urbana, escoamento agrícola e florestal, decomposição de rochas e se- dimentos, e transporte das camadas superficiais do solo (erosão). A eutrofização aparece em vários contextos e não é exclusivamente decor- rente da ação humana, pois existem registros desse processo no desenvolvimento dos lagos pós-glaciais, através do estudo do tipo de sedimento encontrado antes de qualquer intervenção humana. Porém, com o lançamento de produtos nos rios através do esgoto, principalmente os detergentes, ricos em fosfatos, há um aumen- to na velocidade com que o processo ocorre. Com o aumento de nutrientes, as algas proliferam atingindo quantidades extraordinárias. Com um ciclo de reprodução intenso e uma vida não muito longa, as algas mortas começam a ser decompostas. A decomposição diminui a con- centração de oxigênio nas águas profundas, podendo causar a morte de peixes e outros seres vivos. Os efeitos da eutrofização são: prejuízos ao tratamento de águas para abas- tecimento; prejuízo ao lazer e recreação por causa de má qualidade da água; au- mento da produtividade, e, consequentemente, proliferação de algas tóxicas ou não; mortandade de peixes; a água fica indisponível para o consumo humano. As bacias hidrográficas No Brasil, existem cinco grandes bacias hidrográficas: Amazônica, Prata, São Francisco, Araguaia-Tocantins e Atlântico Sul. A Bacia Amazônica, formada pelo Rio Amazonas e seus afluentes, é consi- derada a maior bacia hidrográfica do mundo, com uma drenagem de 5,8 milhões de quilômetros quadrados. Ela abrange a Venezuela, Colômbia, Peru, Bolívia e Brasil. Neste localiza-se nos estados do Amazonas, Pará, Amapá, Acre, Roraima, Rondônia e Mato Grosso. O Rio Amazonas é responsável por 20% da água doce despejada anualmente nos oceanos. A Bacia do Prata é a segunda maior bacia da América do Sul. Os rios Para- guai, Paraná e Uruguai juntos drenam 10,5% do território brasileiro. Ela atravessa quatro países: Brasil, Paraguai, Argentina e Uruguai. No Brasil, ela abrange os estados de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. A Bacia do São Francisco é a terceira maior bacia do Brasil, e a única intei- ramente brasileira. Ela ocupa 8% do território brasileiro, abrangendo as regiões Sudeste e Nordeste e um pouquinho da região Centro-Oeste. As matas ciliares As matas ciliares são as florestas associadas aos cursos d’água. Mesmo estan-do protegidas por leis federais, sua destruição é preocupante. Elas representam uma barreira física, regulando os processos de troca entre os ambientes terrestre e aquá- tico. Sua presença reduz a possibilidade de contaminação da água por sedimentos, Recursos hídricos e cidadania I 24 resíduos de adubos, defensivos agrícolas, conduzidos pelo escoamento superficial da água no terreno. Os fatores responsáveis por sua degradação são os desmata- mentos, as grandes queimadas e a mineração. Um dos mais sérios problemas provo- cados pela destruição desse ecossistema é o aumento do escoamento superficial de resíduos para o leito dos rios, sendo que o acúmulo desse sedimento é o responsável pelo rebaixamento do nível do lençol freático, gerando enchentes e diminuindo a vida útil das barragens e hidrelétricas. Além disso, ainda favorece os problemas de erosão, perda de fertilidade do solo, deslizamento de rochas e queda de árvores. Desse modo, as matas ciliares são consideradas de extrema importância para a manutenção das bacias hidrográficas. A bacia hidrográfica como unidade de planejamento As bacias hidrográficas proporcionam uma visão integrada do conjunto das condições naturais e das atividades humanas desenvolvidas. Pelo seu caráter inte- grador das dinâmicas ocorridas no ambiente da bacia hidrográfica, são excelentes áreas de estudos para o planejamento, facilitando o acompanhamento do processo de renovação ou manutenção dos recursos naturais. Entre os princípios básicos praticados nos países que avançaram na gestão de recursos hídricos, o primeiro é o da adoção da bacia hidrográfica como unida- de de planejamento. Tendo-se os limites das bacias como o que define o perímetro da área a ser planejada, fica mais fácil fazer o confronto entre as disponibilidades e as demandas, essenciais para um determinado balanço hídrico. Como uma mesma bacia hidrográfica localiza-se em vários estados, seu pa- pel também é o de descentralizadora das ações de gestão dos recursos hídricos, transformando o processo em um planejamento regional desenvolvido em cada ba- cia hidrográfica, com a atuação do Estado, da população e das organizações civis. Conclusão A água é um dos recursos naturais essenciais para a existência da vida. Sem ela, a vida na Terra, como a conhecemos, não seria possível. No entanto, os seres humanos esquecem da importância desse recurso quando o tratam como produto descartável, usando, tornando imprestável e jogando fora. Os ecossistemas que “se virem” para filtrar e neutralizar essa poluição. Só que os ecossistemas são responsáveis pela produção da água de boa qua- lidade para a vida em suas diferentes formas, e quando desequilibrados não con- seguem exercer sua função. Falta de cobertura vegetal, solos impermeabilizados e lixo são apenas alguns dos problemas enfrentados pelas bacias hidrográficas. A água é um bem de uso comum. Todos podem usufruir, mas não “deveriam” poluir. Sem a informação e a conscientização, esse recurso poderá se tornar escasso em pouco tempo, aumentando os problemas ambientais, sociais e econômicos. Recursos hídricos e cidadania I 25 Um dos passos mais importantes, na legislação referente a recursos hídri- cos, foi valorizar a bacia hidrográfica como unidade de gestão (Lei das Águas, 1997). É a ordem natural e deve orientar o planejamento econômico. Quer di- zer, o desenvolvimento precisa regular seu crescimento e discutir prioridades com base nos recursos hídricos disponíveis dentro de cada bacia hidrográfica. Não se pode tirar a água de outras bacias para atender a um crescimento não planejado, como se pretende fazer com São Paulo em relação à bacia do Rio Piracicaba. Ninguém quer condenar os paulistanos à sede, é evidente, mas é importante trabalhar com os recursos disponíveis e, se não há mais recursos, é preciso parar de crescer. (MACHADO, 2004). Site do Projeto Brasil das Águas: <www.brasildasaguas.com.br>. Esse é o site oficial do Projeto Brasil das Águas, desenvolvido por Gerard e Margi Moss, em parceria com pesquisadores de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Durante 14 meses, um avião anfíbio foi utilizado para coletar e analisar a água de todo o território brasileiro. O resultado do projeto é um “raio X” da qualidade da água doce do Brasil. Recursos hídricos e cidadania I 26 Recursos hídricos e cidadania II A capacidade de armazenamento de água da maioria dos reservatórios já foi muito reduzida pelo assoreamento e falta de cuidado com as margens. Mas é só co- meçar a chover que, aliviados com a abundância de água, deixamos de nos preocupar com o controle dos desperdícios e dos excessos. E deixamos de sentir a falta que a água faz nos ecossistemas, uma questão que se torna tanto mais crítica quanto maior a disputa em torno dos múltiplos usos dos recursos hídricos em atividades humanas. Liana John O aumento da população mundial tem como umas das consequências mais diretas o aumento proporcional do consumo dos recursos naturais. No caso da água, além do consumo crescente, a falta de cuidados com os reservatórios, que muitas vezes também são usados para disposição final dos efluentes domésticos, comerciais e industriais, têm sido os principais fatores de degradação. A deterioração dos ecossistemas, principais geradores e mantenedo- res da qualidade da água, também tem causado a diminuição dos estoques de água utilizável para consumo humano. A percepção da necessidade de regulamentação do uso da água tem promo- vido uma série de propostas de leis que disciplinam esse uso, em todos os níveis de administração pública. Na década de 1990, a questão da água foi bastante dis- cutida e instituiu-se a Lei de Recursos Hídricos, em 1997. Lei de Recursos Hídricos A Lei Federal 9.433/97, também conhecida como Lei das Águas, instituiu a Política Nacional dos Recursos Hídricos e criou o Sistema Nacional de Geren- ciamento dos Recursos Hídricos. Através da Lei 9.984/2000, foi criada a Agência Nacional de Águas (ANA), com a missão de implementar o sistema criado pela Lei de Recursos Hídricos. Essa Lei tem como base o princípio de que a água é um bem de domínio público, porém é um recurso natural limitado, dotado de valor econômico. Essa lei também determina que, em situações de escassez, o uso da água tem como priori- dade o consumo humano e a dessedentação de animais. Além disso, a gestão dos recursos hídricos deve proporcionar o uso múltiplo das águas. A Política Nacional de Recursos Hídricos tem como objetivo assegurar a disponibilidade de água po- tável para esta e para as futuras gerações, e tem como um de seus instrumentos a Outorga de Direito de Uso de Recursos Hídricos1. 1 A Outorga de Direito de Uso de Recursos Hídricos é um documento emitido pela Agência Nacional das Águas (ANA), que dá o direito de retirada do recurso natural a uma empresa por determina- do tempo. Recursos hídricos e cidadania II 28 O principal ponto da Lei 9.433/97 é considerar a água como bem de consu- mo, passando a ser cobrada. Hoje, o valor que pagamos pela água em nossos lares é referente à sua distribuição e tratamento. A proposta da lei é cobrar pela retirada de água do ambiente, ou seja, cobrar pelos recursos naturais que estão sendo utili- zados. Dessa maneira, deseja-se fazer com que a água seja reconhecida como bem econômico, fornecendo ao usuário uma indicação de seu real valor e incentivando a racionalização do seu uso, além de obter recursos financeiros para o financia- mento dos programas e intervenções contemplados nos recursos hídricos. A experiência em outros países mostra que, em bacias que utilizam a co- brança, os indivíduos e firmas poluidores reagem incorporando custos associados à poluição ou a outro uso da água. A cobrança pelo uso de recursos hídricos, mais do que instrumento para gerar receita, é indutorade mudanças pela economia da água, pela redução de perdas e pela gestão com justiça ambiental, pois se cobra de quem usa ou polui. A Política Nacional de Gestão de Recursos Hídricos define a bacia hidro- gráfica como uma unidade de planejamento e gestão. O Comitê de Bacia é o órgão responsável pela aprovação do plano da bacia, onde são definidas as prioridades de obras e ações, além de ter o papel de negociador, com instrumentos técnicos para analisar o problema dentro de um contexto mais amplo. Todavia, a outorga de direito de uso da água na bacia é de responsabilidade dos órgãos gestores estaduais e da ANA. A deliberação sobre ações que transcendem o âmbito da bacia é responsabilidade do Conselho Nacional de Recursos Hídricos, órgão superior do Sistema Nacional de Gerencia- mento de Recursos Hídricos. As principais competências dos Comitês de Bacias Hidrográficas são: promover o debate das questões relacionadas a recursos hídricos e arti- cular a atuação das entidades intervenientes; arbitrar, em primeira instância administrativa, os conflitos relacionados aos recursos hídricos; aprovar o Plano de Recursos Hídricos da bacia; acompanhar a execução do Plano de Recursos Hídricos da bacia e suge- rir as providências necessárias ao cumprimento de suas metas; propor ao Conselho Nacional e aos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos as acumulações, derivações, captações e lançamentos de pouca expressão, para efeito de isenção da obrigatoriedade de outorga de direi- tos de uso de recursos hídricos, de acordo com seus domínios; estabelecer os mecanismos de cobrança pelo uso de recursos hídricos e sugerir os valores a serem cobrados; estabelecer critérios e promover o rateio de custo das obras de uso múl- tiplo, de interesse comum ou coletivo. Os comitês são constituídos por representantes dos poderes públicos, dos usuários das águas e das organizações civis com ações desenvolvidas para a recu- O que são os Comitês de Bacias Hidrográficas? Recursos hídricos e cidadania II 29 peração e conservação do meio ambiente e dos recursos hídricos em uma deter- minada bacia hidrográfica. A gestão é participativa e descentralizada. Sua criação formal depende de autorização do Conselho Nacional de Recursos Hídricos e de decreto da Presidência da República. Para qualquer finalidade de uso das águas de um rio, lago ou mesmo de águas subterrâneas, deve ser solicitada uma Outorga de Direito de Uso de Recur- sos Hídricos ao Poder Público. Os usos mencionados referem-se, por exemplo, à captação de água para o abastecimento doméstico, para fins industriais ou para irrigação; ao lançamento de efluentes industriais ou urbanos; à construção de obras hi- dráulicas, como barragens e canalizações de rio, uso de recursos hídricos com fins de aproveitamento dos potenciais hidrelétricos, ou, ainda, a ser- viços de desassoreamento e de limpeza de margens. Em outras palavras, qualquer interferência que se pretenda realizar na quantidade ou na qualidade das águas de um manancial necessita de uma autorização do Poder Público. Princípio do poluidor-pagador O princípio do poluidor-pagador, também conhecido como usuário-paga- dor, tem o objetivo de promover o uso racional dos recursos naturais, visando a preservação desses recursos para as gerações futuras. Esse princípio prevê que os responsáveis diretos ou indiretos pela degradação de qualquer ambiente deverão pagar pelos prejuízos causados. Recursos como a água e o ar são bens públicos e sua poluição acarretará em mais prejuízos para a população, além da perda de qualidade desses recursos. Esse princípio não serve para afirmar que quem paga pode poluir, mas sim para evitar que pessoas ajam sem pensar nas consequências de seus atos. Dessa maneira, o pagamento efetuado pelo poluidor não lhe dá o direito de poluir. A di- ficuldade encontrada está no fato da quantificação de valores que devem ser pagos para a recomposição ambiental e nos valores devidos em multas indenizatórias. Na legislação brasileira, o princípio do poluidor-pagador é referenciado no artigo 4.º, VII, combinado com o parágrafo 1.º do artigo 14, da Lei 6.938/81 – Lei da Política Nacional do Meio Ambiente – que diz que é obrigação do poluidor, culpado ou não, indenizar ou reparar danos causados ao meio ambiente ou a terceiros afeta- dos por sua atividade. Ele também é reforçado pela Constituição Federal de 1988, ar- tigo 225, parágrafo 3.º, que afirma: “as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”. No caso do uso da água, é responsabilidade do usuário-poluidor o custo de despoluição da água por ele utilizada. Assim, uma empresa ou pessoa que utilize água de um rio, deve retornar essa água ao rio com a mesma qualidade de quando foi captada. A cobrança pelo uso e/ou poluição dos recursos hídricos é um ins- trumento de gestão para induzir os usuários a serem mais racionais no uso desse recurso e a preservarem o meio ambiente. Por que solicitar autorização de uso da água ao Poder Público? Recursos hídricos e cidadania II 30 Tecnologias para o uso da água Recuperar uma fonte de recursos hídricos custa caro e leva bastante tempo. Para melhorar a situação dos recursos hídricos no planeta, é preciso, além de tentar limpar as fontes que já estão poluídas, evitar o desperdício, interromper os proces- sos poluidores e criar novas maneiras de captação, controle e distribuição da água. O Rio Tâmisa, em Londres, já foi tão poluído que deixou de ser considerado um cartão-postal da cidade. Seu estado de poluição já era crítico em 1856, e em 1950 esse rio foi dado como “morto” por causa da grande quantidade de esgoto que recebia. A recuperação do Tâmisa começou em 1960, com o tratamento do esgoto e das águas pluviais, além de normas impostas às indústrias poluidoras. O processo exigiu muito investimento e fiscalização por parte do governo, e hoje o rio é considerado o estuário metropolitano mais limpo do mundo. Outro exemplo interessante é do estuário do Guaíba, em Porto Alegre (RS). O Guaíba é na verdade um grande lago, com 12 comitês responsáveis pelo seu ge- renciamento, uso e proteção. As três principais cidades banhadas por ele são Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul, Canoas e Guaíba. Hoje, a única indústria que poluía o rio faz o tratamento total de seus resíduos químicos e possui certifi- cação ISO 140002. A coleta do esgoto melhorou na capital, mas ainda são neces- sários mais esforços no sentido de melhorar a qualidade da água do Guaíba. Em alguns países, o esgoto é tratado e a água é reaproveitada para consumo. Esse destino não poluente do esgoto não é assim uma tecnologia novíssima. Há mais de 20 anos os cidadãos de Orange County, terra da Disneylândia, nos Esta- dos Unidos, consomem a água reciclada dos esgotos. No mesmo país, a população do Arizona tem 80% de seu esgoto renovado em água potável. O Japão é outro exemplo: reutilizam 80% da água usada na indústria. A reutilização da água dá um fim à poluição causada pelo lançamento de esgoto nos cursos d’água, e tam- bém ao problema de captação de recursos hídricos enfrentados pelas cidades, como acontece aqui no Brasil, na grande São Paulo, por exemplo. Na Índia, optou-se por uma alternativa barata de captação de água. Os len- çóis freáticos foram salvos através de poços feitos nos quintais para recolher a água da chuva. Aqui no Brasil, em alguns lugares semiáridos do Nordeste, as cis- ternas para captação da água da chuva estão sendo a salvação de muitas famílias. A grande São Paulo também já aderiu a essa ideia, bastante simples. Há muito tempo o cloro vem sendo utilizado para desinfecção da água. Em 1975, descobriu-se que o cloro reagecom a matéria orgânica e produz substâncias organocloradas, similares aos agrotóxicos e prejudiciais à saúde. Uma opção mais “limpa” é a utilização do ozônio, produzido no local do tratamento a partir de ar seco ou oxigênio puro, submetidos a descargas elétricas. Assim, não é necessário adicionar outras subs- tâncias à água. O ozônio é um oxidante que elimina micro-organismos, utilizado na desinfecção de piscinas, processos de lavagem de garrafas, frutas, legumes e verduras, atua na remoção de ferro e manganês, melhora o gosto e o odor da água, elimina o limo e limpa as tubulações. Sua utilização para tratamento de efluentes é bastante eficaz. 2O certificado que atesta o compromisso e a condu- ta da empresa em relação ao meio ambiente. E quanto ao tratamento da água? Recursos hídricos e cidadania II 31 Outra forma de desinfecção da água é através da radiação ultravioleta (UV). Ela também é gerada no local da desinfecção por descarga elétrica, através de lâmpadas de vapor de mercúrio. Essa radiação penetra no corpo dos micro-orga- nismos, altera seu código genético e impossibilita a reprodução. Assim como o ozônio, a radiação ultravioleta não produz substâncias nocivas na água. Esses métodos têm sido empregados no tratamento de piscinas, com bastan- te eficiência e maior satisfação dos usuários. Importância da Educação Ambiental no uso dos recursos hídricos No Brasil, as pessoas estão acostumadas com a ideia de abundância de água, afinal de contas, é o país que possui 12% da água doce do mundo. Sem a consciência de que esse recurso pode acabar, é comum encontrar pessoas lavando a calçada com a mangueira aberta sem necessidade, utilizando jatos d’água (“vas- soura hidráulica”), ou então escovando os dentes com a torneira aberta, jogando fora água potável. Os exemplos de desperdício e despreocupação são muitos: la- vagem de veículos com água tratada, o uso de válvulas sob pressão nas descargas dos vasos sanitários, o despejo das águas servidas de banho e lavagens em geral, sem a preocupação com a racionalização de consumo e/ou reutilização. Um meio para evitar a falta de água no futuro está nas ações de educação e conscientização das pessoas, incluindo todas as classes sociais e todos os setores: agrícola, indús- tria, comércio, residências e escolas. Ensinar a inter-relação que existe entre solo, água, ar e seres vivos é um modo de alcançar o objetivo de se ter cidadãos mais comprometidos com o futuro do planeta. Segundo dados do Banco Mundial, mais de 2,2 milhões de pessoas morrem todo ano e metade dos leitos hospitalares em todo o mundo estão ocupados por pacientes com doenças causadas pelo consumo de água contaminada e pela falta de saneamento. As crianças com até cinco anos são as mais afetadas, sendo 6 000 mortes infantis por dia. Essa realidade ocorre especialmente nos países em desen- volvimento, como Brasil, China e Índia. Uma pesquisa da Unesco sobre a qualida- de dos mananciais de 122 países mostrou que a Bélgica é o país com pior qualidade de água por causa da escassez de seus lençóis freáticos, da poluição causada pelas indústrias e a falta de tratamento de resíduos. Nos primeiros lugares, estão Finlân- dia, Canadá, Nova Zelândia, Reino Unido e Japão. Ainda de acordo com o relató- rio, os rios asiáticos são os mais poluídos do mundo, e metade da população nos países pobres está exposta a água contaminada por esgoto ou resíduos industriais. Conclusão Apesar da aparente abundância de água que temos em nosso país, sua dis- tribuição é desigual, sendo que nas regiões em que há mais cidades, a água já está se tornando escassa. O mesmo acontece no mundo. Países mais desenvolvidos demandam mais água, mas neles a drenagem desse recurso nem sempre é boa. Recursos hídricos e cidadania II 32 Alguns países já tratam esse recurso como não renovável e apresentam for- mas de uso mais conscientes. Porém, a poluição da água ainda é uma realidade triste na maioria das regiões do planeta. Ensinar as crianças sobre a importância desse recurso é fundamental para evitar que ele se esgote. Na legislação, nosso país já evoluiu, agora é necessário que os cidadãos to- mem consciência e repensem seus hábitos. O Aquífero Guarani (SÃO PAULO, 2005) O Aquífero Guarani é a principal reserva subterrânea de água doce da América do Sul e um dos maiores sistemas aquíferos do mundo, ocupando uma área total de 1,2 milhão de quilômetros quadrados na Bacia do Paraná e parte da Bacia do Chaco-Paraná. Estende-se pelo Brasil (840 000 km²), Paraguai (58 500km²), Uruguai (58 500km²) e Argentina (255 000km²), área equivalente aos territórios da Inglaterra, França e Espanha juntas. Sua maior ocorrência se dá em território brasileiro (2/3 da área total) abrangendo os Estados de Goiás, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. O Aquífero Guarani, denominação do geólogo uruguaio Danilo Anton, em memória do povo indígena da região, tem uma área de recarga de 150 mil quilômetros quadrados e é constituído pelos sedimentos arenosos da Formação Piramboia na Base (Formação Buena Vista na Argentina e Uruguai) e arenitos Botucatu no topo (Missiones no Paraguai, Tacuarembó no Uruguai e na Argentina). O Aquífero Guarani constitui-se em uma importante reserva estratégica para o abasteci- mento da população, para o desenvolvimento das atividades econômicas e do lazer. Sua recarga natural anual (principalmente pelas chuvas) é de 160 quilômetros cúbicos ao ano, sendo que desta, 40 quilômetros cúbicos constituem o potencial explotável sem riscos para o sistema aquífero. As águas em geral são de boa qualidade para o abastecimento público e outros usos, sendo que, em sua porção confinada, os poços têm cerca de 1 500 metros de profundidade e podem produzir vazões superiores a 700 metros cúbicos por hora. No Estado de São Paulo, o Guarani é explorado por mais de 1 000 poços e ocorre numa faixa no sentido sudoeste-nordeste. Sua área de recarga ocupa cerca de 17 mil quilômetros quadrados, onde se encontram a maior parte dos poços. Essa área é a mais vulnerável e deve ser objeto de pro- gramas de planejamento e gestão ambiental permanentes, para se evitar a contaminação da água subterrânea e sobre-explotação do aquífero com o consequente rebaixamento do lençol freático e o impacto nos corpos d’água superficiais. Por ser um aquífero de extensão continental com característica confinada, muitas vezes jor- rante, sua dinâmica ainda é pouco conhecida, necessitando maiores estudos para seu entendi- mento, de forma a possibilitar uma utilização mais racional e o estabelecimento de estratégias de preservação mais eficientes. Recursos hídricos e cidadania II 33 Até hoje, muitos poços foram perfurados para a exploração da água subterrânea, sem a devi- da preocupação com sua proteção, sendo cada caso ou problema tratado isoladamente. Diante da demanda por água doce, faz-se necessário o entendimento amplo desse sistema hídrico, de forma a gerenciar e proteger esse recurso. Para tanto, é necessário organizar os dados e sistemas existentes, de forma que seja possível integrar a utilização dos bancos de dados dos diversos países abrangidos pelo Aquífero Guarani e modelar a hidrodinâmica do sistema, permitindo identificar as áreas mais frágeis que deverão ser protegidas. 1. Formem grupos de três pessoas e respondam: Qual é a bacia que drena a região onde você mora? Quais os rios que fazem parte dessa bacia? 2. Discuta com o seu grupo se existem ou não problemas em relação ao abastecimento de água em sua cidade. Caso existam, quais são eles? Recursos hídricos e cidadania II 34 3. E quanto ao esgoto? Existe coleta e tratamento de esgoto em toda a cidade? 4. Com a turma toda, discuta quais as atitudes que os cidadãos podem tomar para melhorar a qua- lidade de vida na cidade,em relação aos recursos hídricos. Formule um programa de Educação Ambiental que vise informar os cidadãos sobre o caráter finito dos recursos hídricos e sobre a importância da água para todos. Mais de um sexto da população mundial, 18%, o que corresponde a 1,1 bilhão de pessoas, não têm acesso ao fornecimento de água. A situação piora quando se fala em saneamento básico, que não faz parte da realidade de 39% da humanidade, ou 2,4 bilhões de pessoas (UM SEXTO, 2005). BORGHETTI, Nadia Rita Boscardin; BORGHETTI, José Roberto; ROSA FILHO, Ernani Francisco da. Aquífero Guarani: a verdadeira integração dos países do Mercosul. 1. ed. Rio de Janeiro: Funda- ção Roberto Marinho, 2004. v. 1, 214p. Agregam-se nessa obra informações gerais sobre a disponibilidade e o uso da água no mundo, além das informações mais importantes sobre o Aquífero Guarani, como extensão, características geológicas e hidroquímicas, e as aplicações do seu geotermalismo na agropecuária, na indústria e no turismo hidrotermal. Conceitos básicos de águas subterrâneas e aquíferos, além de um glossário, objetivam facilitar a compreensão do assunto para aqueles leitores que não estão familiarizados com o tema. Uma lista com os municípios localizados sobre o Guarani, e o mapa esquemático do mesmo em lâminas de acetatos, também são apresentados. O livro é ilustrado com gráficos e infográficos, mapas detalhados, cortes tridimensionais e transparências em acetato. (Disponível em: <www.oaquiferoguarani.com.br>.) Site da Agência Nacional das Águas (ANA): < www.ana.org.br> Nesse site, encontram-se informações sobre a Lei de Recursos Hídricos, a Outorga de Direito de Uso de Recursos Hídricos e informações sobre os Comitês de Bacias Hidrográficas, quais são e como estão funcionando. Resíduos sólidos e cidadania H á uma tendência clara de aumento da população mundial e, na mesma medida em que ela cresce, também cresce a necessidade de recursos na-turais. Como consequência, a produção de resíduos da atividade humana é crescente, e na maior parte dos casos eles são descartados e conhecidos pelo nome de lixo. A espécie humana tem usado o planeta como uma grande “lata de lixo”, sem se importar com a possibilidade de algum dia não haver mais espaço para dispor a grande quantidade de resíduos que produz diariamente. Estima-se que, em mé- dia, um cidadão de Tóquio produza cerca de 1 quilo de lixo por dia, formado em grande parte por materiais que, devidamente separados e processados, podem ser reutilizados ou reciclados. Reduzir a quantidade de lixo produzida e dar a ele a correta destinação. O lixo é hoje o grande desafio da maioria das cidades, visto que os impactos socio- ambientais do lixo são cada vez mais preocupantes, com destaque para a contami- nação das fontes de água usadas para o abastecimento público e a degradação da paisagem e de seus atributos naturais. Estima-se que cada brasileiro produza entre 0,5 e 1 quilo de lixo por dia, en- quanto países como os Estados Unidos têm cidades em que cada habitante chega a produzir 3 quilos de lixo por dia. O país produz cerca de 200 milhões de toneladas de lixo por ano, e é considerado o que mais gera lixo no mundo. Isso porque se o desenvolvimento é maior, aumentam também a renda per capita e o poder de consumo, gerando uma quantidade maior de resíduos sólidos. A diferença na composição do lixo dos norte-americanos em relação ao lixo brasileiro é que eles geram menos resíduos sólidos orgânicos, enquanto no Brasil mais da metade do lixo é composto por matéria orgânica, em grande parte resul- tante do desperdício de alimentos. Entende-se por lixo os restos das atividades humanas, considerados pelos geradores como inúteis, indesejáveis ou descartáveis. Normalmen- te, apresentam-se sob estado sólido, semissólido ou semilíquido. Podem originar-se da indústria, dos serviços públicos e das atividades domésticas. Em todos os locais onde há consumo de recursos naturais, há geração de resíduos sólidos. O que é resíduo sólido ou lixo? Resíduos sólidos e cidadania 36 Tipos de resíduos sólidos Os resíduos sólidos podem ser classificados conforme diferentes critérios, entre os quais sua natureza física, composição química, origem, riscos à saúde, entre outros. Quanto à natureza física, podem ser classificados em seco, como as aparas de papel produzidas na fabricação de material impresso; ou molhado, como no caso dos restos de alimentos produzidos por restaurantes e outros estabelecimentos que servem alimentos processados. Em relação à composição química, os tipos mais usualmente reconhecidos são o lixo orgânico, formado por resíduos de vegetais, alimentos e animais, e o inorgâni- co, com materiais industrializados pelo homem, como plásticos, papéis e metais. Os resíduos podem ainda ser categorizados conforme o respectivo risco que apresentam ao meio ambiente. Os lixos considerados perigosos possuem uma ou mais das seguintes características: inflamabilidade, corrosividade, reatividade, to- xicidade e patogenicidade. São exemplos de resíduos sólidos potencialmente peri- gosos as pilhas, baterias, lâmpadas fluorescentes e frascos de aerossóis. Os resíduos chamados de não perigosos não oferecem nenhum risco direto à saúde humana e nem ao ambiente, pois não introduzem substâncias químicas estranhas a ele. Quanto à origem, os resíduos sólidos podem ser classificados da seguinte forma: Domiciliares – Originados da vida diária nas residências, compostos ba- sicamente por restos de alimentos, papéis (revistas, jornais e embalagens), vidros, latas, papel higiênico e outros itens, como pilhas e lâmpadas. Comerciais – Originam-se dos estabelecimentos comerciais, como lo- jas, bancos, supermercados, restaurantes, entre outros – sendo os mais comuns os papéis e plásticos. Podem apresentar outros itens, como papel higiênico e restos de alimentos. Públicos – Originam-se dos serviços de limpeza das vias e locais públi- cos e geralmente contêm restos de podas e folhas de árvores, material retirado da limpeza de galerias, córregos, terrenos, praias, restos de feiras livres e animais mortos. Hospitalares – Resultam de materiais usados no tratamento da saúde, sendo representado por seringas, agulhas, gazes, bandagens, algodões, sangue, luva descartável, remédios com prazo de validade vencido, filmes fotográficos de raio X, entre outros. Esse tipo de material é classificado como resíduo séptico, pois tem grande potencial de contaminação do am- biente com patógenos e substâncias tóxicas. Os outros resíduos, como restos de alimentos, papéis e plásticos, podem ser tratados normalmente, desde que não entrem em contato com os resíduos sépticos. Industriais – Bastante variados, dependendo da natureza da atividade industrial, podendo conter cinzas, lodos, óleos, resíduos alcalinos ou áci- Resíduos sólidos e cidadania 37 dos, plásticos, papéis, madeiras, fibras, pigmentos, borrachas, metais, vidros e cerâmicas. É comum entre os resíduos industriais a presença de substâncias tóxicas. Agrícolas – São resíduos provenientes das atividades agrícola e pecu- ária. Além dos restos da colheita, existem as embalagens de rações, de defensivos agrícolas e de fertilizantes. Nesse caso, também são conside- rados materiais tóxicos. Entulhos – Vêm da construção civil e são compostos por restos de de- molição, obras e escavações. A maioria dos resíduos da construção civil é passível de reaproveitamento; porém, materiais como amianto, tintas e solventes são tóxicos e merecem atenção especial. A coleta e disposição final dos resíduos domiciliar, comercial e pú- blico são de responsabilidade das prefeituras municipais. Já os resíduos dos serviços de saúde, industrial, agrícola e os entulhos são de respon- sabilidade de quem produz, ou seja, cada um é responsável pelo seu lixo, coletando, armazenandoe tratando adequadamente esses resíduos. Em casa ou no local de trabalho, os responsáveis pela separação e destinação adequada do lixo somos nós, antes mesmo de entregarmos ao caminhão de coleta. Resíduos de origem orgânica devem ser separados dos resíduos recicláveis, assim como os resíduos tóxicos – pilhas, lâmpadas, restos de tintas e medicamentos vencidos. Se a cidade onde você mora não tem coleta seletiva, procure sua asso- ciação de bairro ou o representante de sua região no poder legislativo municipal, para propor medidas que minimizem o impacto desses resíduos na cidade. Formas de disposição final dos resíduos sólidos Os resíduos sólidos, mesmo quando coletados adequadamente pelo Poder Público municipal, provocam impactos sobre o ambiente pela necessidade de um local para sua disposição final. As formas mais comuns de disposição final são os chamados lixões ou aterros sanitários. Outras formas de tratar o lixo são a com- postagem, a reciclagem e a incineração. Porém, para que possam ser eficientes, é necessária a coleta pela prefeitura e, quando não ocorre, a população vê os detritos se acumulando em terrenos baldios e no leito dos rios, com consequências para a saúde dos próprios responsáveis pela produção do lixo. No Brasil, a coleta do lixo cobre cerca de 70% da população das áreas ur- banas, em média; enquanto no Distrito Federal apenas 1,4% dos domicílios não tem coleta de lixo, no Maranhão essa taxa é de 67,5% dos domicílios. Nos estados do Sul, Sudeste e Centro-Oeste, a coleta do lixo atinge um percentual maior da população, sendo a média de domicílios sem coleta de lixo nessas regiões de 12%. Nas regiões Norte e Nordeste, essa média é de 42%. A maior parte do lixo, cerca de 76%, mesmo coletado pela prefeitura, é dis- posto em lixões a céu aberto, 13% vai para aterros controlados e 10% para aterros Quem são os responsáveis pelos resíduos sólidos? Resíduos sólidos e cidadania 38 sanitários. A compostagem e a incineração não são práticas usuais em nosso país, representando juntas apenas 1% do destino final do lixo. Observe a Tabela 1, que relaciona a situação do lixo com a densidade demográfica e o nível de renda dos habitantes do planeta. Quadro 1 – Situação mundial do lixo conforme diferentes características socioeconômicas de países do mundo Japão, Alemanha, Bélgica e costa leste dos Estados Unidos Canadá, interior dos Estados Unidos e países nórdicos Cidades na Índia, China, Egito Áreas rurais da África e de algumas regiões da América Latina Densidade demográfica alta alta alta baixa Renda per capita alta alta baixa baixa Geração de lixo (per capita) alta alta média baixa Característica do lixo alto teor de embalagens alto teor de embalagens; grande quantidade de resíduos de jardinagem teor médio de embalagens e grande quantidade de restos de alimentos alto teor de restos de alimentos Coleta do lixo total (programas de coleta seletiva) total inadequada inadequada Destinação final do lixo incineração para gerar energia; aterro sanitário com controle ambiental aterro sanitário; algumas iniciativas de reciclagem; compostagem lixão (há a preocupação em criar aterros sanitários); reciclagem lixão (D ’A L M E ID A ; V IL H E N A , 2 00 0, p . 5 ) Formas mais usuais de disposição final dos resíduos sólidos Lixões Os lixões são a pior forma de disposição final dos resíduos sólidos, pois o lixo é jogado diretamente sobre o solo, a céu aberto. Os problemas ambientais causados por essa disposição são a poluição da água, do ar e do solo. Ainda exis- tem os problemas relacionados à saúde pública, pois além da contaminação am- biental que afeta diretamente a população, os lixões são locais de disseminação de diversos vetores de doenças, por exemplo, baratas, moscas e ratos. O principal agente contaminante é o chorume – líquido escuro gerado da de- composição da matéria orgânica, cuja composição é variável e depende das condi- ções locais e das características dos resíduos. Ele pode conter metais pesados que, Resíduos sólidos e cidadania 39 associados aos compostos altamente solúveis do chorume, contaminam os solos, a água e consequentemente toda a cadeia alimentar, incluindo o homem. Aterros Existem três tipos diferentes de aterros: os sanitários, os controlados e os industriais. Os aterros sanitários são locais especialmente projetados para receber resíduos sólidos de origem domiciliar. Os terrenos recebem um tratamento de impermeabilização para evitar que o chorume penetre no solo e contamine as águas. Os resíduos depositados são compactados e recobertos por camadas de terra. O projeto inclui a drenagem da água, captação e tratamento do chorume, além da captação e tratamento dos gases que se originam da decomposição dos resíduos, entre eles, o metano e o dióxido de carbono, os quais contribuem para o aquecimento global. Hoje, pode-se transformar o metano em energia elétrica. Por causa dos impactos ambientais e dos conflitos com a vizinhança, é difícil de se conseguir um local para a construção de aterros. Os aterros controlados nada mais são do que lixões que passaram por certas adequações operacionais. Normalmente não atendem às especificações técnicas de controle de poluição, pois o terreno não é impermeabilizado como acontece nos ater- ros sanitários. Também não apresentam tratamento do chorume e nem dos gases. Os aterros industriais são locais especialmente projetados para receber os resíduos industriais perigosos. Devem garantir que esses resíduos não causem danos à saúde pública e ao ambiente. No Brasil, nem todos os rejeitos industriais são adequadamente tratados, e ainda não se sabe quais serão exatamente as con- sequências desse descaso. Incineração Na incineração, os resíduos sólidos são queimados em temperaturas acima de 800ºC. Esse processo gera poluentes sólidos (cinzas), líquidos (lamas) e gasosos, tendo, como as demais formas de disposição final, um certo impacto ambiental. As cinzas devem ser destinadas a aterros de resíduos perigosos, e a emissão de gases deve ser controlada por filtros. Além da geração de poluentes, a incineração tem a desvantagem de ser um processo de alto custo de implantação e de operação. Por outro lado, durante a queima, pode ser gerada energia elétrica ou térmica. Com a incineração, há uma redução de 70% da massa e de 90% do volume dos resíduos, fazendo-se assim uma economia de espaço nos aterros. Outra van- tagem é a esterilização dos resíduos, destruindo-se bactérias e vírus. Por isso, a incineração é recomendada no tratamento dos resíduos hospitalares. Compostagem O processo de compostagem consiste na decomposição da matéria orgânica pela ação de agentes biológicos microbianos na presença de oxigênio, necessi- tando de condições físicas e químicas adequadas para levar à formação de um produto de boa qualidade, chamado de composto. Pode ser uma alternativa para a destinação final dos resíduos orgânicos, sendo utilizada no meio rural há mui- to tempo. Nesse processo, a matéria orgânica é decomposta, gerando composto Resíduos sólidos e cidadania 40 orgânico que pode ser utilizado como fertilizante, melhorando as características de solos empobrecidos. Em um país como o nosso, onde mais de 50% do lixo é matéria orgânica, a compostagem reduz o volume desse tipo de lixo destinado aos aterros, aumentando a vida útil destes. A compostagem pode ocorrer por dois métodos: o natural e o acelerado. Natural – a parte orgânica do lixo é disposta em pilhas sobre o solo; a aeração é necessária para fornecer oxigênio aos micro-organismos, e esta é conseguida através de revolvimentos periódicos. O processo todo leva de três aquatro meses. Acelerado – as pilhas de lixo orgânico são dispostas sobre tubulações que forçam a aeração. Também se pode utilizar reatores nos quais a ma- téria orgânica passa no sentido contrário ao da corrente de ar. Depois de cerca de quatro dias sobre a tubulação ou no reator, a matéria orgânica é disposta em pilhas e o processo segue como no método natural. O tempo total desse método é de dois a três meses. É importante ressaltar que a compostagem também produz chorume e os efluentes também devem ser tratados adequadamente, para que não haja contami- nação da água. No Brasil, algumas cidades possuem usinas de compostagem pelo método acelerado. Entre elas estão: Boa Vista (RO), Belém (PA), Belo Horizonte e Ube- raba (MG), Rio de Janeiro (RJ), São José dos Campos, Santo André e São Paulo (SP). Muitas usinas pararam de funcionar principalmente por mau planejamento. A implementação e a operação de uma usina de compostagem são proces- sos caros. Ela não vai trazer “lucro” para o município. Na verdade, o mercado de compostos e dos materiais recicláveis não chega a cobrir os custos financeiros de uma usina de triagem e compostagem. Porém, os benefícios diretos relacionados ao aumento da vida útil de um aterro, de uma produção mais baixa de chorume e gases, da diminuição do consumo de matérias-primas, energia e água, além da redução da poluição ambiental, justificam a implantação de uma usina de benefi- ciamento do lixo reciclável e de compostagem para os resíduos orgânicos de um município. Coleta seletiva A coleta de lixo seletiva é um processo de recolhimento de produtos reci- cláveis, como papéis, vidros, metais, plásticos e orgânicos, que são previamente separados pelos geradores. Ela auxilia o trabalho nas usinas de triagem de lixo, além de os materiais poderem ser vendidos às indústrias recicladoras. A separação do lixo por categorias agiliza o processo de reciclagem dos materiais, reduzindo assim o consumo dos recursos naturais. Vários municípios brasileiros já contam com um programa de coleta de lixo reciclável separadamente do lixo comum. Essa consciência também se reflete nas famílias de baixa renda que hoje sobrevi- vem da catação de lixo reciclável. Resíduos sólidos e cidadania 41 IE SD E B ra si l S .A . O lixo que machuca O trabalho de coleta do lixo é indispensável para manter a boa qualidade de vida nas cidades; cada coletor de lixo recolhe uma média de 4 a 6 toneladas de resíduos sólidos por dia. Expostos aos perigos do trânsito e à discriminação das pessoas, os coletores ainda precisam se cuidar na hora de recolher o lixo, pois quando mal acondicionado pode causar ferimentos e doenças. O que mais aconte- ce são cortes e perfurações nas mãos, em função de vidros e materiais cortantes mal acondicionados em sacos plásticos ou espalhados pela rua. Observe algumas dicas que podem ajudar no trabalho do coletor, e diminuir assim os riscos de acidentes. Evite jogar lixo nos terrenos próximos à sua casa. Recolha o lixo e acon- dicione em sacos plásticos. Evite o desperdício, reutilizando embalagens quando possível. Dessa forma, você contribui também para a diminuição do volume de lixo co- letado diariamente. Ensine as crianças a acondicionar o lixo e a jogar os papéis de balas e chocolates nas lixeiras. Leve o lixo com você, na bolsa ou no bolso, até encontrar o recipiente adequado. Procure saber a hora que o coletor passa pela rua e coloque o lixo nesse horário. É proibido colocar lixos nas calçadas antes da hora da coleta. Resíduos sólidos e cidadania 42 Não queime o lixo, pois ele pode soltar gases tóxicos e prejudiciais à sua saúde. Todo o lixo que incluir agulhas, latas, material cortante e perfurante em geral, deve ser acondicionado em papel ou em recipientes com tampas, como as latas de biscoito ou leite em pó. Evite estacionar veículos em frente aos pontos de disposição de lixo pela população, pois dificulta o trabalho dos coletores de lixo e aumenta a sua carga de trabalho. Evite pendurar sacos de lixo em portões, grades ou árvores, pois o co- letor de lixo terá de realizar um grande esforço para realizar a coleta desses sacos. Evite a utilização de sacos muito grandes, pois ficam muito pesados, especialmente se houver resíduos como terra, entulhos etc. Procure na sua cidade, através da prefeitura ou das empresas que rea- lizam a coleta de lixo, se há algum tipo de serviço especial para coleta de objetos grandes ou bagulhos, tais como mesas, vasos sanitários, pias, televisões etc. Não jogue pilhas e baterias no lixo, pois elas contêm substâncias tóxicas prejudiciais à saúde de todos. As pilhas e baterias já utilizadas devem ser entregues aos estabelecimentos que as comercializam ou à rede de assistência técnica autorizada para repasse aos fabricantes ou importado- res, para que estes adotem os procedimentos de reutilização, reciclagem, tratamento ou disposição final adequada. Mantenham os cães presos para evitar ataques e agressões aos coletores de lixo no momento da coleta. Aguarde o término da limpeza das ruas de feira para poder transitar com os veículos. Não esperar pode provocar o atropelamento dos cole- tores de lixo. A produção, coleta e disposição final do lixo nas grandes cidades, nas in- dústrias e no meio rural são questões que devem receber uma atenção especial de cada cidadão, assim como do Poder Público. Aos cidadãos cabe a função de redu- zir o consumo de produtos que gerem lixo, separar e acondicionar adequadamente o lixo produzido e atuar conscientemente, no sentido de cobrar do Poder Público a destinação correta dos resíduos. Ao Poder Público, além da regulamentação de todos os processos relacionados ao lixo, cabe implantar um sistema eficiente de coleta seletiva e destinação final dos resíduos, levando em consideração sua ori- gem e as respectivas características físicas e químicas. Resíduos sólidos e cidadania 43 Central de Moagem de Entulhos (UNILIVRE, 2005) Objetivos: reduzir a deposição de sobras de materiais da indústria da construção civil em fundos de vales, e reciclar esse material para a confecção de blocos, bloquetes e canaletas de concreto. A grande quantidade de sobras de materiais da indústria da construção civil, cerca de 400 toneladas ao dia, constituía um grave problema ambiental para o município de Londrina (PR). A maior parte desses rejeitos eram sistematicamente abandonados em terrenos baldios e fundos de vale, promovendo a poluição e assoreamento dos leitos dos ribeirões que cortam o município. A Central de Moagem de Entulho, instalada pela AMA – Autarquia do Meio Ambiente, numa antiga pedreira da prefeitura, em uma área de aproximadamente 174 mil metros qua- drados, com um custo de instalação de 180 mil reais, processa diariamente cerca de 25 a 30% do total de entulhos produzidos na cidade. Com o material produzido através da reciclagem – areia, pedrisco e brita de várias granulometrias – são fabricados, no mesmo local, os blocos, bloquetes e as canaletas de concreto. Esses produtos estão sendo utilizados na construção de casas populares, como parte do Pro- grama Morar Melhor, desenvolvido pela AMA em parceria com a Cohab-LD, com o objetivo de reurbanizar as favelas do município, além da urbanização de parques e praças públicas. A produção média da Central de Moagem de Entulhos é de aproximadamente 1 200 blocos por dia, quantidade equivalente a 100 metros quadrados de construção. Com a conclusão da ampliação dessa central, a capacidade de produção aumentará, possibilitando ainda uma diversificação na produção, com o desenvolvimento de novos produtos. A Central de Moagem de Entulhos é uma usina com capacidade inicial de britagem de 100 a 120 toneladas diárias de rejeitos da indústria da construção civil, resultante da demolição e das sobrasde obras, tais como argamassas, materiais de alvenaria, concreto não estrutural, ma- teriais cerâmicos e outros. O entulho da construção civil é previamente coletado e transportado por caminhões com dispositivos poliguindastes, para transporte de caçambas estacionárias até a Central de Moagem de Entulhos. Esse transporte é realizado por empresas particulares, sendo seu custo de responsa- bilidade do gerador dos entulhos. No pátio de recebimento, os entulhos são descarregados em pilhas de acordo com uma pré-classificação quanto à natureza do material e sua destinação final. Posteriormente, esse material passa por um processo de triagem manual, em que são separados os materiais plás- ticos, metálicos, a madeira e o vidro, que recebem uma destinação adequada, sendo também encaminhados para reciclagem. Resíduos sólidos e cidadania 44 Máquinas operatrizes, como pá carregadeira e retroescavadeira, realizam a remoção e o transporte dos entulhos, já triados e classificados, até o alimentador vibratório, responsável pela separação inicial do material mais fino e pela alimentação do britador de mandíbulas, que realiza a primeira etapa de moagem, em que ocorre a primeira redução da granulometria dos entulhos. Os entulhos britados são transportados por uma transportadora de correia e depositados na porção superior de um silo metálico, que descarrega os entulhos na calha vibratória que, por sua vez, alimenta o moinho de martelos. Nesse moinho, os entulhos britados são mais uma vez desagregados e particulados, tendo novamente a sua granulometria reduzida. Finalmente, o ma- terial proveniente do moinho de martelos é transportado por uma transportadora de correia até o sistema rotativo de peneiras, onde é classificado de acordo com sua granulometria em areia, pedrisco, brita 1, brita 2 e brita 3. As britas 2 e 3 são novamente encaminhadas ao início do processo para uma nova britagem. Uma vez terminado o processo de moagem, a areia e o pedrisco são transportados até o local de instalação das máquinas para a moldagem dos blocos. Atualmente, esse transporte ainda é feito com máquinas operatrizes, mas com a ampliação e a readequação espacial da Central de Moagem de Entulho, este passará a ser feito por calhas. No local de instalação das máquinas para a moldagem dos blocos, o material – areia e pe- drisco – é misturado a água e cimento, e a massa de concreto é moldada. De acordo com o tipo de forma utilizada, são produzidos blocos, bloquetes e canaletas de concreto. A Central iniciou sua produção com mais de 1 000 tijolos por dia, destinados para a cons- trução de casas populares, e que são produzidos até hoje. Além do reaproveitamento, os quase 4 000 pontos de despejos de entulho detectados no município foram praticamente extintos. Hoje chegam à Central cerca de 100 caminhões de entulho por dia – 300 toneladas em média (das cerca de 400 toneladas produzidas diariamente na cidade); 10 a 15% delas são processa- das e viram brita, e o restante é reaproveitado em pavimentações diversas, como calçamento de praças e logradouros públicos. 1. Forme grupos de até cinco pessoas com seus colegas para fazer uma avaliação do lixo produzi- do na sua casa e no seu ambiente de trabalho. Procure monitorar a produção de lixo diária por, no mínimo, uma semana, separando o material nas seguintes categorias: papel, plástico, vidro, metal e orgânico. Junte o material de cada categoria ao final do período monitorado e procure um local para fazer a pesagem, que pode ser uma farmácia, um armazém ou uma usina de reci- clagem, caso sua cidade tenha uma. Resíduos sólidos e cidadania 45 1.1. Reúna as informações do grupo e obtenha os seguintes indicadores: a) distribuição proporcional das diferentes categorias de lixo; b) produção média diária de lixo per capita; c) produção média diária per capita por categoria. 1.2. Faça uma comparação entre a produção de lixo no ambiente doméstico e no ambiente de trabalho, considerando as diferentes categorias de lixo. 2. Discuta os resultados no grupo, prepare uma apresentação sintética sobre essa discussão e apresen- te para o restante da turma. Solicite a um membro do grupo que relate os aspectos mais impor- tantes da discussão para incorporar ao trabalho final. 3. Organize uma rodada de discussões com seus colegas sobre experiências na sua escola, na sua comunidade ou na sua casa, sobre a separação, reutilização e reciclagem do lixo. Procure organizar as experiências relatadas em um quadro e avalie as possibilidades de adotar as ações bem-sucedidas. D’ALMEIDA, Maria Luiza Otero; VILHENA, André (Coord.). Lixo Municipal: manual de gerencia- mento integrado. 2. ed. São Paulo: IPT/Cempre, 2000. (Publicação IPT 2.622). Trata-se de uma excelente publicação informativa sobre resíduos sólidos no ambiente urbano, com orientações técnicas destinadas à coleta, transporte e disposição final do lixo, além de muita informação sobre a reciclagem de diferentes tipos de materiais. Apresenta ainda uma coletânea de leis que disciplinam a questão do lixo nos municípios, servindo como uma boa referência no assunto. Há a possibilidade de acessar o site do Cempre – Compromisso Empresarial pela Reciclagem – onde informações atualizadas sobre o tema estão à disposição, de forma rápida e confiável. O endereço é <www.cempre.org.br>. Site eletrônico do Ministério das Cidades: <www.cidades.gov.br>. Site oficial do Ministério no qual é possível encontrar várias informações sobre ações de coleta e destinação dos resíduos sólidos, saneamento e demais atribuições do Poder Público municipal em diferentes regiões brasileiras. Permite acesso a programas governamentais, possibilidades de finan- ciamentos e parcerias voltadas à gestão municipal dos resíduos sólidos. Resíduos sólidos e cidadania 46 Resíduos sólidos e cidadania II A população mundial em notável crescimento e o consequente aumento no uso dos recursos naturais têm gerado uma quantidade cada vez maior de resíduos sólidos, de diferentes naturezas, genericamente chamados de lixo. Mesmo as projeções mais otimistas apontam para cenários futuros, nos quais essa questão é decisiva para a manutenção da qualidade de vida do homem, não havendo outra alternativa viável que não seja reduzir a quantidade de resíduos produzidos, reutilizar tudo o que for possível e, principalmente, reciclar o lixo que pode ser utilizado em novos produtos. É o que se conhece popularmente como “os três Rs”: Reduzir, Reutilizar e Reciclar. Há quem acrescente a essa tríade mais dois Rs, que todo educador deve con- siderar. Os cinco Rs são: Repensar hábitos e atitudes; Reduzir o consumo e diminuir a geração e o descarte de resíduos sólidos; Reutilizar para aumentar a vida útil de cada produto; Reciclar para transformar o resíduo em um novo produto; Recusar produtos que agridam a saúde e o ambiente. No Brasil, o lixo coletado diariamente é de cerca de 228 mil toneladas. De todo esse lixo, apenas 4% é reciclado e, do restante, 20% é jogado em rios e várzeas. Apenas 8% dos municípios brasileiros têm programas de coleta seletiva de lixo. O Quadro 1 mostra a proporção de resíduos sólidos de diferentes naturezas que são re- ciclados no Brasil. Embora alguns materiais tenham percentuais relativamente altos de reciclagem (como o alumínio), outros ainda têm muito a crescer nesse sentido, seja porque ainda não têm um valor de mercado atraente para investidores, como o PET, seja porque a tecnologia disponível para a reciclagem ainda é pouco difundida e empregada, como é o caso das embalagens longa vida. Percebe-se também que os materiais com maior percentual de reciclagem são aqueles que têm maior valor no mercado de recicláveis, como as latas de alumínio e alguns tipos de papel. Resíduos sólidos e cidadania II 48 O que é reciclagem? Quadro 1 – A reciclagem noBrasil – Porcentagem de lixo reciclado D is po ní ve l e m : < w w w .c em pr e. or g. br >. Papel branco 41% Papel ondulado 77,3% Plástico filme 17,5% Plástico rígido 17,5% PET 35% Alumínio 87% Latas de aço 45% Vidro 44% Pneus 57% Longa vida 15% Reciclagem é um conjunto de técnicas que têm por finalidade aproveitar os detritos e reutilizá-los no ciclo de produção de que saíram. É o resultado de uma série de atividades, pela qual materiais que se tornariam lixo, ou estão no lixo, são desviados, coletados, separados e processados para serem usados como matéria- -prima na manufatura de novos produtos. A coleta seletiva A coleta seletiva é o recolhimento dos resíduos sólidos previamente sepa- rados por categorias, de acordo com sua composição química. Ela se inicia com a separação do lixo, que é feita pelos próprios geradores ou pelos catadores de materiais recicláveis. É parte do processo de reciclagem, pois após a coleta os materiais estão prontos para serem vendidos às centrais, indústrias que fazem o reaproveitamento do material. Para o município, a coleta seletiva e adequada destinação final do lixo não podem ser vistas como atividades lucrativas. O tratamento dos resíduos sólidos deve ser implantado com base em seus benefícios sociais e ambientais, entre os quais podem ser destacados: redução de custo com aterros sanitários ou incineração; aumento da vida útil dos aterros sanitários; diminuição de gastos com áreas degradadas pelo mal acondicionamento do lixo; conscientização da população sobre o meio ambiente; uma comunidade mais educada, o que representa uma economia de re- cursos gastos com limpeza pública; melhoria das condições ambientais e de saúde pública do município; Resíduos sólidos e cidadania II 49 geração de empregos diretos e indiretos, com consequente resgate social dos catadores de lixo. Os catadores de materiais recicláveis (BESEN, 2005, p. 320) A reciclagem no Brasil sempre foi sustentada pelos catadores informais de lixo nas ruas e nos lixões. Estima-se que existam mais de 200 mil catadores de rua e mais de 40 mil pessoas vivendo diretamente da catação em lixões. Esses catadores sempre ajudaram a promover a limpeza das cidades e a pro- teção do meio ambiente, sem nenhum tipo de reconhecimento da sociedade. Nos últimos dez anos, os catadores começaram a se organizar em cooperativas e associações com o apoio de instituições da sociedade civil e de prefeituras. Criaram o Movimento Nacional dos Catadores. Hoje, são conhecidos como agentes de limpeza pública e reconhecidos pelo Ministério do Trabalho como uma categoria, a de catadores de materiais recicláveis. A coleta seletiva pode ser feita porta a porta, assim como acontece com a coleta normal. Outra forma é a coleta seletiva voluntária, na qual a população de- posita seu lixo em recipientes específicos, dispostos em pontos da cidade denomi- nados pontos de entrega voluntária (PEVs) ou locais de entrega voluntária (LEVs). Nesses pontos, recipientes (lixeiras) com cores específicas e simbologia adequada auxiliam o cidadão a depositar seu lixo. O sucesso da coleta seletiva está relacio- nado com a sensibilização ambiental da população. IE SD E B ra si l S .A . Resíduos sólidos e cidadania II 50 Identificação dos materiais recicláveis Para identificar os materiais recicláveis, há uma padronização das cores dos recipientes de coleta. Também existem símbolos que podem ou não estar associa- dos com as cores. Observe no quadro abaixo o padrão de cores e símbolos adota- dos nessa identificação. Quadro 2 – Cores e símbolos para identificação de materiais recicláveis D is po ní ve l e m : < w w w .a m bi en te br as il .c om .b r> . Cor Material Simbologia Azul Papel/papelão Vermelho Plástico Verde Vidro Amarelo Metal Preto Madeira Laranja Resíduos perigosos Branco Resíduos ambulatoriais e de serviço de saúde Roxo Resíduos radioativos Marrom Resíduos orgânicos Cinza Resíduo geral não reciclável ou misturado, ou contaminado não passível de separação Um trabalho de conscientização da população é fundamental para que os produtos provenientes da reciclagem sejam “comprados”. Caso contrário, sem mercado não haverá mais estímulo para os catadores e para as indústrias recicla- doras. Um dos produtos que tem mercado certo é a latinha de alumínio. Com o preço do alumínio e a queda de oferta de matéria-prima de primeira mão, as latas de alumínio são as mais coletadas pelos catadores. Uma lata de alumínio é 100% reciclável e tem um ótimo preço no mercado de recicláveis. Resíduos sólidos e cidadania II 51 Tabela 1 – Mercado nacional de recicláveis (cotação)1 Valor mínimo R$/tonelada Valor máximo R$/tonelada Valor médio R$/tonelada Papelão 150 320 218 Papel branco 60 450 264 Latas de aço 40 420 214 Alumínio 1.500 5.000 3.145 Plástico rígido 200 750 438 PET 150 1.500 952 Plástico filme 10 800 391 Longa vida 50 280 131 Vidro incolor 10 160 93 Vidro colorido 10 120 68 D is po ní ve l e m : < ht tp :// w w w .c em pr e. or g. br /m er ca do .p hp >. Reciclagem Reciclagem de papel No Brasil, cerca de 99% da pasta celulósica utilizada na fabricação do papel vem da madeira, e o restante vem de materiais como sisal, bambu e línter2 de algo- dão. A pasta celulósica pode ser produzida a partir do próprio papel, ou seja, a partir da reciclagem. No entanto, o papel não é infinitamente reciclável, pois com seu pro- cessamento as fibras perdem qualidade. Os principais fornecedores de papel para a reciclagem são a indústria e o comércio, representando 86%, e o lixo domiciliar 10%. Reciclar papel é importante para evitar que mais árvores sejam cortadas. Outro ponto importante a ser abordado é a diminuição do consumo de papel e o desperdício. Alguns papéis não podem ser reciclados, são eles: papel vegetal, papel im- pregnado com substâncias impermeáveis (resina sintética, betume etc.), papel- carbono, papel sanitário usado (essa categoria inclui o papel higiênico, papel toa- lha, guardanapo e lenço de papel), papel sujo, engordurado ou contaminado com produtos químicos nocivos à saúde, certos tipos de papel revestidos (com parafina ou silicone). Nesse caso, os papéis são mandados para os aterros sanitários. Reciclagem de plástico Plásticos são produtos obtidos a partir do petróleo. Embora apresentem pou- ca massa, isto é, cerca de 4 a 7% da massa total do lixo, eles ocupam muito espaço, representando de 15 a 20% do volume do lixo. Isso dificulta sua disposição nos aterros, pois ocupam mais espaço, prejudicando a compactação da camada de lixo. Além disso, por serem impermeáveis, dificultam a decomposição da matéria orgânica. Os plásticos também não devem ser queimados, pois o produto final de sua combustão são gases poluentes e tóxicos. Um exemplo é o PVC ou policloreto 1 Os valores são os pratica-dos por programas de co- leta seletiva ou catadores nas cidades de Rio Branco (AC), Itabira e Lavras (MG), Pau- la Freitas (PR), Petrópolis, Rio de Janeiro e São José do Vale do Rio Preto (RJ), Nova Odessa, Quintana, Santo An- dré, Santos, São Bernardo e São José dos Campos (SP). 2 A parte da fibra que fica fortemente aderida à se- mente. Para se obter o línter, é preciso submeter o caroço do algodão, separado da fi- bra, a um segundo processo, chamado de deslinteração. É utilizado para encher col- chões, travesseiros e almofa- das, para fazer fios de alguns tipos de tapetes, na produção de celulose, na indústria têx- til (rayon e algodão artificial) e na indústria de verniz, entre outras. É ainda matéria bási- ca da elaboração do algodão absorvente, bem comodo algodão para fins cirúrgicos. Na indústria bélica, é em- pregado na preparação de pólvora, pois dele se obtêm explosivos. Resíduos sólidos e cidadania II 52 de vinila, aquele que usamos como filme plástico na cozinha. A queima do PVC gera dioxinas que são substâncias tóxicas e cancerígenas, e junto há a liberação de cloro, o qual pode originar o ácido clorídrico, que é bastante corrosivo. A re- ciclagem dos plásticos traz várias vantagens, como a redução do volume de lixo encaminhado aos aterros, economia de energia e petróleo, geração de empregos, a redução de cerca de 30% no preço de produtos de plástico reciclado, além das melhorias ambientais, como redução do consumo de energia, água e petróleo. Isso evita que os plásticos fiquem no ambiente até serem totalmente degradados, o que poderia causar a morte de animais que os ingerem por tomá-los como presas, como é o caso dos peixes, que comem plástico por ser semelhante às algas. Os plásticos são divididos em duas categorias mais importantes. Termofixos – Representam 20% do consumo, e são os que não permitem reciclagem, pois não se fundem novamente (ex.: EVA ou poliacetato de etileno vinil, material bastante utilizado hoje para artesanato). Apesar de não permitirem reciclagem, ainda podem ser utilizados em outras aplica- ções, por exemplo, condicionadores de asfalto. Termoplásticos – Os mais utilizados e podem ser reciclados várias ve- zes. Nessa categoria, estão os polietilenos de baixa e de alta densidade (PEBD e PEAD), o policloreto de vinila (PVC), o poliestireno (PS), o polipropileno (PP), o politereftalato de etileno (PET) e as poliamidas (náilon). Quadro 3 – Tipos de plástico Artefato Tipo de plástico Baldes, garrafas de álcool PEAD Condutores para fios e cabos elétricos PVC, PEBD, PEAD, PP Copos de água mineral PP e PS Copos descartáveis (água, café etc.) PS Embalagens de massas e biscoitos PP, PEBD Frascos de detergente e produtos de limpeza PP, PEAD, PEBD, PVC Frascos de xampu e artigos de higiene PEBD, PEAD, PP Gabinetes de aparelho de som e TV PS Garrafas de água mineral PVC, PEAD, PET, PP Garrafas de refrigerante PET (o rótulo é de PEBD e a tampa em PP) Garrafões de água mineral PVC, PEAD, PP Isopor PS Lonas agrícolas PVC, PEAD, PEBD Potes de margarina PP Sacos de adubo PEBD Sacos de leite PEBD Sacos de lixo PEBD, PEAD, PVC D is po ní ve l e m : < w w w .c em pr e. or g. br /m er ca do .p hp >. Resíduos sólidos e cidadania II 53 Artefato Tipo de plástico Sacos de ráfia PP Tubos de água e esgoto PVC, PP OU PEAD Reciclagem de metais Os metais podem ser ferrosos, como o ferro e o aço, ou não ferrosos, como alumínio, cobre e suas ligas, chumbo, zinco e níquel. Eles podem ser fabricados de duas maneiras: a partir do minério ou a partir da sucata. O primeiro processo é mais dispendioso, pois consome mais energia para transformar o minério em metal. Na reciclagem do alumínio, utiliza-se 20 vezes menos energia em relação à quantidade necessária para utilização da matéria-prima virgem. Reciclagem de vidro O vidro é um produto obtido da fusão de compostos inorgânicos, sendo seu principal componente a sílica (SiO2). Ele pode ser reutilizado inúmeras vezes, pois permite a esterilização em altas temperaturas. Também pode ser reciclado, não havendo perda de massa durante o processo (1t de caco de vidro = 1t de vidro novo = economia de 1,2t de matéria-prima virgem). Os vidros levam muito tempo para se decompor, mais de 1 milhão de anos, e com isso geram problemas de espaço nos aterros. Sua reciclagem tem ainda como ponto benéfico a redução do uso de energia. Alguns tipos de vidro não podem ser reciclados, como espelhos, vidros de janelas e box de banheiro, vidros de automóveis, cristais, lâmpadas, tubos de televisão, válvulas, ampolas de medicamentos e os vidros temperados de uso doméstico. Já existem recursos para se reciclar o vidro das lâmpadas. Para isso, é neces- sário que o gás de mercúrio existente nelas seja retirado e tratado adequadamente, para que não polua o ambiente. Reciclagem das embalagens de agrotóxicos As embalagens plásticas utilizadas com agrotóxicos não devem ser reutili- zadas, pois os resíduos de agrotóxicos podem contaminar os produtos colocados nessas embalagens. A legislação, através da Lei Federal 9.974/2000 e do Decreto 4.074/2002, proíbe qualquer reutilização da embalagem de agrotóxico. O agricul- tor deve lavar a embalagem três vezes após utilizar seu conteúdo (tríplice lava- gem), utilizando a água da lavagem junto com o produto para aplicação. Essa água não deve ser descartada em outro local, pois acarretará a contaminação ambiental. Após essa lavagem, a embalagem deve ser furada3 e devolvida nos postos de co- leta no prazo de até um ano após a compra. Os postos de coleta são de responsa- bilidade dos revendedores. 3 Furando-se as embala-gens, evita-se que elas sejam reutilizadas. Quais os tipos de plásticos você tem em casa? Resíduos sólidos e cidadania II 54 A parte metálica das embalagens é reaproveitada para a fabricação de verga- lhões para a construção civil, entre outros. O polietileno de alta densidade (PEAD) pode ser transformado em conduítes corrugados, barricas plásticas e bombonas para lubrificantes. O PET pode ser usado para se fazer vassouras. As tampas das embalagens são utilizadas para a fabricação de novas tampas para embalagens de agrotóxicos. Quanto tempo o lixo demora para se decompor? Matéria orgânica: 3 a 6 meses Chiclete: 5 anos Jornal: 2 a 6 semanas Papel: 1 a 3 meses Pneu: tempo indeterminado Madeira sem tratamento: 6 meses Madeira pintada: 13 anos Embalagens longa vida: até 100 anos Lata de alumínio: 100 a 500 anos Latas de conserva: 100 anos Plástico: 200 a 400 anos Vidro: tempo indeterminado, alguns comentam em cerca de 1 milhão de anos Quadro 4 – Benefícios da substituição de recursos virgens por materiais secundários Alumínio (%) Aço (%) Papel (%) Vidro (%) Uso de energia 90-97 47-74 23-74 4-32 Uso de água — 40 58 50 Poluição do ar 95 85 74 20 Poluição da água 97 76 35 — (C O R S O N , 1 99 3) Perspectivas futuras Para sermos cidadãos responsáveis, precisamos adotar práticas de recicla- gem, coleta seletiva e redução do consumo de recursos naturais, e temos que ir além: informar outras pessoas, exigir atitudes e posicionamentos dos governos, Resíduos sólidos e cidadania II 55 mostrar que somos consumidores conscientes e que queremos o melhor para nos- sa família, e principalmente para o planeta. Vale lembrar aqui novamente dos cinco Rs: Repensar, Reutilizar, Reciclar, Reduzir e Recusar. Repense seus hábitos e atitudes com relação aos recursos naturais. Procure reutilizar tudo o que ainda tiver proveito, e quando achar que não serve mais, mande para a reciclagem. Reduza o consumo dos recursos naturais no seu dia a dia e recuse produtos que agridem o meio ambiente, por eles mesmos ou devido ao seu respectivo processo de fabricação. Além disso, informe, ensine outras pessoas. Somos responsáveis pela saúde do planeta, mas temos a obrigação de agir localmente. Não podemos mudar o mundo todo de uma vez, mas podemos começar pela nossa casa, pela nossa escola ou ambiente de trabalho, pela nossa cidade. São vários os exemplos, espalhados por diferentes países, de ações que bus- cam equacionar de uma forma mais “amigável” a questão da produção de resíduos sólidos. A Suécia, somente para citar um destes, é o maior produtor mundial de veículos automotivos. Lá, as fábricas recebem de volta os carros que não estão mais em condições de trafegar e utilizam suas partes na fabricação de novos auto- móveis. O proprietário que devolver seu carro velho recebe um valor emdinheiro como premiação. Desse modo, barateia-se o custo de produção comprando-se ma- téria-prima de segunda mão, e não é preciso ter depósitos para os carros velhos. Aqui no Brasil, as bandejas de isopor4 são utilizadas pelos fumicultores para a germinação das sementes de tabaco. Depois de germinadas, as mudas são transplantadas para o campo. Dessa maneira, não é mais necessária a utilização do brometo de metila5, que antes era utilizado na prevenção das pragas. Essa é uma experiência iniciada no estado do Rio Grande do Sul e que hoje é utilizada por 90% dos produtores do país. No entanto, as bandejas que têm vida útil de três ou quatro safras estavam sendo descartadas de forma incorreta pelos produtores agrícolas. Nas últimas sete safras, utilizaram-se cerca de 6 milhões de bandejas. Com iniciativa da Associação Brasileira do Poliestireno Expandido (Abrapex), em conjunto com o Sindicato da Indústria do Fumo (Sindifumo) e com a Associação dos Fumicultores do Brasil (Afubra), as bandejas são coletadas, assim como é fei- to com as embalagens de agrotóxicos, e encaminhadas para o setor de confecção de calçados, onde são reprocessadas e utilizadas como matéria-prima para a con- fecção de solas de sapatos. “A reciclagem do material é um pleito antigo do setor fumageiro, e poderá servir de modelo para os demais países produtores”, afirma o presidente da Abrapex. O projeto já despertou interesse de outros países que enfrentam os mesmos problemas com o isopor. Outros exemplos ainda podem ser citados no Brasil: o programa Câmbio Verde e o Programa de Recolhimento das Baterias de Celular Usadas, ambos em- preendidos em Curitiba (PR). O programa Câmbio Verde começou em 1991, quando houve uma supersa- fra de produtos hortigranjeiros na região metropolitana de Curitiba. Os pequenos 4 O nome Isopor é marca re-gistrada da Knauf-Isopor e designa comercialmente o material fabricado por essa em- presa. Quimicamente, o isopor chama-se poliestireno expan- dido ou EPS (sua sigla interna- cional). 5 O brometo de metila é uma substância prejudicial à ca- mada de ozônio e seu uso está sendo banido em todo o plane- ta, pelo Protocolo de Montreal (1987). Resíduos sólidos e cidadania II 56 produtores, com dificuldade para escoar sua produção, estavam transformando seu excedente em ração e adubo orgânico. O Poder Público, então, resolveu au- xiliá-los e passou a adquirir o excedente de produção. Esses produtos são troca- dos com pessoas de baixa renda (com renda entre 0 e 3,5 salários mínimos) por lixo reciclável. Cinco quilos de material reciclável rendem um quilo de alimento. Os recicláveis são triados e vendidos e o dinheiro da venda serve para comprar mais produtos, e dar continuidade ao programa. A partir de então, pessoas que antes jogavam seu lixo em terrenos baldios e rios passaram a trocá-los por alimen- tos. Hoje, o programa já tem outras modalidades, como o Câmbio Verde na escola, que troca lixo por material escolar, por exemplo. O Programa de Recolhimento de Baterias de Celular Usadas foi iniciado em 1999, como uma parceria da organização não governamental Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS) e uma empresa de telefonia celu- lar do Paraná. As baterias passaram a ser recolhidas nas revendedoras da empresa nos estados do Paraná e Santa Catarina e no município de Pelotas, no Rio Grande do Sul. A empresa de telefonia encaminha as baterias a seus fabricantes, onde elas recebem a destinação correta, do ponto de vista ambiental. Além dos benefícios am- bientais, o programa provoca nos envolvidos a reflexão sobre o consumo consciente e o papel do cidadão na construção de um futuro melhor para todos. Conclusão A quantidade de lixo no Brasil ainda não é das maiores do mundo. No en- tanto, o exemplo dos países desenvolvidos serve de aviso para nós brasileiros. Mu- dar nossos hábitos de consumo para reduzir a quantidade de lixo mandado para os aterros e lixões é um passo importantíssimo. Escolher produtos em embalagens recicláveis e consumir apenas o necessário, além de separar o lixo e entregá-lo aos postos de coleta seletiva ou ao sistema de transporte do lixo, também devem fazer parte do dia a dia dos cidadãos. O fato de existir um símbolo de reciclável na em- balagem que você leva para sua casa não significa que ela será automaticamente reciclada, principalmente se ela for mandada junto com o lixo orgânico para um aterro ou lixão. As atitudes tomadas por nós hoje serão refletidas, no futuro, em um país mais limpo e em um ambiente mais saudável. Brasil revoluciona na reciclagem de embalagens cartonadas (CEMPRE, 2005) O dia 13 de abril de 2005 marcou a partida de uma importante contribuição do Brasil para o desenvolvimento tecnológico, o meio ambiente e a geração de emprego e renda. As empresas Resíduos sólidos e cidadania II 57 Klabin, Tetra Pak, Alcoa e TSL Ambiental inauguraram, em Piracicaba (SP), uma nova planta de reciclagem de embalagens cartonadas que utiliza tecnologia de Plasma para separação total do alumínio e do plástico. Esse processo revoluciona o modelo atual de reciclagem das caixinhas longa vida, que até então separava o papel, mas mantinha o plástico e o alumínio unidos. O embrião do projeto de Plasma nasceu no Brasil há cerca de sete anos, com uma parceria entre o Grupo de Plasma do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), da Universidade de São Paulo, e a Tetra Pak. Para a construção da planta – que é operacionalizada pela TSL Ambiental – foram investi- dos cerca de 12 milhões de reais, compartilhados entre as quatro empresas. O processo consiste em aplicar energia elétrica para produzir um jato de plasma a 15 000ºC, que aquece a mistura de plástico e alumínio. O plástico é, então, transformado em composto parafínico e o alumínio é totalmente recuperado na forma de lingotes de alta pureza. A emissão de poluentes na recuperação dos materiais é próxima a zero, e o processo apresen- ta eficiência energética de cerca de 90%. A Klabin possui uma fábrica para reciclar a camada de papel das embalagens cartonadas vizinha à planta de Plasma, e é a responsável pelo fornecimento do alumínio com o plástico. Há capacidade para processar 8 000 toneladas por ano desse material – o que equivale à reciclagem de 32 mil toneladas de embalagens longa vida. O lingote será encaminhado para a Alcoa – forne- cedora da folha fina de alumínio – e será direcionado para a produção de uma nova caixinha. Já a parafina será comercializada para a indústria petroquímica nacional e poderá ter várias utilidades, como a fabricação de detergentes. Maior valor à cadeia de reciclagem A novidade de aproximar o alumínio e o plástico de seus usos originais significa agregar valor à cadeia de reciclagem. Para se ter uma ideia, a tonelada de embalagem longa vida pós-consumo gira em torno de 250 mil reais. A partir de agora, espera-se que a tonelada possa alcançar 300 reais. “A nova planta ampliará ainda mais o volume de reciclagem das embalagens longa vida pós- -consumo”, avalia Fernando von Zuben, diretor de Meio Ambiente da Tetra Pak. Isso sem contar que a expansão da reciclagem das caixinhas também beneficiará os fabricantes de objetos feitos a partir de embalagens cartonadas, como telhas, placas e vassouras. A aliança das quatro empresas para transformar esse projeto em uma unidade de reciclagem via plasma já vinha despertando a atenção mundial antes mesmo de seu lançamento. Desde o ano passado, representantes de outros países – como Suécia, Espanha e China – têm visitado a unidade e já está em construção uma planta similar à brasileira, que deverá ser inaugurada na cidade espanhola de Valência, no próximo ano. Outros interessados pela tecnologia brasileira es- tão na Alemanha, Itália, França e Canadá. A expectativa dos parceiros Klabin, Tetra Pak, Alcoa e TSL Ambiental é quea planta tenha fôlego por dois anos para reciclar o volume de caixinhas consumidas no Brasil. Depois, ao que tudo indica, a expansão será o caminho para essa iniciativa pioneira. Resíduos sólidos e cidadania II 58 1. Reflita sobre sua atitude diante do assunto resíduos sólidos e cidadania. Repense seus hábitos e a forma como você trata o lixo em casa. Liste a seguir pontos que você, como cidadão, pode melhorar. 2. Repita a atividade anterior, só que agora pense no local de trabalho ou na escola. 3. Discuta com a classe maneiras de se reaproveitar o lixo ou meios de atingir outras pessoas e sensibilizá-las com a questão do lixo. Liste abaixo as ideias que lhe pareceram mais viáveis. Site do Compromisso Empresarial para Reciclagem (Cempre): <www.cempre.org.br>. Nesse site, há informações sobre reciclagem e gerenciamento integrado do lixo, com informa- ções direcionadas a formadores de opinião e pessoas responsáveis pela tomada de decisão referente aos resíduos sólidos. Site do Setor Reciclagem: <www.setorreciclagem.com.br>. O portal Setor Reciclagem é um veículo de comunicação de conteúdo informativo especializado em reciclagem, para empresários, empreendedores e pesquisadores do ramo. Acumula informações diárias coletadas na internet, resenhas enviadas por assessorias de comunicação ou por profissionais do segmento e matérias exclusivas. O uso do solo D esde que o homem começou a praticar a agricultura, há cerca de 10 mil anos, vem provocando alterações no solo dos locais por onde passa. Essas alterações têm sido tanto mais severas quanto têm avançado as tecnolo- gias voltadas ao aumento da produção agrícola. Mas esse não é o único uso que o homem faz do solo. O solo tem sido utilizado também para erguer cidades e explorar minérios, e invariavelmente essas atividades estão associadas a algum tipo de degradação, sendo as consequências mais comuns a erosão, a contamina- ção de aquíferos e o assoreamento dos rios, canais e lagos. Em geral, a retirada da vegetação nativa, seja ela uma floresta ou um campo, é o primeiro passo para a utilização do solo com fins produtivos. A desestruturação da camada fértil do solo, o uso de substâncias químicas diversas, a utilização de terras inadequadas para atividades agrícolas, a impermeabilização dos solos das cidades, a ocupação urbana de áreas impróprias, a abertura de estradas e escavações para a extração de minérios, são algumas das causas mais comuns da degradação do solo, tanto nos ambientes urbanos como no meio rural. O solo é um conjunto de corpos naturais tridimensionais resultantes da ação integrada do clima e dos organismos sobre o material de origem. É condicionado pelo relevo em diferentes períodos de tempo e apresentando, então, características que constituem a expressão dos processos e dos mecanismos dominantes na sua formação. É composto por uma parte orgânica e uma mineral. A parte orgânica é representada por restos animais e vegetais em decomposição, e a parte mineral vem do intemperismo1 das rochas e compõe-se, por exemplo, de quartzo2, caulini- ta3, montmorillonita4 e óxido de ferro5, entre outros, dependendo da composição da rocha matriz. O solo apresenta três fases: sólida, líquida e gasosa. As fases líquida e gaso- sa preenchem os espaços entre os corpos tridimensionais da fase sólida. O ar que compõe a fase gasosa é composto por gases atmosféricos e gases provenientes das reações que ocorrem no sistema água-solo-planta. Na fase líquida, a retenção da água está relacionada ao tipo de solo, mais especificamente às suas características físicas e químicas. No processo de formação do solo, conhecido como pedogênese, a produção e deposição dos diferentes materiais formadores gera a diferenciação de camadas mais ou menos paralelas à superfície, denominadas na literatura especializada de horizontes. O conjunto organizado de horizontes de um solo constitui o que se chama de perfil do solo, unidade fundamental na classificação dos solos. O dia- grama ilustra um perfil esquemático de solo, com seus diferentes horizontes. 1 Conjunto de processos que ocasionam a desin- tegração e a decomposição dos minerais em geral, pela ação de agentes atmosféricos e biológicos. É sinônimo de meteorização. 2 Cristal de brilho vítreo gerado por processos metamórficos, magmáticos, diegenéticos e hidrotermais. Tem sido utilizado na fabrica- ção de vidros, esmaltes, sapo- náceos, abrasivos, lixas, entre outros materiais diversos. 3 Mineral do grupo das argilas, encontrada em rochas metamórficas e ígne- as, produzida pela decompo- sição do feldspato. Também ocorre em rochas sedimen- tares e pode ser produzida por reações do material de origem com fontes hidroter- mais, formada principalmen- te sob condições tropicais. Constitui matéria-prima bá- sica na indústria de cerâmica e porcelanas, além de vários outros usos industriais (MA- CHADO; MOREIRA; ZA- NARDO et al., 2005). 4 Trata-se de um silicato de alumínio, cálcio e mag- nésio hidratado, associados a minerais presentes na argila, resultante da intemperização de rochas ígneas efusivas, metamórficas e sedimentares em ambientes mal drenados (MACHADO; MOREIRA; ZANARDO et al., 2005). 5 Forma química em que o ferro comumente ocorre nos diferentes tipos de solo, podendo apresentar diferen- tes combinações e graus de hidratação. É um dos respon- sáveis pelas diferentes colo- rações dos horizontes do solo (MACHADO; MOREIRA; ZANARDO et al., 2005). O uso do solo 60 Floresta de coníferas Floresta caducifólia Campo Horizonte A Horizonte B Horizonte C Rocha matriz (a) (b) (c) IE SD E B ra si l S .A . Figura 1 – Perfil esquemático de três tipos de solo: (a) solo sob floresta de coníferas (Coniferous forest), na qual o folhedo decompõe-se lentamente resultando em um horizonte superficial ácido e com pouca matéria orgânica humificada; (b) solo sob floresta caducifólia (Deciduous forest), na qual o folhedo decompõe-se mais rapidamente e forma um solo mais fértil, com mais matéria orgânica; (c) solo sob campo (grassland) onde há uma camada orgânica bastante espessa, resultante da morte anual das partes aéreas das plantas e consequente acúmulo sobre o solo. O horizonte A contém grande quantidade de material orgânico, tanto vivo como morto, tais como folhas mortas e em decomposição e outras partes de plan- tas, insetos e outros pequenos artrópodos, minhocas, organismos unicelulares, nematoides e fungos. O horizonte B é a região de deposição, ou seja, onde os óxidos de ferro, as partículas de argila e a matéria orgânica trazidas do horizonte A pela água da chuva se depositam. O horizonte B contém menos material orgânico e é menos intemperizado que o horizonte A. O horizonte C é composto por rochas intemperizadas e minerais, a partir dos quais o verdadeiro solo dos horizontes superiores é formado. Está em conta- to direto com a rocha matriz, ou seja, aquela que dá origem à fração mineral do solo. Os solos não são iguais em todas as partes do planeta. Podem variar, inclu- sive, em uma escala muito pequena, às vezes dentro de uma mesma fazenda, por exemplo. Sua composição pode variar de acordo com o tipo de rocha matriz, além, é claro, de fatores como o clima da região, os organismos que vivem no local, o relevo e o tempo necessário para sua formação. Tipos de solos Cambissolo – classe de solo com horizonte B incipiente, não hidromór- fico, ou seja, sem efeito direto da ação da água, com uma sequência inci- piente de horizontes. O uso do solo 61 Latossolo – solo predominantemente formado em regiões tropicais úmi- das, sem horizontes subsuperficiais de acúmulo de argila, caracterizado por apresentar baixa relação molecular entre a sílica e os sesquióxidos, formas estáveis de ligação do ferro com o oxigêniona fração argila, além de uma baixa capacidade de troca catiônica, isto é, a capacidade de reter os elementos necessários às plantas, e baixo teor de minerais primários facilmente intemperizáveis. É normalmente muito espesso. Litossolo – solo pouco espesso que apresenta pequena camada enrique- cida em matéria orgânica (horizonte A), diretamente assentada sobre a rocha matriz. Comumente está associado a afloramentos de rocha em locais com relevo acidentado. Podzol – classe de solos geralmente formados em climas temperados úmidos, sob vegetação de coníferas e caracterizados particularmente por apresentar um horizonte claro eluvial, ou seja, de perda de minerais e matéria orgânica para as camadas inferiores do solo, sobre horizonte es- pódico, isto é, rico em óxidos de ferro e alumínio e pobre em argilas. No Brasil, a maior parte desses solos está associada a materiais arenosos de origem marinha com lençol freático elevado. O conhecimento e a organização das qualidades e características dos solos, que podem ser identificados em levantamentos de campo, são essenciais para o fornecimento das bases necessárias para as seguintes atividades: referência para o estabelecimento de políticas e estratégias de desenvol- vimento sustentável, com conservação ambiental; estabelecer políticas e estratégias de Educação Ambiental, de ordena- mento e de utilização de áreas de forma economicamente viáveis, social- mente justas e ecologicamente adequadas; modelar o desenvolvimento agrícola sustentável e melhorar a qualidade de vida para as gerações atuais e futuras; planejar e implementar o desenvolvimento de sistemas integrados de produção e selecionar áreas para exploração agrícola, pastoril e florestal intensivas nas propriedades rurais; identificar e avaliar os impactos ambientais provocados pela ação do homem; estudar áreas para localização e orientação de obras de infraestrutura, como rodovias e ferrovias, além do desenvolvimento urbano, rural e in- dustrial; selecionar áreas para turismo, recreação, parques, camping, aterro sani- tário, cemitérios e proteção da flora e da fauna; selecionar áreas para programas de conservação, agrovilas, estações ex- perimentais, irrigação e drenagem; selecionar áreas para loteamentos e infraestrutura de saneamento básico; O uso do solo 62 planejar, elaborar programas e identificar problemas na implantação de práticas de manejo e conservação do solo e da água; estabelecer e implementar polos irradiadores para difusão e transferência de tecnologias sustentáveis; zoneamentos agroambientais, avaliação da aptidão agrícola das terras, diversificação agrícola e recuperação de áreas degradadas; estudos de avaliação da fertilidade natural, impedimentos à mecaniza- ção, tráfego de máquinas pesadas, suscetibilidade à erosão, profundidade do solo e do lençol freático. Os solos como “organismos vivos” A fertilidade de um determinado tipo de solo é consequência de uma série de fatores relacionados à sua origem e processo de formação. A cobertura vegetal, como um desses fatores, tem um papel fundamental na manutenção dos processos que mantêm as interações no solo e, portanto, suas características podem refletir diferentes níveis de especificidade nos ciclos dos minerais. Boa parte da floresta amazônica ocorre sobre solos arenosos e pobres em nutrientes, formados basica- mente por sedimentos depositados pelos sistemas fluviais da região. O processo rápido de decomposição da matéria orgânica, associado a eficientes formas de ab- sorção dos nutrientes essenciais pelas plantas, garante a manutenção dos estoques de nutrientes necessários no processo de ciclagem dos minerais. Há uma relação bastante estreita entre clima, solo e vegetação. Em geral, quanto mais densa a cobertura vegetal, mais protegido o solo está da ação do vento, das variações de temperatura e das chuvas, fatores responsáveis por alte- rações em sua estrutura. Os organismos que vivem no solo são fonte de matéria orgânica e contribuem na transformação desse material em substâncias húmicas, além de atuarem na decomposição das rochas. As raízes das plantas intensificam a decomposição da parte mineral e contribuem para manter os fragmentos no solo agregados, evitando assim a erosão. A fauna, seja ela visível ou não a olho nu, atua na translocação do material mineral e na mistura de materiais orgânicos e inorgânicos do solo. As minhocas, por exemplo, contribuem para a aeração do solo, evitando sua compactação, além de produzirem material orgânico semelhan- te ao húmus de origem vegetal, presente no solo. Os ciclos biogeoquímicos Os nutrientes inorgânicos, como o nitrogênio, o fósforo e o cálcio, são es- senciais para o crescimento e para o metabolismo dos seres vivos. Esses nutrientes são incorporados de diferentes formas e mais tarde retornam para o ambiente, geralmente quando o indivíduo morre e entra em decomposição. Isso também acontece com o carbono, por exemplo, presente na atmosfera como dióxido (CO2) ou monóxido de carbono (CO). O dióxido de carbono é a fonte de carbono para as plantas, passando a compor moléculas de carboidratos através do processo de O uso do solo 63 fotossíntese, e, quando a planta morre, esses carboidratos são decompostos e o dióxido de carbono volta à atmosfera. Outros nutrientes que servem como exemplo são o potássio (K+), responsá- vel principalmente pelo balanço iônico das células, o cálcio (Ca2+), componente da parede das células vegetais e dos ossos nos vertebrados, o fósforo, presente nos ácidos nucleicos e no ATP, molécula de importância vital para os seres vivos, pois libera a energia durante a respiração celular, além do nitrogênio, ocorrente em diversas moléculas, como aminoácidos, proteínas, nucleotídeos, ácidos nucleicos, clorofilas e coenzimas. O nitrogênio gasoso (N2), ao contrário do oxigênio (O2) e do gás carbônico (CO2), não é absorvido pelos seres vivos. Em uma cadeia alimentar, os produtores, ou seja, os seres vivos que fazem fotossíntese, absorvem o nitrogênio do ambiente e fixam esse elemento em substâncias como as proteínas e os nucleotídeos. Dessa forma, colocam o nitrogênio à disposição na cadeia alimentar. Entretanto, para que as plantas consigam assimilar esse nitrogênio, é necessário que ele esteja na forma de NO3– (nitrato) ou NH4 + (amônia). Na natureza, existem bactérias que são capazes de fazer a transformação do nitrogênio gasoso em formas assimiláveis pelas plantas. Elas são chamadas de bactérias fixadoras de nitrogênio e estão pre- sentes no solo, na água e em simbiose com outros organismos. A simbiose pode ocorrer entre uma bactéria e uma planta ou uma bactéria e um fungo. Pesquisas já mostraram que algumas espécies de fungos também são fixadoras de nitrogênio, vivendo em simbiose com plantas. Alguns exemplos de fixadores de nitrogênio conhecidos são Rhizobium – bactérias que vivem em simbiose com plantas leguminosas, formando nódulos em suas raízes; Anabaena – cianobactéria que vive simbioticamente nos poros das folhas de uma pequena pteridófita aquática flutuante (Azolla sp.); actinomicetos – grupo de fungos que vivem associados às raízes de plantas como Araucaria, Ginkgo e Casuarina. Como exemplo de bactérias de vida livre, pode-se citar Azo- tobacter, Clostridium e as cianobactérias Nostoc e Anabaena. Cerca de 80% de todo o nitrogênio assimilado pela biota global é reciclado a partir do estrato terrestre e aquático, e apenas 20% vem da fixação do nitrogênio atmosférico. Uma porção muito pequena dos fertilizantes aplicados às terras é reciclada. A maior parte é perdida na retirada da colheita, na lixiviação ou escoa- mento e na desnitrificação6. A degradação do solo e a qualidade de vida A ocupação dos solos pelas cidades, a completa desestruturação do solo e seu isolamento provocam o que sechama de impermeabili- zação urbana. Normalmente, a água que cai sobre o solo é drenada para um aquífero, rio ou lago. Nos solos urbanos, o asfalto, as calçadas e as construções atuam como barreiras, não deixando que a água seja 6 Processo pelo qual bac-térias reduzem o nitrato a gás nitrogênio e óxido de nitrogênio, que voltam para a atmosfera. A ocupação urbana e as atividades agríco- las são as principais causas da degrada- ção dos solos. O uso do solo 64 drenada para o solo e deste para a alimentação da bacia hidrográfica. Para permitir que haja essa drenagem, são construídas tubulações e galerias pluviais que levam a água até um ponto de escoamento para algum rio. Frequentemente ocorre o acú- mulo de lixo e sedimentos nessas tubulações, tendo como resultado uma diminui- ção da capacidade de drenagem do sistema, provocando as enchentes nos períodos mais chuvosos. Os deslizamentos de encostas em regiões montanhosas é outro problema urbano decorrente do uso inadequado do solo. Os deslizamentos de terra podem ocorrer naturalmente e são importantes modelando a paisagem da superfície ter- restre. Porém, com a interferência humana, principalmente com a ocupação desor- denada de áreas de risco, os deslizamentos ocorrem e causam grandes prejuízos. Em 1993, segundo dados da Defesa Civil da ONU, os deslizamentos de terra causaram 2 517 mortes no mundo, ficando em terceiro lugar entre os desastres naturais que mais afetam a humanidade. Nas grandes cidades brasileiras, têm sido um problema frequente, sendo suas principais causas os cortes de encostas para implantação de moradias e estradas, a remoção da vegetação nas encostas mais íngremes, atividades de mineração, disposição final inadequada do lixo e dos es- gotos domésticos. Nas áreas rurais, os principais fatores de degradação do solo são a erosão e a contaminação química com adubos e defensivos agrícolas. A erosão é provocada basicamente pela falta de proteção do solo, combi- nada à ação das chuvas, ventos e temperatura. Alguns solos são mais frágeis e suscetíveis à erosão do que outros, e são mais rapidamente degradados pela ação do tempo. Quando a cobertura vegetal é retirada, a umidade do solo diminui e consequentemente sua fauna e microfauna também diminuem. Com a perda de matéria orgânica, responsável em grande parte pela agregação do solo, este fica menos agregado, facilitando a remoção dos grãos pela ação do vento e da chuva. Menos estável e compactado, o solo perde a porosidade e tem menor taxa de infil- tração da água, aumentando o escoamento superficial e diminuindo a resistência ao impacto das gotas de chuva. Erosão As matas ciliares, isto é, as florestas que acompanham o curso dos rios, protegem os solos contra o fluxo superficial de sedimentos e evitam que parte do solo erodido seja levado para dentro dos rios. Essa proteção contribui para evitar o assoreamento dos rios, evidenciado pela diminuição da profundidade do rio e consequente aumento de sua largura. Outra consequência possível da supressão da cobertura vegetal é a desertifi- cação, entendida como a diminuição drástica do potencial biológico da terra pela perda de água, levando a condições ambientais semelhantes a desertos. No Brasil, até os anos 1970, as observações de desertificação restringiam-se ao semiárido nordestino. Porém, hoje se sabe que existem outros núcleos de desertificação em vários locais do território brasileiro, como, por exemplo, no extremo sudoeste do Rio Grande do Sul. O uso do solo 65 A desestruturação e o empobrecimento do solo em um ecossistema iniciam- -se com a remoção da cobertura vegetal. Os solos sob cultivo intensivo são aqueles que frequentemente mostram um declínio mais notável na quantidade de mine- rais, principalmente nitrogênio, nutriente que também é perdido quando a camada orgânica superficial do solo é levada pela erosão ou destruída pelo fogo. A conservação dos solos e a produção de alimentos O aumento da produção agrícola de alimentos em diversas regiões do mun- do teve como consequência um uso intensivo do solo, com consequente perda de fertilidade e necessidade de utilização de substâncias químicas, como adubos e defensivos. De uma forma genérica, as substâncias químicas que são empregadas na agricultura recebem o nome de agrotóxicos, palavra que em geral traz uma conotação negativa em relação às ameaças à saúde do agricultor. Os agrotóxicos são substâncias químicas – herbicidas, pesticidas, hormô- nios e adubos químicos – utilizadas em produtos agrícolas e nas pastagens de gado; têm a finalidade de proteger os cultivos contra a ação de outros seres vivos. Existem cerca de 15 mil formulações para 400 tipos diferentes de agrotóxicos. No Brasil, cerca de 8 000 formulações estão licenciadas. Além da degradação ambiental provocada pela introdução de substâncias totalmente estranhas nas cadeias alimentares, os agrotóxicos provocam diversos problemas de saúde, sendo o mais comum a intoxicação. Esta pode ser de três tipos: aguda, subaguda e crônica. A intoxicação aguda tem sintomas imediatos; a intoxicação subaguda tem efeitos que aparecem aos poucos, como dor de cabeça e sonolência; e a intoxicação crônica é aquela que tem os efeitos a longo prazo, podendo levar a pessoa à paralisia ou a algum tipo de câncer. Segundo a Organi- zação Mundial de Saúde, há 20 mil óbitos/ano em consequência da manipulação, inalação e consumo indireto de agrotóxicos nos países em desenvolvimento, como o Brasil. Estatísticas apontam que o uso de fertilizantes nitrogenados nos Estados Unidos aumentou 12 vezes entre 1950 e 1980, embora a produtividade não tenha aumentado mais que duas vezes no mesmo período, indicando que grande parte do fertilizante usado foi jogado fora. Entre os anos de 1964 e 1979, o uso de agro- tóxicos no Brasil aumentou 420%, mas a produção não chegou a aumentar 5% no mesmo período. Atualmente, o Brasil é o maior consumidor mundial de agrotó- xicos. Mesmo com a legislação nacional proibindo o uso de muitas substâncias químicas na agricultura, alguns agricultores continuam utilizando e conseguem comprar mercadoria contrabandeada. Dessa forma, colocam em risco a própria vida, a vida de outros milhões de brasileiros que irão se alimentar desses produtos e a vida das demais espécies que fazem parte dos diferentes ecossistemas. Os pesticidas inorgânicos foram muito utilizados no passado, porém, atual- mente não representam mais do que 10% do total em uso. São produtos à base de O uso do solo 66 arsênico e flúor e que agem por contato, matando a praga por asfixia. Os pesticidas orgânicos podem ser de origem vegetal ou sintéticos. Os de origem vegetal são de baixa toxicidade e de curta permanência no ambiente, sendo utilizados em algu- mas práticas agroecológicas, como o piretro, extraído do crisântemo, e a rotenona, extraída do timbó. Os pesticidas orgânicos sintéticos (organossintéticos) persistem por muitos anos nos ecossistemas, contaminando-os e trazendo uma série de pro- blemas de saúde para os seres humanos. O DDT (diclorodifeniltricloretano) foi preparado pela primeira vez em 1874 por Othomar Zeidler? Sua utilização como inseticida, porém, só acon- teceu depois de muito tempo, durante a Segunda Guerra Mundial, por causa dos mosquitos que transmitiam doenças e matavam os soldados. Paul Muller descobriu o efeito inseticida do DDT e recebeu o Prêmio Nobel de Medicina ,em 1948, pois, com o uso do inseticida, muitas vidas foram salvas. Os principais grupos de pesticidas organossintéticos, conforme suas respec- tivas composições químicas, são os que seguem. Organoclorados – não causam morte imediata e permanecem por mais tempo no organismo ou no ambiente, quando comparados aos outros grupos de agrotóxicos. Fazem parte desse grupo o DDT, Aldrin, Diel- drin, Endrin, heptacloro, clordano,toxafeno, Mirex e o BHC. Os efeitos dos organoclorados são mais sentidos pelas pessoas expostas continua- mente a doses baixas, como os profissionais que produzem ou aplicam os produtos. Os organoclorados atuam no sistema nervoso e possuem efeitos cancerígenos. Além disso, podem entrar na cadeia alimentar e intoxicar os seres vivos. Organoclorofosforados – são altamente tóxicos e podem causar morte imediata, por agir no sistema nervoso central. Organofosforados – são altamente tóxicos, mas se degradam rapida- mente e não se acumulam nos tecidos adiposos. Assim como os organo- clorofosforados, podem causar morte súbita, atuando no sistema nervo- so. O herbicida Paraquat, que é um organofosforado, é comercializado no Brasil com o nome de Gramoxone. É um herbicida que mata todos os tipos de plantas. A substância causa lesões de rim e se concentra nos pulmões, causando fibrose irreversível. Carbamatos – apresentam toxicidade média e são degradados rapida- mente, não se acumulando nos tecidos adiposos. Os carbamatos também atuam inibindo a transmissão dos impulsos nervosos cerebrais. Muitos desses produtos foram proibidos em diversos países, em virtude de seu efeito altamente cancerígeno. O uso do solo 67 Os agrotóxicos chegaram ao Brasil em meados da década de 1960, junto com as monoculturas da soja, do trigo e do arroz. Era praticamente obrigatório o uso desses produtos para quem pretendesse usufruir o crédito rural. Atualmente, os agrotóxicos encontram-se disseminados na agricultura convencional, como uma solução de curto prazo para a infestação de pragas e doenças. Na Guerra do Vietnã, entre 1954 e 1975, os agrotóxicos foram usados como armas de guerra, pois se utilizaram herbicidas desfolhantes – conheci- dos como “agente laranja” –, utilizados pelos norte-americanos para remover a fo- lhagem das árvores que os soldados vietnamitas usavam para se esconder e atacar. Os aviões aspergiam os herbicidas sobre as florestas, dificultando as tocaias ar- madas pelos vietnamitas. Essa operação militar trouxe consequências ambientais e de saúde graves para as populações que ficaram expostas ao agente laranja. O herbicida 2.4.5-T (“agente laranja”) é acompanhado da dioxina, que é o mais ativo composto causador de deformações em recém-nascidos que se conhece (teratogê- nico); permanece no solo e na água por mais de um ano. Na União Europeia, só é possível comprar agrotóxicos fosforados após a re- alização de um curso de 60 horas, que habilita o usuário a receber uma carteira de autorização para utilização do agrotóxico no seu município. Segundo informações divulgadas em vários meios de informação ambiental, a maioria dos fabricantes de agrotóxicos estão instalados em países do terceiro mundo, muitos deles inclusive mediante a concessão de incentivos para instalação. No início do período de maior utilização dos agrotóxicos na agricultura, a primeira preocupação foi em relação aos casos de morte em um curto prazo de tempo após o contato com a substância química. Depois, essa preocupação passou a ser em relação aos efeitos a longo prazo que esses venenos têm sobre o corpo humano. Hoje se sabe que os diferentes tipos de venenos atuam em todas as partes das células, sendo a ação dependente da função da célula e da natureza química da substância. Em geral, ocorrem alterações nas reações celulares, estimulando ou inibindo reações especificas. Fim dos 12 poluentes orgânicos (NASS; FRANCISCO, 2002) Durante uma reunião do Programa das Nações Unidas para o Ambiente, UNEP, ocorrida em maio de 2001 na capital sueca, Estocolmo, representan- tes de 90 países, incluindo o Brasil, assinaram a Convenção sobre Poluentes Orgânicos Persistentes, que visa proibir a produção e o uso de 12 substâncias orgânicas tóxicas, atendendo a um apelo do diretor da UNEP e da comunidade internacional. Os 12 poluentes orgânicos persistentes (POPs), conhecidos também como a “dúzia suja” (dirty dozen, em inglês) são Aldrin, clordano, Mirex, Dieldrin, DDT, dioxinas7, furanos8, PCBs9, Endrin, heptacloro, BHC e toxafeno. Eles são acusados de causar doenças graves, em especial o câncer, e malformação de 7 São provenientes da in-cineração do lixo, da combustão da madeira, de decomposição de produtos de origem vegetal e de trans- formações de herbicidas por processos enzimáticos. Subs- tância bastante tóxica, sendo que apenas um miligrama de dioxina é suficiente para matar um macaco de 15 qui- logramas. 8 Produto da reação dos PCBs com o oxigênio at- mosférico. Molécula pareci- da com a dioxina e tão tóxica quanto ela. 9 PCBs – bifenilas poli-cloradas (a sigla vem do nome em inglês, Polychlori- nated biphenyls). Composto orgânico clorado de grande utilização na indústria por causa de suas propriedades, tais como: isolante térmico, pouco combustível e baixa evaporação. Acumula-se nos tecidos animais e dificilmen- te é eliminado. O uso do solo 68 humanos e animais de todo o mundo, muitas vezes sendo encontrados em lo- cais distantes de qualquer fonte emissora, tornando-se portanto um problema global. [...] A maioria dos 12 compostos da lista já foi banida ou teve seu uso reduzido em boa parte do mundo, reduzindo o impacto econômico da ratifica- ção da convenção e facilitando sua entrada em vigor. O Brasil, por exemplo, não produz diretamente nenhum dos 12 compostos, mas importa três deles para uso industrial. Entretanto, as dioxinas e os furanos, por serem produzidos de forma não intencional, demorarão mais a serem eliminados. O uso sustentável do solo As atividades agrícolas são, por natureza, aquelas que mais provocam alte- rações nas características do solo e, muitas vezes, a sua degradação. As formas tradicionais de produção, com base em monoculturas mantidas às custas de gran- de quantidade de insumos, têm impactos variados sobre o solo, e cada vez mais têm sido utilizadas técnicas de menor impacto e que visam sua conservação. Na sequência, são apresentadas as técnicas mais usuais no Brasil, com suas respectivas características e vantagens em relação à conservação do solo. Rotação de culturas – a rotação de culturas consiste em alternar espé- cies vegetais anuais numa mesma área agrícola, de forma a conciliar pro- dução agrícola com conservação do solo. Entre as principais vantagens da rotação de culturas, estão uma produção mais diversificada, a melho- ria das características físicas, químicas e biológicas do solo, um auxílio no controle de plantas daninhas, doenças e pragas, uma maior reposição de matéria orgânica, a proteção do solo contra a ação dos agentes climá- ticos e a facilitação no sistema de plantio direto, com vantagens para o produtor e principalmente para o ambiente como um todo. A máxima eficiência no sistema de rotação de culturas é obtida quando é feito um planejamento, associando espécies que produzem bastante biomassa e com rápido desenvolvimento, que podem ser cultivadas tan- to isoladamente como em consórcio com as culturas comerciais. As es- pécies vegetais empregadas na rotação de cultura devem ser escolhidas tendo em vista a utilização comercial e a cobertura do solo, com a possi- bilidade ainda de envolver espécies úteis na “adubação verde”, que será abordada na sequência. Deve ser dada preferência para plantas capazes de fixar nitrogênio, com sistema radicial profundo e abundante, contri- buindo assim para promover a ciclagem de nutrientes. Plantas com sistemas radiciais, formas de crescimento e exigências nu- tricionais diferentes podem interromper ciclos de pragas e doenças, redu- zindo custos e aumentando o rendimento da cultura principal. Algumas opções frequentemente usadas com essa finalidade são o milho, o sorgo, o milheto e o girassol. Quando o objetivo é a recuperação de solos degradados, são indicadas espécies com grande quantidade de matériaverde e com abundante sis- O uso do solo 69 tema radicial. O consórcio de espécies comerciais com leguminosas, por exemplo, milho e guandu, ou então a mistura de culturas que promovam a cobertura do solo e culturas com grande produção de biomassa. Adubação verde – prática agrícola que incorpora ao solo massa ve- getal não decomposta, de plantas cultivadas com a finalidade de en- riquecer o solo com matéria orgânica e elementos minerais. Consiste basicamente no plantio de diversas espécies vegetais intercaladas ou concomitantes às culturas comerciais. Na adubação verde, a agricultura procura imitar o que ocorre nas florestas naturais: diversificar os tipos de vegetação sobre o solo, diversificar os tipos de micro-organismos no solo, adicionar matéria orgânica ao solo e interromper o ciclo de pragas e doenças, entre outros. Um dos principais benefícios da adubação verde é a economia significa- tiva que o produtor faz com a fixação do nitrogênio do ar atmosférico. A mucuna-preta, uma das espécies usadas na adubação verde, chega a fixar 157 quilos de nitrogênio por hectare, enquanto a crotalária fixa até 155 quilos, o feijão de porco até 190 quilos e o guandu até 280 quilos. A adubação verde propicia ainda uma maior ciclagem de nutrientes, um aumento de teores e melhoria na qualidade da matéria orgânica, um in- cremento na atividade biológica do solo, uma maior agregação do solo, melhor infiltração e armazenamento de água, redução da compactação e proteção contra a erosão. Deve-se ter o cuidado de evitar que as espécies usadas na adubação ver- de cheguem até a fase de produção de sementes, evitando assim que elas se transformem em plantas invasoras ou contaminantes biológicos. Controle biológico – o controle biológico consiste no uso de um orga- nismo que ataca outro organismo, que esteja causando danos econômi- cos às lavouras. Esse agente pode ser um predador, um parasita ou um patógeno. Muitos países têm investido grandes quantidades de recursos na pesquisa de agentes que atuam no controle biológico das espécies mais frequentemente cultivadas, esperando com isso diminuir a depen- dência de produtos químicos, cujos direitos de uso são pagos às grandes corporações multinacionais que atuam no setor. Em Cuba, o desenvolvimento das técnicas de controle biológico iniciou em consequência do embargo aplicado pelos Estados Unidos, que impe- diu que o país comprasse agrotóxicos para o combate das pragas. Atual- mente essa técnica é utilizada em cerca de 56% da área agrícola do país, sendo referência em nível mundial no tema. No Brasil, o uso do controle biológico não é uma prática muito comum entre os agricultores, embora haja vários avanços nessa área de pesquisa no país. Estes devem-se principalmente aos esforços de órgãos estaduais de pesquisa e extensão rural e da Empresa Brasileira de Pesquisa Agro- pecuária – Embrapa –, que há muitos anos vem pesquisando agentes biológicos de controle de pragas. Um exemplo bem-sucedido é o con- O uso do solo 70 trole da lagarta da soja (Anticarsia gemmatalis) por meio do Baculovirus anticarsia. Essa prática foi lançada em 1983, pelo Centro Nacional de Pes- quisa da Soja, unidade da Embrapa localizada na cidade de Londrina (PR). Estima-se que o uso desse agente já proporcionou uma economia estimada em cem milhões de dólares em agrotóxicos ao país, e grandes benefícios ambientais decorrentes da não aplicação de mais de 11 milhões de litros de venenos no ambiente. O Quadro 1 mostra alguns exemplos de organismos que são empregados como agente de controle biológico no Brasil. Quadro 1 – Micro-organismos utilizados no controle biológico de pragas Agente biológico Nome O que ele ataca Como se aplica Fungo Metarhizium anisopliae Cigarrinha da folha da cana-de-açúcar É pulverizado e, em contato com o corpo do inseto, causa doença. Broca dos citrus É polvilhado nos buracos da planta, contaminando a praga. Fungo Beauveria bassiana Besouro moleque-da- bananeira É aplicado na forma de pasta em pedaços de bananeira que são colocados ao redor das árvores, servindo de isca. Fungo Insectonrum sporothrix Percevejo mosca-de- -renda É pulverizado e, em contato com o corpo do inseto, causa doença. Vírus Baculovirus anticarsia Lagarta da soja Pulverizado sobre a planta, adoece a lagarta que se alimenta das folhas. Vírus Baculovirus spodoptera Lagarta do cartucho de milho Pulverizado sobre a planta, adoece a lagarta que se alimenta da espiga em formação. Vírus Granulose Mandorová da mandioca Pulverizado sobre a mandioca, é nocivo à praga. Nematoide Deladenus siricidicola Vespa-da-madeira Em forma de gelatina, é injetado no tronco da árvore, esterilizando a vespa. Bactéria Bacillus thuringiensis Lagartas desfolhadoras Pulverizado sobre a planta, é nocivo às lagartas. Sistemas agroflorestais (SAF) – os sistemas agroflorestais podem tam- bém ser chamados de sistemas agrossilviculturais. Trata-se de uma prática de manejo em que as culturas comerciais são plantadas entre corredores de árvores e arbustos, podendo ainda ser associada à criação de animais junto à plantação de árvores. Entre as várias vantagens dos SAF estão a recupe- ração da fertilidade do solo, maior controle das condições microclimáticas da área, aumento da diversidade de culturas e o controle de ervas daninhas. As espécies cultivadas nos SAF podem servir para diferentes fins, como produção de madeira, de frutos e sementes, de forragem, de lenha, ou ainda D is po ní ve l e m : < w w w .p la ne ta or ga ni co .c om .b r/ co nt ro le .h tm >. O uso do solo 71 funcionar como quebra-vento e cercas-vivas, no caso das árvores e dos arbustos. Esse sistema pode atender diferentes escalas de produção, des- de a atividade de subsistência até a comercial. Agricultura orgânica – sob essa denominação, são incluídas várias prá- ticas agrícolas de menor impacto sobre o ambiente, entre as quais a con- servação do solo é um direcionador. Os métodos agroecológicos buscam aplicar o princípio da prevenção, fortalecendo o solo e as plantas pela pro- moção do equilíbrio em todo o ambiente de produção. Algumas práticas comuns na agroecologia são o controle agroecológico de insetos, fungos, ácaros, bactérias e viroses, o plantio em épocas corretas e com variedades adaptadas ao clima e ao solo da região, o uso da adubação orgânica e da rotação de culturas, o uso de cobertura morta e plantio direto, o plantio de variedades e espécies resistentes às pragas e doenças, a consorciação de culturas e manejo seletivo das espécies invasoras, a prevenção contra a erosão do solo, o uso de plantas que funcionem como “quebra-ventos” e “faixas protetoras”, a nutrição equilibrada das plantas e a conservação dos remanescentes de vegetação nativa existentes na região. Café com Floresta muda a paisagem do Pontal Assentamentos vizinhos ao Morro do Diabo criam corredores de fauna plantando café orgânico com árvores nativas (JOHN, 2003) Campinas – Um saldo de apenas 1,85% da cobertura florestal original foi o resultado ambiental mais evidente de pelo menos cinco décadas de conflitos fundiários do Pontal do Paranapanema, no oeste de São Paulo. Extremamente fragmentados, estes remanescentes se espalham em fazendas e assentamen- tos, em torno do Parque Estadual Morro do Diabo, a única grande mancha de mata nativa preservada, com seus 37 mil hectares. Para reverter essa fragmen- tação – e as consequências desastrosas que ela tem para a fauna – o Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ) iniciou um projeto de bosques “trampolim”, incentivando fazendeiros e assentados a plantar pelo menos um hectare de ár- vores nativas entre o parque e suas reservas particularesde floresta, nas trilhas usadas por alguns animais silvestres, na sua busca diária por alimento. Há um ano, os bosques-“trampolim” ganharam uma nova versão, com a adição de mudas de café, cultivadas sem agrotóxicos, o que é possível graças à proteção natural oferecida pela sombra e diversidade das árvores nativas, com as quais o café divide o espaço. “Embora tenhamos conseguido implantar 70 hec- tares de bosques-trampolim, entre 1998 e 2000, em dois assentamentos vizinhos ao parque, ainda faltava um estímulo para aumentar a adesão dos agricultores à formação de bosques”, explica Laury Cullen Júnior, do IPÊ, coordenador do O uso do solo 72 projeto. “É difícil convencer um assentado, com um lote de 14 a 18 hectares, a destinar um hectare para árvores nativas, que não geram renda”. Mas com o Café com Floresta é diferente. Já no segundo ano, o agricultor colhe uma safrinha e a produção plena inicia no quarto ano. O café é orgânico e do tipo arábica, com boa aceitação e preço diferenciado no mercado. “Au- mentou muito a adoção; as famílias de assentados têm vindo nos procurar e, em um ano, já constituímos 40 hectares de bosques”, comemora Cullen Jr. “A paisagem do Pontal está mudando e, além do valor ambiental, essa mudança tem valor social e cultural”. E, para a fauna, o que importa é que a mobilização do solo é mínima – pois o café é uma cultura permanente –, não se usam vene- nos – pois o cultivo é orgânico – e o caminho entre os remanescentes de mata natural estão mais protegidos, facilitando até o trânsito de animais menores. O projeto é apoiado pela Ashoka Empreendedores Sociais, Fundação O Boticário de Proteção à Natureza, Fundação Interamericana e Instituto Flo- restal de São Paulo, da Secretaria Estadual de Meio Ambiente. Conta com cerca de 100 mil dólares para um prazo de quatro anos, recursos utilizados no estabelecimento de viveiros de mudas de nativas – de pelo menos 40 espécies diferentes – e compra das mudas orgânicas certificadas de café, além da assis- tência técnica e cursos de capacitação dos agricultores. Segundo Cullen Jr., o IPÊ também está começando a desenvolver planos de negócios para a comer- cialização do café, visando aumentar ainda mais a adesão. “A gente sempre sonhou com o verde e aproveitava os passeios no meio ambiente, junto com o pessoal do IPÊ, para conhecer melhor. Agora, com o café, deu para plantar”, diz Antônia Pereira dos Santos, de 47 anos, do assen- tamento Ribeirão Bonito. Com 6 pessoas da família morando no lote e plan- tando “de tudo um pouco”, Antônia já espera colher a primeira safra de café em 2004 e admira o tamanho das mudas nativas. “Já tem árvore pra mais de metro, algumas até pra mais de dois metros”. “Se você chega na minha casa, já é um bosque de mato”, afirma outro as- sentado de Ribeirão Bonito, José Santiago, de 52 anos. “Sempre gostei de preve- nir com o meio ambiente: aqui a temperatura nesta época chega a 35, 40 graus, sem sombra. Nem os bichos aguentam, quanto mais o ser humano”. Além de dois bosques-trampolim, Santiago plantou nativas em volta da casa e numa pe- quena área destinada às crianças. E comemora a possibilidade de comer frutas sem veneno, graças à opção pelo cultivo orgânico, feita com a orientação técnica do IPÊ. “Os bosques protegem contra as pragas e também contra a geada, já plantei tanto que daqui a pouco meu lote vai virar reserva”, brinca. A necessidade de utilização do solo, cuja formação envolve processos com- plexos e milhares de anos de evolução, é um fato concreto nas civilizações atuais. O aumento da população, e consequentemente o aumento da necessidade de áreas para instalação de aglomerações urbanas e para plantio de alimentos, são inevitá- veis a curto e médio prazo. Frente a esse cenário, o grande desafio é fazer com que o desenvolvimento leve em consideração alguns princípios básicos de conserva- O uso do solo 73 ção do solo, considerando que já existem informações disponíveis suficientes de experiências bem-sucedidas que não deixaram de utilizar este precioso patrimô- nio natural que é o solo, garantindo a manutenção da produção agropecuária com menor impacto sobre o ambiente. Primavera Silenciosa, Rachel Carson Um dos livros que marcaram o século XX (SABIO, 2005) Ao ser introduzido para uso no combate a pragas, o DDT – o mais poderoso pesticida que o mundo já conhecera – terminou por mostrar que a natureza é vulnerável à intervenção humana. A maior parte dos pesticidas é efetiva contra um ou outro tipo de insetos, mas o DDT era capaz de destruir de imediato centenas de espécies diferentes de insetos. O DDT, cujo inventor recebeu o Prêmio Nobel, tornou-se conhecido durante a Segunda Guerra Mundial, quando foi usado pelas tropas americanas contra insetos causadores da malária. Ao mesmo tempo, na Europa, começou a ser usado sob a forma de pó, eficiente contra pulgas e outros pequenos insetos. No livro Silent Spring (Primavera Silenciosa), lançado em 1962, Rachel Carson mostrou como o DDT penetrava na cadeia alimentar e acumulava-se nos tecidos gordurosos dos animais, inclusive do homem (chegou a ser detectada a presença de DDT até no leite humano!), com o risco de causar câncer e dano genético. A grande polêmica movida pelo instigante e provocativo livro é que não só ele expunha os perigos do DDT, mas questionava de forma eloquente a confiança cega da humanidade no progres- so tecnológico. Dessa forma, o livro ajudou a abrir espaço para o movimento ambientalista que se seguiu. Juntamente com o biólogo René Dubos, Rachel Carson foi uma das pioneiras da conscien- tização de que os homens e os animais estão em interação constante com o meio em que vivem. Quando o DDT se tornou disponível para uso também por civis, poucas pessoas desconfiavam do miraculoso produto, talvez apenas aquelas que eram ligadas a temas da natureza. Uma dessas pes- soas foi o escritor E. W. Teale, que advertia: “Um spray que atua de forma tão indiscriminada como o DDT pode perturbar a economia da natureza tanto quanto uma revolução perturba a economia social. Noventa por cento dos insetos são benéficos e, se são eliminados, as coisas em pouco tempo fogem do controle”. Outra dessas pessoas foi Rachel Carson, que propôs um artigo para o Reader’s Digest falando sobre a série de testes que estavam sendo feitos com o DDT próximo de onde ela vivia, em Ma- ryland. A ideia foi rejeitada. Treze anos mais tarde, em 1958, a ideia de Rachel de escrever sobre os perigos do DDT teve um novo alento, quando ela soube da grande mortandade de pássaros em Cape Cod, causa- da pelas pulverizações de DDT. Porém, seu uso tinha aumentado tanto desde 1945 que Rachel não conseguiu convencer nenhuma revista a publicar sua opinião sobre os efeitos adversos do DDT. Ainda que Rachel já fosse uma pesquisadora e escritora reconhecida, sua visão do assun- to soava como uma heresia. O uso do solo 74 Então, ela decidiu abordar o assunto em um livro. Primavera Silenciosa levou quatro anos para ser terminado. Além da penetração do DDT na cadeia alimentar, e de seu acúmulo nos tecidos dos animais e do homem, Rachel mostrou que uma única aplicação de DDT em uma lavoura matava insetos durante semanas e meses e, não só atin- gia as pragas, mas um número incontável de outras espécies, permanecendo tóxico no ambiente mesmo com sua diluição pela chuva. Rachel concluía que o DDT e outros pesticidas prejudicavam irremediavelmente os pássa- ros e outros animais, e deixavam contaminado todo o suprimento mundial de alimentos. O mais contundente capítulo do livro, intitulado “Uma fábula para o amanhã”, descrevia uma cidade americana anônima na qual toda vida – desde os peixes, os pássaros, até as crianças – tinham sido silenciadas pelos efeitos insidiosos do DDT. O livro causou alarme entre os leitores americanos. Como era de se esperar, provocou a in-dignação da indústria de pesticidas. Reações extremadas chegaram a questionar a integridade, e até a sanidade, de Rachel Carson. Porém, além de ela estar cuidadosamente munida de evidências a seu favor, cientistas emi- nentes vieram em sua defesa e quando o Presidente John Kennedy ordenou ao comitê científico de seu governo que investigasse as questões levantadas pelo livro, os relatórios apresentados foram favoráveis ao livro e à autora. Como resultado, o governo passou a supervisionar o uso do DDT e este terminou sendo banido. A visão sobre o uso de pesticidas foi ampliada e a conscientização do público e dos usuários começou a acontecer. Logo, já não se perguntava mais “será que os pesticidas podem ser realmen- te perigosos?”, mas sim “quais pesticidas são perigosos?”. Então, em vez dos defensores da natureza terem de provar que os produtos eram prejudiciais, foram os fabricantes que passaram a ter a obrigação de provar que seus produtos são seguros. A maior contribuição de Primavera Silenciosa foi a conscientização pública de que a natureza é vulnerável à intervenção humana. Poucas pessoas até então se preocupavam com problemas de conservação, a maior parte pouco se importava se algumas ou muitas espécies estavam sendo ex- tintas. Mas o alerta de Rachel Carson era assustador demais para ser ignorado: a contaminação de alimentos, os riscos de câncer, de alteração genética, a morte de espécies inteiras... Pela primeira vez, a necessidade de regulamentar a produção industrial de modo a proteger o meio ambiente se tornou aceita. 1. Relacione a seguir as vantagens e desvantagens da agricultura convencional, que utiliza adubos e de- fensivos químicos (agrotóxicos). Compare-a com a agricultura orgânica e suas principais técnicas. O uso do solo 75 2. Cite as principais formas de uso sustentável do solo, comentando as vantagens de cada técnica. 3. Forme um grupo de três pessoas e discuta como um cidadão, que não é um agricultor, pode agir para amenizar os impactos de suas ações sobre o solo. 4. Organize os principais pontos da discussão e apresente uma síntese das ideias do grupo para o restante da turma. O uso do solo 76 GUERRA, Antonio José Teixeira; CUNHA, Sandra Baptista da (Org.). Geomorfologia e Meio Am- biente. 5. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004. 372p. Esse livro trata das relações entre a geomorfologia, ou seja, o estudo das diferentes feições da Terra, e o meio ambiente, considerando seus diversos aspectos e elementos. São vários temas trata- dos, sendo uma consulta fundamental para profissionais e estudantes que têm interesse na ocupação da superfície terrestre e na consequente degradação dos ambientes naturais, de forma a aplicar esses conhecimentos na melhoria da gestão ambiental. Disponível em: <www.planetaorganico.com.br>. Esse site trata de assuntos ligados ao tema conservação do solo, como as implicações do uso de agrotóxicos, a compostagem e a agricultura orgânica, mostrando ainda técnicas e informações sobre os produtos orgânicos. O site tem um glossário para os termos utilizados no texto, facilitando assim a compreensão, mesmo daqueles que nunca tiveram contato direto com o assunto. Disponível em: <www.estadao.com.br/ext/ciencia/zonasderisco/dano.htm>. Esse é o site oficial do jornal O Estado de São Paulo e traz informações sobre produtos tóxicos normalmente usados em produtos de limpeza ou agrotóxicos, entre outros. São informações sobre o que são esses produtos, onde são encontrados, qual a sua origem, os impactos ambientais que sua utilização provoca e os riscos à saúde humana. Disponível em: <www.taps.org.br/aorganica17.htm>. A TAPS (Temas Atuais na Promoção da Saúde) é um centro de estudos que mantém uma bi- blioteca e um website abrangendo diversas áreas relacionadas com a saúde. Nesse site, encontram-se diversos temas relacionados à saúde, além de curiosidades, perguntas e respostas pertinentes ao tema alimentação, envolvendo produção orgânica de alimentos e outras técnicas e hábitos alimentares. Efeito estufa A atmosfera A Terra é circundada por uma camada gasosa espessa denominada atmosfe-ra. Ela é formada por vários estratos que contribuem para a conservação da temperatura do planeta e a filtração dos raios solares. Uma série de fenômenos importantes se processa na atmosfera, como os deslocamentos de mas- sas de ar e os ventos, as precipitações meteorológicas e as mudanças do clima. A atmosfera é composta por diferentes camadas, formadas basicamente pe- los mesmos gases. As camadas da atmosfera são: troposfera – camada que está em contato direto com a superfície ter- restre. Situa-se desde zero quilômetros até 17 quilômetros de altura, na região entre os trópicos, e até cerca de 7 quilômetros nos polos. Essa é a camada onde acontecem os fenômenos climáticos e onde os seres vivos conseguem respirar normalmente. O ar nessa camada é composto 78% por gás nitrogênio (N2), 21% por gás oxigênio (O2), 0,93% por ar- gônio (Ar), 0,03% por gás carbônico (CO2) e 0,04% por outros gases 1. Além disso, pode-se encontrar cinzas, micro-organismos, poeira e vapor d’água. estratosfera – é a camada que vai do término da troposfera até cerca de 50 quilômetros de altura. Entre 20 e 35 quilômetros de altitude, situa-se a camada de ozônio. mesosfera – vai da estratosfera até 80 quilômetros da superfície terrestre. Apresenta poeira de meteoritos e pouca quantidade de gases (os mesmos que compõem a troposfera). termosfera – vai da mesosfera até quase 500 quilômetros da superfície terrestre. Nessa camada, os meteoritos são destruídos quando entram na atmosfera. exosfera – camada mais externa, alcança a distância de 900 quilômetros da Terra. Nela, os átomos e moléculas de gases são “perdidos” para o espaço. 1 Os outros gases que com-põem a atmosfera são: Hélio (He), Ozônio (O3), Hi- drogênio (H), Criptônio (Kr), Metano (CH4), Xenônio (Xe) e Radônio (Rn). Efeito estufa 78 Nas camadas da atmosfera, a pressão diminui com o aumento da altitude, havendo uma maior concentração de gases mais próximo da Terra. Isso se deve à força da gravidade, que mantém cerca de 90% da massa total de gases da atmos- fera abaixo de 18 quilômetros. IE SD E B ra si l S .A . Estufa é um compartimento fechado, no qual se controla a tempe- ratura e a umidade para o cultivo de espécies vegetais. Geralmente são construções envidraçadas ou com revestimento transparente, pois assim deixam passar a luz solar e não deixam o calor e a umidade saírem. A atmosfera da Terra funciona como uma estufa. Quando a radiação solar atinge a atmosfera terrestre, as camadas mais externas refletem cerca de 40% dessa radiação. As camadas inferiores da atmosfera absorvem cerca de 17% da radiação, impedindo que ela atinja a superfície terrestre. A camada de ozônio é a responsável pela absorção dos raios ultravioleta. Dos 43% da radiação solar que chega até a superfície terrestre, 10% é re- fletida. A superfície terrestre se aquece e irradia energia em forma de raios in- fravermelhos para a atmosfera. O gás carbônico e vapor d’água existentes no ar atmosférico absorvem parte dessa radiação infravermelha aquecendo o ambiente, e o restante da radiação é dissipada para o espaço. Pode-se dizer que através desse Nós vivemos em uma estufa? Efeito estufa 79 efeito estufa natural, a atmosfera mantém sua temperatura cerca de 33ºC mais quente do que seria se não houvesse a retenção do calor pelas moléculas de gás carbônico e água. O aquecimento do ar, da terra e da água proporcionam os movimentos do ar na atmosfera e da água nos oceanos. Os deslocamentos do ar2 são determinantes na distribuição do calor e da umidade na atmosfera, pois ativam a evaporação e dispersam as massas de ar quente ou frio conforme a região. As formas de deslo- camento daágua mais conhecidas são as correntes marinhas, as quais se devem, ao menos em parte, às diferenças de temperatura entre as regiões da Terra. Da mesma forma que os deslocamentos de ar, as correntes também podem descrever trajetórias horizontais e verticais, e contribuem para a definição dos vários tipos climáticos do planeta. O aquecimento dos oceanos, associado à capacidade de re- tenção de calor pela água – maior que o do continente –, é responsável pela forma- ção das brisas costeiras, tão comuns e facilmente percebidas na costa brasileira. Toda essa dinâmica explica os diferentes tipos climáticos e, consequente- mente, de solo e vegetação existentes no globo terrestre. O efeito estufa recebe esse nome, pois é exatamente esta a sua fun- ção: uma estufa. O problema é que o aumento na quantidade de determi- nados gases na atmosfera está fazendo com que a temperatura na tropos- fera aumente. Gases como o gás carbônico, metano e óxido nitroso, entre outros, são responsáveis pela retenção de parte da radiação solar que é refletida pela superfície terrestre. Pode-se comparar com os efeitos em uma estufa para cultivo de vegetação: se não houver um escape, que pode ser um basculante, para o ar deslocar-se, a energia térmica ficará presa dentro da estufa, aumentando a temperatura ambiente. Causas do efeito estufa A temperatura da Terra vem sendo monitorada em várias estações meteoro- lógicas desde 1860. Os maiores aumentos aconteceram entre 1910 e 1945, e entre 1976 e 2000. Além das medições de temperatura, existem outras evidências do aquecimento da Terra, tais como a diminuição da cobertura de neve nas monta- nhas e regiões geladas do planeta, o aumento do nível dos mares e outros eventos extremos de mau tempo, durante o século XX. Os principais gases que agravam o efeito estufa são aqueles capazes de ab- sorver a radiação infravermelha, mantendo-a na atmosfera e, consequentemente, impedindo que o calor seja difundido para o espaço. Os chamados gases do efeito estufa são o dióxido de carbono ou gás carbônico (CO2), o monóxido de carbono (CO), o metano (CH4), o óxido nitroso (N2O) e os clorofluorcarbonos (CFCs). 2 Os deslocamentos do ar na horizontal são cha- mados de ventos, e os des- locamentos na vertical, de correntes de ar. Esses des- locamentos, somados aos movimentos de massas de ar, determinam as condições cli- máticas do planeta. O que é o efeito estufa? Efeito estufa 80 Quadro 1 – Com algumas características dos gases do efeito estufa Dióxido de carbono (CO2) Monóxido de carbono (CO ) Ozônio (O3) Cloro- fluorcar- bonos (CFCs) Óxido nitroso (N2O) Metano (CH4) Principais fontes Queima de combustí- veis fósseis, queima de biomassa. Queima de combustíveis fósseis, queima de biomassa. Queima de hidrocarbo- netos com óxidos de nitrogênio, queima de biomassa. Refrigerado- res, aerossóis, processos industriais. Fertilizantes, conversão do uso da terra. Cultivo de arroz inunda- do, pecuária, queima de combustíveis fósseis, queima de biomassa e decomposição de matéria orgânica. Tempo de vida na atmosfera 50-200 anos meses semanas e meses 60-100 anos 150 anos 10 anos Taxa anual de aumento 0,5% 0,7-1,0% 0,5-2,0% 4% 0,3% 0,9% Contribuição relativa ao efeito estufa 60% 8% 12% 5% 15% D is po ní ve l e m : < w w w .c np m a. em br ap a. br /p ro je to s/ in de x. ph p3 ?s ec = ag ro g: ::8 1> . Cerca de 61% da emissão de óxido nitroso (N2O) para a atmosfera acontece por causa da desnitrificação, processo pelo qual formas assimiláveis de nitrogênio (nitrato e amônia) são reduzidas por bactérias a formas gasosas, sendo uma delas o óxido nitroso. O aumento da utilização de fertilizantes pela agricultura é um dos principais causadores do aumento de óxido nitroso na atmosfera. O metano (CH4) tem várias fontes emissoras, sendo as principais a fermen- tação entérica dos animais criados na pecuária (22%) e o cultivo de arroz inunda- do (16%). Locais de disposição de resíduos sólidos a céu aberto, tais como lixões e aterros, representam 10% da emissão de gás metano na atmosfera. De todos os gases que colaboram para o efeito estufa, o CO2 é o que mais preocupa, pois desde a Revolução Industrial sua emissão tem aumentado. Menos de um quarto da população mundial é responsável por três quartos das emissões globais de dióxido de carbono anuais? Efeito estufa 81 As plantas absorvem o dióxido de carbono da atmosfera, que é pro- cessado e transformado em glicose, através da fotossíntese: A glicose é utilizada na produção de várias outras moléculas, incluindo amido, celulose e lignina. O primeiro é um carboidrato de reserva e os outros dois são substâncias estruturais da parede celular vegetal. Os principais organismos fotossintetizantes são aqueles que têm clorofila em suas respectivas estruturas celulares, tais como as plantas terrestres, as algas pluricelulares, além dos compo- nentes do fitoplâncton3. Os átomos de carbono ficam disponíveis para os demais níveis tróficos da cadeia alimentar. Ao serem ingeridos, os compostos orgânicos são degradados até formar novamente dióxido de carbono e água. A decomposição é o processo através do qual o carbono retido nos diferen- tes níveis tróficos retorna ao ambiente na sua forma gasosa (CO2). Atuam como decompositores da matéria orgânica, principalmente os fungos e as bactérias. Historicamente, ao longo dos períodos geológicos, a concentração de dió- xido de carbono da atmosfera variou bastante. Porém, nos últimos 10 mil anos – pelo menos até a Revolução Industrial – ela permaneceu constante, resultado do equilíbrio entre a fotossíntese, a respiração e a decomposição. Após a Revolução Industrial, que ocorreu no século XVIII, os níveis de dióxido de carbono passa- ram de 280 partes por milhão para 378 partes por milhão, em 2004. Além da queima de combustíveis fósseis, a queima de restos de culturas e de grandes áreas com vegetação nativa contribuem muito para a emissão desse gás. A queima de vegetação, além de liberar dióxido de carbono para a atmosfera, destrói esse importante meio de absorção do carbono atmosférico. A combustão é um processo que libera energia. Uma molécula requer energia quando é sintetizada. No caso da fotossíntese, a energia utilizada para a produção de moléculas é a luminosa. Quando a molécula é quebrada, a energia guardada nas ligações químicas é liberada. O processo de combus- tão, ou seja, queima, acontece no nosso corpo dentro das células, em um processo chamado respiração celular. Dentro das células, substâncias são queimadas para produzir energia para a manutenção da vida. Nesse processo, moléculas de glico- se são desmontadas e, com consumo de oxigênio, resultam em dióxido de carbono e água. Veja o esquema da reação a seguir: Para que haja a combustão, é necessária a presença do comburente, nesse caso, o oxigênio. A celulose e a lignina, principais constituintes das células vege- 3 Comunidade vegetal mi-croscópica que flutua livre- mente nas diversas camadas de água. Sua distribuição vertical é restrita à zona eufótica (com luz), onde graças à presença de energia luminosa, realiza o processo fotossintético. Como o carbono é liberado? Como o carbono é fixado? Efeito estufa 82 tais, são carboidratos, isto é, substâncias à base de carbono. Por isso, quando esses seres vivos são queimados, há uma grande liberação de dióxido de carbono para a atmosfera. A combustão em um motor de automóvel libera a energia contida nos com- bustíveis para que o motor funcione. Combustíveis provenientes do petróleo, como a gasolina e o diesel, também são ricos em carbono. Observe a reação de combustãoda gasolina (C8H18): O monóxido de carbono (CO) origina-se quando não há oxigênio suficiente para a queima do combustível. Desse modo, ao invés de originar CO2, a combustão origina CO. A fuligem (C – carbono puro) que sai do escapamento é originada da queima de combustível na ausência de oxigênio, quando o motor está desregulado. O monóxido de carbono é prejudicial à saúde dos seres humanos, pois tem grande afinidade com a hemoglobina, dificultando o transporte de gases no san- gue. Uma vez ligado a uma molécula de hemoglobina, esta fica incapaz de trans- portar o oxigênio. Além desses gases, a queima de combustíveis fósseis libera óxidos de nitro- gênio (NxOy) e de enxofre (SOx). Esses gases poluentes, quando em contato com a água da chuva, reagem e formam o ácido nítrico (HNO3) e o ácido sulfúrico (H2SO4), respectivamente, originando a chuva ácida. Essa chuva altera a compo- sição química do solo e da água, destrói a vegetação e corrói esculturas, monu- mentos e edificações. Consequências Durante os últimos 70 anos, a temperatura da superfície da Terra apresentou um aumento médio de 0,6ºC. As cidades europeias tiveram um aumento de pelo menos 1ºC na temperatura máxima nos últimos 30 anos. Madri registrou tempe- raturas 2ºC mais altas do que durante os anos 1970. Outras cidades europeias que tiveram grande aumento da temperatura foram Londres, Paris, Estocolmo, Lisboa e Atenas, nas quais as temperaturas registradas estavam 1,5ºC mais altas. O aumento da temperatura modifica o padrão de movimentação do ar no globo terrestre, e consequentemente muda o regime de chuvas e de circulação dos oceanos. A mudança climática pode diminuir a disponibilidade de água doce, a produção e a distribuição de alimentos, a propagação sazonal de doenças infeccio- sas transmitidas por vetores, como a malária, a dengue e a esquistossomose. Estimativas baseadas em pesquisas científicas apontam que, em 2050, a re- gião amazônica poderá estar 5 ou 6ºC mais quente do que é hoje, ocasionando mais chuvas para a região Sul e menos chuvas para a região Nordeste. Outra consequência do aumento de temperatura é o degelo das calotas po- lares e das neves das montanhas. O derretimento do gelo dos polos vai ocasionar um aumento do nível dos oceanos, além de alterar a salinidade da água. Esses Efeito estufa 83 Área do tamanho do Pará está derretendo na Sibéria (BBC BRASIL, 2005) Um milhão de quilômetros quadrados de área congelada da Sibéria estão derretendo, o que pode aumentar significativamente a velocidade do aqueci- mento global. [...] O repentino descongelamento de uma área do tamanho da França e da Alemanha juntas (ou pouco menor do que o Estado do Pará, que tem 1,2 milhão de quilômetros quadrados) pode liberar na atmosfera bilhões de toneladas de metano, um poderoso gás causador do efeito estufa. A informação foi divulgada pelos pesquisadores Sergei Kirpotin, da Tomsk State University, na Rússia, e Judith Marquand, da Universidade de Oxford, na Inglaterra. Kirpotin suspeita que o fenômeno tenha cruzado o crítico limiar em que um pequeno aumento na temperatura global pode ser responsável por grandes mudanças no meio ambiente. Essas alterações, por sua vez, aumentam ainda mais as temperaturas da terra. [...] Segundo ele, toda a região subártica do oeste da Sibéria começou a derreter, o que já “vem ocorrendo há três ou quatro anos”. No lugar da área de terra congelada estão surgindo inúmeros lagos rasos, com mais de um quilômetro de extensão. De acordo com a New Scientist, o oeste da Sibéria esquentou mais rapidamente do que todo o resto do mundo, com um aumento nas temperaturas de 3ºC nos últimos 40 anos. [...] Outra causa do aquecimen- to é justamente o derretimento do gelo, que provoca a exposição de solo e oceano. Essas superfícies absorvem mais o calor solar do que o gelo, o que leva a mais aquecimento. Os lamaçais de turfa (uma massa de tecido de várias plantas) congelados que estão derretendo formaram-se há cerca de 11 mil anos, no fim da última era do gelo, e vêm gerando metano desde então. A maior parte do gás está presa na superfície congelada e em estruturas de gelo mais profundas. O pesquisador Larry Smith, da Universidade da Califórnia, em Los Angeles, estima que ape- nas nos lamaçais do oeste da Sibéria existam cerca de 70 bilhões de toneladas de metano, um quarto de todo o gás armazenado na superfície terrestre. Medidas mitigadoras Protocolo de Kyoto Em 1997, na 3.ª Conferência das Partes no Japão, os países industriali- zados comprometeram-se a reduzir suas emissões de gases do efeito estufa em acontecimentos irão mudar o padrão de correntes marítimas e, consequentemente, a vida marinha. O derretimento da neve das montanhas poderá provocar aumento do fluxo de água dos rios e, consequentemente, poderá haver enchentes por falta de drenagem dessa quantidade de água. Efeito estufa 84 pelo menos 5%, em relação aos índices registrados em 1990. Esse compromisso é chamado de Protocolo de Kyoto. O primeiro período do compromisso é de 2008 a 2012. Cada país tem uma meta específica a ser alcançada. Os Estados Unidos não aderiram ao Protocolo, mesmo sendo responsáveis por 25% da emissão total dos gases de efeito estufa. Três instrumentos de cooperação, também conhecidos como “mecanismos flexíveis”, foram adotados para atingir os objetivos da redução: o comércio de emissões, a implementação conjunta4 (IC) e o mecanismo de desenvolvimento limpo5(MDL). No IC, os países industrializados comprometidos com a redução de emissão dos gases do efeito estufa receberão créditos por financiar projetos que diminuam ou revertam a emissão desses gases. Os projetos poderão ser desenvolvidos ape- nas em países que tenham assinado o compromisso. Os projetos de IC estão sendo desenvolvidos no leste da Europa e na ex-União Soviética, sendo financiados pela União Europeia, Canadá e Japão. No MDL, países industrializados podem investir em projetos que diminuam ou revertam a emissão de gás carbônico na atmosfera. Com isso, esses países re- cebem créditos de carbono, ou seja, podem descontar esses créditos na quantidade de CO2 emitida em seu território, e assim atingir a meta estabelecida pelo Proto- colo. Os projetos podem ser desenvolvidos em outros países que não participem do Protocolo de Kyoto. Alguns países em desenvolvimento, como o Brasil, a China e a Índia, estão entre os maiores emissores atuais de CO2. No entanto, até 2012, eles não têm me- tas de redução e sua participação está restrita ao MDL. Aqui estão alguns exemplos de projetos para redução ou reversão da emis- são de gás carbônico na atmosfera: substituição dos ônibus de transporte coletivo urbano movidos a diesel por ônibus elétricos; transformação dos lixões em aterros sanitários, com tratamento do bio- gás (metano); sequestro de carbono, ou seja, usar plantio de árvores para captar e assi- milar o CO2 atmosférico; utilização de outras fontes energéticas, como a solar ou a eólica, entre outras. 4 Em inglês, o IC é conheci-do como Joint Implemen- tation (JI). 5 Em inglês, o MDL é conhe-cido como Clean Develop- ment Mechanism (CDM). [...] em outra palestra na SBPC, o secretário-geral do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, Luiz Pinguelli Rosa, da UFRJ (Universidade Fe- deral do Rio de Janeiro), falou sobre a proposta encaminhada pelo fórum à Presidência da República para que o Brasil crie metas de redução do desma- Efeito estufa 85 tamento, para reduzir as emissões de gases-estufa. Inventário apresentado no ano passado, revelou que 77% das emissões brasileiras se devem a queimadas (BONALUME NETO, 2005). Diminuição da geração de gases Segundo dados do Ibama, as emissões globais dos gases do efeito estufa, especialmente do CO2, continuam aumentando. Isso mostra a inadequação das políticase medidas nacionais e internacionais para tratar a questão da mudança do clima. Várias pesquisas vêm sendo realizadas na procura de novas fontes de energia para substituir o petróleo. Até a queima do metano, apesar de também liberar CO2, é considerada uma energia mais limpa, pois não produz o óxido de nitrogênio. No Brasil, o tratamento de gases em aterros sanitários é praticamente todo feito através da queima do metano (CH4) e liberação do dióxido de carbono (CO2). Essa técnica é a melhor alternativa, pois o metano retém mais calor na atmosfera do que o gás carbônico. Além disso, nos 4 mil lixões existentes no país ocorre a liberação de todos os gases gerados para a atmosfera, contaminando o ambiente, e prejudicando a qualidade de vida da população. A geração de energia através da utilização do biogás está inserida no MDL, podendo fazer parte da venda de créditos de carbono e, consequentemente, arrecadação de verbas para a gestão integrada de resíduos sólidos urbanos. O objetivo governamental é erradicar os lixões abertos, promover a inclusão social dos catadores e soluções sustentáveis para o problema do lixo no Brasil. Sequestro de carbono As florestas em crescimento absorvem mais dióxido de carbono do que flo- restas maduras ou em declínio. Isso se explica por causa da taxa de fixação do carbono através da fotossíntese, que é maior quando uma planta está crescendo. Quando uma floresta está madura, a taxa de fotossíntese é compensada pela taxa de respiração das plantas. Desse modo, a quantidade de dióxido de carbono fixado durante a fotossíntese acaba retornando para a atmosfera através da respiração da planta. Entretanto, esse fato não pode ser usado como desculpa para o desmata- mento, pois a retirada da cobertura vegetal também interfere no efeito estufa. Os projetos de sequestro de carbono têm o objetivo de recuperar áreas degra- dadas, através do plantio de árvores que assimilarão o carbono atmosférico. Isso também se aplica à preservação de áreas florestais com riscos de serem destruídas. Entre as práticas agrícolas que restauram a capacidade dos solos como reservatório de carbono podem ser citadas: reflorestamento, cultivo de culturas perenes (culturas extrativistas, como seringueira, cacau, castanhas, fruticultura etc.), uso adequado de fertilizantes químicos e adubos orgânicos, pastagens bem manejadas, agrofloresta e práticas de conservação do solo. Efeito estufa 86 No Brasil, algumas iniciativas para sequestro de carbono já estão sendo co- locadas em prática. Pode-se citar os trabalhos desenvolvidos em Guaraqueçaba e Antonina, no litoral do estado do Paraná, pela organização não governamental SPVS (Sociedade de Proteção da Vida Selvagem e Educação Ambiental) em par- ceria com a TNC (The Nature Conservancy – uma organização não governamental norte-americana). Os projetos desenvolvidos através dessa parceria são Ação con- tra aquecimento global na Serra do Itaqui, Projeto de reflorestamento da Floresta Atlântica em Cachoeira e Projeto piloto de reflorestamento no Morro da Mina. O Instituto Ecológico, também uma organização não governamental, desen- volve projetos no Tocantins, como o Projeto de sequestro de carbono da Ilha do Bananal e Projeto de sequestro de carbono em Carmo Rio. No Mato Grosso, uma parceria entre a fábrica de veículos Peugeot, a organi- zação não governamental francesa ONF (Office National des Forêts) e a brasileira Pró-Natura desenvolvem o Projeto de reflorestamento para o sequestro de carbo- no da Peugeot. Esse projeto é financiado pela corporação transnacional, por causa da sua necessidade de redução de emissão de gases. A vida na Terra só foi possível em função de uma combinação de fatores que ocasionam um tipo de “efeito estufa natural”. Vários gases são responsáveis por esse efeito, com destaque para o gás carbônico, que representa 60% das emis- sões originadas da atividade humana. Entre as principais causas dessas emissões, podem ser citadas as queimadas e derrubadas de florestas e o uso de combustíveis fósseis, processos que se tornaram mais impactantes após a Revolução Industrial, especialmente no século XX. Além do gás carbônico, outros gases contribuem para esse efeito, como o monóxido de carbono, o metano e o óxido nitroso. Ainda levará um bom tempo para reverter essa situação, pois o gás carbônico perma- nece na atmosfera entre 50 e 200 anos. A substituição das matrizes energéticas por fontes de energia mais limpa é um importante passo nessa jornada. Outras medidas que podem ser adotadas para reverter a tendência de aquecimento global, decorrente do efeito estufa, são a redução das taxas atuais de desmatamento e a restauração ambiental das áreas já degradadas. Um novo impulso para recuperar matas ciliares (GOLDEMBERG, 2004, p. 82) O aumento da concentração de gases causadores do efeito estufa, promovendo a elevação da temperatura global, tem suscitado inúmeras discussões em todo o mundo. O tema foi ressuscitado Efeito estufa 87 agora com a adesão dos russos ao Protocolo de Kyoto, o que deverá emprestar um novo impulso à questão. O Brasil, por conta do clima e das amplas extensões territoriais, deve estar atento aos diversos aspectos em torno das propostas e dos acordos internacionais voltados à mitigação das mudanças climáticas. Por ocasião da 9.ª Conferência das Partes da Convenção do Clima, ocorrida em Milão, em 2003, instituições governamentais e não governamentais brasileiras envolveram-se em exaustivas discussões acerca da possibilidade de se utilizar áreas ciliares, protegidas pelo Código Florestal, para o desenvolvimento de projetos de Mecanismos de Desenvolvimento Limpo – MDL. O resultado dessa mobilização foi um acordo internacional que acena com a possibilidade de se desenvolver projetos de reflorestamento ao longo de corpos d’água, com base no MDL, promo- vendo a proteção do meio ambiente, a conservação da biodiversidade, da água e dos solos e, ao mesmo tempo, gerando créditos de carbono. Não se trata de adicionar ou contrapor ao Código Florestal nenhum novo dispositivo, nem mesmo de reinterpretá-lo, mas apenas de viabilizar programas de recuperação de áreas degradadas e restauração de florestas nativas em grande escala, promovendo a absorção e fixação de carbono, além dos ganhos para o meio ambiente. Levantamento da Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo estima em mais de 1 milhão de hectares de áreas marginais aos corpos d’água, que se encontram desprovidas da pro- teção oferecida pela vegetação ripária, que, além de proteger a água e o solo, reduziria o assorea- mento dos rios e o aporte de poluentes, criaria corredores para o fluxo gênico entre remanescentes florestais, abrigaria e alimentaria espécies da fauna nativa e estabeleceria barreiras contra a disse- minação de pragas e doenças nas culturas agrícolas. Mas somente para recuperar as matas ciliares paulistas seria necessário produzir, plantar e manter mais de 2 bilhões de mudas. É nesse ponto que os programas e projetos com o objetivo de recuperar essas áreas apresentam a sua maior fragilidade: a insuficiência de recursos financeiros, o que poderia ser contornado com a remuneração pela absorção e fixação de carbono por florestas ciliares, em conformidade com o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), previsto pelo Protocolo de Kyoto, e que poderá impulsionar de forma extraordinária as ações de reflorestamento com espécies nativas em São Paulo. É em tal contexto que a Secretaria de Meio Ambiente está implementando o Programa de Re- cuperação de Matas Ciliares, para o qual já obteve o apoio do GEF – Global Environment Facility – aguardando-se apenas a aprovação final, com previsão de implementação do projeto já em 2005. O projeto prevê a realização de estudos para a valoração dos serviços ambientais prestado pelas florestas ciliares, especialmente osequestro de carbono. Estão em desenvolvimento, no mo- mento, estudos para suprir a carência de informações, além da análise e adequação de metodologias para a definição da linha de base e para avaliar e monitorar os estoques de carbono absorvido por matas ciliares. As informações produzidas serão divulgadas e disponibilizadas sob a forma de um guia de orientação, de modo a possibilitar sua aplicação por instituições públicas e privadas, para que pos- sam propor projetos de recuperação de matas ciliares que gerem créditos de carbono. A nossa expectativa é de que, dessa maneira, se consiga reduzir custos e dissipar incertezas de modo a viabilizar o aporte de recursos do “mercado de carbono” para a recuperação de matas ciliares. Efeito estufa 88 1. Relacione os principais gases que contribuem para o efeito estufa. 2. Forme um grupo de três pessoas e relacionem quais são as atitudes que cidadãos comuns podem tomar para evitar a emissão de gases do efeito estufa. 3. Compartilhe suas ideias com a turma toda. Relacione as melhores ideias que podem ser usadas em um programa de Educação Ambiental. Site da World Wildlife Fund: <www.wwf.org.br>. Nesse site, encontram-se várias notícias e resultados de pesquisas feitas sobre o aquecimento global. Site do Ministério da Ciência e Tecnologia: <www.mct.gov.br>. Nesse site, encontra-se informação sobre legislação e programas desenvolvidos no Brasil, em relação ao aquecimento global. A camada de ozônio A atmosfera é responsável pela vida na Terra, pois impede que o calor rece-bido do Sol seja totalmente dissipado para o espaço. Os gases que consti-tuem a atmosfera são provenientes de várias reações químicas, entre elas as que ocorrem no metabolismo dos seres vivos. O gás carbônico, por exemplo, proveniente da respiração dos seres vivos, é responsável pela absorção da radiação infravermelha, aquecendo a troposfera. O ozônio é um outro gás também respon- sável pela vida, pois filtra a radiação solar nociva, a radiação ultravioleta. O ozônio está presente na troposfera em uma quantidade bem pequena. No entanto, é na estratosfera que ele aparece em maior quantidade, formando uma camada de cerca de 15 quilômetros de espessura (entre 20 e 35km de altura no Equador e 14 e 30km nos polos). O ozônio começou a acumular-se na estratosfera há cerca de 400 milhões de anos, permitindo com isso o desenvolvimento da vida no planeta até as formas que conhecemos hoje. A radiação ultravioleta provoca mudanças na constituição genética dos seres vivos, por isso se diz que a vida é frágil perante esse tipo de radiação. Radiação solar De todo o espectro solar, os seres humanos são capazes de enxergar apenas a parte conhecida como luz branca ou luz visível. Essa luz corresponde à faixa do espectro solar compreendida entre o vermelho e o violeta, passando por todas as cores do arco-íris. A parte do espectro que é barrada na camada de ozônio é aque- la compreendida entre 400 e 100 nanômetros, chamada de radiação ultravioleta, e esta ainda é separada em três tipos: Radiação ultravioleta A – corresponde à faixa do espectro solar que varia do comprimento de onda de 400 até 320 nanômetros. Não é barrada na atmosfera e, apesar de menos nociva, também pode causar danos aos seres humanos. A ultravioleta A pode causar o eritema solar (vermelhi- dão na pele). Além disso, potencializa a ação da ultravioleta B. Radiação ultravioleta B – corresponde à faixa do espectro solar que varia do comprimento de onda de 320 até 280 nanômetros. Nos seres humanos, sabe-se que a ultravioleta B provoca envelhecimento precoce, eritema solar, queimaduras, imunossupressão1 e câncer de pele. Radiação ultravioleta C – corresponde à faixa do espectro solar que varia do comprimento de onda de 280 até 100 nanômetros. Essa radiação não atinge a superfície terrestre e não se sabe ao certo quais são suas ações sobre organismos vivos. 1 O estado no qual o siste-ma imunológico é supri- mido, deixando o indivíduo mais suscetível à ação dos agentes patogênicos. A camada de ozônio 90 O ozônio e sua função escudo de radiação ultravioleta O ozônio é uma molécula formada por três átomos de oxigênio. Permanece em estado gasoso na atmosfera e tem estrutura bastante instável e reativa, ou seja, reagindo facilmente com outras substâncias. Na estratosfera, existem condições adequadas para a formação do ozônio: a forte incidência de raios ultravioletas e a presença de muitas moléculas de oxigênio. Nessa camada, os raios ultravioletas C (UV-C) incidem sobre as moléculas de oxigênio (O2) e separam seus átomos, conforme a seguinte reação: Após essa separação, os átomos de oxigênio juntam-se rapidamente a outras moléculas de O2, formando o ozônio. Veja a reação: Com a incidência principalmente da radiação ultravioleta B (UV-B), o ozô- nio, que é bastante instável, desfaz-se em uma molécula de oxigênio (O2) e um átomo de oxigênio (O). Deve-se considerar que essas reações estão sempre acontecendo na estratos- fera, por isso a camada de ozônio é capaz de barrar totalmente a radiação ultravio- leta C e parcialmente a ultravioleta B. A destruição da camada de ozônio Desde 1957, a camada de ozônio é monitorada na Antártida. Em 1982, re- gistrou-se uma diminuição de cerca de 20% da quantidade de ozônio sobre aquele continente. Os registros continuaram marcando sua diminuição, que chegou em 30% a menos em 1984 e já era de metade da quantidade original em 1987. Nesse mesmo ano, detectaram-se outras “falhas” na camada de ozônio, que foram cha- madas de miniburacos, todas próximas da região Polar Sul. Além disso, medições de satélite mostraram que a quantidade geral de ozônio havia diminuído, princi- palmente no hemisfério Sul, sobre os continentes australiano e sul-americano. Em 1991, a Nasa anunciou a maior baixa da concentração de ozônio que já havia sido registrada na Antártida. Logo no ano seguinte, foi a vez do Ártico, que perdeu 20% do seu ozônio, e em 1996 esse buraco no Polo Norte já havia crescido 30%. Desde então, a quantidade de ozônio só diminuiu, aumentando os casos de câncer de pele nos países mais próximos do buraco da Antártida, como Chile e Argentina, e do Ártico, como Canadá, EUA e os países da Europa. A camada de ozônio 91 A causa da destruição Alguns produtos são considerados responsáveis pela destruição da camada de ozônio. O clorofluorcarbono (CFC), usado nos aerossóis e como gás refrigerante em aparelhos de ar-condicionado e refrigeradores; óxidos de nitrogênio, provenien- tes da desnitrificação do solo; e o metilbrometo, usado como pesticida e conservan- te de produtos – são alguns gases que podem destruir a camada de ozônio. Quando esses gases chegam até a estratosfera, as moléculas são quebradas pela radiação ultravioleta, liberando os átomos que as compõem. Um átomo de cloro, por exemplo, consegue destruir cerca de 100 mil moléculas de ozônio. Quando há a presença de átomos que reagem facilmente com o oxigênio, a velocidade de produção é mais baixa que a de destruição do ozônio, pois quando o oxigênio O2 tem seus átomos separados pela radiação ultravioleta, estes reagem com as outras substâncias presentes e não formam o ozônio como acontece normalmente. Além disso, outro fato terrível é que a molécula de CFC é bastante estável, permanecendo na atmosfera entre 60 e 100 anos. Ou seja, na metade do século XXI, mesmo que o uso de CFC seja banido, o que foi lançado no século XX ainda vai estar atuando sobre a camada de ozônio. Em 1987, o Programa das Nações Unidas para Proteção do Meio Ambiente conseguiu a adesão de 31 países no Protocolo de Montreal, o qual determinou que a produção mundial de CFC deveria cair pela metade até o ano 2000. Dois anos depois do Protocolo de Montreal, mais 50 países aderiram, inclusive o Brasil. Os países decidiram queaté o ano 2000 a produção de CFC deveria ser totalmente interrompida. Alemanha, Dinamarca e Holanda interromperam a produção desse gás em 1994, os EUA pararam sua produção em 1996. A previsão é que os países em desenvolvimento parem de produzir o gás até 2010. Outras substâncias nocivas à camada de ozônio ainda precisam de mais atenção, como: tetracloreto de carbono, utilizado como solvente; clorofórmio, uti- lizado como anestésico e solvente; dióxido de nitrogênio, usado na produção do ácido nítrico e produzido naturalmente por bactérias desnitrificantes, que têm sua ação acentuada por causa do uso exagerado de fertilizantes no solo. Para entender por que a camada de ozônio está sendo destruída apenas em alguns locais, é preciso entender a movimentação do ar no globo terrestre. Na região do Equador, onde a incidência da radiação solar é mais intensa, ocorre a ascensão das massas de ar e isso gera um deslocamento da atmosfera. O movimento de rotação da Terra, combinado a essa as- censão, gera os padrões de deslocamento atmosférico mostrados na figura. Mas o ozônio não está o tempo todo sendo produzido e destruído? Por que o buraco na camada de ozônio é maior na Antártida? A camada de ozônio 92 IE SD E B ra si l S .A . Ventos polares do leste Células de Hadley Células de Hadley Frente polar Na faixa dos trópicos, conhecidos como Centros de Alta Pressão, esse des- locamento ocorre tanto em direção ao Equador como em direção aos polos, onde as massas de ar descrevem um movimento circular em torno de um ponto deno- minado Vórtex Polar. É justamente nessa região que se acumulam diversos gases, entre os quais aqueles responsáveis pela destruição do ozônio. As consequências da destruição da camada de ozônio As principais consequências da destruição da camada de ozônio para os seres vivos são as queimaduras e o câncer de pele. Além disso, a catarata2 e a queda do sistema imunológico, deixando os indivíduos mais suscetíveis a doenças causadas por patógenos. A radiação ultravioleta B é altamente oxidante, podendo modificar a estrutu- ra genética das células, dependendo do tempo de exposição. Uma das consequên- cias mais graves é o desenvolvimento do melanoma maligno, tipo de câncer que pode levar à morte. 2 s.f. Turvação do cristalino (a lente do olho) – Muitas cataratas principiam pelo aparecimento de pequeninas manchas no cristalino, as quais interferem ligeiramente na visão. Podem causar a ce- gueira quando se estendem a todo o cristalino, que fica de um branco leitoso e opaco. As cataratas ocorrem por várias razões: velhice (catarata se- nil); inflamações oculares ou ferimento no olho; diabetes; perturbações do funciona- mento da glândula paratireoi- de; ou ainda a criança pode nascer com a doença (catarata congênita). ©2002 Enciclopé- dia Koogan Houaiss Digital. Segundo dados da Organiza- ção Mundial de Saúde, entre 12 e 15 milhões de pessoas estão cegas, no mundo intei- ro, devido à catarata, cerca de 20% desse total (mais ou menos 3 milhões) podem ter tido como causa a exposição excessiva aos raios UV. A Agência Norte-Americana de Proteção Ambiental estima que 1% de re- dução da camada de ozônio provocaria um aumento de 5% no número de pesso- as que contraem câncer de pele. Em setembro de 1994, foi divulgado um estudo realizado por médicos brasileiros e norte-americanos, no qual se demonstrava que cada 1% de redução da camada de ozônio desencadeava um crescimento específico de 2,5% na incidência de melanomas. A incidência de melanoma, aliás, já está aumentando de forma bastante acelerada. Entre 1980 e 1989, o nú- A camada de ozônio 93 mero de novos casos anuais nos Estados Unidos praticamente dobrou; segundo a Fundação de Câncer de Pele, enquanto que em 1930 a probabilidade de as crianças americanas terem melanoma era uma para 1 500, em 1988 essa chance era uma para 135. Em 1995, já se observava um aumento nos casos de câncer de pele e ca- tarata em regiões do hemisfério Sul, como a Austrália, Nova Zelândia, África do Sul e Patagônia. Em Queensland, no nordeste da Austrália, mais de 75% dos cidadãos acima de 65 anos apresentam alguma forma de câncer de pele; a lei local obriga as crianças a usarem grandes chapéus e cachecóis quando vão à escola, para se protegerem das radiações ultravioleta. A Academia de Ciências dos Estados Unidos calcula que apenas naquele país estejam sur- gindo anualmente 10 mil casos de carcinoma de pele por causa da redução da camada de ozônio. O Ministério da Saúde do Chile informou que desde o aparecimento do buraco no ozônio sobre o Polo Sul, os casos de câncer de pele no Chile cresceram 133%; atualmente, o governo fez campanhas para a população utilizar cremes protetores para a pele e não ficar exposta ao Sol durante as horas mais críticas do dia. A radiação UV-B também inibe a atividade do sistema imunológico hu- mano, o mecanismo natural de defesa do corpo. Além de tornar mais fáceis as condições para que os tumores se desenvolvam sem que o corpo consiga com- batê-los, supõe-se que haveria um aumento de infecções por herpes, hepatite e infecções dermatológicas provocadas por parasitas (GEOMUNDO, 2005). As plantas reagem à maior exposição aos raios UV-B diminuindo sua área foliar e aumentando a espessura das mesmas; essa é uma reação bastante co- mum. Entretanto, isso não é ruim, pois é um meio de proteção desenvolvido, ou estimulado, pela maior presença de radiação UV-B. Por outro lado, o que mais foi pesquisado foi a reação das plantas de interesse econômico, como a soja, que apresenta uma diminuição na sua produção proporcional ao aumento da radiação ultravioleta. O pinheiro que é plantado para a fabricação de papel, Pinus taeda, apresentou menor crescimento com o aumento da radiação. Nos ecossistemas aquáticos também há prejuízo, pois com maior incidência de raios UV-B, o fitoplâncton, maior consumidor de gás carbônico do planeta, tem sua produtividade reduzida, e consequentemente deixa de fixar o gás carbônico em compostos orgânicos através da fotossíntese. Na verdade, a clorofila, pigmento responsável pela fotossíntese, é degradada quando exposta a intensa radiação solar. Logo, a planta perde parte de sua capaci- dade de fotossintetizar, diminuindo seu metabolismo e retardando seu crescimen- to, ou muitas vezes morrendo. Há efeitos sobre os animais também, como larvas de peixes e nematódeos. Já se constatou também que rebanhos apresentam um aumento de enfermidades oculares, como conjuntivite e câncer, quando expostos a uma incidência maior de UV-B. A camada de ozônio 94 A ação da radiação ultravioleta B é tão intensa que é utilizada artificialmen- te para fazer a desinfecção da água, pois elimina seres vivos patogênicos através da oxidação que promove na água. Medidas mitigadoras e Educação Ambiental A partir do momento em que se soube da destruição da camada de ozônio, os países mobilizaram-se no sentido de tentar reverter a situação. Os primeiros passos foram parar de usar o CFC e ensinar a população a se proteger da ação da radiação UV-B. De acordo com o IBGE, o Brasil reduziu em 21% o consumo de CFC no período entre 1997 e 2000, colaborando com o Protocolo de Montreal, do qual é signatário. Esse protocolo, criado em 1987, foi a primeira medida tomada pelos países para evitar a total destruição da camada de ozônio. As medidas de proteção contra a exposição da radiação ultravioleta incluem roupas adequadas, chapéus e uso de filtros solares, de preferência com fator de proteção alto. Para os olhos, óculos escuros com lentes antirraios UV. É aconselhável não ficar ao Sol entre 10 e 14 horas, quando os níveis de radiação ultravioleta estão no máximo (durante o horário de verão, esse período ocorre entre 11 e 15 horas. Também sedeve levar em conta as propriedades de reflexão do solo. Grama, solo e água refletem menos de 10% dos raios UV inci- dentes. A neve, porém, reflete 80%, enquanto a areia reflete entre 10% e 25%. É importante lembrar que, apesar de fazê-lo menos intensamente, a radiação indire- ta (o chamado mormaço) com o céu nublado também afeta a pele. Outra informação importante é que a sensibilidade de cada pessoa à radia- ção ultravioleta depende do tipo de pele, o qual é um fator genético que não se modifica pela ação de agentes físicos e químicos. Ou seja, fazer bronzeamento artificial ou usar os produtos “autobronzeadores” não vai proteger mais a pele da radiação ultravioleta. Além de usar protetor solar e óculos escuros para se proteger, é preciso pro- teger o planeta Terra. Para isso, podemos mudar nossos hábitos e passar a consu- mir produtos que não contenham CFC ou não utilizem gases nocivos à camada de ozônio na sua formulação ou processo de produção. Por isso, é muito importante manter-se atualizado com relação ao que acontece na sua cidade e no mundo para poder agir como um cidadão responsável e multiplicador de informação. Hoje, os gases dos aerossóis estão sendo substituídos por uma mistura de propano e butano. Pode-se encontrar no rótulo do produto um selo indicando que aquele produto não contém CFC. Muitos refrigeradores e aparelhos de ar- -condicionado antigos ainda utilizam o CFC como gás refrigerante. No entanto, já existem no mercado refrigeradores que possuem HFC (hidrofluorcarbono) e ciclo- pentano (um hidrocarboneto), além de outros gases, podendo o consumidor optar A camada de ozônio 95 por alternativas ambientalmente corretas. Outro produto que está atendendo às necessidades ambientais é o poliestireno expandido, mais conhecido como isopor. No seu processo de produção, utilizava-se CFC para expandi-lo, mas hoje, esse gás está sendo substituído por pentano, um hidrocarboneto que não tem efeito direto sobre a camada de ozônio. Nosso compromisso com o planeta também é o de fiscalizar se a legislação está sendo cumprida e os tratados estão sendo colocados em prática em nosso país. 1. Caracterize a camada de ozônio, abordando sua localização, composição e função. 2. Quais os problemas que surgem para os organismos vivos com a destruição da camada de ozônio? 3. Quais as precauções que os cidadãos devem tomar em relação à radiação ultravioleta? A camada de ozônio 96 4. Como os cidadãos podem colaborar para evitar a destruição da camada de ozônio? Temos uma natureza riquíssima e uma população consciente e alerta para as questões do am- biente. No entanto, o país precisa combater a desigualdade. [...] Quem está agredindo mais os ecossis- temas do Brasil e do planeta é a riqueza. O padrão de consumo que existe no Brasil e no mundo hoje é insustentável. Presidente do IBGE, em entrevista sobre a conferência Rio +10, em 2002 (GÓIS, 2002). Site do Ministério do Meio Ambiente: <www.mma.gov.br>. Nesse site encontram-se informações sobre a camada de ozônio, bem como notícias e legislação a respeito. A hipótese Gaia A hipótese Gaia surgiu no final da década de 1960, e até hoje é bastante criti-cada por vários pesquisadores. Ao afirmar que a Terra é um superorganis-mo capaz de autorregulagem, a hipótese vai contra todas as afirmações de que a Terra é simplesmente uma “bola” de rocha com vida sobre ela. As grandes dimensões do planeta e longas escalas de tempo dificultam pensar em Gaia como um ser vivo de maneira concreta. A palavra Gaia é de origem grega e significa “Deusa Terra” ou “Mãe Terra”. A origem da hipótese Gaia O químico James Lovelock foi contratado pela Nasa (Administração Na- cional de Aeronáutica e Espaço dos Estados Unidos) nos anos 1960 para descobrir se há condições de vida em outros planetas, como Vênus e Marte. Lovelock questionou como seria a vida nesses planetas e se há meios de descobrir se tal vida seria semelhante à da Terra. Foi pensando sobre isso que o cientista concluiu que, para viver, os seres vivos retiram matéria e energia do meio em que vivem e descartam os resíduos também nesse meio. No caso da Terra, há a atmosfera (meio gasoso) e os oceanos (meio líquido), que servem como meios flui- dos de retirada de energia e descarte de resíduos. Logo, se ele analisasse a atmosfera do planeta poderia concluir se existe vida ou não, sem precisar ir até o planeta. Na Terra, a atmosfera tem 21% de oxigênio, que é altamente reativo e seria facilmente eliminado por outros gases, como hidrogênio, amônia, entre outros. Isso se explica porque a vida no planeta é responsável pela constante produção do gás, repondo sua quantidade na atmosfera. Quadro 1 – Diferença da composição da atmosfera dos três planetas (Terra, Marte e Vênus) Vênus Terra Marte Nitrogênio (N2) 1,9% 78% 2,7% Oxigênio (O2) 0,1% 21% 0,13% Gás carbônico (CO2) 98% 0,03% 95% A explicação para isso é que, se a composição da atmosfera é constante, sem compostos resultantes de metabolismo sendo alterados, não há vida. Para mim, a revelação pessoal de Gaia veio subitamente – como um flash ou lampejo de iluminação. Eu estava numa pequena sala do pavimento superior do edifício do Jet Pro- pulsion Laboratory, em Pasadena, na Califórnia. Era outono de 1965, e estava conversan- A hipótese Gaia 98 do com Dian Hitchcock sobre um artigo que estávamos preparando... Foi nesse momento que, num lampejo, vislumbrei Gaia. Um pensamento assustador veio a mim. A atmosfera da Terra era uma mistura extraordinária e instável de gases, e, não obstante, eu sabia que sua composição se mantinha constante ao longo de períodos de tempo muito longos. Será que a Terra não somente criou a atmosfera, mas também a regula – mantendo-a com uma composição constante, num nível que é favorável aos organismos vivos? (LOVELOCK apud TIO ALÊ, 2005) Para ajudá-lo na formulação da hipótese Gaia, Lovelock convidou a bióloga microbiologista Lynn Margulis. Através da hipótese, eles questionam a ideia de que a vida surgiu na Terra por causa das condições atmosféricas e climáticas fa- voráveis do planeta. Pelo contrário, dizem que a vida cria as condições necessárias para continuar existindo. Além disso, afirmam que o planeta é um ser vivo, inteli- gente e que se autorregula, mantendo as condições favoráveis para a manutenção da vida, sendo capaz de superar os desequilíbrios ambientais, criando novas con- dições de equilíbrio, mesmo que isso resulte em adaptação, grandes extinções ou surgimento de novas espécies. Em outras palavras, a hipótese Gaia afirma que a superfície da Terra, que sempre temos considerado o meio ambiente da vida, é na verdade parte da vida. A manta de ar – a troposfera – deveria ser considerada um sistema circulatório, produzido e sustentando pela vida [...] Quando os cientistas nos dizem que a vida se adapta a um meio ambiente essencialmente passivo de química, física e rochas, eles perpetuam uma visão mecanicista seriamente distorcida, própria de uma visão de mundo falha. A vida, efetivamente, fabrica, modela e muda o meio ambiente ao qual se adapta. Em seguida, esse “meio ambiente” realimenta a vida que está mudando e atuando e crescendo sobre ele. Há interações cíclicas, portanto, não lineares e não estritamente determinísticas. (MARGULIS apud TIO ALÊ, 2005) As evidências da hipótese O calor irradiado pelo Sol aumentou cerca de 25% desde que a vida surgiu na Terra. O questionamento de Lovelock foi como a temperatura conseguiu se manter estável, com um clima favorável à vida, durante 4 bilhões de anos? A resposta encontrada foi Gaia, a Terra como um superorganismo capaz de regular suas condições físicas e químicas. Nessa hipótese, os fatores bióticos agem sobre os abióticos modificando o ambiente. Todas as evidências apontam para essa re- lação entre os fatores. Para explicar e comprovarque a Terra é um superorganismo, os cientistas citam vários acontecimentos no planeta como sendo evidências da hipótese. A formação de ilhas por corais, as dunas com vegetais, a acidez do solo, surgimento do oxigênio na atmosfera, entre outros. Durante milhões de anos, a Terra foi habitada apenas por micro-organis- mos anaeróbios, ou seja, que não dependem do oxigênio para sobreviver. Com A hipótese Gaia 99 seu metabolismo simples, nutriam-se de compostos orgânicos, liberando como resíduos compostos inorgânicos simples. A proliferação desses organismos fez com que a quantidade de compostos orgânicos diminuísse. Na tentativa de se adaptar às novas condições ambientais, alguns desses organismos evoluíram e deram origem às plantas verdes, que conseguem assimilar as substâncias inor- gânicas e transformá-las em compostos orgânicos através da fotossíntese. Mas como produto desse novo processo surge o oxigênio, letal para os seres anaeró- bios. Novamente, os seres evoluíram para conseguir utilizar essa nova substância e controlar sua presença de uma maneira que todos conseguissem sobreviver. Os solos cultivados, por exemplo, seriam muito ácidos se não houvesse as bactérias para transformar o nitrogênio inorgânico em formas assimiláveis pelas plantas. Os corais também são exemplos, pois seu metabolismo permite fixar o cálcio da água do mar e transformar suas colônias em “rochas”. Isso modifica todo funcionamento no local onde se instalam. As dunas locomovem-se com os ventos, mas a partir do momento que começam a receber vegetação, ficam mais estáveis. A matéria mineral das dunas (silício) junta-se com a matéria orgânica dos seres vivos que passam a viver nelas, e transforma-se em solo. Hoje, é impensável a vida sem o oxigênio. Porém, sem os organismos fotos- sintetizantes, o oxigênio deixaria de ser reciclado e a maior parte dos seres vivos morreria. O planeta das margaridas James Lovelock postulou o modelo do Planeta das Margaridas para explicar como os seres vivos conseguem agir sobre o ambiente. Supondo-se que haja apenas três espécies de margarida vivendo no pla- neta: as brancas, as cinzentas e as pretas. Se a temperatura está muito baixa, as margaridas pretas reproduzem-se mais e espalham-se por todas as regiões. Isso é possível graças à sua coloração que permite que elas absorvam mais calor. À me- dida que elas vão se proliferando, o planeta vai se tornando mais quente por causa do calor absorvido por elas. Se o planeta é mais quente, as margaridas brancas se proliferariam, pois suas pétalas refletiriam mais o calor. Logo, o planeta também se tornaria mais frio. Porém, se a temperatura é média, as margaridas cinzentas iriam se proliferar mais do que as outras. Pode-se juntar às margaridas mais duas populações: coelhos e raposas. Se o número de coelhos aumentar, diminuirá o número de margaridas que seriam co- midas pelos coelhos. Entretanto, se as margaridas se esgotassem, a população de coelhos morreria de fome. Nesse caso, é necessário atingir um equilíbrio no qual o número de margaridas é exatamente o suficiente para alimentar a população de coelhos. A mesma lógica se aplica para a população de coelhos e de raposas, sendo estas os predadores dos coelhos. A hipótese Gaia 100 Ações humanas e a hipótese Gaia Os seres humanos têm uma grande capacidade para alterar o meio em que vivem. Suas atividades de caça, desmatamento, mineração, produção agrícola e pecuária e desenvolvimento de cidades transformam a paisagem e intensificam os acontecimentos naturais. Desde as civilizações pré-históricas, animais foram extintos pela caça. O desmatamento deixa o solo exposto à ação do tempo, fragmentando a paisagem natural, levando espécies à extinção e provocando catástrofes. A mineração polui rios e destrói a vegetação. A atividade agropecuária também provoca grandes estragos na paisagem, empobrecendo o solo, poluindo a água e o ar. As cidades constituídas e administradas sem planejamento estratégico provocam o mal-estar da população e dos demais seres vivos. Enchentes, enxurradas, deslizamentos, erosão, poluição – esse é o resultado da presença humana no planeta. Além disso, podem ser citadas mais consequências para o ambiente. A chu- va ácida, por exemplo, é resultante da emissão de óxidos de enxofre pela queima de combustíveis derivados do petróleo. Esses óxidos reagem com a água existente na atmosfera e transformam-se em ácido sulfúrico (água + óxido de enxofre). O resultado é a precipitação desses ácidos, que prejudicam estruturas metálicas, vegetação e construções, afetando a composição química do solo e da água na superfície do planeta. O aquecimento global, o derretimento de geleiras, o aumento do nível do mar são acontecimentos naturais que estão sendo intensificados e catalisados pela ação do homem sobre a natureza. Pela hipótese Gaia, é a Terra (Gaia) tentando achar uma saída para regular o ambiente e deixá-lo novamente favorável à vida. O estresse causado nas catástrofes resultou em extinções. Os impactos causam estresse no ambiente. Eles podem ser agudos, quando percebidos imediatamente, ou crônicos, quando percebidos depois de um tempo. Na história evolutiva do planeta, grandes e rápidas modificações foram catastró- ficas para a vida. Como exemplo de estresse crônico pode ser citado o uso de gás CFC, des- coberto como maléfico para a camada de ozônio após anos de uso. Hoje, sofre-se a consequência da ignorância de gerações passadas, assim como gerações futuras ainda vão sofrer com a ignorância das gerações atuais. Perspectivas futuras Para conservar é preciso amar. [...] minha visão de ecologia, ao contrário de muitos livros lançados sobre o assunto, não está centralizada no homem. Se quisermos ter sucesso em conservação da natureza, precisamos de uma outra lógica diferente da nossa lógica econô- mica atual. [...] só vamos poder conservar a natureza se o fizermos para o seu próprio bem. Fernando Fernandez A hipótese Gaia 101 À medida que o tempo passa e as catástrofes começam a afetar a hu- manidade, o posicionamento dos governos em relação à natureza começa a mudar. Muito já foi destruído para que as pessoas se dessem conta do que já foi perdido em relação à natureza. A inclusão da Educação Ambiental no currículo das escolas brasileiras, a conscientização sobre os problemas já causados é um bom começo. Ainda falta muito! As pessoas consomem mais do que realmente precisam. A tradição de se ter muito faz com que o ser humano não perceba os recursos naturais como finitos. Além disso, as ideias “conservacionistas” ficam apenas nas palavras e não aparecem nas atitudes do dia a dia . Poucas pessoas se preocupam em gastar menos água, menos energia. Apenas aquelas que veem seu bolso sendo atacado cada vez que precisam pagar a conta é que começam a racionar. Imagine uma cena de uma família de quatro pessoas andando na rua, pai, mãe e dois filhinhos. O pai com um pacote de bala na mão. Ele “descasca” a bala, põe na boca e joga o papel no chão, e os filhinhos fazem o mesmo. É certo que as crianças serão exatamente assim quando crescerem, pois se inspiram nos pais para aprender a viver. Na natureza acontece isso. Filhotes imitando os pais e co- piando seus hábitos e habilidades. Com o ser humano não seria diferente, apesar de esquecermos que somos animais, da espécie Homo sapiens, e que nosso DNA tem 98% de semelhança com os chimpanzés. A população humana esquece que sua sobrevivência está intimamente ligada à sobrevivência das outras espécies. Quanto mais degradamos, mais danos causamos a nós mesmos. [...] A projeção animista também serve de base para uma moderna religião travestida de ciência, que atende pelo nome de hipótese Gaia. A ambiciosa ideia, formulada pelo químico James Lovelock, é de que o planeta inteiro teria evoluído para servir de abrigo adequadoà vida, e funcionaria como uma espécie de superorganismo autorregulado. A fragilidade da argumen- tação de Gaia chega a ser comovente. Toda e qualquer característica do ajuste Terra-organismos apontada como evidência a favor da hipótese Gaia, é explicada de maneira muito mais simples e óbvia por seleção natural. Por exemplo, Lovelock argumenta que o planeta desenvolveu uma alta concentração de oxigênio em sua atmosfera para se tornar acolhedor para os animais, que respiram oxigênio. No entanto, é infinitamente mais simples e plausível conceber que, por ser o oxigênio um recurso abundante, a seleção natural tenha favorecido os organismos que desenvol- veram a capacidade de utilizá-lo. A popularidade da hipótese Gaia, apesar de evidente falta de bons argumentos a seu favor, a meu ver é bastante fácil de explicar: Gaia fala exatamente o que as pessoas queriam ouvir, ao fornecer um motivo “superior”, maior que nós, pelo qual devería- mos agir corretamente com o nosso planeta, que afinal de contas também seria um organismo A hipótese Gaia 102 vivo. O segundo livro de Lovelock chama-se As Idades de Gaia; é bem claro que pelo menos a ideia de Gaia de fato é muito antiga: nada mais é que a velha projeção animista em grandiosa escala, com uma roupagem “modernosa” e pseudocientífica. O caráter religioso também é bas- tante claro, não faltando nem mesmo a revelação (o próprio Lovelock afirma ter percebido que o nosso planeta era vivo ao ver pela primeira vez uma foto da Terra vista do espaço). Como qual- quer religião, Gaia pode ser efetiva em mobilizar pessoas por uma causa, no caso a conservação. Porém, uma vez que Gaia não se assume como religião e prefere manter seu disfarce de ciência, espero que a conservação não dependa dela, pois cedo ou tarde vai surgir alguém para dizer “o rei está nu”, como alguns aliás já estão fazendo (FERNANDEZ, 2004, p. 237-238). 1. Forme um grupo de três pessoas e discuta a hipótese Gaia, levantando aspectos positivos e negativos. 2. Ainda em grupo, discuta se a hipótese Gaia pode ser verdadeira, ou não passa de religião, como é apresentado no texto complementar. 3. Exponha suas conclusões para a turma e discuta com os outros colegas sobre o que o seu grupo escreveu na atividade 2. TAVARES, Marina de Lima; EL-HANI, Charbel Niño. Um Olhar Epistemológico Sobre A Trans- posição Didática da Teoria Gaia. Disponível em: <www.if.ufrgs.br/public/ensino/vol6/n3/v6_n3_ a4.htm>. Acesso em: 29 set. 2005. Matrizes energéticas Q uando o homem passou a dominar o fogo, percebeu que tinha em mãos uma importante fonte de energia, capaz de não só aquecê-lo nos perí-odos mais frios como também preparar o seu alimento. Notou também que o fogo poderia ser um importante aliado no manejo da vegetação natural para práticas de cultivo e criação de animais, além de utilizar o fogo como uma técnica de caça. O uso da energia transformou o poder de produção do homem, e conse- quentemente provocou uma série de impactos no ambiente. Dessa época até chegarmos à Revolução Industrial, na qual a energia calorífica serviu para movimentar os primeiros motores a vapor, foi um pulo em termos tecnológicos. Curioso por natureza, o homem continuou buscando novas formas de energia, visando atender suas diferentes necessi- dades, agora num mundo em franca expansão tecnológica e industrial. No entanto, sabe-se que para gerar energia há um custo e esse custo não é baixo. Produzir cada vez mais em menos tempo é resultado do avanço tecnológico. Mas qual o preço desse avanço? Até agora, pelo menos para o ambiente, o resultado foi extinção de espécies, ar poluído, chuva ácida, efeito estufa, desmatamento. No final do século XX, começou a preocupação com a substituição das fon- tes de energia, pois estudos mostravam que as fontes de petróleo estavam se es- gotando. Novas fontes de energia foram desenvolvidas, mais limpas e renováveis. No entanto, as novas alternativas ainda não conseguiram substituir as antigas formas poluidoras de geração de energia. Os países industrializados, apesar de abrigarem apenas 21% da popu- lação mundial, consomem 70% das fontes convencionais de energia e 75% da eletricidade? Quantos anos queimando combustíveis que poluem até que o homem percebesse o mal que vinha fazendo ao planeta? Matrizes energéticas 104 Quadro 1 – Matrizes energéticas mais utilizadas no Brasil Renováveis Não renováveis álcool (combustível) álcool anidro (aditivo na gasolina) lenha carvão vegetal bagaço da cana petróleo e seus derivados gás natural1 carvão mineral xisto As fontes renováveis ainda representam a menor parcela da produção ener- gética no Brasil. Quarenta e um por cento da energia produzida e utilizada no país vem do petróleo e seus derivados, 24% das fontes renováveis, 18% de gás natural, carvão mineral e xisto e 17% de hidrelétricas. Petróleo C or el Im ag e B an k. O petróleo é uma substância oleosa, inflamável, menos densa do que a água, com cheiro característico, e de cor que varia entre negro e castanho escuro. Sua origem mais provável é da decomposição incompleta dos organismos marinhos em ambiente com pouca oxigenação, o que formou as reservas dessa substância, que é composta por grandes quantidades de carbono. Através de técnicas de des- tilação, craqueamento térmico, alquilação e craqueamento catalítico, o petróleo é refinado, derivando diversas outras substâncias, como combustíveis (gasolina e diesel), lubrificantes, plásticos, fertilizantes, medicamentos, tintas e tecidos. Os combustíveis derivados do petróleo, quando queimados, liberam uma grande quantidade de dióxido de carbono, além dos óxidos de enxofre, poluindo o ar atmosférico. Quando a queima acontece na presença de pouca quantidade de oxigênio, o resultado é a liberação de monóxido de carbono. Caso não haja oxigê- nio, haverá liberação de carbono na forma de fuligem. 1 Gás composto 85% de metano, retirado junto com o petróleo das reservas. Matrizes energéticas 105 Os combustíveis derivados do petróleo são atualmente a forma mais utiliza- da para gerar energia, sendo utilizadas para mover motores de automóveis e até na geração de eletricidade nas usinas termoelétricas. A extração do petróleo requer grandes investimentos, pois as reservas desse material ficam em locais bastante profundos da plataforma continental. Do local de extração até as refinarias e daí para os postos de distribuição e venda dos produtos, o transporte é feito através de navios, dutos e caminhões. Quando acontece um acidente que envolve uma das fases citadas, a degra- dação ambiental é bastante grande. Em janeiro de 2000, por exemplo, um rompimento de um duto no Rio de Janeiro lançou 4 mil toneladas de óleo na Baía de Guanabara, e para recuperar o ecossistema serão necessários cerca de dez anos. No mesmo ano, um outro acidente acontece no Paraná, lançando mais de 4 milhões de litros de óleo no Rio Iguaçu. Em abril de 2001, houve um acidente na plataforma marítima P-7, no Rio de Janeiro, que lançou no mar 26 mil litros de óleo. Um mês depois desse acidente, a plataforma P-36, uma das mais modernas em alto-mar, é destruída por explosões de seus dutos e a estrutura de 34 mil toneladas vai para o fundo do mar. O resultado desse acidente foi uma mancha de óleo de 60 quilôme- tros quadrados. Além de gerar impactos no seu uso, o petróleo é problemático desde a sua extra- ção. Além disso, esta é uma fonte de ener- gia não renovável, por isso a preocupação em desenvolver novas tecnologias com o uso de outras fontes energéticas. Usinas hidrelétricas O uso da água para geração de ener- gia aparentemente não causa problemas de poluição. No entanto, a implantação de uma usina hidrelétrica provoca vários proble- mas sociais e ambientais. O represamento do rio causa o alagamento de umagrande área ocupada por vegetação nativa, plan- tações, criação de animais, expulsando os moradores locais. Além disso, a inundação e o represamento do rio interferem drasti- camente no regime hidrológico da região, afetando a vegetação, a fauna e as popula- ções ribeirinhas. C or el Im ag e B an k. Matrizes energéticas 106 A maior barragem do mundo, a barragem de Três Gargantas (China), pro- vocou a relocação de 1 milhão de pessoas? No Brasil, a construção da hidrelétrica de Balbina, no Rio Uatumã, próxi- mo à capital Manaus, foi um desastre. Sua barragem inundou 2 360 quilômetros quadrados de floresta, mas hoje 30% de sua extensão tem apenas um palmo de profundidade. A produção dessa usina não é suficiente para abastecer Manaus e sua produção cai de 250 para 100 megawatts na estação seca. O Brasil tem inúmeras usinas hidrelétricas e, de acordo com a WWF-Brasil, o atual parque de hidrelétricas existentes no país pode produzir mais energia atra- vés da troca de turbinas e modernização de suas instalações, sem a necessidade de construir novas usinas. Hoje, 77% da eletricidade brasileira é produzida por usinas hidrelétricas, e o restante provém de usinas termoelétricas e usinas nucleares. Biomassa O uso da biomassa para produção de energia sig- nifica o aproveitamento da energia solar, que foi ante- riormente utilizada na fixação do carbono através da fotossíntese, para gerar novamente energia. Convencio- nalmente, aproveita-se a energia fixada na fotossínte- se para alimentação, porém os resíduos das plantações podem ser utilizados para gerar outros tipos de energia. Através da fermentação, queima, carburação, pirólise, produção de metanol e etanol, síntese de hidrogênio, cé- lulas combustíveis, entre outros, converte-se a biomassa em energia. Na fermentação é produzido o biogás, aprovei- tando-se todo tipo de resíduo biodegradável jogado no lixo. Se esses resíduos ficarem a céu aberto, o metano proveniente da sua fermentação será todo lançado na at- mosfera, contribuindo para o aumento da temperatura global. O aproveitamento desses resíduos é total, pois o metano (biogás) é posteriormente queimado para gerar calor e energia, e a matéria orgânica decomposta é utili- zada como fertilizante. Em nosso país, a temperatura é adequada para que aconteça esse processo naturalmente, sem a necessidade de utilizar energia para aquecer a ma- téria orgânica e assim permitir a ação das bactérias. B . N av ez . Matrizes energéticas 107 No Brasil, a utilização do álcool combustível é uma inovação, pois polui menos que os derivados do petróleo. O álcool é derivado da cana-de-açúcar e a produção brasileira desse vegetal é de 300 milhões de toneladas por ano, sendo 52% desse total destinado à produção do combustível. A cana-de-açúcar é hoje alvo de pesquisa para melhoria de produção e aproveitamento dos subprodutos, como plástico biodegradável e derivados da cana para uso medicinal. Além do combustível, da cana ainda pode ser produzido um aditivo da gasolina, o álcool anidro, que substitui o MTBE (metil-tércio-butil-éter), derivado do petróleo e al- tamente tóxico. O valor energético contido em 300 milhões de toneladas de cana-de-açú- car equivale a 324 milhões de barris de petróleo? Com o uso do bagaço da cana, ainda é possível conseguir a energia equivalente a 216 milhões de barris de petróleo. A energia elétrica produzida na usina canavieira é de 800 megawatts, podendo chegar a 3 mil megawatts sem precisar trocar os equipamentos. Só não se produz mais porque não há mercado para esse tipo de eletricidade. O biodiesel é outra proposta para o aproveitamento energético da biomassa. Esse produto é uma mistura de diesel comum, derivado do petróleo, com óleos de origem vegetal. Utiliza-se óleo de plantas, como amendoim, girassol, mamona, sementes de algodão e de colza, além de plantas brasileiras como a andiroba, o babaçu e o dendê. O problema do uso da biomassa é que sua queima também gera dióxido de carbono, que é liberado para a atmosfera, porém com a vantagem de não liberar o enxofre, que é liberado na queima dos combustíveis derivados do petróleo. As plantações de cana-de-açúcar também têm os impactos ambientais e os problemas sociais relacionados a ela. Uso extensivo do solo, necessidade de fertilizantes, mão de obra infantil são alguns dos problemas embutidos na produção da cana- -de-açúcar. Energia solar fotovoltaica A geração de energia elétrica através dos sistemas fo- tovoltaicos tem emissão mínima de dióxido de carbono. Po- rém, o investimento necessário para sua implantação é muito alto, desestimulando os interessados. A produção de eletrici- dade através da energia solar não traz retorno financeiro ao investidor. No entanto, seus benefícios são para a comunida- de e o meio ambiente. En ric o D ol ab el i. Matrizes energéticas 108 Hoje, essa fonte de energia é utilizada em locais distantes das linhas de transmissão e distribuição de eletricidade. Algumas fazendas possuem sistemas fotovoltaicos, pois os investimentos para trazer a rede elétrica até a fazenda são equivalentes à instalação das placas de coleta de energia solar. Algumas casas e edifícios também já aderiram a esse sistema, pois se produzindo a energia utiliza- da, essas construções têm autonomia energética. Em Israel, o uso de energia solar é obrigatório e faz parte do projeto de construção de casas. Energia eólica O vento é capaz de gerar energia de uma forma totalmente limpa e renová- vel. Em 2002, já eram produzidos cerca de 24 500 megawatts no mundo todo, sen- do que o mercado para energia eólica movimentava cerca de seis bilhões de dóla- res só com a fabricação dos aerogeradores. O custo da energia eólica em muitos países já alcançou os custos da energia gerada por hidrelétricas e termoelétricas. A capacidade geradora das usinas eólicas em regiões brasileiras, em que a média anual de velocidade dos ventos é de 8 metros por segundo, chega a 40%, sendo que em locais como o litoral nordestino essa capacidade chega a 60%. Hoje, no Brasil, existem usinas eólicas em Taíba, Prainha e Mucuripe (Ce- ará), Palmas (Paraná) e Bom Jardim da Serra (Santa Catarina). Isso representa apenas 22,2 megawatts de potência eólica. Em nosso país, os períodos mais secos coincidem com os períodos de mais vento, ou seja, quando os reservatórios das hidrelétricas ficam com menor capaci- dade, as usinas eólicas passam a produzir mais energia. Com a crescente demanda de energia no mundo aliada às necessidades de controle ambiental, preservação da natureza e crescimento autossustentado, o aproveitamento dos ventos é uma alternativa que deve ser explorada. Os avanços tecnológicos e redução dos custos desse tipo de energia fazem dela uma das tec- nologias que mais cresce em todo o mundo, cerca de 40% ao ano. Energia nuclear A energia nuclear não emite gases poluentes na atmosfera, sendo que em alguns países europeus ela fornece mais da metade da energia elétrica utilizada. No entanto, gera o lixo nuclear ou lixo radioativo que permanece ativo durante muito tempo, representando uma ameaça para o ambiente. A instalação de uma usina nuclear necessita de muito investimento. No Brasil, a primeira usina foi implantada em 1972, a Angra I, mais conhecida como “vaga-lume” por causa do fornecimento de energia frequentemente interrompido. Angra II recebeu seus equipamentos em 2000, 25 anos após o acordo de compra com a Alemanha. Para Angra III, já foram investidos 750 milhões de dólares em equipamentos, mas sua construção foi adiada por falta de recursos e por causa das críticas ao programa nuclear (conte-se aqui a ineficiência de Angra I). Em 2002, a França se interessou Matrizes energéticas 109 em financiar o término de Angra III e fez um acordo com oBrasil de cooperação para uso pacífico, porém, apenas em 2004 um grupo de trabalho começou a estu- dar a viabilidade técnica, econômica e social dessa obra. Da mesma maneira que é necessário muito investimento para implantar uma usina nova, para desativar essa usina é necessário muito dinheiro também, pois é preciso isolar os materiais radioativos. O preço da desativação é dez vezes maior do que um reator novo. Os riscos gerados pelo lixo radioativo são muito grandes. Em 1986, houve o acidente em Chernobyl, na Ucrânia, que matou cerca de 30 mil pessoas. Hoje, os ucranianos enfrentam altos índices de câncer e mutações em consequência do acidente. Energia “limpa” ameaça camada de ozônio (ANGELO, 2003) As chamadas energias verdes também têm o seu lado cinzento. Um estudo publicado hoje indica que o hidrogênio, considerado o combustível do futuro por não poluir a atmosfera, pode trazer problemas até então não imaginados, como um resfriamento global e o aumento dos buracos na camada de ozônio sobre os polos. Embora ressalve que esses problemas não devem impedir o desenvolvi- mento de células de combustível2 para substituir a economia do petróleo – que, além do aquecimento global, também alimenta guerras –, o estudo diz que eles devem ser levados em conta quando se debatem medidas a serem adotadas, para evitar danos ambientais na transição para a economia do hidrogênio. Elemento mais abundante do universo, o hidrogênio é considerado a gran- de aposta entre as energias limpas no lugar dos combustíveis fósseis (como petróleo, gás natural e carvão mineral). Uma das razões para essa esperança é o fato de sua queima ter como subproduto apenas água (H2O), enquanto os de- rivados de petróleo produzem poluentes como enxofre e óxidos de nitrogênio, além de gás carbônico (CO2), o vilão do aquecimento global. Mas, claro, nada vem tão fácil. Primeiro, o hidrogênio precisa ser disso- ciado da água ou de outras moléculas, o que gasta energia. O estudo de cientistas do Instituto de Tecnologia da Califórnia, EUA, pu- blicado na revista Science (Disponível em: <www.sciencemag.org>), acende um segundo sinal amarelo: se o hidrogênio substituísse inteiramente os com- bustíveis fósseis, seria de esperar o vazamento de 10% a 20% do gás em usinas de força, tanques, células de combustível e gasodutos. Isso aumentaria as emissões de H2 em até oito vezes. Como o hidrogênio tende a subir para a alta atmosfera e a reagir com o oxigênio, produzindo água, o resultado previsível seria o crescimento da umidade na estratosfera. E até água, em excesso, faz mal. “Isso resultaria num resfriamento da baixa estratosfera e numa perturba- ção na química do ozônio”, escreveram os cientistas. 2 As células de combus-tível funcionam como uma grande bateria movida a hidrogênio, que reage com o oxigênio e produz água. Tecnologia ainda em desen- volvimento. Matrizes energéticas 110 Os pesquisadores, liderados por Tracey Tromp, usaram dois modelos de computador para simular o que aconteceria com a atmosfera do planeta em dois casos: com as concentrações de hidrogênio semelhantes às atuais e com concentrações quadruplicadas. No segundo cenário, a quantidade de água na estratosfera acima dos 40 quilômetros de altitude chegaria a 30%, com várias consequências indiretas. A principal seria o resfriamento estratosférico, o que aumentaria a quantidade de nuvens nos polos e “tornaria o buraco de ozônio maior (em área) e mais persistente (na primavera)”. A pior situação, afirma o grupo de Tromp, estaria no Ártico, onde a camada de ozônio ainda está relativamente intacta “e tem potencial para ficar como a da An- tártida”. Ali, a quantidade de ozônio diminuiria em até 8%. Como esse gás protege a Terra da radiação ultravioleta solar, que causa mutações – e câncer – em seres vivos, a perda da capa no Ártico, muito mais habitado que a Antártida, é motivo de preocupação. Apesar de a camada de ozônio estar se recompondo aos poucos, como resultado da proibição dos CFCs, gases que a destroem, a economia do hi- drogênio poderia atrasar essa recuperação. No entanto, para melhor prever o impacto, será preciso esclarecer o papel da tecnologia na redução dos vaza- mentos e dos solos como “ralo” do H2 humano. Uso racional das matrizes energéticas As reservas de energia do planeta irão durar por tempo determinado? Veja os exemplos a seguir: Petróleo: 42 anos Gás natural: 65 anos Carvão mineral: 165 anos Linhito: mais de 200 anos Urânio: 40 anos O consumo excessivo faz aumentar a demanda por usinas de produção de energia. Quanto maior a produção, maior é o gasto energético. Além de trocar as fontes de energia não renováveis por fontes renováveis, é necessário que haja a colaboração da sociedade na redução do consumo de energia. Para se ter uma ideia, o gasto de energia do stand-by, estado no qual o apare- lho eletrônico está ligado, porém não realiza sua atividade principal, corresponde a cerca de 10% do gasto de eletricidade em escritórios e domicílios. Matrizes energéticas 111 Observe o gasto dos aparelhos quando estão em stand-by: TV – 1 a 13W Videocassete – 5 a 19W Rádio relógio – 1 a 3W Forno de micro-ondas – 2 a 6W Recarregador de bateria – 2 a 4W Secretária eletrônica – 2 a 4W Telefone sem fio – 2 a 7W Micro system – 0 a 12W Som portátil – 0 a 5W Veja algumas formas de se economizar energia em casa: Desligar a luz nos recintos não ocupados. Degelar regularmente as geladeiras. Usar a máquina de lavar roupa apenas com a carga máxima. Reduzir o uso de torneira elétrica. Não ficar abrindo e fechando a geladeira muitas vezes e observar se a borracha de vedação está bem conservada. Diminuir o tempo de banho nos chuveiros, fechando-o enquanto se ensaboa e lava o cabelo, pois além de economizar energia elétrica, eco- nomiza-se água. Não deixar a televisão ligada se não está assistindo. Aproveitar ao máximo a luz do dia. Utilizar lâmpadas fluorescentes. Evitar o uso de secadora de roupa. O Brasil precisou importar cerca de 2 bilhões de dólares em petróleo no ano de 2002 para suprir o consumo dessa fonte de energia? Sessenta por cento foram utilizados na área de transportes, sendo que o Brasil é o país que mais consome combustíveis nessa área. Perspectivas futuras As fontes renováveis são uma forma de aumentar o acesso à eletricidade, ge- rar empregos, descentralizar a geração elétrica e reduzir os impactos ambientais. Cresce a compreensão de que uma boa diversificação e substituição de carvão, pe- Matrizes energéticas 112 tróleo, gás e da energia nuclear são pré-requisitos para o crescimento econômico sustentável, considerando-se o aumento de exigências no abastecimento. A redu- ção dos custos está deixando as energias renováveis cada vez mais competitivas. O Brasil tem um potencial eólico muito superior à Alemanha, campeã mun- dial de energia eólica. No sul e no litoral brasileiro, as zonas climáticas são propí- cias ao aproveitamento dessa energia. Além disso, a demanda industrial de ener- gia é considerável. Essas considerações valem também para o aproveitamento da energia solar no território brasileiro. A Eletrobras criou o Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Ener- gia Elétrica (Proinfa), que prevê a inclusão das fontes renováveis, como as usinas eólicas e as usinas de biomassa, na produção de energia brasileira. As fontes renováveis ainda são uma pequena parcela da matriz energética do Brasil. Para que elas passem a representar uma maior quantidade na geração de energia no país, Roberto Zilles, professor do programa de pós-graduação em energia da USP, dá a dica: “criação de legislação que exija de cada concessionária a comercialização de um percentual mínimo anual de energia elétrica proveniente de fontes renováveis. Essepercentual estará associado ao volume total de ener- gia elétrica comercializado, onerando assim equitativamente cada concessionária. Essa lei criaria os Créditos de Comercialização de Energias Renováveis – CCER que podem ser negociados entre concessionárias para fins de cumprimento das metas”. É preciso considerar que sem um incentivo inicial, as fontes renováveis não vão conseguir espaço em um mercado energético tão competitivo, pois o uso das fontes não renováveis ainda é mais barato. Na Alemanha, os custos iniciais para incentivar a produção de energia a partir de fontes renováveis representaram um milésimo do orçamento público anual, mas esse investimento já retornou na forma de energia poupada, cresci- mento econômico e empregos. Esse exemplo pode ser seguido por outros países, principalmente o Brasil, que tem condições climáticas favoráveis ao uso de ener- gias renováveis. O petróleo ainda é a fonte energética mais barata e, por enquanto, a mais fácil de ser conseguida. A grande maioria dos motores de automóveis são movi- dos a combustíveis derivados do petróleo, sendo boa parte da poluição atmosféri- ca causada por esse uso de energia. Outras matrizes energéticas já estão em fase de pesquisa e desenvolvimento, mas por enquanto poucos automóveis que estão rodando funcionam com algum tipo de combustível alternativo. A próxima fase é o desenvolvimento de motores e de toda uma infraestrutura de abastecimento de combustíveis de outras fontes, renováveis. A geração de energia elétrica também precisa ser substituída totalmente por maneiras menos impactantes, ao invés de queima de combustíveis fósseis e alaga- mento de grandes áreas para a construção das barragens das hidrelétricas. Como foi visto nesta aula, já existem várias formas de se produzir energia elétrica sem que haja a necessidade de poluir mais o ambiente. Matrizes energéticas 113 Outro ponto crucial na questão das matrizes energéticas é o padrão de con- sumo de energia cada vez maior, com uma quantidade maior de aparelhos eletrô- nicos em todos os setores da sociedade. A redução do consumo e a substituição das fontes energéticas não renováveis por fontes renováveis e menos poluentes são fatores decisivos para um ambiente mais saudável. Vantagens adicionais da energia eólica para o Brasil (AIDAR, 2002, p. 176-177) a) A demanda emergencial por geração no Sistema Elétrico Brasileiro pode ser em grande parte atendida pela grande rapidez de implantação de Usinas Eólicas em escala de giga- watt, pois para tais usinas as autorizações ambientais são descomplicadas, e o arrenda- mento das pequenas áreas necessárias é feito sem prejuízo das atividades econômicas e ambientais existentes. Uma usina eólica de 100 megawatts, por exemplo, pode ser ins- talada em menos de um ano, sendo que uma PCH e/ou termoelétrica da mesma potência levaria de três a cinco anos para ser construída. b) A capacidade tecnicamente comprovada da geração eólica pode vir a atender até 20% de nossa demanda elétrica, reforçada pela revelação progressiva de existência de um enor- me potencial eólico no Brasil – recurso natural inesgotável, estratégico, cuja “matéria- -prima”, o vento, tem custo zero. c) Grande parte desse potencial situa-se em regiões de baixo desenvolvimento industrial e residencial, consequentemente em regiões de baixo consumo de energia elétrica, sendo tais regiões, na sua imensa maioria, precariamente atendidas por redes fracas, ou até mesmo sem acesso a energia elétrica. d) Temos atualmente instalados no Brasil apenas 2,22 megawatts de geração eólica, sendo 20,5 megawatts (91%) em escala comercial e instalados pela única fabricante nacional de aerogeradores, a Wobben Windpower, mas tais usinas já comprovaram com sucesso a viabilidade dos aproveitamentos eólicos no Brasil. e) A energia eólio-elétrica gerada no Brasil está interligada aos sistemas elétricos das res- pectivas concessionárias distribuidoras de energia elétrica, adjacentes às respectivas usi- nas eólicas, sem qualquer interferência prejudicial a esses sistemas. f) A vocação da eólica é também de suprimento energético às pontas de sistemas elétricos, o que comprovadamente aumentará a confiabilidade e estabilidade elétrica do Sistema Interligado Brasileiro, desde que garantida escala de participação. g) Há comprovada complementaridade sazonal entre as fontes eólica e hidráulica no Brasil, potencializando uma maior confiabilidade e estabilidade sazonal do Sistema Elétrico Matrizes energéticas 114 Brasileiro quanto ao atendimento da demanda, pelo aproveitamento otimizado da siner- gia de nossos recursos naturais (eólico e hidrelétrico). h) A total ausência de riscos ambientais, e consequentemente financeiros, para geração eó- lica em grande escala no território nacional. i) As usinas eólicas da Wobben Windpower na Taíba, Prainha e Mucuripe (Ceará), em Pal- mas (Paraná), e Bom Jardim da Serra (Santa Catarina), com potência total instalada de 20,5 megawatts, gerando cerca de 68 550 megawatts-hora ao ano, evitam a emissão de 41 200 toneladas de CO2 a cada 12 meses de operação. j) Já existe atualmente no Brasil a Wobben Windpower, empresa que fabrica aerogeradores necessários à montagem de usinas eólicas, bem como projeta, constrói, opera e mantém com assistência técnica permanente essas usinas eólicas, com consequente geração de empregos diretos em produção industrial e correspondente fixação de tecnologia. k) Há grande interesse de segmentos do setor elétrico, bem como de outros segmentos do setor produtivo nacional, em investir na geração eólio-elétrica. l) As significativas reduções de custo obtidas pela eólica no mundo nos últimos anos, de- correntes de fator de escala e evolução tecnológica, comprovam a necessidade do fator escala para que o Brasil possa atingir patamares de preços de geração compatíveis com o mercado nacional de energia elétrica. 1. Forme um grupo de três pessoas e pesquise quais as fontes de energia utilizadas na sua cidade. Inclua na sua lista todos os estabelecimentos que utilizam energia e de onde vem essa energia que eles usam. Matrizes energéticas 115 2. Quais os impactos que essas fontes causam em sua cidade e nos arredores? 3. Quais as condições climáticas de sua cidade? Com base em sua resposta, liste as fontes de ener- gia renovável que poderiam ser implementadas. Matrizes energéticas 116 Imagine que você saiu para jantar com o pessoal do escritório, todas as 100 pessoas do seu departamento. Você está numa fase difícil de dinheiro, mas... Como a conta vai ser dividida por igual, por que não pedir lagosta? Se todo o resto do departamento pedir filé com fritas que custa 10 reais, e você pedir a lagosta de 40 reais, todos pagarão R$10,30. Sua vantagem então será de R$29,70, contra um acréscimo de módicos R$0,30 para cada um dos outros colegas. Genial, não? (MARINHO, 2002) O que você acaba de ler é um exemplo da tragédia dos comuns, que hoje precisa ser combatida para impedir que o planeta seja destruído. O Protocolo de Kyoto e outros protocolos já postulados pelo homem são meios para se evitá-la. A não adesão dos Estados Unidos e da Austrália ao Protocolo de Kyoto, por exemplo, pode ser considerada uma atitude igual a quem pediu lagosta no exemplo an- terior, da mesma forma que pensar que a não substituição das fontes de energia em um país pequeno não faria a menor diferença na poluição do planeta. ORTIZ, Lúcia Schild (Org.). Fontes Energéticas de Energia e Eficiência Energética: opção para uma política energética sustentável no Brasil. Campo Grande: Fundação Heinrich Böll/Coalizão Rios Vivos, 2002. 208p. O livro documenta o Seminário Internacional, de mesmo título, que aconteceu em 2002 na capi- tal brasileira. O acontecimento reuniu pesquisadores, representantes da indústria de energia, ambien- talistas, líderes de movimentossociais, sindicalistas, membros de cooperativas de eletrificação rural e parlamentares no intuito de ampliar e descentralizar o debate sobre a matriz energética brasileira. Avaliação de impactos ambientais Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Constituição Federal de 1988 D evido às atividades humanas, as características ambientais do planeta têm sofrido uma série de alterações, algumas indesejáveis para o próprio ho-mem, como doenças, diminuição na disponibilidade de recursos, alterações nas paisagens naturais, mudanças no clima global, somente para citar as mais conhe- cidas. E justamente por este ser um fato incontestável, é que a partir de meados do século passado, mais exatamente nos anos de 1960, nos Estados Unidos, iniciou-se um processo mais intenso de discussão e de definição sobre o que é impacto ambien- tal, e de que forma ele pode ser mensurado, valorado e minimizado, com vistas a uma melhor qualidade ambiental. No Brasil, a avaliação de impactos ambientais surgiu em decorrência de exi- gências de organismos financiadores internacionais, para depois ser considerada uma informação necessária no sistema de licenciamento ambiental, para só nos anos de 1980 passar a ser incorporada oficialmente como uma ferramenta do Sis- tema Nacional de Meio Ambiente – SISNAMA. A Constituição Federal de 1988 definiu como responsabilidade do Poder Pú- blico e da coletividade zelar por um ambiente de qualidade para as atuais e as fu- turas gerações, e exigiu para a instalação de qualquer obra ou atividade potencial- mente causadora de degradação ambiental o estudo prévio de impacto ambiental, assunto cuja normatização anterior era uma resolução do Conselho Nacional de Meio Ambiente – CONAMA –, a Resolução 1/86, de 23 de janeiro de 1986. Conforme definido na Resolução citada, define-se como impacto ambiental “qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia re- sultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente, afeta a saúde, a segurança e o bem-estar da população; as atividades sociais e econômicas; a biota; as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente; a quali- dade dos recursos ambientais”. Essa definição é bem abrangente e ressalta tanto os aspectos relacionados à qualidade de vida e à saúde do homem, como os referentes aos ecossistemas e ambientes naturais, incluindo a biota e os recursos naturais. O que é impacto ambiental? Avaliação de impactos ambientais 118 Os impactos ambientais podem ser quantificados numericamente, por exem- plo, quando se tem uma área com extensão conhecida que será alterada, ou en- tão qualificados, quando é analisada sua duração e seu grau de permanência no ambiente. Nesse sentido, costuma-se classificar os impactos ambientais conforme diferentes critérios. Tipo – o impacto pode ser classificado em direto, quando seus efeitos são decorrentes de alguma etapa da atividade geradora, enquanto os impactos indiretos decorrem de algum efeito secundário do empreendimento. Categoria de impacto – os impactos podem ser benéficos ou positivos, quando provocam uma melhoria nos meios biótico, físico ou socioeco- nômico, ou então adverso ou negativo, quando seus efeitos sobre alguns desses meios provocam algum tipo de alteração indesejável. Área de abrangência – os impactos podem ser classificados em locais, quando seus efeitos ocorrem na área de influência direta do empreendi- mento, ou regionais, quando seus efeitos manifestam-se na área de influ- ência indireta. Duração – os impactos podem ser temporários, como muitos que são re- gistrados na fase de implantação de um determinado empreendimento, ou permanentes, quando seus efeitos incidem de forma contínua sobre algum dos meios considerados. Reversibilidade – um impacto pode ser reversível, quando seus efeitos são temporários e podem ser minimizados; ou irreversível, quando seus efeitos, uma vez estabelecidos, não têm possibilidades de retorno à condi- ção original. A supressão da vegetação pelo enchimento de um reservató- rio de hidrelétrica é um exemplo de um impacto irreversível. Magnitude – os impactos podem ser classificados em forte, médio, fraco e variável, dependendo da intensidade com que manifestam seus efeitos. Prazo – os impactos podem ser imediatos, quando se manifestam tão logo inicie o empreendimento, ou a médio prazo, quando seus efeitos manifes- tam-se depois de um certo tempo de execução do empreendimento, ou en- tão a longo prazo, quando seus efeitos manifestam-se normalmente após alguns anos de implantação e operação de um certo empreendimento. Os impactos de um determinado empreendimento normalmente são listados em matrizes de análise, em que a classificação de cada impacto é feita segundo di- ferentes critérios, buscando definir possibilidades de sinergismo entre os impactos, e considerando as diferentes fases de empreendimento. Normalmente são consi- deradas as fases de planejamento, implantação e operação – podendo em alguns casos haver a etapa de desativação, como acontece em alguns tipos de mineração e em aterros sanitários. Avaliação de impactos ambientais 119 Impactos ambientais e licenciamento ambiental Um aspecto muito importante relacionado aos impactos ambientais de um empreendimento é o processo de licenciamento ambiental, obrigação legal neces- sária à instalação de qualquer atividade potencialmente poluidora ou degradadora do ambiente. A participação social no processo de tomada de decisão em relação a essa atividade é garantida com a realização das Audiências Públicas. A obrigação de avaliar os empreendimentos ou atividades e expedir as li- cenças é compartilhada pelos Órgãos Estaduais de Meio Ambiente e pelo Insti- tuto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais – Ibama –, como partes integrantes do Sistema Nacional de Meio Ambiente – SISNAMA. O Ibama atua principalmente no licenciamento de grandes projetos de infraestrutura cujos im- pactos atinjam mais de um estado ou área da União, como nas atividades do setor petroleiro na plataforma continental. As principais diretrizes legais para a execução do licenciamento ambiental são expressas na Lei 6.938/81 e nas Resoluções CONAMA 1/86 e 237/97. O Mi- nistério do Meio Ambiente pode definir a competência estadual ou federal para o licenciamento, tendo como fundamento a abrangência do impacto. O processo de licenciamento ambiental pode ser dividido em três tipos de licenças: licença prévia (LP) – é solicitada pelo empreendedor ao órgão ambien- tal na fase de planejamento da atividade, e contém os requisitos básicos a serem atendidos nas fases de localização, instalação e operação, obser- vados os planos municipais, estaduais ou federais de uso do solo. licença de instalação (LI) – é concedida no início da implantação do empreendimento, de acordo com as especificações constantes do projeto executivo aprovado. licença de operação (LO) – autoriza o início da atividade e o funciona- mento dos equipamentos pertinentes, após as devidas verificações reali- zadas pelo órgão responsável do cumprimento das condições colocadas na licença de instalação. O processo de licenciamento ambiental de um empreendimento consiste basicamente no interessado dirigir-se ao órgão estadual de meio ambiente para obter informações sobre os trâmites necessários, devendo reunir a documentação solicitada e protocolar o pedido no órgão. Os técnicos do órgão realizam uma vistoria no local de implantação de empreendimento a ser licenciado e a licença ambiental é expedida quando o solicitante atender aos requisitos exigidospelo órgão responsável do estado. Após a expedição da licença, o empreendedor deverá publicar o recebimen- to desta no Diário Oficial do estado e num periódico de grande circulação, no prazo de 30 dias, sob pena de perda da validade da licença. Avaliação de impactos ambientais 120 [...] o Brasil foi o primeiro país a colocar o estudo ambiental prévio na Constituição? “O princípio mais importante aí é a prevenção e um dos desas- tres que motivaram sua inclusão na Carta Magna foi a hidrelétrica de Balbina, no Amazonas. Originalmente havia proposto que a escolha da empresa res- ponsável pelo estudo fosse feita pela administração pública, ou seja, o em- preendedor pagaria o estudo, mas não poderia escolher quem o executaria. Isso garantia a independência. Porém, esse texto foi suprimido em 1986, uma mutilação. Felizmente a Constituição de 1998 garante o direito à informação, ao assegurar a publicidade do estudo. Ou seja, para um relatório de impacto ambiental ter credibilidade é preciso passar por uma Audiência Pública. Hoje, em muitos casos, o EIA / RIMA é substituído pelo relatório ambiental preli- minar (RAP), que é inconstitucional, por não ter a peça chave: a publicidade, a garantia de controle social de obras com impacto ambiental. Essa legislação está na UTI, precisa de uma revitalização. O EIA deve ser a aplicação do princípio de prevenção.” (Paulo Affonso Leme Machado, em entrevista para a revista Terra da Gente, set. de 2004). A Resolução CONAMA 1/1986 relaciona uma série de empreendi- mentos com efeitos modificadores do ambiente, cuja realização de estu- dos de impactos ambiental é obrigatória, a saber: estradas de rodagem com duas ou mais faixas de rolamento; ferrovias; portos e terminais de minério, petróleo e produtos químicos; aeroportos; oleodutos, gasodutos, minerodutos, troncos coletores e emissários de es- gotos sanitários; linhas de transmissão de energia elétrica, acima de 230 quilowatts; obras hidraúlicas para exploração de recursos hídricos, como barragem para fins hidrelétricos acima de 10 megawatts, de saneamento, de irriga- ção, canais para navegação, drenagem e irrigação, retificação de cursos d’água, abertura de barras e embocaduras, transposição de bacias, di- ques; extração de combustíveis fósseis como petróleo, xisto e carvão; extração de alguns tipos de minérios; aterros sanitários, processamento e destino final de resíduos tóxicos ou perigosos; usinas de geração de eletricidade acima de 10 megawatts; Quais atividades necessitam de EIA/ RIMA para o licen- ciamento ambiental? Avaliação de impactos ambientais 121 complexos e unidades industriais e agroindustriais, como petroquímicos, siderúrgicos, cloroquímicos, destilarias de álcool, hulha, extração e cul- tivo de recursos hidróbios; distritos e zonas industriais; exploração econômica de madeira ou de lenha, em áreas acima de 100 hectares ou menores, quando atingir áreas significativas do ponto de vis- ta ambiental; projetos urbanísticos, acima de 100 hectares ou em áreas de relevante interesse ambiental; qualquer atividade que utilizar carvão vegetal, derivados ou produtos similares, em quantidade superior a dez toneladas por dia; projetos agropecuários que contemplem áreas acima de mil hectares, ou menores, quando se tratar de áreas significativas do ponto de vista am- biental, inclusive nas Áreas de Proteção Ambiental. A relação de empreendimentos presentes na resolução é bastante extensa, o que garante do ponto de vista legal a manutenção da integridade dos ambientes a despeito das necessidades de crescimento da atividade econômica. Na prática, o que se observa em muitos casos é a realização de estudos superficiais e desprovidos de um caráter mais técnico e científico, que encontra muitas vezes órgãos ambientais despreparados tecnicamente para proceder a avaliação desses estudos, resultando em empreendimentos licenciados sem a devida atenção aos impactos provocados. A Usina Hidrelétrica de Barra Grande, no Rio Pelotas, na divisa dos estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul, é um exemplo dessa situação (ver Texto Complementar). Características do estudo de impacto ambiental (EIA) Os estudos de impacto ambiental são atividades técnicas e científicas que abordam diferentes aspectos de um empreendimento degradador do ambiente, e incluem um diagnóstico ambiental, a identificação, previsão, medição, interpreta- ção e valoração dos impactos, e a definição de medidas mitigadoras e programas de monitoramento dos impactos ambientais. O relatório de impacto ambiental é um documento do processo da avaliação de impacto ambiental, e deve trazer todos os elementos necessários para a tomada de decisão do órgão ambiental em relação ao empreendimento, bem como para o público em geral, afetado por este. Deve ser elaborado em linguagem clara e acessível, e discutir de forma integrada os impactos negativos e positivos do em- preendimento em questão. Os estudos de impacto ambiental geralmente seguem uma sequência de etapas previamente definidas, que têm como base a regulamentação da questão no país (Resolução CONAMA 1/86). As principais etapas do estudo estão dispostas a seguir. Quais as principais partes de um estudo de impacto ambiental? Avaliação de impactos ambientais 122 Descrição do empreendimento – consiste em uma apresentação clara e detalhada do empreendimento a ser implantado, informando a natureza das atividades a serem realizadas e suas respectivas alternativas tecno- lógicas e de locação. Referências de empreendimentos anteriores execu- tados pelo mesmo proponente podem ser apresentadas como forma de compreender a capacidade operacional dos executores. Diagnóstico ambiental da área de influência do projeto – consiste em uma descrição analítica o mais completa possível das características ambientais e de suas respectivas interações, de modo a fornecer uma caracterização da situação ambiental da área, antes da implantação do projeto. A área de influência é definida com base na natureza do empre- endimento e nas características ambientais da região. As bacias hidro- gráficas têm sido adotadas como unidades naturais de definição de área de abrangência de empreendimentos, visando facilitar a definição de um plano integrado de ocupação e conservação da área. Deve considerar o meio físico, que compreende o subsolo, as águas, o ar, o clima, os re- cursos minerais, a topografia, o solo, o regime hidrológico, as correntes marinhas e as correntes atmosféricas, entre outros; o meio biológico, que inclui os ecossistemas naturais e suas respectivas fauna e flora, com ên- fase para espécies indicadoras, de valor científico e econômico, raras e ameaçadas de extinção; e o meio socioeconômico, que aborda questões como dinâmica populacional, estrutura produtiva, organização social, uso e ocupação do solo, uso da água, presença de sítios e monumentos arqueológicos, históricos e culturais e as relações entre a sociedade e os recursos ambientais, com vistas à potencial utilização futura desses recursos. Análise dos impactos ambientais – são relacionados os impactos do pro- jeto em questão, em suas diferentes etapas de execução, bem como de suas alternativas de locação. Os impactos detectados são identificados em uma matriz e é feita uma análise quanto às suas respectivas natureza, magnitu- de, importância, tempo de permanência, reversibilidade e temporalidade, além de suas propriedades cumulativas e possibilidades de sinergia. Definição de medidas mitigadoras – uma vez constatados e qualifica- dos os impactos ambientais de um empreendimento, são definidas me- didas, equipamentos e sistemas de controle e tratamento de despejos, avaliando-se a eficiência e aplicabilidade de cada um deles. As medidas mitigadoras podemser de caráter compensatório e devem ser contratadas pelo empreendedor da forma prevista no estudo de impacto ambiental, e prestam-se para minimizar impactos de caráter irreversível. Programas de acompanhamento e monitoramento dos impactos – devem indicar as medidas necessárias para o acompanhamento da evolu- ção dos impactos positivos e negativos detectados nas diferentes etapas de implantação do empreendimento. O estudo de impacto ambiental deve ser feito por uma equipe multidisci- plinar devidamente habilitada e credenciada nos respectivos conselhos de clas- Avaliação de impactos ambientais 123 se, que não tenha nenhum vínculo direto ou indireto com o proponente, e será responsável tecnicamente pelos resultados e avaliações apresentadas. Essa equipe normalmente é formada por profissionais de diferentes forma- ções: biólogos, geólogos, geógrafos, engenheiros florestais, agrônomos, sociólo- gos, engenheiros civis, historiadores, educadores, entre outros. O relatório de impacto ambiental – RIMA O relatório de impacto ambiental (RIMA) traz de forma resumida as conclu- sões. Deve ter linguagem fácil e acessível ao público em geral, com ilustrações, como mapas, gráficos, fotos e quadros, facilitando o entendimento das consequências am- bientais do projeto e de suas respectivas alternativas tecnológicas e de locação. O RIMA deve conter no mínimo os seguintes pontos: objetivos e justificativas do projeto, com vistas às suas relações com as políticas e planos setoriais do governo; descrição do projeto e suas alternativas tecnológicas e de locação, es- pecificando as matérias-primas e mão de obra, as fontes de energia, os processos operacionais, os efluentes, as emissões, os resíduos, as perdas de energia e os empregos diretos e indiretos gerados, entre outros, consi- derando as diferentes etapas de implantação do empreendimento; síntese dos estudos de diagnóstico ambiental da área de influência do projeto; descrição qualitativa dos impactos ambientais, considerando as diferen- tes etapas de execução do empreendimento e suas alternativas e indican- do os métodos, técnicas e critérios adotados para identificação, quantifi- cação e avaliação desses impactos; caracterização da qualidade ambiental futura da área de influência, com- parando diferentes opções do projeto e suas alternativas, incluindo a hi- pótese de sua não realização; descrição do efeito das medidas mitigadoras previstas para os impactos negativos, mencionando, para aqueles que não puderem ser evitados, o grau de alteração esperado; programa de acompanhamento e monitoramento dos impactos; recomendações referentes à alternativa mais favorável, do ponto de vista ambiental, e conclusões do relatório. Para que um EIA/RIMA tenha seu efeito legal, deve ser acessível ao público, respeitando o sigilo industrial quando for o caso. Suas cópias devem permanecer disponíveis aos interessados em centros de documen- tação ou bibliotecas dos órgãos ambientais envolvidos, inclusive durante o perí- odo necessário para a análise técnica do documento. Todos os órgãos públicos podem manifestar interesse em dar vistas ao EIA/RIMA, e receberão cópias dos documentos para conhecimento e manifestação. O que são Audiências Públicas? Avaliação de impactos ambientais 124 O órgão estadual competente, o município ou mesmo a União, dependendo do empreendimento, podem determinar o prazo para dar conhecimento aos co- mentários feitos pelos órgãos públicos e demais interessados e, caso julgue neces- sário, poderá promover a realização de Audiência Pública para informação sobre o projeto e seus impactos ambientais, assim como para discussão do RIMA. A Resolução CONAMA 9, de 3 de dezembro de 1987, define que a Audi- ência Pública tem por finalidade expor aos interessados o conteúdo do RIMA, dirimindo dúvidas e recolhendo as críticas e sugestões dos presentes a respeito. Pode ser convocada sempre que necessário, ou quando for solicitado por entidade civil, pelo Ministério Público, ou por 50 ou mais cidadãos. A data deve ser fixada pelo órgão de meio ambiente, em edital e através de anúncio pela imprensa local, num prazo que deve ser de, no mínimo, 45 dias a partir da divulgação. Caso haja a solicitação de Audiência Pública e o órgão ambiental estadual não a realize, a licença ambiental concedida não terá validade. Pode haver mais de uma Audiência Pública, em função da localização geográfica do empreendimento e da complexidade do tema. Ao final da audiência, deve ser lavrada uma ata, à qual serão anexados todos os documentos escritos e assinados que forem entregues durante a sessão. Essa ata e seus anexos, juntamente com o RIMA, serão a base para a análise e parecer final do órgão licenciador quanto à aprovação ou não do projeto. A necessidade de o homem intervir na natureza para suprir suas necessi- dades básicas, que vão desde moradia até alimentação, é um fato irreversível, ao menos enquanto perdurar esta economia de mercado que domina o planeta. Frente a essa realidade, cabe aos poderes públicos e principalmente à população como um todo, por meio das instituições que a representam, buscar soluções para evitar ou mesmo minimizar esses impactos, sem com isso bloquear o processo de cresci- mento econômico, especialmente dos países considerados em desenvolvimento. Um passo importante nesse sentido é ter um marco legal a partir do qual o processo pode transcorrer da melhor forma, e, nesse ponto, o Brasil é uma refe- rência. O país já tem uma legislação pertinente apontada por muitos especialistas como a mais avançada do mundo, porém ainda não tem uma estrutura técnica que permita dar o suporte adequado às avaliações necessárias quando da instalação de um empreendimento que provoca danos ambientais. Nesse contexto, vale destacar também que a participação popular é muito importante, e infelizmente, depois de muitos anos de um regime de governo fechado e que não estimulou a discussão dos problemas brasileiros de uma forma mais ampla, o que se vê não é bem isso. Graças à atuação de algumas organizações não governamentais e de outros ato- res sociais, alguns inclusive ligados ao Poder Público, temos observado alguns avanços, ainda aquém das reais necessidades do Brasil, um país de dimensões continentais e detentor da maior biodiversidade do planeta. O Quadro 1, apresentado na sequência, traz uma compilação dos princi- pais impactos negativos de uma série de tipos de empreendimentos, devidamente acompanhados por um conjunto de medidas que visam minimizar esses impactos. O maior ou menor detalhamento, tanto dos impactos como das medidas mitigado- ras, podem ser encontrados nas referências citadas ao final do texto. Avaliação de impactos ambientais 125 Ti po d e em pr ee nd im en to P ri nc ip ai s im pa ct os P ri nc ip ai s m ed id as m it ig ad or as A gr op ec uá ri a Pe rd a de b io di ve rs id ad e. C on se rv aç ão d e ár ea s p re vi st as n a le gi sl aç ão , c om o ár ea s d e pr es er va çã o pe rm an en te e re se rv as le ga is , a lé m d o es tím ul o à cr ia çã o de á re as e sp ec ia lm en te p ro te gi da s ( un id ad es de c on se rv aç ão ). C on ta m in aç ão d o m ei o co m ag ro qu ím ic os . P rá ti ca s de c ul ti vo a de qu ad as à s ca ra ct er ís ti ca s na tu ra is d os e co ss is te m as lo ca is . E m pr eg o de p rá tic as a m bien ta lm en te a de qu ad as , c om o ad ub aç ão v er de , r ot aç ão d e cu lt ur as , c on tr ol e bi ol óg ic o, m an ej o in te gr ad o de p ra ga s, d im in ui nd o ao m áx im o o us o de f er ti li za nt es e a gr ot óx ic os . A um en to d a ve lo ci da de d o ve nt o em de co rr ên ci a do d es m at am en to . I m pl an ta çã o de q ue br a- ve nt os e m p ar ce la s de fi ni da s co nf or m e o ta m an ho d a ár ea e o se nt id o pr ed om in an te d os v en to s. I m pl an ta çã o de c on só rc io s en tr e es pé ci es h er bá ce as , a rb us ti va s e ar bó re as e m s is te m as ag ro flo re st ai s. C on ta m in aç ão d o ag ric ul to r c om ag ro qu ím ic os . P rá ti ca s de c ul ti vo a de qu ad as à s ca ra ct er ís ti ca s na tu ra is d os e co ss is te m as lo ca is . Em pr eg o de p rá tic as a m bi en ta lm en te a de qu ad as , c om o ad ub aç ão v er de , r ot aç ão d e cu lt ur as , c on tr ol e bi ol óg ic o, m an ej o in te gr ad o de p ra ga s, d im in ui nd o ao m áx im o o us o de f er ti li za nt es e a gr ot óx ic os . U ti li za çã o co rr et a do s eq ui pa m en to s de p ro te çã o in di vi du al ( E PI ). U so d e ag ro tó xi co s e fe rt il iz an te s co m o ri en ta çã o de té cn ic os e sp ec ia li za do s e se gu in do to da s as in st ru çõ es d o fa br ic an te . Po lu iç ão d o ar c om m at er ia l p ar ti cu la do de vi do à s q ue im ad as . N ão u til iz aç ão d e qu ei m ad as c om o pr át ic as d e m an ej o ou , q ua nd o ne ce ss ár ia s, co m an uê nc ia e s up er vi sã o do ó rg ão a m bi en ta l r eg ul ad or e s eg ui nd o a le gi sl aç ão p er ti ne nt e. D eg ra da çã o do s ol o e de se rt ifi ca çã o de ár ea s. U til iz aç ão d e pr át ic as d e co ns er va çã o do so lo , c om o ro ta çã o de c ul tu ra s, pl an tio d ire to , po us io , a du ba çã o ve rd e, im pl an ta çã o de c ur va s d e ní ve l e te rr aç os , e nt re o ut ra s. R ed uç ão d a ut il iz aç ão d e m áq ui na s pe sa da s. R efl or es ta m en to c om e sp éc ie s na ti va s da s ár ea s m ai s ín gr em es e /o u co m s ol os m ai s fr ág ei s. (D IA S, 1 99 9. A da pt ad o. ) Quadro 1 – Principais impactos e medidas mitigadoras das atividades produtivas mais comuns Avaliação de impactos ambientais 126 Ti po d e em pr ee nd im en to P ri nc ip ai s im pa ct os P ri nc ip ai s m ed id as m it ig ad or as P ro du çã o an im al Pe rd a de b io di ve rs id ad e. C on se rv aç ão d e ár ea s p re vi st as n a le gi sl aç ão , c om o ár ea s d e pr es er va çã o pe rm an en te e re se rv as le ga is , g ar an tin do o is ol am en to d es ta s d as á re as u til iz ad as p ar a o pa st or ei o. C on ta m in aç ão d o m ei o co m re sí du os d o co nfi na m en to . L oc al iz aç ão a de qu ad a de e st áb ul os e o ut ro s e st ab el ec im en to s. A do çã o de m ed id as d e tr at am en to a de qu ad o do s r es íd uo s p ro du zi do s, in te gr an do -o s, na m ed id a do p os sí ve l, às d em ai s r ot in as p ro du tiv as d a pr op rie da de . D eg ra da çã o do so lo . F az er ro ta çã o de p as ta ge ns , o bs er va nd o a ca pa ci da de d e su po rt e do s p as to s e c on tro la nd o o te m po d e du ra çã o do p as to re io . A do ta r m ed id as d e co nt ro le d e er os ão n as p as ta ge ns , m es cl an do d if er en te s es pé ci es d e fo rr ag em . N ão a ce ss o do s a ni m ai s a á re as in st áv ei s, co m o en co st as ín gr em es e lo ca is c om so lo s ra so s. C on ta m in aç ão d o m ei o, d os a lim en to s e do h om em p el o us o ex ce ss iv o de ag ro qu ím ic os , r em éd io s e h or m ôn io s. P rá ti ca s de a dm in is tr aç ão d os r eb an ho s ad eq ua da s às c ar ac te rí st ic as n at ur ai s do ec os si st em a lo ca l. L im ita çã o do u so d e in su m os q ue p os sa m c on ta m in ar a s p as ta ge ns e d e re m éd io s e ho rm ôn io s em d os es a ci m a da s re co m en da da s pe lo f ab ri ca nt e. U so c or re to e c om a o rie nt aç ão d e ve te ri ná rio s, se gu in do to da s a s i ns tr uç õe s d o fa br ic an te . R es pe it o à le gi sl aç ão v ig en te . U til iz aç ão in ad eq ua da d a ág ua p ar a de ss ed en ta çã o do re ba nh o. P la ne ja m en to d o us o da á gu a pe lo r eb an ho d en tr o da s un id ad es p ro du ti va s. I ns ta la çã o de f on te s de á gu a e sa l n a pa st ag em e m lo ca is a de qu ad os p ar a a de ss ed en ta çã o e af as ta do s do s cu rs os d e ág ua . Quadro 1 – Principais impactose medidas mitigadoras das atividades produtivas mais comuns (continuação) Avaliação de impactos ambientais 127 Ti po d e em pr ee nd im en to P ri nc ip ai s im pa ct os P ri nc ip ai s m ed id as m it ig ad or as A qu ic ul tu ra D eg ra da çã o de a m bi en te s ú m id os e pe rd a de b io di ve rs id ad e no s l oc ai s d e im pl an ta çã o do s c ul tiv os . A te nd er a le gi sl aç ão e n ão im pl an ta r c ul tiv os e m á re as d e pr es er va çã o pe rm an en te , c om o be ir as d e rio s, vá rz ea s e m an gu ez ai s. A lt er aç ão d o flu xo d e ág ua e d im in ui çã o da d is po ni bi lid ad e de á gu a pa ra o ut ra s fi na li da de s. L oc al iz ar o s ta nq ue s de c ul ti vo e m lo ca is d efi ni do s de f or m a a nã o in te rr om pe r os u so s tr ad ic io na is d a ág ua d a re gi ão , b us ca nd o, n a m ed id a do p os sí ve l, o us o m úl tip lo d a ág ua do s t an qu es . R eq ue re r a ou to rg a pe lo u so d a ág ua d e fo rm a a co nt ro la r o us o de nt ro d as v az õe s pe rm iti da s à qu el a ba ci a. C on ta m in aç ão d o m ei o co m e flu en te s e pr od ut os q uí m ic os u sa do s n a pr od uç ão . T ra ta r os e flu en te s an te s do la nç am en to n o m ei o e ev it ar o u so d es ne ce ss ár io e s em a de vi da o rie nt aç ão té cn ic a de p ro du to s q uí m ic os , d ro ga s e in su m os p ar a a pr od uç ão . In tr od uç ão d e es pé ci es e xó ti ca s e pa tó ge no s as so ci ad os . E vi ta r o us o de e sp éc ie s ex ót ic as n os c ul ti vo s, d an do p re fe rê nc ia , s e fo r o ca so , à qu el as qu e já te nh am s eu s pr in ci pa is a sp ec to s bi ol óg ic os b em c on he ci do s. O bs er va r a le gi sl aç ão e sp ec ífi ca q ue o ri en ta a u ti li za çã o de e sp éc ie s ex ót ic as e m am bi en te s n at ur ai s. A um en to d os n ív ei s d e ca rb on o, ni tr og ên io e f ós fo ro n o m ei o. D et er m in ar a c ap ac id ad e de su po rt e do s t an qu es , a de qu an do a p ro du çã o e o tr at am en to da s á gu as a e ss a ca pa ci da de . A lte ra çõ es n as c ar ac te rís tic as so ci o- ec on ôm ic as re gi on ai s. P ro m ov er o e nv ol vi m en to d as p op ul aç õe s lo ca is n os p ro ce ss os d ec is ór io s re la ti vo s à im pl an ta çã o do s p ro je to s d e aq ui cu ltu ra . A gr oi nd ús tr ia Su pr es sã o de a m bi en te s n at ur ai s e pe rd a de b io di ve rs id ad e no s l oc ai s de im pl an ta çã o da s u ni da de s d e be ne fic ia m en to . L oc al iz ar a u ni da de c on fo rm e as e sp ec ifi ci da de s do lo ca l, at en de nd o a le gi sl aç ão r el at iv a às á re as d e pr es er va çã o pe rm an en te , p ro te ge nd o os c ur so s d e ág ua e d em ai s l oc ai s d e re le vâ nc ia a m bi en ta l. A lte ra çã o do s p ad rõ es d e dr en ag em su pe rfi ci al . A va li ar a c on st it ui çã o ge ol óg ic a e o pa dr ão d e re le vo p ar a bu sc ar a lt er na ti va s qu e ga ra nt am a m an ut en çã o do s m an an ci ai s, se m c om pr om et er se us u so s e se u pa pe l p ar a a bi ot a or ig in al . Quadro 1 – Principais impactos e medidas mitigadoras das atividades produtivas mais comuns (continuação) Avaliação de impactos ambientais 128 Ti po d e em pr ee nd im en to P ri nc ip ai s im pa ct os P ri nc ip ai s m ed id as m it ig ad or as A gr oi nd ús tr ia C on ta m in aç ão d as á gu as p el o la nç am en to d e efl ue nt es e d is po si çã o in ad eq ua da d e re sí du os s ól id os . I ns ta la r eq ui pa m en to s pa ra m on it or am en to e t ra ta m en to d os e flu en te s, s eg ui nd o a le gi sl aç ão re la tiv a ao la nç am en to d es te s n o am bi en te . D is po r os r es íd uo s só li do s de f or m a ad eq ua da e e m lo ca l d ev id am en te p re pa ra do p ar a es sa fi na li da de , q ue a te nd a a le gi sl aç ão e o s cr it ér io s té cn ic os p er ti ne nt es . I m pl an ta r fo rm as a lt er na ti va s de r eu ti li za çã o e re ci cl ag em d e re sí du os s ól id os n os pr oc es so s p ro du tiv os . C on ta m in aç ão d o ar p or m at er ia l pa rt ic ul ad o e em is sã o de o do re s de sa gr ad áv ei s. E st ud ar a lte rn at iv as d e lo ca çã o do e m pr ee nd im en to q ue e vi te m a d is pe rs ão d e m at er ia l pa rt ic ul ad o e de o do re s p ar a ár ea s h ab ita da s. E m pr eg ar té cn ic as d e fi lt ra ge m e r ed uç ão d as e m is sõ es , a de qu an do o p ro ce ss o às ca ra ct er ís tic as d a m at ér ia -p ri m a ut ili za da . D is po si çã o ad eq ua da e c on tro la da d e de je to s,co m m on ito ra m en to c on tín uo p ar a ev ita r e de te ct ar v az am en to s. A um en to d a ci rc ul aç ão d e ve íc ul os , da g er aç ão d e ru íd os e p oe ira , a lé m d o au m en to d o nú m er o de a ci de nt es . I so la r a s á re as q ue p ro du ze m m ai s b ar ul ho e b us ca r a lte rn at iv as d e lo ca çã o qu e co nt em co m b ar re ir as n at ur ai s à pr op ag aç ão d o so m , c om o fi le ir as d e ár vo re s e bo sq ue s. I m pl an ta r um p ro je to e sp ec ífi co d e tr at am en to a cú st ic o, in te gr ad o ao s is te m a de ci rc ul aç ão d e ve íc ul os e m áq ui na s. P la ne ja r de f or m a in te gr ad a as v ia s de c ir cu la çã o de v eí cu lo s, c om s in al iz aç ão a de qu ad a e m on it or am en to d o flu xo d e ve íc ul os . R is co s à sa úd e do s tr ab al ha do re s qu e m an us ei am e flu en te s, r es íd uo s só li do s e pr od ut os tó xi co s. I m pl an ta r u m p ro gr am a de se gu ra nç a e sa úd e oc up ac io na l e in st al aç ão d e eq ui pa m en to s in di vi du ai s e c ol et iv os d e pr ev en çã o e pr ot eç ão d e ac id en te s. In dú st ri a em g er al Po lu iç ão d a ág ua e d o so lo p el a em is sã o de e flu en te s, p ro du to s qu ím ic os e su bs tâ nc ia s or gâ ni ca s di ve rs as , t óx ic as ou n ão , c om d if er en te s aç õe s so br e os or ga ni sm os v iv os . R ed uz ir o v ol um e de d es pe jo s, p ro cu ra nd o re ut il iz ar e r ec ic la r os r es íd uo s, s e po ss ív el n a pr óp ri a ca de ia p ro du ti va . T ra ta r de f or m a ad eq ua da to do e q ua is qu er e flu en te s pr od uz id os , p ro cu ra nd o la nç ar o s re sí du os tr at ad os n o am bi en te e m c on di çõ es m el ho re s d o qu e o co rp o re ce pt or . I ns ta la r si st em as d e fi lt ra ge m d e efl ue nt es . D efi ni r um p la no d e co nt in gê nc ia p ar a ca so s de v az am en to s de p ro du to s in du st ri ai s. A te nd er à le gi sl aç ão v ig en te , p ar a ca da ti po d e pr od uç ão in du st ria l, co m e sp ec ia l a te nç ão àq ue la s c om m ai or p ot en ci al p ol ui do r e d e de gr ad aç ão a m bi en ta l. Quadro 1 – Principais impactos e medidas mitigadoras das atividades produtivas mais comuns (continuação) Avaliação de impactos ambientais 129 Ti po d e em pr ee nd im en to P ri nc ip ai s im pa ct os P ri nc ip ai s m ed id as m it ig ad or as In dú st ri a em g er al Po lu iç ão d o ar p el a em is sã o de m at er ia l pa rt ic ul ad o, su bs tâ nc ia s q uí m ic as , fu m aç a e va po r de á gu a, e nt re o ut ro s. E st ud ar a lte rn at iv as d e lo ca çã o do e m pr ee nd im en to q ue e vi te m a d is pe rs ão d e su bs tâ nc ia s qu ím ic as , m at er ia l p ar ti cu la do e f um aç a pa ra á re as h ab it ad as , c om e sp ec ia l at en çã o às s ub st ân ci as tó xi ca s e/ ou q ue p ro du za m o do re s de sa gr ad áv ei s. E m pr eg ar té cn ic as d e fi lt ra ge m e r ed uç ão d as e m is sõ es , a de qu an do o p ro ce ss o às ca ra ct er ís tic as d a m at ér ia -p ri m a ut ili za da e a o tip o de re sí du o pr od uz id o. M on ito ra r a s e m is sõ es c on tin ua m en te e d es en vo lv er té cn ic as q ue p er m ita m d et ec ta r ev en tu ai s va za m en to s de p ro du to s e de fe it os n os s is te m as d e co nt ro le e t ra ta m en to d as em is sõ es . Po lu iç ão s on or a ge ra da p el a at iv id ad e in du st ri al , v ar iá ve l c on fo rm e o ti po d e in dú st ria . E st ud ar a lt er na ti va s de lo ca çã o da s un id ad es in du st ri ai s qu e nã o fiq ue m p ró xi m as a á re as ha bi ta da s. P ro te ge r e is ol ar a cu st ic am en te e qu ip am en to s qu e pr od uz am n ív ei s el ev ad os d e ru íd o, at en ta nd o pa ra a m an ut en çã o ad eq ua da e r ev es ti m en to a cú st ic o da s ed ifi ca çõ es . U til iz ar e qu ip am en to s d e pr ot eç ão in di vi du al , n o ca so d os tr ab al ha do re s q ue a tu am e m lo ca is c om la to s n ív ei s d e ru íd os . D eg ra da çã o da q ua lid ad e am bi en ta l p el o au m en to n a ge ra çã o de r es íd uo s só li do s e es go to . D is po r ad eq ua da m en te o s re sí du os s ól id os e a de qu ar -s e às e xi gê nc ia s le ga is d o si st em a de c ol et a e tr at am en to d o lix o no re sp ec tiv o lo ca l d e pr od uç ão . D if un di r pr in cí pi os d e re du çã o, r eu ti li za çã o e re ci cl ag em d os r es íd uo s pr od uz id os . I ns ta la r u m a es ta çã o de tr at am ento a de qu ad a à na tu re za d o es go to p ro du zi do . T ur is m o A um en to n o co ns um o de re cu rs os na tu ra is c om o ág ua e e ne rg ia . P la ne ja r a ut il iz aç ão d a ág ua e im pl an ta r té cn ic as d e re ut il iz aç ão d es se r ec ur so , a lé m d e m ed id as d e se ns ib ili za çã o pa ra q ue a s p es so as n ão d es pe rd ic em á gu a. D efi ni r a ca pa ci da de d e su po rt e do lo ca l d e fo rm a qu e a po pu la çã o de t ur is ta s nã o pr ov oq ue u m a so br ec ar ga n a ut ili za çã o do s r ec ur so s. E st ab el ec er u m p la no d ir et or p ar a o lo ca l d e ut il iz aç ão t ur ís ti ca , d e fo rm a a di sc ip li na r o us o do e sp aç o at en de nd o a le gi sl aç ão e n or m as té cn ic as v ig en te s. A um en to n a pr od uç ão d e efl ue nt es do m és tic os e c om er ci ai s, al ém d e re sí du os s ól id os d e di fe re nt es o ri ge ns . A de qu ar o s si st em as d e co le ta , t ra ta m en to e d is po si çã o fi na l d os r es íd uo s só li do s e de es go to p ar a at en di m en to d as d em an da s s az on ai s g er ad as p el a at iv id ad e tu rís tic a. R ea li za r ca m pa nh as d e se ns ib il iz aç ão e c on sc ie nt iz aç ão q ua nt o ao li xo e a o es go to . Quadro 1 – Principais impactos e medidas mitigadoras das atividades produtivas mais comuns (continuação) Avaliação de impactos ambientais 130 Ti po d e em pr ee nd im en to P ri nc ip ai s im pa ct os P ri nc ip ai s m ed id as m it ig ad or as T ur is m o A um en to n a ex pl or aç ão d e an im ai s vi sa do s p el a at iv id ad e tu rís tic a, c om o cr us tá ce os , p ei xe s e m ol us co s. E st ab el ec er m ed id as d e co nt ro le d os e st oq ue s n at ur ai s d as p ri nc ip ai s e sp éc ie s e xp lo ra da s, co m o fo rm a de e st ab el ec er a s ba se s pa ra u m a ut il iz aç ão q ue c on si de re a s ne ce ss id ad es d e re po si çã o de ss es e st oq ue s. A te nd er à s no rm as e a le gi sl aç ão v ig en te r ef er en te à e sp éc ie e xp lo ra da . D iv ul ga r as é po ca s de “ de fe so ” da s es pé ci es e r ea li za r ca m pa nh as q ue d es es ti m ul em o tu ris ta a c on su m ir es se s r ec ur so s n es sa s é po ca s. F is ca liz ar a s a tiv id ad es d e ex pl or aç ão d e pl an ta s e a ni m ai s n at iv os . N ec es si da de d e im pl an ta çã o de o br as de in fr ae st ru tu ra q ue c au sa m d iv er so s im pa ct os so br e o am bi en te , c om o dr en ag en s, es tr ad as , m ov im en ta çõ es d e te rr a e at er ro s. E st ab el ec er u m p la no d ir et or q ue c on si de re o z on ea m en to e co ló gi co -e co nô m ic o da r eg iã o e su as c ar ac te rís tic as a m bi en ta is , e m q ue o o rd en am en to n o us o do e sp aç o at en da à le gi sl aç ão v ig en te e à s c ar ac te rís tic as so ci oe co nô m ic as lo ca is . A va li ar c ad a ti po d e em pr ee nd im en to d e fo rm a m ai s es pe cí fic a, a te nd en do à le gi sl aç ão vi ge nt e e às n ec es si da de s lo ca is e p er sp ec ti va s fu tu ra s da r eg iã o. D eg ra da çã o da p ai sa ge m e d os a m bi en te s na tu ra is p el a im pl an ta çã o de e di fic aç õe s, ob ra s de in fr ae st ru tu ra e p el o au m en to no fl ux o de v is it an te s em lo ca is f rá ge is , co m o re ci fe s de c or ai s e m an gu ez ai s. S in al iz ar a s ár ea s de p re se rv aç ão p er m an en te e o s lo ca is d e m ai or f ra gi li da de a m bi en ta l, de f or m a a m os tr ar a o tu ri st a a im po rt ân ci a da c on se rv aç ão d aq ue le lo ca l. E st ab el ec er u ni da de s de c on se rv aç ão d e pr ot eç ão in te gr al o nd e a vi si ta çã o co m fi ns de re cr ea çã o e co nt at o co m a n at ur ez a se ja m p er m iti da s e e st im ul ad as , c om a d ev id a es tr ut ur a pa ra e ss a vi si ta çã o. I m pl an ta r pr oj et os p ai sa gí st ic os q ue c on si de re m a h is tó ri a e as c ar ac te rí st ic as lo ca is , in co rp or an do e le m en to s q ue m in im iz em e ve nt ua is im pa ct os d ec or re nt es d o au m en to d e ru íd os e p ol ue nt es e m á re as m ai s u rb an iz ad as . Z on ea r ad eq ua da m en te a s lo ca li da de s de m ai or a ti vi da de t ur ís ti ca , d e fo rm a a ev it ar q ue co ns tr uç õe s d es ca ra ct er iz em a s p ai sa ge ns e d em ai s a tr at iv os d o lo ca l. A lte ra çõ es d as c ar ac te rís tic as so ci oe co nô m ic as d a re gi ão , de co rr en te s d as m ud an ça s d e va lo re s, co m po rtam en to s e m od os d e vi da da s p op ul aç õe s q ue v iv em n os lo ca is tu rís tic os . P os si bi li ta r a pa rt ic ip aç ão d a po pu la çã o en vo lv id a no p ro ce ss o de p la ne ja m en to e ex ec uç ão d o em pr ee nd im en to , e nv ol ve nd o es sa p op ul aç ão n a ge ra çã o de e m pr eg os e be ne fí ci os e co nô m ic os d ec or re nt es d o tu ri sm o. P la ne ja r o tu ri sm o re sp ei ta nd o os h áb it os e t ra di çõ es d as p op ul aç õe s lo ca is . A do ta r m ed id as d e fo rm aç ão e c ap ac it aç ão d a po pu la çã o lo ca l p ar a at en de r à de m an da tu rís tic a. I m pl em en ta r d is po si tiv os le ga is q ue p ro te ja m o s i nt er es se s l oc ai s e m re la çã o à po ss e e us o da te rr a. Quadro 1 – Principais impactos e medidas mitigadoras das atividades produtivas mais comuns (continuação) Avaliação de impactos ambientais 131 Ti po d e em pr ee nd im en to P ri nc ip ai s im pa ct os P ri nc ip ai s m ed id as m it ig ad or as M in er aç ão A lt er aç õe s na p ai sa ge m e m d if er en te s ní ve is , d ep en de nd o do ti po d e m in er aç ão e da e ta pa d e ex pl or aç ão d a m in a. P la ne ja r a ut il iz aç ão d e to da a á re a de in flu ên ci a di re ta d a m in er aç ão , d e fo rm a a co m pa tib ili za r o s a ce ss os , a s á re as d e em pr és tim o e as d em ai s á re as n ec es sá ria s p ar a di sp os iç ão d as e di fic aç õe s e in fr ae st ru tu ra . C on tro la r p ro ce ss os e ro si vo s c om a im pl an ta çã o de té cn ic as d e m od el ag em d o te rr en o e re ve ge ta çã o, c om fi ns d e re st au ra çã o am bi en ta l, em á re as d e m ai or f ra gi li da de . Su pr es sã o da v eg et aç ão n as m in er aç õe s a cé u ab er to e n os lo ca is d e im pl an ta çã o da s m in as su bt er râ ne as . E st ud ar a lte rn at iv as d e lo ca çã o qu e co ns id er em a p re se nç a de re m an es ce nt es d e ve ge ta çã o na ti va e m b om e st ad o de c on se rv aç ão , a te nd en do à le gi sl aç ão e sp ec ífi ca e , s e ne ce ss ár io , à s no rm as té cn ic as d e di ag nó st ic o da v eg et aç ão e d a fa un a e de r es ga te d e es pé ci es a m ea ça da s. E st ab el ec er á re as so b re gi m e es pe ci al d e pr ot eç ão q ue a br ig ue m o s e co ss is te m as de st ru íd os c om o fo rm a de c om pe ns ar a s pe rd as d ec or re nt es d o em pr ee nd im en to , q ua nd o nã o ex is tir em a lte rn at iv as a de qu ad as d e lo ca çã o. I m pl an ta r m ed id as d e pr ot eç ão d a ve ge ta çã o, c om c or tin as v eg et ai s, re du çã o da e m is sã o de p ó e pl an ej am en to d e m ed id as d e re st au ra çã o da v eg et aç ão p ós -l av ra . M ud an ça s no p er fi l s oc io ec on ôm ic o da re gi ão d e im pl an ta çã o da m in er aç ão , co m a um en to d o flu xo d e pe ss oa s e da s at iv id ad es re la ci on ad as . P la ne ja r o em pr ee nd im en to c on si de ra nd o as n ec es si da de s de c om un ic aç ão e es cl ar ec im en to p ar a a po pu la çã o lo ca l, im pl an ta nd o m ed id as q ue v is em a m el ho ria d a qu al id ad e de v id a as so ci ad a à pr ot eç ão e u so a de qu ad o do s r ec ur so s n at ur ai s. P la ne ja r o us o e oc up aç ão d o so lo n os a ss en ta m en to s po pu la ci on ai s e no e st ud o de te nd ên ci as d e ur ba ni za çã o no e nt or no d as á re as m in er ad as . C on ta m in aç ão d o am bi en te d ev id o ao la nç am en to d e efl ue nt es n os c or po s d´ ág ua s up er fic ia is e s ub te rr ân eo s, n o so lo , e d e m at er ia l p ar tic ul ad o no a r e so br e a ve ge ta çã o. I m pl an ta r si st em as d e tr at am en to e d es ti na çã o de e flu en te s qu e co ns id er em a s pr in ci pa is dr en ag en s lo ca is e a s es pe ci fic id ad es d o m at er ia l p ro du zi do . D ed ic ar e sp ec ia l a te nç ão p ar a qu e em e sc av aç õe s n ão se ja m c on ta m in ad as a s á gu as su bt er râ ne as , i m pl an ta nd o si st em as q ue g ar an ta m a su a qu al id ad e. U ti li za r ba rr ei ra s de c on te nç ão p ar a m at er ia l p ar ti cu la do e e flu en te s do p ro ce ss o de m in er aç ão . Quadro 1 – Principais impactos e medidas mitigadoras das atividades produtivas mais comuns (continuação) Avaliação de impactos ambientais 132 Ti po d e em pr ee nd im en to P ri nc ip ai s im pa ct os P ri nc ip ai s m ed id as m it ig ad or as A ba st ec im en to d e ág ua e tr at am en to d e es go to A lte ra çõ es n os c ur so s d ´á gu a e no b al an ço h íd ric o lo ca l,pe la re m oç ão d a ve ge ta çã o, e ro sã o da s m ar ge ns , a lt er aç õe s na fl or a e fa un a e re ba ix am en to d o le nç ol f re át ic o. I m pl an ta r p ro gr am as d e pr ot eç ão d as n as ce nt es e d as m at as c ili ar es , s e ne ce ss ár io c om a re co m po si çã o da v eg et aç ão , c on se rv aç ão d o so lo e p la ne ja m en to te rr ito ria l. I m pl an ta r m ed id as d e m on ito ra m en to d a qu al id ad e da á gu a qu e é ca pt ad a e da q ue é de sp ej ad a ap ós o t ra ta m en to d o es go to d om és ti co e in du st ri al . A te nd er à le gi sl aç ão v ig en te re la tiv a às á re as d e pr es er va çã o pe rm an en te . C on ta m in aç ão d a ág ua e d o so lo p el a di sp os iç ão in ad eq ua da d e lo do e á gu as re si du ár ia s d o si st em a de tr at am en to d a ág ua e d o es go to . E st ud ar a lte rn at iv as d e lo ca çã o qu e co ns id er em a p re se nç a de re m an es ce nt es d e ve ge ta çã o na ti va e m b om e st ad o de c on se rv aç ão , a te nd en do à le gi sl aç ão e sp ec ífi ca e , s e ne ce ss ár io , à s no rm as té cn ic as d e di ag nó st ic o da v eg et aç ão e d a fa un a e de r es ga te d e es pé ci es a m ea ça da s. E st ab el ec er á re as so b re gi m e es pe ci al d e pr ot eç ão q ue a br ig ue m o s e co ss is te m as de st ru íd os c om o fo rm a de c om pe ns ar a s pe rd as d ec or re nt es d o em pr ee nd im en to , q ua nd o nã o ex is tir em a lte rn at iv as a de qu ad as d e lo ca çã o. I m pl an ta r m ed id as d e pr ot eç ão d a ve ge ta çã o, c om c or tin as v eg et ai s, re du çã o da e m is sã o de p ó e pl an ej am en to d e m ed id as d e re st au ra çã o da v eg et aç ão p ós -l av ra . R is co s ao a m bi en te e a o ho m em d ev id o a fa lh as n o si st em a de p ro ce ss am en to e re se rv a da á gu a e do e sg ot o. M on it or ar a s at iv id ad es d e ca pt aç ão , p ro ce ss am en to e d is tr ib ui çã o/ di sp os iç ão fi na l. I m pl an ta r u m si st em a de a le rt a e co m un ic aç ão e nt re a s u ni da de s d e bo m be am en to e pr oc es sa m en to . A um en to n o ris co d e co nt am in aç ão e co m pr om et im en to d a sa úd e pú bl ic a pe la di ss em in aç ão d e ve to re s d e do en ça s q ue de pe nd em d a ág ua p ar a se p ro li fe ra r. E m pr eg ar te cn ol og ia s qu e pe rm it am u m c on tr ol e so br e os r es er va tó ri os d e ág ua , e sg ot o e lo do , d e fo rm a a da r as c on di çõ es a de qu ad as d e re se rv a e pr oc es sa m en to . M on ito ra r o s p on to s d e ac úm ul o de á gu a e es go to p ar a de te cç ão d e ev en tu ai s s ur to s d e de se nv ol vi m en to d e es pé ci es v et or es d e do en ça s. Su pr es sã o da v eg et aç ão n as á re as de im pl an ta çã o da s e st aç õe s d e pr oc es sa m en to . R es ta ur ar á re a eq ui va le nt e de nt ro d as m es m as c on di çõ es a m bi en ta is , e sp ec ia lm en te qu an do o e m pr ee nd im en to é in st al ad o em á re as d e pr es er va çã o pe rm an en te . R es íd uo s só lid os D is po si çã o fi na l i m pr óp ri a (l ix õe s) c om po ss ib ili da de d e pr ov oc ar u m a sé rie d e im pa ct os a o am bi en te e a o ho m em . E st ab el ec er u m s is te m a ad eq ua do d e co le ta e d is po si çã o fi na l d os r es íd uo s, a te nd en do à le gi sl aç ão p er ti ne nt e em n ív el f ed er al e m un ic ip al . P ro m ov er a d iv ul ga çã o da s ro ti na s de c ol et a e di sp os iç ão fi na l d o li xo , c om c am pa nh as de re du çã o, re ut ili za çã o e re ci cl ag em d e re sí du os . Quadro 1 – Principais impactos e medidas mitigadoras das atividades produtivas mais co- muns (continuação) Avaliação de impactos ambientais 133 Ti po d e em pr ee nd im en to P ri nc ip ai s im pa ct os P ri nc ip ai s m ed id as m it ig ad or as R es íd uo s só lid os G er aç ão d e od or es , c in za s e ga se s pr ov en ie nt es d os a te rr os sa ni tá rio s e de m ai s fo rm as d e di sp os iç ão fi na l d o lix o. I so la r á re as d e tr an sp or te e p ro ce ss am en to d o lix o co m c or tin as v eg et ai s e e st ab el ec er um a zo na d e am or tiz aç ão d os im pa ct os , e m q ue a o cu pa çã o hu m an a se ja re st rit a. I ns ta la r si st em as d e fi lt ra ge m , d ep ur aç ão , t ra ta m en to e r eu ti li za çã o do s pr od ut os d o pr oc es sa m en to d o lix o. C on ta m in aç ão d e ág ua s s ub te rr ân ea s e su pe rfi ci ai s po r li xi viaç ão d o at er ro sa ni tá rio . I m pl an ta r si st em a de d re na ge m s up er fic ia l p ar a ev it ar a in fi lt ra çã o e o es co am en to d as ág ua s p lu vi ai s n a ár ea d o at er ro . C on fl it os s ob re o u so d e ár ea s pa ra at er ro s s an itá rio s o nd e ex is te m lo ca is já ha bi ta do s. P la ne ja r a lo ca li za çã o da u ni da de d e tr at am en to e d is po si çã o fi na l e m f un çã o do p la no di re to r do m un ic íp io e im pl an ta r zo na s de p ro te çã o no e nt or no d a ár ea d efi ni da . R ea li za r to do s os t râ m it es p re vi st os n a le gi sl aç ão r ef er en te a os im pa ct os a m bi en ta is , es cl ar ec en do a p op ul aç ão n as A ud iê nc ia s P úb li ca s so br e as c ar ac te rí st ic as d o em pr ee nd im en to . Su pr es sã o da v eg et aç ão n as á re as d e im pl an ta çã o do s at er ro s e de m ai s fo rm as de d is po si çã o fi na l. R es ta ur ar á re a eq ui va le nt e de nt ro d as m es m as c on di çõ es a m bi en ta is , a te nd en do à le gi sl aç ão e sp ec ífi ca r el at iv a às á re as q ue n ec es si ta m d e pr ot eç ão e sp ec ia l. I m pl an ta r p ro je to d e re co m po si çã o pa is ag ís tic a em a te rr os q ue já te nh am c he ga do à su a ca pa ci da de m áx im a de a rm az en am en to d e lix o. O br as d e ir ri ga çã o Er os ão d o so lo . P ro je ta r ad eq ua da m en te o s is te m a de d re no s e a lâ m in a de ir ri ga çã o a se r ap li ca da . Sa tu ra çã o e sa lin iz aç ão d o so lo . U til iz ar té cn ic as c om m ai or c on tro le d a qu an tid ad e de á gu a, e vi ta nd o a ir rig aç ão ex ce ss iv a. I m pl an ta r s is te m a de c on tro le d a lâ m in a de ir rig aç ão p ar a co nt ro la r o b al an ço d e sa is n a zo na ra di ci al . I ns ta la r e m an te r u m si st em a ad eq ua do d e dr en ag em . Li xi vi aç ão d os n ut rie nt es d o so lo . A pl ic ar c or re ta m en te o s fe rt il iz an te s ev it an do a p er da d e nu tr ie nt es c om o ni tr og ên io e fó sf or o. E vi ta r a ir rig aç ão e xc es si va . Su rg im en to d e al ga s e p ra ga s, al ém do a um en to d a in ci dê nc ia d e do en ça s re la ci on ad as à á gu a. E vi ta r a p er da d e nu tr ie nt es p ro ve ni en te s d a ag ric ul tu ra p ar a a ág ua c om o u so d e pr át ic as ag ríc ol as a de qu ad as . I m pl em en ta r m ed id as d e pr ev en çã o e co nt ro le d e ag en te s bi ol óg ic os q ue p os sa m p ro vo ca r a ob st ru çã o do s c an ai s d e dr en ag em e o d es en vo lv im en to d e ve to re s d e do en ça s. Quadro 1 – Principais impactos e medidas mitigadoras das atividades produtivas mais comuns (continuação) Avaliação de impactos ambientais 134 Ti po d e em pr ee nd im en to P ri nc ip ai s im pa ct os P ri nc ip ai s m ed id as m it ig ad or as O br as d e ir ri ga çã o R ed uç ão d a va zã o do r io à ju sa nt e do po nt o de c ap ta çã o da á gu a. R ed uz ir a r et ir ad a de á gu a bu sc an do m an te r ní ve is a de qu ad os a os d em ai s us os d o m an an ci al . I m pl em en ta r s is te m as d e co nt ro le d a di st rib ui çã o da á gu a en tre o s u su ár io s, lim ita nd o a ut ili za çã o ao s n ív ei s d e re ca rg a. P ro te ge r a ve ge ta çã o ci li ar e vi ta nd o o as so re am en to d os m an an ci ai s. E vi ta r a ir rig aç ão e xc es si va e o d es pe rd íc io d e ág ua . A lte ra çã o ou p er da d a ve ge ta çã o e da f au na q ue o co rr e na s ár ea s de im pl an ta çã o do si st em a de c ap ta çã o e di st rib ui çã o de á gu a. A va li ar a s op çõ es d e lo ca çã o do e m pr ee nd im en to d e fo rm a a ev it ar a in te rv en çã o em ár ea s fr ág ei s do p on to d e vi st a am bi en ta l, pr ev en do c or re do re s pa ra a m ov im en ta çã o da fa un a. I m pl an ta r p ro gr am as d e re co m po si çã o da s m at as c ili ar es e c on tro le d a qu al id ad e da á gu a em pr eg ad a no si st em a. T ra ns po rt e D eg ra da çã o de e co ss is te m as n os lo ca is de in st al aç ão d e es tr ad as , p or to s, ae ro po rt os e te rm in ai s r od ov iá rio s e d e ca rg as . A na lis ar a lte rn at iv as d e lo ca is p ar a im pl an ta çã o qu e ev ite m á re as a m bi en ta lm en te m ai s fr ág ei s, c om o m an gu ez ai s, e nc os ta s ín gr em es , l oc ai s co m s ol os r as os e v ár ze as , a lé m d e at en de r à le gi sl aç ão v ig en te so br e as á re as q ue d em an da m p ro te çã o es pe ci al. L im ita r a su pr es sã o da v eg et aç ão a os lo ca is d e im pl an ta çã o do p ro je to , p re ve nd o a re co m po si çã o da s á re as u til iz ad as so m en te n a et ap a de im pl an ta çã o da s o br as . I m pl an ta r á re as so b pr ot eç ão e sp ec ia l, qu e, d ep en de nd o da si tu aç ão , p od em se r r el at iv as à ad eq ua çã o à le gi sl aç ão o u en tã o cr ia nd o al gu m ti po d e ár ea p ro te gi da c om o m ed id a co m pe ns at ór ia . Fr ag m en ta çã o de h ab ita ts p el o is ol am en to p ro vo ca do p el as ro do vi as , fe rr ov ia s e hi dr ov ia s. A va lia r a lte rn at iv as d e lo ca çã o qu e m in im iz em e ss e im pa ct o, e vi ta nd o qu e o tr aç ad o de ss as o br as p as se m p or á re as c om v eg et aç ão e m b om e st ad o de c on se rv aç ão , e m un id ad es d e co ns er va çã o ou e m á re as so b al gu m ti po d e pr ot eç ão le ga l. E st ab el ec er c or re do re s pa ra o d es lo ca m en to d a fa un a e m an ut en çã o da s co ne xõ es d a ve ge ta çã o, c om v is ta s a m an te r vi áv ei s ec ol og ic am en te o s fr ag m en to s re su lt an te s da in te rv en çã o. I m pl an ta r c am pa nh as e du ca tiv as c om o s u su ár io s d as e st ra da s p ar a at en de r a os li m ite s d e ve lo ci da de e m á re as e sp ec ia lm en te im po rt an te s pa ra a c on se rv aç ão d a flo ra e d a fa un a. Quadro 1 – Principais impactos e medidas mitigadoras das atividades produtivas mais comuns (continuação) Avaliação de impactos ambientais 135 Ti po d e em pr ee nd im en to P ri nc ip ai s im pa ct os P ri nc ip ai s m ed id as m it ig ad or as T ra ns po rt e M ov im en ta çã o de g ra nd e qu an tid ad e de m at ér ia re su lta nt e de c or te s, at er ro s e de m ai s m od ifi ca çõ es d a to po gr afi a do s lo ca is d e im pl an ta çã o. A va li ar o d es en ho a rq ui te tô ni co m ai s ad eq ua do d e fo rm a a ev it ar a a lt er aç ão d e ár ea s am bi en ta lm en te im po rt an te s e fr ág ei s. P la ne ja r as in te rv en çõ es u ti li za nd o ár ea s de e m pr és ti m o e de “ bo ta -f or a” d e fo rm a in te gr ad a e qu e pr ev ej am u m a re co m po si çã o am bi en ta l a pó s o té rm in o do em pr ee nd im en to . P ro te ge r as s up er fí ci es d e te rr en os e xp os to s po r te rr ap le na ge ns e c or te s de te rr en o, c om m at er ia is n at ur ai s ou a rt ifi ci ai s, in st al an do e st ru tu ra s de d is si pa çã o de e ne rg ia e d e co nt en çã o de m at er ia is p ar a ev ita r e ro sã o e as so re am en to d os c ur so s d ´á gu a. A um en to te m po rá rio d o nú m er o de pe ss oa s e m d ec or rê nc ia d a im pl an ta çã o do e m pr ee nd im en to e su as c on se qu ên ci as so ci oe co nô m ic as . R ea li za r um p la ne ja m en to d o us o e or de na m en to d o so lo n a ár ea d e in flu ên ci a do em pr ee nd im en to , i nc lu in do to do s o s n ív ei s i nt er ve ni en te s n a su a re sp ec tiv a im pl an ta çã o e op er aç ão . E st ab el ec er d iá lo go e b us ca r c rit ér io s a de qu ad os p ar a as in te rv en çõ es q ue e nv ol va m as se nt am en to s, de sa pr op ria çõ es e re lo ca çõ es d e pe ss oa s. D eg ra da çã o da q ua lid ad e da á gu a de vi do a al te ra çõ es n os fl ux os e n a dr en ag em re gi on al . I m pl an ta r si st em as d e co le ta e t ra ns po rt e da s ág ua s su pe rfi ci ai s, d im en si on ad os à s ne ce ss id ad es d o em pr ee nd im en to e à s c ar ac te rís tic as re gi on ai s. M on it or ar o s po nt os d e in te rv en çã o do e m pr ee nd im en to e m to da s as s ua s fa se s, d e fo rm a a es ta be le ce r u m si st em a de a co m pa nh am en to e g es tã o am bi en ta l. A um en to d a oc up aç ão h um an a ao lo ng o da á re a de im pl an ta çã o do em pr ee nd im en to , c om c on se qu en te es pe cu la çã o im ob ili ár ia e a um en to d a de m an da d e re cu rs os e d a pr od uç ão d e re sí du os . P la ne ja r a oc up aç ão d a ár ea d e in flu ên ci a do e m pr ee nd im en to c on si de ra nd o to da s as fa se s de s ua im pl an ta çã o, in cl ui nd o a op er aç ão , d e fo rm a a di m en si on ar e im pl an ta r as ne ce ss id ad es d e in fr ae st ru tu ra d ec or re nt es d es se im pa ct o. P ro m ov er c am pa nh as q ue e sc la re ça m a p op ul aç ão s ob re o e m pr ee nd im en to e s ua s ne ce ss id ad es d e pe ss oa l d ur an te su a op er aç ão . R is co d e ac id en te s co m c ar ga stó xi ca s e co ns eq ue nt e co nt am in aç ão d o so lo e da á gu a po r v az am en to s d e su bs tâ nc ia s qu ím ic as d iv er sa s. E la bo ra r p la no s d e co nt in gê nc ia p ar a si tu aç õe s d e em er gê nc ia , m in im iz an do ri sc os du ra nt e o tr an sp or te e a rm az en am en to d e ca rg as p er ig os as . P la ne ja r ro ta s es pe ci ai s pa ra t ra ns po rt e de c ar ga s pe ri go sa s e cu m pr ir a le gi sl aç ão es pe cí fic a qu e re gu la m en ta e ss a qu es tã o no s di fe re nt es n ív ei s ad m in is tr at iv os . R ep re sa s A lte ra çõ es c lim át ic as d ec or re nt es d a fo rm aç ão d os r es er va tó ri os . A va li ar a lt er na ti va s de f or m aç ão d o re se rv at ór io d e fo rm a a di m in ui r os e fe it os d e gr an de s á re as c om lâ m in a de á gu a so br e o cl im a lo ca l. Quadro 1 – Principais impactos e medidas mitigadoras das atividades produtivas mais comuns (continuação) Avaliação de impactos ambientais 136 Ti po d e em pr ee nd im en to P ri nc ip ai s im pa ct os P ri nc ip ai s m ed id as m it ig ad or as R ep re sa s Su pr es sã o de á re as e xt en sa s c om ve ge ta çã o na ti va e c om d if er en te s si st em as d e us o da te rr a. A na li sa r al te rn at iv as p ar a re du çã o do t am an ho d o re se rv at ór io d e fo rm a a ev it ar a in un da çã o de á re as c om v eg et aç ão n at iv a e co m si st em as p ro du tiv os . P la ne ja r a re in te gr aç ão d as á re as d o ca nt ei ro d e ob ra s, d e em pr és ti m o e de b ot a- fo ra à pa is ag em lo ca l e r ec up er aç ão d as á re as d eg ra da da s co m fi na li da de s de p ro te çã o da fl or a e da f au na . I m pl an ta r um p ro gr am a de c on se rv aç ão d a flo ra e d a fa un a no e nt or no d o re se rv at ór io , co m c ria çã o de u ni da de s d e co ns er va çã o e re st au ra çã o da s á re as q ue d em an da m p ro te çã o es pe ci al . R ea li za r o re sg at e da f au na e d a flo ra a nt es d o en ch im en to d e re se rv at ór io , d es ti na nd o o re su lt ad o de ss a at iv id ad e às in st it ui çõ es e lo ca is a de qu ad os a c ad a gr up o bi ol óg ic o co ns id er ad o. M ud an ça s n as c ar ac te rís tic as so ci oe co nô m ic as d a re gi ão c om a ch eg ad a de m ai s p es so as , r et ira da de p op ul aç õe s d a ár ea d ire ta m en te af et ad a, im pl an ta çã o de in fr ae st ru tu ra e de m ai s a tiv id ad es re la ci on ad as a o em pr ee nd im en to . R ea ss en ta r a po pu la çã o ur ba na e r ur al d ir et am en te a fe ta da e m lo ca is d ot ad os d e in fr ae st ru tu ra a de qu ad a em r el aç ão a os s er vi ço s bá si co s de a te nd im en to à p op ul aç ão (s aú de , e du ca çã o, s an ea m en to , f or ne ci m en to d e ág ua e e ne rg ia e tc .). R eo rd en am en to d as a ti vi da de s pr od ut iv as d a re gi ão , c om r el oc aç ão d e vá ri as o br as d a ár ea in un da da p ar a no vo s lo ca is , i nc lu in do m on um en to s, p at ri m ôn io a rq ue ol óg ic o e pa is ag ís tic o, te m pl os , c en tro s c om un itá rio s, ce m ité rio s, en tre o ut ro s. A de qu ar a in fr ae st ru tu ra d os m un ic íp io s at in gi do s pa ra d es en vo lv er p ro gr am as d e us o m úl ti pl o do r es er va tó ri o, in te gr an do a p op ul aç ão à n ov a si tu aç ão a pó s a co nc lu sã o da s ob ra s. A lt er aç õe s na b ac ia h id ro gr áfi ca , no s fl ux os h íd ri co s, n os p ro ce ss os d e tr an sp or te e d ep os iç ão d e m at er ia is , na n av eg ab il id ad e do s ri os a fe ta do s, no n ív el d as á gu as su bt er râ ne as , e nt re ou tro s. E st ab el ec er m ed id as d e co nt ro le e m on ito ra m en to d a er os ão e d e co ns er va çã o do so lo n a ba ci a hi dr og rá fic a. C on tr ol e do n ív el d o re se rv at ór io p ar a ev it ar g ra nd es v ar ia çõ es n os fl ux os h íd ri co s. O rd en ar o u so d o so lo e a o cu pa çã o da b ac ia h id ro gr áfi ca . S up re ss ão d a ve ge ta çã o na z on a in un da da d e fo rm a a ev it ar a d im in ui çã o do s fl ux os n o in te ri or d o re se rv at ór io . C on st ru ir ca na is d e de sv io d os se di m en to s. Quadro 1 – Principais impactos e medidas mitigadoras das atividades produtivas mais comuns (continuação) Avaliação de impactos ambientais 137 Barra Grande – epílogo (ALDÉ, 2005) Aproxima-se do fim uma das maiores disputas ambientais do Brasil nos últimos tempos. A hidrelétrica de Barra Grande recebeu do Ibama a licença de operação para encher seu reservatório no Rio Pelotas, na fronteira de Santa Catarina com o Rio Grande do Sul. Com isso, vai inundar mais de 4 000 hectares de Mata Atlântica íntegra ou em bomestado de regeneração, incluindo araucárias e uma espécie de bromélia que só existe ali. O escândalo de Barra Grande veio a público há quase um ano, com a descoberta de que o es- tudo de impacto ambiental da obra subestimou, e muito, a riqueza florestal da região. Desde então, grupos ambientalistas lutam na Justiça para embargar a usina. As ações ainda tramitam, mas a licença de operação concedida pelo Ibama liberou oficialmente o fechamento das comportas. A floresta estará submersa em três meses. No dia 31 de outubro, a BAESA, consórcio de construtoras responsável por Barra Grande, pretende acionar a primeira das três turbinas que vão gerar 690 megawatts. Nessa troca de natureza por energia, o que sobra é muita controvérsia. A começar pela própria licença de operação, que até a tarde do dia 5 de junho o Ibama não confirmava ter liberado. Faltaria o pagamento de uma taxa por parte da BAESA. O pre- sidente da empresa, Carlos Alberto Bezerra de Miranda, disse que pagou a taxa, de 112 mil reais, e que já tem a licença em mãos. O valor diz respeito aos estudos feitos para embasar a decisão. Não foram poucos. Os mais recentes tiveram como alvo a bromélia Dyckia distachya. Segundo botânicos da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), a espécie só existe, no Brasil, na região a ser alagada por Barra Grande. O professor Ademir Reis, que há um ano coordena o projeto destinado a identificar os ha- bitats da bromélia para propor estratégias de conservação, nos últimos dias largou as picadas de floresta que tinha de enfrentar em busca da planta para se meter em uma série de reuniões em Bra- sília, com técnicos do Ministério do Meio Ambiente e do Ibama. “Denunciei que só existem três populações da espécie no Brasil, todas na área de Barra Grande. O Ibama não poderia autorizar a extinção de uma espécie no país. Se o fez, eu mesmo entro na Justiça”, diz Reis. Mas ressalva que ainda havia a possibilidade de encontrarem a mesma bromélia em São Joaquim (SC), ali perto. Na semana passada, um grupo de técnicos do Ministério esteve na área, mas ele estava viajando e não soube do resultado. Para o presidente da BAESA, a sobrevivência da bromélia em território brasileiro é o de menos. “É uma planta muito comum na Argentina”, desdenha Carlos Miranda. Ele diz que a empresa vai gastar 180 milhões de reais em medidas socioambientais, incluindo a compra de outra floresta de 5 700 hectares e a criação de um banco de germoplasma das principais espé- cies a serem retiradas ou afogadas. “Vocês conseguiram uma vitória enorme em Barra Grande”, argumentou para o repórter d’O Eco. “A Licença de Operação tem 76 condicionantes. Nunca uma licença de operação teve tantos condicionantes”, queixa-se. Avaliação de impactos ambientais 138 Quais são os condicionantes, Miranda não sabe detalhar. Nem o professor Ademir Reis sabe dizer se o estudo genético de suas bromélias está entre eles. Ibama e Ministério do Meio Ambien- te, se nem confirmaram a licença, que dirá explicar seus termos. Essa falta de transparência irrita os ambientalistas. E não é de hoje. Miriam Prochnow, co- ordenadora da Rede de ONGs da Mata Atlântica (RMA), diz que desde o início do ano tentam marcar uma reunião com Marina Silva para tratar de Barra Grande, mas a ministra se nega a recebê-los. Uma das líderes do movimento de resistência à hidrelétrica, ela estava atônita ao te- lefone, nesta terça-feira de manhã. “A concessão dessa licença é algo absolutamente degradante. Mostra o que é a política ambiental do governo. Diante desse fato, feito dessa forma, não tenho mais esperanças”, desabafou. Em nota divulgada na parte da tarde, Miriam também diz estranhar que o anúncio da licença tenha sido feito pela senadora Ideli Salvatti (PT/SC). “O que ela tem a ver com isso?”, pergunta. O site da senadora dá a pista de que a decisão partiu da Casa Civil, agora sob o comando da ex- -ministra das Minas e Energia, Dilma Rousseff. Dilma não se pronunciou, mas o presidente da BAESA tem na ponta da língua o discurso que faz a cabeça da ministra. “O Brasil precisa de energia, e a solução viável é a oferta hidrelé- trica. Temos 20% da água do planeta. Temos que resolver esses conflitos pesando todos os lados da questão”, diz Carlos Miranda. E o lado ambiental de Barra Grande está resolvido com sobras, reafirma. Até porque, segundo ele, “não tem essa vegetação toda lá”. Miranda garante que a maior parte da floresta íntegra vai ficar acima do nível da represa, e põe em dúvida até a motivação ori- ginal da crise: o estudo de impacto ambiental da Engevix. “Novas análises estão sendo feitas e parece que o estudo inicial estava certo”, sugere. Isso, apesar de o Ibama ter reconhecido a fraude no relatório da Engevix, multado e descadastrado a empresa, e estabelecido a enorme lista de “condicionantes” ambientais que a BAESA aceitou, sem pestanejar muito. Ainda assim, é tentador acreditar no que Carlos Miranda afirma com veemência. Como é tentador torcer para que a bromélia Dyckia distachya tenha sido encontrada em São Joaquim. Até porque, a essa altura, não resta muito a fazer para os que defendem a floresta. A não ser torcer ou espernear. A segunda opção já mobilizou a Associação de Preservação do Meio Ambiente do Alto Vale do Itajaí (Apremavi), que pretende “bloquear a caixa de correio” do Poder Executivo com mensagens garrafais de protesto contra a licença de operação para Barra Grande. E, no front antibarragens, não falta trabalho pela frente. A começar pela rara bromélia. Se de fato foram encontrados exemplares em São Joaquim, começa agora uma nova corrida para salvá- -la, pois também ali será construída uma hidrelétrica, a de Paiquerê. Já sua prima próxima Dyckia ibiramensis protagoniza um escândalo com o mesmo script de Barra Grande, mas em versão re- duzida. Bromélia exclusiva da região de Ibirama (SC), está ameaçada por uma Pequena Central Hidrelétrica (PCH). Detalhe: a obra ganhou licença prévia da FATMA, órgão estadual de meio ambiente, mas o estudo de impacto simplesmente desapareceu. Será que era da Engevix? Avaliação de impactos ambientais 139 1. Faça uma visita a um distrito industrial, porto, aeroporto, área agrícola, usina hidrelétrica, ater- ro sanitário ou lixão, ou algum outro empreendimento em sua cidade ou região que tenha pro- vocado impactos sobre o meio ambiente. Faça uma lista dos prováveis impactos verificados e avalie-os quanto às suas características em termos de forma de manifestação, periodicidade, reversibilidade etc., listando-os conforme os itens abaixo: a) consequências sobre o meio físico; b) consequências sobre o meio biológico; c) consequências sobre o meio socioeconômico. 2. Forme um grupo de quatro pessoas e discuta as observações que cada um fez. Reúna os dados em uma matriz de impactos, procurando reconhecer os pontos em comum que os empreendi- mentos apresentam e seus respectivos impactos. Tente reconhecer também quais são os impac- tos que poderão ser potencializados ou minimizados reciprocamente (sinergia). 3. Sistematize a discussão realizada e apresente para o restante da turma. Registre os principais pontos discutidos com a turma. Site do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis: <www. ibama.gov.br>. Nesse site podem ser encontradas informações sobre licenciamento ambiental e avaliação de impacto ambiental no Brasil, com toda a regulamentação sobre o assunto, incluindo leis, decretos, resoluções e instruções normativas. Avaliação de impactos ambientais 140 A Carta da Terra Estamos diante de um momento crítico na história da Terra, numa época em que a huma- nidade deve escolher o seu futuro. À medida que o mundo torna-se cada vez mais interde- pendente e frágil, o futuro enfrenta, ao mesmo tempo, grandes perigos e grandes promes- sas.Para seguir adiante, devemos reconhecer que, no meio de uma magnífica diversidade de culturas e formas de vida, somos uma família humana e uma comunidade terrestre com um destino comum. Devemos somar forças para gerar uma sociedade sustentável global baseada no respeito pela natureza, nos direitos humanos universais, na justiça econômica e numa cultura da paz. Para chegar a esse propósito, é imperativo que nós, os povos da Terra, declaremos nossa responsabilidade uns para com os outros, com a grande comunidade da vida, e com as futuras gerações. (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 2005) A Organização das Nações Unidas (ONU) foi criada em 1945, tendo como objetivos o estabelecimento da paz, os direitos humanos e o desenvolvi-mento equitativo dos países. A questão ambiental passou a fazer parte dos objetivos da ONU apenas a partir de 1972, após a Conferência de Estocolmo sobre Entorno Humano. Em 1987, a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMAD) sugeriu a criação de uma declaração sobre a proteção ambiental e de- senvolvimento sustentável. Em 1992, na Eco 92, iniciou-se o projeto da Carta da Terra, que foi terminado em 2002. A Carta da Terra será um código de ética para o planeta, equivalente à Declaração Universal dos Direitos Humanos. Ela é baseada em princí- pios e valores que consideram a natureza como riqueza a ser preservada durante o desenvolvimento das sociedades. Terra, nosso lar A humanidade é parte de um vasto universo em evolução. A Terra, nosso lar, está viva com uma comunidade de vida única. As forças da natureza fazem da existência uma aventura exigente e incerta, mas a Terra providenciou as condições essenciais para a evolução da vida. A capacidade de recuperação da comunidade da vida e o bem-estar da humanidade dependem da preservação de uma biosfera saudável com todos seus sistemas ecológicos, uma rica variedade de plantas e animais, solos férteis, águas puras e ar limpo. O meio ambiente global com seus recursos finitos é uma preocupação comum de todas as pessoas. A proteção da vitalidade, diversidade e beleza da Terra é um dever sagrado. (ORGANIZA- ÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 2005) A situação global Os padrões dominantes de produção e consumo estão causando devastação ambiental, redução dos recursos e uma massiva extinção de espécies. Comunidades estão sendo ar- ruinadas. Os benefícios do desenvolvimento não estão sendo divididos equitativamente e o fosso entre ricos e pobres está aumentando. A injustiça, a pobreza, a ignorância e os conflitos violentos têm aumentado e são causa de grande sofrimento. O crescimento sem precedentes da população humana tem sobrecarregado os sistemas ecológico e social. As bases da segurança global estão ameaçadas. Essas tendências são perigosas, mas não ine- vitáveis. (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 2005) Para que a Carta da Terra? A Carta da Terra 142 Desafios para o futuro A escolha é nossa: formar uma aliança global para cuidar da Terra e uns dos outros, ou arriscar a nossa destruição e a da diversidade da vida. São necessárias mudanças funda- mentais dos nossos valores, instituições e modos de vida. Devemos entender que, quando as necessidades básicas forem atingidas, o desenvolvimento humano será primariamente voltado a ser mais, não a ter mais. Temos o conhecimento e a tecnologia necessários para abastecer a todos e reduzir nossos impactos ao meio ambiente. O surgimento de uma sociedade civil global está criando novas oportunidades para construir um mundo demo- crático e humano. Nossos desafios ambientais, econômicos, políticos, sociais e espirituais estão interligados, e juntos podemos forjar soluções includentes. (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNI- DAS, 2005) Responsabilidade universal Para realizar estas aspirações, devemos decidir viver com um sentido de responsabilidade universal, identificando-nos com toda a comunidade terrestre bem como com nossa co- munidade local. Somos, ao mesmo tempo, cidadãos de nações diferentes e de um mundo no qual a dimensão local e global estão ligadas. Cada um compartilha da responsabilidade pelo presente e pelo futuro, pelo bem-estar da família humana e de todo o mundo dos seres vivos. O espírito de solidariedade humana e de parentesco com toda a vida é fortalecido quando vivemos com reverência o mistério da existência, com gratidão pelo dom da vida, e com humildade, considerando o lugar que ocupa o ser humano na natureza. Necessitamos com urgência de uma visão compartilhada de valores básicos para propor- cionar um fundamento ético à comunidade mundial emergente. Portanto, juntos na espe- rança, afirmamos os seguintes princípios, todos interdependentes, visando um modo de vida sustentável como critério comum, através dos quais a conduta de todos os indivíduos, organizações, empresas, governos, e instituições transnacionais será guiada e avaliada. (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 2005) Princípios Na Carta da Terra, os princípios abrangem não só a ecologia, como as so- ciedades, a economia e a democracia, pois para preservar a natureza é necessário o desenvolvimento de sociedades pacíficas e cidadãos responsáveis. 1. Respeitar a Terra e a vida em toda sua diversidade. Esse princípio prevê que o homem precisa respeitar a natureza e preservá-la, independentemente de seu valor econômico e utilitário para a humanidade. Além disso, está implícito que a diversidade cultural, étnica e religiosa dos seres huma- nos também deverá ser respeitada, sendo o potencial intelectual do ser humano o responsável pela dignidade e respeito para com a vida. 2. Cuidar da comunidade da vida com compreensão, compaixão e amor. O homem deverá aceitar que o fato de poder utilizar os recursos naturais não lhe dá o direito de poluir o ambiente, sendo seu dever protegê-lo. Além disso, A Carta da Terra 143 esse princípio coloca como a questão da ética na utilização das tecnologias, sendo de responsabilidade do homem a promoção do bem comum. 3. Construir sociedades democráticas que sejam justas, participativas, sustentáveis e pacíficas. É papel do homem a construção de sociedades pacíficas e democráticas, sem que para isso seja necessário destruir a natureza. Os homens precisam reali- zar seus sonhos sem destruir o dos outros. Desenvolver comunidades de maneira sustentável, lembrando-se de que tudo está interligado no planeta. 4. Garantir as dádivas e a beleza da Terra para as atuais e as futuras gerações. A utilização dos recursos naturais deverá ser garantida para as futuras ge- rações com a mesma qualidade. Para isso, o desenvolvimento sustentável deverá ser praticado pelas gerações atuais, ensinando às próximas gerações sobre a im- portância da natureza para a sobrevivência de todos no planeta. 5. Proteger e restaurar a integridade dos sistemas ecoló- gicos da Terra, com especial preocupação pela diversida- de biológica e pelos processos naturais que sustentam a vida. Para seguir esse princípio, é preciso que as normas e leis ambientais sejam respeitadas, sendo que todo desenvolvimento deverá ter a conservação ambiental em primeiro plano. A proteção da vida precisa ser em todas as suas formas, com reservas em terra e em mar. Recuperação de áreas degradadas e espécies ameaça- das de extinção, assim como a erradicação de organismos não nativos e modifica- dos geneticamente são atitudes necessárias ao bem-estar dos ecossistemas. O manejo e uso sustentável de recursos, como água, solo, produtos flores- tais e vida marinha, garantirá a disponibilidade desses recursos para as próximas gerações. Assim como o manejo da extração e utilização de recursos finitos ga- rantirá menor dano ao ambiente. 6. Prevenir o dano ao ambiente como o melhor método de proteção ambiental e, quando o conhecimento for limitado, assumir uma postura de precaução. O meio ambiente não poderá ser afetado em hipótese alguma, sendode responsabilidade de todos. Quando houver dano, a empresa, grupo ou governo deverá ser responsabilizado. Para evitar que isso aconteça, a tomada de decisão deve ser baseada na avaliação dos impactos globais, cumulativos, de longo prazo, indiretos e de longo alcance. O desenvolvimento deve acontecer sem haver polui- ção, e impedindo o uso de substâncias radioativas, tóxicas ou qualquer outra que represente perigo à vida. Nesse caso, as atividades militares também devem ser barradas caso venham a causar danos ao ambiente. A Carta da Terra 144 7. Adotar padrões de produção, consumo e reprodução que protejam as capacidades regenerativas da Terra, os direitos humanos e o bem-estar comunitário. Deverá fazer parte do dia a dia dos cidadãos e das cidades a redução do consumo, a reutilização e a reciclagem de materiais para se evitar a escassez dos recursos naturais e a poluição do ambiente. Economia de energia e uso de fontes energéticas renováveis e não poluentes. Para isso, os governos deverão incentivar e ensinar sobre o uso dessas fontes, bem como de tecnologias ambientalmente corretas. Informar a população sobre as vantagens dos produtos que não agridem a natureza e incentivar o seu consumo. Também faz parte desse princípio a garantia da assistência à saúde e infor- mação sobre a reprodução responsável, tendo em vista a grande quantidade de seres humanos já existentes no planeta Terra. 8. Avançar o estudo da sustentabilidade ecológica e promover a troca aberta e a ampla aplicação do conhecimento adquirido. Esse princípio enfatiza a necessidade de troca de experiências e de sociali- zação das informações para o bem-estar da vida. Ajuda mútua e respeito pela di- versidade são pontos importantes para o desenvolvimento sustentado. Aproveitar os conhecimentos tradicionais e a sabedoria espiritual no que diz respeito à con- servação da natureza. Socializar as informações sobre conservação da natureza e saúde humana para que o planeta caminhe para um futuro mais saudável. 9. Erradicar a pobreza como um imperativo ético, social e ambiental. Para assegurar o futuro da natureza, é preciso ensinar a toda a população sobre sua importância, assim como acabar com a pobreza e as diferenças sociais. Todos os seres humanos têm direito à água potável, ao ar puro e alimentos. O res- peito pelo homem se reflete no respeito à natureza. Quando agredimos a natureza, estamos agredindo a nós mesmos. Enquanto houver pobreza e falta de informa- ção, a natureza será agredida. 10. Garantir que as atividades e instituições econômicas em todos os níveis promovam o desenvolvimento humano de forma equitativa e sustentável. Empresas e organizações financeiras precisam atuar em benefício do bem comum, sendo responsáveis pelo desenvolvimento sustentável dos locais onde atuam. Países mais ricos são responsáveis pelos mais pobres, devendo promover o desenvolvimento intelectual, financeiro, técnico e social nesses países. A Carta da Terra 145 11. Afirmar a igualdade e a equidade de gênero como pré-requisitos para o desenvolvimento sustentável e assegurar o acesso universal à educação, à assistência de saúde e às oportunidades econômicas. Desenvolver a igualdade entre homens e mulheres, banir a violência e pro- mover o respeito à família, tendo como base a educação pautada na igualdade. 12. Defender, sem discriminação, os direitos de todas as pessoas a um ambiente natural e social, capaz de assegu- rar a dignidade humana, a saúde corporal e o bem-estar espiritual, concedendo especial atenção aos direitos dos povos indígenas e minorias. Fazem parte desse princípio a educação dos jovens de hoje para que eles construam um futuro mais equilibrado no planeta; a extinção de todas as for- mas de discriminação, dando condições aos povos indígenas de continua- rem sua tradição; e o respeito e a restauração de locais de importância cultural e espiritual. 13. Fortalecer as instituições democráticas em todos os níveis e proporcionar-lhes transparência e prestação de contas no exercício do governo, participação inclusiva na tomada de decisões e acesso à justiça. A sociedade tem o direito à informação e à participação na tomada de deci- são no que diz respeito ao ambiente onde ela vive. A educação da sociedade tem o objetivo de capacitá-la a cuidar do ambiente onde vive, bem como lutar por um ambiente mais saudável. 14. Integrar, na educação formal e na aprendizagem ao longo da vida, os conhecimentos, valores e habilidades necessárias para um modo de vida sustentável. Levar a Educação Ambiental, em todas as áreas de conhecimento, bem como o ensino da moral e da ética, a todos através das escolas, televisão, rádio e outros meios de informação para que as crianças e jovens de hoje construam um modo de vida mais sustentável para o planeta. 15. Tratar todos os seres vivos com respeito e consideração. Esse princípio inclui não maltratar animais, sejam eles domésticos ou não, e eliminar a caça de espécies que não são criadas. Aqui cabe a não utilização de espécies animais como cobaias em experimentos laboratoriais. A Carta da Terra 146 16. Promover uma cultura de tolerância, não violência e paz. a) Estimular e apoiar o entendimento mútuo, a solidariedade e a cooperação entre todas as pessoas, dentro das e entre as nações. b) Implementar estratégias amplas para prevenir conflitos violentos e usar a colaboração na resolução de problemas para manejar e resolver conflitos ambientais e outras disputas. c) Desmilitarizar os sistemas de segurança nacional até chegar ao nível de uma postura não provocativa da defesa e converter os recursos militares em propósitos pacíficos, incluindo restauração ecológica. d) Eliminar armas nucleares, biológicas e tóxicas e outras armas de destruição em massa. e) Assegurar que o uso do espaço orbital e cósmico mantenha a proteção ambiental e a paz. f) Reconhecer que a paz é a plenitude criada por relações corretas consigo mesmo, com outras pessoas, outras culturas, outras vidas, com a Terra e com a totalidade maior da qual somos parte. (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 2005) O caminho adiante Como nunca antes na história, o destino comum nos conclama a buscar um novo começo. Tal renovação é a promessa dos princípios da Carta da Terra. Para cumprir essa promessa, temos que nos comprometer a adotar e promover os valores e objetivos da Carta. Isso requer uma mudança na mente e no coração. Requer um novo sentido de interdepen- dência global e de responsabilidade universal. Devemos desenvolver e aplicar com imagi- nação a visão de um modo de vida sustentável aos níveis local, nacional, regional e global. Nossa diversidade cultural é uma herança preciosa, e diferentes culturas encontrarão suas próprias e distintas formas de realizar essa visão. Devemos aprofundar e expandir o diá- logo global gerado pela Carta da Terra, porque temos muito que aprender a partir da busca iminente e conjunta por verdade e sabedoria. A vida muitas vezes envolve tensões entre valores importantes. Isso pode significar es- colhas difíceis. Porém, necessitamos encontrar caminhos para harmonizar a diversidade com a unidade, o exercício da liberdade com o bem comum, objetivos de curto prazo com metas de longo prazo. Todo indivíduo, família, organização e comunidade têm um papel vital a desempenhar. As artes, as ciências, as religiões, as instituições educativas, os meios de comunicação, as empresas, as organizações não governamentais e os governos são todos chamados a oferecer uma liderança criativa. A parceria entre governo, socieda- de civil e empresas é essencial para uma governabilidade efetiva. Para construir uma comunidade global sustentável, as nações do mundo devem renovar seu compromisso com as Nações Unidas, cumprir com suas obrigações respeitando os acordos internacionais