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Sumário INTRODUÇÃO CAPITULO 1- EVOLUÇÃO HISTÓRICA 1.1. BABILÔNIA 1.3. ROMA 1.4. JAPÃO 1.5. INGLATERRA 1.6. FRANCÊS 1.7. DIREITO ALEMÃO 1.8. ESTADOS UNIDOS 1.9. DIREITO BRASILEIRO CAPÍTULO 2 - DAS PESSOAS JURÍDICAS 2.1 - Conceito 2.2 - Natureza Jurídica 2.3. Classificação 2.4 - Personalidade CAPÍTULO 3 - A RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA 3.1 - Elementos do Crime e os Pontos Controvertidos Acerca de sua Aplicação à Pessoa Jurídica 3.1.1- Teoria Analítica do Crime CAPÍTULO 4 - RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA NOS CRIMES AMBIENTAIS 4.1 - Conceito de Meio Ambiente 4.2 - Tutela Penal Ambiental no Ordenamento Pátrio 4.2.1- Responsabilidade penal da pessoa jurídica na Lei. 9605/98. 4.2.2 - A Necessidade de Imputação Simultânea da Pessoa Física e da Pessoa Jurídica 4.3 - Sanções Aplicáveis à Pessoa Jurídica CONSIDERAÇÕES FINAIS REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS INTRODUÇÃO Este livro tem como tema a Responsabilidade Penal das Pessoas Jurídicas de Direito Privado na Lei dos Crimes Ambientais, sendo a presente temática palco atual de inúmeros debates acerca de sua admissibilidade, ou seja, a possibilidade de a pessoa moral figurar no pólo passivo de uma ação penal. No Brasil, por fazer parte do sistema civil law, sempre vigorou entre os doutrinadores da seara penal o princípio do societas delinquere nom potest, aludindo que a pessoa jurídica é incapaz de praticar infração penal. Contudo, com o advento da Constituição da República Federativa de 1988, surgiram inúmeras divergências doutrinárias, em especial entre os estudiosos do Direito Penal, quanto a possibilidade de a pessoa jurídica ser inserida no rol de sujeitos passivos de uma relação processual criminal, posto que o constituinte originário encartou em nosso ordenamento jurídico a responsabilidade penal das pessoas jurídicas, via norma constitucional de eficácia limitada. Mais especificamente, no artigo 225, § 3º, da nova Carta Política, o qual dispõe expressamente que “ as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”. Entretanto, tem-se que somente após dez anos da promulgação da CFRB/88, em 12 de fevereiro de 1998, o legislador infraconstitucional regulamentou o suso dispositivo com a publicação da Lei nº. 9605/98, conhecida por Lei dos crimes ambientais, mas que também traz sanções civis e administrativas, a qual prevê expressamente em seu artigo 3º acerca da responsabilidade penal das pessoas jurídicas. Desde então, o ordenamento jurídico pátrio passou a contar com um valioso aparato legal, vez que as ingerências praticadas em face do meio ambiente, transcenderam a órbita civil e administrativa para figurar na seara penal, como mecanismo apto e eficaz na tentativa de coibir as violações que corriqueiramente assolam o meio ambiente. Todavia, boa parte da doutrina clássica, mormente, os penalistas e também constitucionalistas, entendem que a admissão do referido instituto viola princípios básicos do direito, em ambas as esferas, quais sejam, penal e constitucional. Ante o exposto, este trabalho tem por finalidade analisar a possibilidade da pessoa jurídica figurar no pólo passivo de uma demanda criminal, nos moldes em que o instituto da responsabilidade coletiva afetos aos crimes ambientais fora inserido na legislação brasileira. Seu intento é servir como contribuição social, consistindo em auxiliar os profissionais da área do direito, bem como todos aqueles que se interessam pelo assunto, configurando-se uma fonte de pesquisa, conhecimento e referência bibliográfica. Para atingir esse objetivo, proceder-se-á à analise da pessoa jurídica como sujeito apto a figurar no banco dos réus de uma ação penal, verificando a eficácia da reprimenda em matéria ambiental no que concerne à responsabilização dos entes coletivos trazida pela Lei nº. 9605/98. Desse modo, será feito um levantamento doutrinário e legislativo acerca do tema, utilizando-se da pesquisa bibliográfica, códigos, etc. Nestes aspectos, como forma de melhor organizá-lo, foi dividido em três partes. No primeiro capítulo, busca-se trazer à baila o referencial histórico da responsabilidade das pessoas jurídicas, pontuando algumas civilizações que já se podia identificar, em menor ou maior grau, o propósito de se punir a coletividade por determinadas condutas individuais de seus membros. Ato contínuo, no segundo capítulo deu-se enfoque à conceituação e natureza jurídica da pessoa moral, analisando seus aspectos principais, recorrendo-se às diversas teorias que embasam o fundamento teórico das pessoas coletivas, sendo de notória importância, vez que é justamente a partir de sua essência jurídica que se pode melhor entender o instituto em comento, dentro da esfera coletiva, e ainda, enumerando as classificações e a capacidade de imputação. Diante da análise preliminar acerca do que vem a ser pessoa jurídica, tem-se que a aceitação da responsabilidade penal dos entes coletivos está intimamente vinculada a qual teoria servirá como fundamento. Oportuno esclarecer que, no decorrer do segundo capítulo, primou-se em pontuar o critério da nomenclatura, usando alguns sinônimos para referir-se à pessoa jurídica, tais como: pessoas coletivas, pessoas morais, entes coletivos, entes morais, empresas, dentre outros. Na terceiro capítulo, discorre-se sobre a tutela ambiental, analisando os pontos de maior instabilidade, e palco de inúmeras polêmicas quanto à aplicabilidade ou não do instituto da responsabilidade penal das pessoas jurídicas no ordenamento jurídico pátrio. Construindo de maneira breve, uma estruturação do crime em seu critério analítico, e assim, fazendo um paralelo quanto à aplicabilidade da responsabilidade penal aos entes coletivos, bem como se tal imputação não tangencia o princípio da personalidade da pena, erigido constitucionalmente. No quarto e último capítulo, buscou-se inicialmente conceituar o que vem a ser meio ambiente e, por conseguinte, proceder-se uma análise quanto à tutela penal ambiental em nosso ordenamento jurídico. Oportuno frisar que, em relação à responsabilidade penal da pessoa jurídica de direito público, tal temática não figurou dentre os objetos do presente trabalho, uma vez que se ateve apenas, no que tange à pessoa jurídica de direito privado. Ademais, discorreu-se quanto à necessidade de imputação simultânea da responsabilidade penal, tanto às pessoas jurídicas quanto às pessoas físicas, em coautoria, e às peculiaridades quanto à aplicabilidade das sanções penais, tendo em vista suas particularidades. C APITULO 1- EVOLUÇÃO HISTÓRICA A origem da criminalização das coletividades é algo que se remonta às civilizações mais antigas de que se tem conhecimento. Shecaira (2010, p. 1) elenca duas fases para uma melhor compreensão do presente estudo, uma anterior e outra posterior ao século XVIII. Expõe que da Idade Antiga à Idade Média predominaram as sanções coletivas impostas às tribos, comunas, vilas, famílias etc. Após a Revolução Francesa, com o advento do liberalismo, surgido com o pensamento iluminista, a nova ideologia veio extinguir as sanções às corporações e todas as referências associadas às punições coletivas que pudessem pôr em risco as liberdades individuais. A seguir, analisaremos a origem da criminalização das coletividades em diferentes países, dando ênfase no que se refere ao processo evolutivo brasileiro. 1.1. BABILÔNIA O direito babilônico caracterizava-se pelo localismo, em que cada cidade ou vila na região tinha um mundo jurídico particular. Shecaira (2010, p. 2) dissertando sobre o tema, cita que com o advento do Código de Hammurabi, no século XXIII a. C., o rei babilônico passa a impor uma responsabilidade local ou da cidade para o cometimento de certos crimes. Assim, conforme dispõe o parágrafo 23 do mencionado estatuto, em caso de roubo, “se o assaltante não foi preso, o awilum assaltado declarará diante deDeus todos os seus objetos perdidos; a cidade e o governador, em cuja terra e distrito foi cometido o assalto, o compensarão por todos os objetos perdidos”. O mencionado dispositivo estabelece uma alternativa ao parágrafo anterior, hipótese em que o roubador era preso. Nessas circunstâncias caberá ao governante (ou à própria cidade) local indenizar a vítima do crime. O mesmo ocorreria se houvesse um latrocínio. Nessa hipótese, caberia à cidade ou ao governador pagar uma quantidade correspondente em ouro aos familiares da vítima. Verifica-se, então, que o direito antigo já se preocupava em responsabilizar coletivamente os autores de delitos, bem como a comunidade, vez que a pena passava da pessoa do condenado atingindo vizinhos, a cidade ou toda a sociedade. 1.2. GRÉCIA Pode-se dividir a história do direito penal grego em duas fases: a primeira, marcada pelo espírito coletivista, e a outra, pelo individualismo. Até o século VII a.C. não se conhecia a terra como propriedade individual, mas uma terra que pertencia a um grupo, a uma ideia abstrata, que era o espírito da família encarnado sucessivamente nos seus antepassados, nele e nos seus descendentes.[1] Nas cidades, os cidadãos repartiam-se em agrupamentos cada vez mais restritos: a tribo, a fatria e, enfim, imediatamente acima da família individual, o genos, isto é, o clã ou a família ampla. Nessa época, não existia a justiça criminal do Estado.[2] Posteriormente, já marcado pelo individualismo, decorrente da invenção da moeda, o espírito coletivista cede espaço aos conceitos pessoais. Nessa época, deu-se a mais significativa evolução no plano do direito penal, principalmente no que se refere à responsabilidade, embora no tocante aos crimes religiosos e políticos permanecessem as sanções de caráter coletivo. 1.3. ROMA Inicialmente, o Direito Romano, diferente de outras sociedades da antiguidade, desconheceu o direito coletivo, posto que no seio desta sociedade estava arraigado o caráter jurídico positivo prático, afastando quaisquer teorias que traziam abstração ao ordenamento regente da sociedade. No entanto, no transcorrer dos anos, ainda que tardio, reconheceram a responsabilização das pessoas coletivas, embora estas eram consideradas como sendo mera ficçao jurídica, tendo sido concebidas apenas para a satisfaçao de necessidades práticas. Corroborando esta ilação o Professor Sergio Salamão Schecaira, esclarece, in litteris: No entanto, tais entidades eram concebidas como pura ficção, um artifício legal a que não eram diferentes- em essência- das pessoas que as compunham. Ora, em virtude dessa natureza fictícia, as pessoas coletivas não eram responsáveis criminalmente no direito romano; daí o adágio societas delinquere non potest.[3] Entretanto, outros autores, como Aquiles Mestre e Valeur, defendem que os romanos responsabilizavam criminalmente as pessoas jurídicas, negando, assim, a assertiva retro mencionada. Baseiam suas afirmações, sobretudo, nos textos de Ulpiano, sustentando que a ação penal quod metus causa podia ser dirigida contra uma universitas e que os colégios de decuriões podiam ser considerados culpados or fatos dolosos. [4] Outro não é o entendimento de Affonso Arinos de Mello Franco, sic: Apesar, portanto, da regra “soietas delinquere non potest”, que adotavam, e da noção, que já tinham, do conceito subjetivo da imputabilidade pessoal, como fundamento do dolo criminal, os romanos reconheciam implicitamente a possibilidade de delitos praticados por pessoas jurídicas, uma vez que estas eram punidas com sanções penais.[5] Assim, verifica-se que a responsabilidade penal coletiva é um assunto controvertido entre os estudiosos, conforme acima demonstrado. 1.4. JAPÃO O Japão é adepto da responsabilização penal da pessoa jurídica, sendo adotada desde o ano de 1932, com a introdução de um novo sistema pelo Act Preventing Escape of Capital to Foreing Coutries, denominado Ryobatsu-Kitei, de acordo com o qual pune-se pelo delito tanto o autor, pessoa natural, quanto a empresa.[6] 1.5. INGLATERRA A Inglaterra influenciada pela teoria da ficção não admitia em sua doutrina antiga a responsabilização penal das pessoas jurídicas, apesar de ser um país integrante do sistema da common low. Com o advento da Revolução Industrial, século XIX, cresceram vertiginosamente o número de crimes praticados por intermédio de grandes empresas, culminado com uma mudança jurisprudencial, no sentido de aplicar sanções coletivas, para delitos comissivos e omissivos, praticados por pessoas jurídicas. [7] Assim, apesar da evolução ter sido lenta, no ano de 1948, o Criminal Justice Act estabeleceu a possibilidade de conversão da pena privativa de liberdade em prestação pecuniária [8]. Desse modo, no ordenamento em comento, a pessoa jurídica poderia responder criminalmente por qualquer delito, desde que compatíveis com sua natureza peculiar. 1.6. FRANCÊS Tem-se que a responsabilidade penal da pessoa jurídica se consagrou apenas com o advento do Código Penal em vigor a partir de 1º de maio de 1994, instante em que a França juntou-se ao rol dos que admitem expressamente a responsabilidade penal coletiva.[9] O Direito francês admite a responsabilização penal da pessoa jurídica em relação a todas pessoas jurídicas de direito privado, incluindo os sindicatos, associações, as sociedade civis e comerciais. O referido código excluiu de seu alcance as infrações cometidas por coletividades territoriais, como exemplo, as comunas, departamentos, regiões quando no exercício da atividade inerente às funções entendidas como próprias do poder público e do próprio estado.[10] Luiz Régis Prado em análise ao Código Penal francês, acerca dos fundamentos ensejadores da adoção do referido instituto foram basicamente dois; a uma, pela necessidade de se considerar apenas a corporação responsável por fatos delituosos não imputáveis às pessoas naturais, ou seja, visou-se evitar que os dirigentes sofressem uma presunção de responsabilidade efetiva por delitos que poderiam até mesmo ignorar. Necessário, portanto, imputar essa responsabilidade à pessoa jurídica como um todo. A duas, o fundamento invocado diz respeito aos meios poderosos de que dispõem as pessoas jurídicas e que podem atentar face à saúde pública, ao meio ambiente e à ordem econômica e social. Nesses termos, sua imunidade penal seria algo chocante no plano da equidade e da legalidade. 1.7. DIREITO ALEMÃO O sistema jurídico alemão adotou a responsabilização penal da pessoa jurídica de uma forma diferenciada das já mencionadas, originando um arcabouço legislativo-doutrinário de direito administrativo criminal.[11] Para guarnecer o direito penal dentro dos princípios constitucionais, chegou-se à definição de infrações administrativas e à organização da responsabilidade penal das pessoas jurídicas. Existem inúmeros textos, dentro de todos os setores da vida administrativa, econômica e social, que dirigem não só aos entes coletivos legalmente constituídos, mas às associações sem personalidade jurídica. Exigem-se que no comportamento ilícito tenha havido a intervenção de uma pessoa revestida da qualidade de órgão da pessoa jurídica ou, então, que pertença a um de seus órgãos.[12] Desse modo, a responsabilização penal da pessoa jurídica no âmbito do direito penal alemão atrela-se ao direito administrativo e, as penas aplicáveis são as de multa e confisco.[13] 1.8. ESTADOS UNIDOS Nos Estados Unidos desde a promulgação do Código Penal de Nova York, em dezembro de 1882, é admitida a responsabilidade penal dos entes morais. Contudo, Sérgio Salomão Shecaira[14] esclarece que em virtude do sistema federado norte-americano, não são todos os Entes que adotam a referida imputação, citando como exemplo o Estado de Indiana que não segue o posicionamento dos demais. 1.9. DIREITO BRASILEIRO Durante a colonização, surgiu a necessidade de implantação de um sistema penal no Brasil, com escopo de pacificar os conflitos sociais, mormente entre a coroa e o povo, tendo-se por fase as Ordenações Lusitanas, legislandosomente acerca da responsabilidade penal individual. [15] Com a independência do Brasil, e a instituição da República, todas as constituições subseqüentes, 1981, 1934, 1937, 1946,1967, trataram também, somente da responsabilidade individual. Somente com o advento da Constituição Federativa da República Brasileira em 5 de outubro de 1988, é que foi incorporado ao sistema jurídico brasileiro, o instituto da responsabilidade penal da pessoa jurídica, normatizando de forma expressa e taxativa a responsabilidade dos entes morais. No artigo 173, § 5º da Nossa Carta Política está disposto a responsabilidade da pessoa jurídica contra condutas atentatórias à ordem econômica e contra a economia popular: Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei. [...] § 5º - A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular. Noutro prisma, o artigo 225, em seu parágrafo 3º, se enveredou na seara penal, vez que dispôs expressamente a responsabilidade penal da pessoa jurídica por crimes praticados contra o meio ambiente, senão vejamos: Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações. [...] § 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. Contudo, com a implantação do citado instituto em nosso ordenamento jurídico, surgiram várias controvérsias acerca do tema, tanto doutrinários, quanto jurisprudencial. Se por um lado, alguns autores afirmam que a Constituição Federal de 1988 consagrou a responsabilidade penal dos entes coletivos, existem os opositores, entendendo que dentro do sistema penal pátrio não é possível tal impetração, permanecendo assim, em vigor, o brocardo societas delinquere non potest. Discorrendo acerca do tema, o professor Gaspar Alexandre ressalta, que a maior parte dos constitucionalistas pátrios se posicionam no sentido de que a Constituição Federal realmente instituiu a responsabilidade penal corporativa. Embasando tal assertiva no escólio de Celso Ribeiro de Bastos e Ives Gandra Martins, os quais lecionam que a Constituição em vigor “ rompeu com um dos princípios que vigorava plenamente no nosso sistema jurídico, o de que a pessoa jurídica não é passível de responsabilização penal. Em que pese não concordarem com a opção dos constituintes, reconhecem que vontade do texto constitucional lhes parece incontroversa. [16] Nesta esteira, alguns penalistas seguiram o entendimento de que a novel Constituição de 1988 consagrou a responsabilidade penal dos entes morais, a citar Márcia Dometila Lima de Carvalho: (...) a responsabilidade penal da pessoa jurídica está prevista constitucionalmente e necessita ser instituída, como forma inclusive de fazer ver, ao empresariado, que a empresa privada também é responsável pelo saneamento da economia popular e do meio ambiente, pelo objetivo social do bem comum, que deve estar acima do objetivo individual do lucro a qualquer preço.[17] Corroborando do mesmo entendimento, vários estudiosos se filiaram como partidários, de que a Constituição Federal de 1988 consagrou a responsabilidade penal das pessoas jurídicas, tais como: Pinto Ferreira, Silvio Cappelli, Gilberto Passos de Freitas, Fernando Castelo Branco, Sérgio Salomão Shecaira, Fausto Martins de Sanctis, Walter Claudius Rothemburg, dentre outros.[18] Em sentido contrário, porém, autores renomados como Luiz Regis Prado, Walter Coelho, Miguel Reale Jr., René Ariel Doti, Luiz Vicente Cernicchiaro, discordam que a Constituição Federal tenha instituído a responsabilidade penal das pessoas jurídicas, tendo como principal argumento a forma de interpretação da constituição. [19] Dentre os citados autores, Luiz Regis Prado, afirma que o § 3º do artigo 225 referiu-se, claramente, à conduta/atividade e em seguida às pessoas físicas ou jurídicas, argüindo que o próprio legislador procurou distinguir esses dois vocábulos. Desse modo, não há que lograr êxito os posicionamentos que afirmam que o disposto no art. 225, § 3º, da nossa Carta Política, referiu-se claramente aos vocábulos conduta/atividade, imbuindo de forma evidente, o primeiro às pessoas físicas, e o segundo ás pessoas coletivas, vez que o texto constitucional apenas buscou de maneira abstrata trazer palavras que continham o mesmo significado, não cabendo, sequer, o emprego da hermenêutica para solução da aventada interpretação. É também o entendimentos de Sérgio Salomão Shecaira, que trouxe em seu escólio que os vocábulos “conduta” e “atividade” foram empregados no texto constitucional como sinônimos, chegando a conclusão de que tanto as pessoas físicas quanto as jurídicas podem praticar condutas ou atividades lesivas ao meio ambiente, devendo ser punidas por isso.[20] Assim, por tal responsabilidade acobertar matéria de suma importância, ou seja, questões afetas ao Meio Ambiente, necessário se faz a aplicação da norma com maior rigor, atingindo não somente as pessoas físicas, mas também as pessoas jurídicas, vez que atuam mediante a volição daqueles, auferindo todas as vantagens provenientes do delito. O constituinte brasileiro quando inseriu tais dispositivos na Carta Magna, o fez baseado na realidade contemporânea, onde se verifica um tendência de diversos países, no sentido de coibir os crimes praticados pelos entes morais, responsabilizando-os pelos mesmos. [21] Pelo exposto, não há que se dar guarida a qualquer outro posicionamento, senão àqueles que afirmam a possibilidade da responsabilidade penal dos entes coletivos trazidos pela Constituição Federal de 1988, restringindo sua aplicabilidade apenas aos dispositivos expressamente estabelecidos na Lei Maior, em virtude do tema ser bastante intrincado e palco de inúmeras divergências. CAPÍTULO 2 - DAS PESSOAS JURÍDICAS 2.1 - Conceito Tem-se que desde a antiguidade, o homem, ciente de suas limitações e por ser gregário por natureza, buscou auxílio mútuo com os demais seres pertencentes à sua espécie, formando, assim, os primeiros agrupamentos com escopo de alcançar seus objetivos. Em razão de ser um sujeito eminentemente social, tentava atingir seus fins unindo-se aos seus semelhantes, e com essa união de esforços acabavam superando suas carências individuais, bem como a efemeridade de suas vidas. Acerca do tema o Carlos Roberto Gonçalves, retrata esse espírito de associação: O Direito não podia ignorar essas unidades coletivas, criadas pela evolução histórica ou pela vontade dos homens, e passou então a discipliná-las, para que possam participar da vida jurídica como sujeitos de direitos, a exemplo das pessoas naturais, dotando-as, para esse fim, da personalidade própria. A razão de ser, portanto, da pessoa jurídica está na necessidade ou conveniência de os indivíduos unirem esforços e utilizarem recursos coletivos para a realização de objetivos comuns, que transcendem as possibilidades individuais. Com efeito, vê-se que a pessoa jurídica é proveniente de um fenômeno histórico e social. Surgiu, asssim, a necessidade de regulamentar e inserir no ordenamento normativo os entes morais, tornando-se sujeitos de direitos e obrigações com plena capacidade e gozando de determinada individualidade, podendo desempenhar suas funções em nome próprio, desvinculando de certo forma o ser individual. Diferentes denominações foram atribuídas a essas entidades em diversos ordenamentos jurídicos pelomundo, a citar: pessoas morais (Direito francês), pessoas coletivas (Direito português), pessoas civis, místicas, fictícias, abstratas, intelectuais, de existência ideal, universais compostas ou universalidades de pessoas. No Brasil, na Alemanha, na Espanha e na Itália, dentre outros países, preferiu-se a expressão “pessoas jurídicas”. Buscando um conceito adequado em relação às pessoas coletivas, o Professor Silvio Rodrigues define como sendo “entidades a que a lei empresta personalidade, isto é, seres que atuam na vida jurídica, com personalidade diversa da dos que os compõem, capazes de serem sujeitos de direitos e obrigações na ordem civil”. Todavia, insta ressaltar que não é toda e qualquer reunião ocasional de pessoas naturais que pode receber a denominação pessoa jurídica, tornando-se sujeito de direitos e obrigações distinta daquela inerente à individualidade. As personalizações coletivas dependem da conjunção de três requisitos básicos, de acordo com o escólio de Caio Mário da Silva Pereira, quais sejam, a vontade humana criadora, a observância das condições legais para sua formação e licitude de seus objetivos. No que diz respeito à vontade humana criadora, o animus de constituir um corpo social diferente dos membros integrantes é fundamental. Tem-se, também, que para a pessoa jurídica gozar de suas prerrogativas, deverá seguir a observância de determinadas regras, bem como dirigir-se para um fim lícito, contudo, caso haja desvios ilícitos daqueles relacionados ao contrato social, o ordenamento possui mecanismos legais para inibir abusos e até extinguir sua personalidade. 2.2 - Natureza Jurídica Embora existiram teorias que negaram a existência da pessoa jurídica (corrente negativista), o direito no decorrer dos anos foi-se afastando desta acepção, fortalecendo a corrente afirmativista que, em suas diversas vertentes buscaram definir a natureza jurídica dos entes coletivos. Entretanto, é relevante ressaltar aquelas que mais se destacaram dentre as concepções elaboradas: 1) teoria da ficção legal; 2) teoria da equiparação; 3) teoria da realidade objetiva ou orgânica; 4) teoria da realidade das instituições jurídicas, ou, da realidade técnica e institucionalista. A teoria da ficção legal teve sua origem no Direito Canônico, partindo do pressuposto que somente o homem seria capaz de ser sujeito de direitos, ao passo que a pessoa jurídica teria uma existência meramente ideal ou abstrata, sendo uma criação da pura técnica do direito. É a teoria sustentada por Saviny, que teve prevalência na Alemanha e na França no século XVIII. Essa teoria foi palco de fortes críticas, em especial no que se refere à personalidade jurídica do próprio Estado, pois sendo este uma ficção jurídica, o direito que dele emanar, também o seria. Formulando como resposta os seguidores desta teoria, entendem que, como o Estado é necessidade primária e fundamental, tem existência natural. É este também o entendimento de Maria Helena Diniz, quando discorre acerca do tema, afirmando que: “não se pode aceitar esta concepção, que, por ser tão abstrata, não corresponde à realidade, pois o Estado é uma pessoa jurídica e se se concluir que é ficção legal ou doutrinária o direito que dele emana também será.” Na mesma esteira segue Giorgio Del Vecchio: “A teoria da ficção não pode ser aceita. Ela não cuidou de explicar de maneira alguma a existência do Estado como pessoa jurídica. Quem foi o criador do Estado? Uma vez que ele não se identifica com as pessoas físicas, deverá ser havido como ficção? Nesse caso, o próprio direito também será outra ficção. Porque emanado do Estado. Ficção será, portanto, tudo quanto se encontre na esfera jurídica, inclusive a própria teoria da pessoa jurídica” Discorrendo sobre a teoria da equiparação defendida por Windscheid e Brinz, Washington de Barros Monteiro entende que esta nega qualquer personalidade jurídica como substância, posto que a indigitada teoria considerava que as pessoas jurídicas não passavam de meros patrimônios destinados a um fim específico, ou patrimônios personificados pelo direito, tendo em vista o objetivo a conseguir-se. Ainda, Washington Monteiro de Barros, citando Del Vecchio, evidencia a inaceitabilidade de semelhante concepção, que personaliza o patrimônio, elevando os bens ao plano de sujeitos e direitos e, por outro lado, rebaixando as pessoas, até confundi-las com as coisas. De acordo com a teoria em comento, depreende-se que não seria capaz a constituição de pessoas jurídicas sem patrimônio. Contudo, tal fato não condiz com a realidade jurídica atual, vez que diversos entes coletivos são constituídos não com intuitos econômicos, mais sim, recreativos, ou para praticar a caridade, a assistência social, sem que haja a finalidade de obtenção de lucros. De maneira diversa aos preceitos trazidos pela teoria da ficção, que dizia que somente o homem poderia ser sujeito e titular de direitos, a teoria da realidade objetiva ou orgânica, de procedência germânica (Gierke e Zitelmann), buscou uma conceituação ampla, entendendo que pessoa não é só homem, pois juntos deste há entes dotados de existência real, tão real quanto as pessoas físicas. Esta teoria defendia que a pessoa jurídica seria simplesmente um organismo social vivo, a ser explicada pela sociologia e não pela técnica do direito. Todavia, em que pese suas acepções terem buscado a corrigenda dos preceitos fictícios defendidos, acabou por se mostrar também insuficiente, vez que ao afirmar que a pessoa coletiva possui determinação de vontade própria, negou-se o próprio fenômeno volitivo, algo que é inerente somente aos seres humanos. Surge, então, uma teoria eclética, a qual mescla preceitos da teoria da ficção legal e da teoria da realidade orgânica, denominada de teoria da realidade técnica ou jurídica, também conhecida por teoria da realidade das instituições. Vicente Ráo, afirma que embora as pessoas jurídicas sejam reais, sua realidade jurídica não pode ser confundida com a das pessoas naturais. Assim, tem-se que a existência das pessoas coletivas está intimamente ligada à sua titularidade de direitos, não podendo concebê-las sem tal prerrogativa, demonstrando, desse modo, que sua existência é real e não fictícia. Sendo mista, a teoria reconhece que há uma parcela de verdade em cada uma das teorias já citadas. Do ponto de vista físico e natural, só a pessoa física é realidade, não passando a pessoa jurídica de mera ficção. Em contrapartida, verificou-se que a essência da personalidade, de sujeito de direito, não é noção que vá se buscar nas ciências naturais, mas sim, na ciência jurídica. Desse modo, vê-se que esta teoria, mais equilibrada, reconhece que a pessoa jurídica seria personificada pela técnica abstrata do direito, além de ter também dimensão social integrando relações de variadas ordens. Apresentando-se como uma das principais objeções acerca da teoria em análise, está o fato dela não traçar nenhum critério justificativo da atribuição da personalidade. Além disso, não consegue explicar como seria possível conceder personalidade jurídica para as sociedades que se organizam sem o objetivo de prestar serviços ou preencher ofícios. Maria Helena Diniz discorrendo acerca do tema, considera que a teoria da realidade técnica ou jurídica, ou como prefere chamá-la, teoria da realidade das instituições, é a que melhor atende a essência jurídica, por estabelecer, com propriedade que a pessoa jurídica é uma realidade. 2.3. Classificação As pessoas jurídicas podem ser classificadas quanto à nacionalidade, à sua estrutura interna e às suas funções e capacidade. Sob o primeiro aspecto, a pessoa jurídica divide-se em nacionais e estrangeiras, tendo em vista sua articulação e subordinação à ordem jurídica que lhe conferiu personalidade, sendo irrelevante a nacionalidade dos membros que a compõem e à origem do controle financeiro. Assim, tem-se que a sociedade nacional é aquela organizada segundo o ordenamento jurídico pátrio e que tenha sua sede administrativa no País.Em relação à segunda classificação, no que se refere à estrutura das pessoas jurídicas, têm-se a instituição de associações (universitas personarum), ou fundações (universitas bonorum), sendo que, aquelas se distinguem destas, em razão de que os requisitos integrantes daquelas são a pluralidade de pessoas e o escopo comum que os anima, e destas o pressuposto é eminentemente patrimonial destinados a uma finalidade. Alicerçando o argumento exposto, afirma Andrea Torrente: Aquelas, se referindo às associações, têm, é claro, um patrimônio, mas esse patrimônio tem função instrumental, representa um meio para consecução dos fins colimados pelos sócios. Nestas, nas fundações, o patrimônio constitui elemento essencial, juntamente com o objetivo a que ele a destina. Por fim, quanto às funções e capacidade, as pessoas morais são classificadas de direito público, interno ou externo, e de direito privado (art. 40, CC). As pessoas jurídicas de direito público externo são regulamentadas pelo direito público internacional, v.g. nações estrangeiras, uniões aduaneiras que têm por escopo facilitar o comércio exterior e organismos internacionais (ONU – Organização das Nações Unidas, OEA – Organização dos Estados Americanos). O artigo 42 do Código Civil dispõe: “são pessoas jurídicas de direito público externo os Estados estrangeiros e todas as pessoas que forem regidas pelo direito internacional”. Já em relação às pessoas jurídicas de direito público interno, tem-se que são reguladas pelo direito interno de um país, podendo citar em nosso ordenamento aqueles entes pertencentes à administração direta: União, os Estados, Distrito Federal, Territórios e Municípios, bem como os órgão descentralizados pertencentes à administração indireta, criados por lei e com personalidade jurídica própria para o exercício de atividades Públicas, como ocorre com as autarquias (INSS, INCRA, IPHAN e etc.) As pessoas jurídicas de direito privado estão enumeradas no artigo 44, incisos de I a VI, do Código Civil. São as associações, as sociedades (simples e a empresária), as fundações (particulares), as organizações religiosas e os partidos políticos, sendo inseridas, com o advento da Lei 12.441/2011, as empresas individuais de responsabilidade limitada (EIRELI). As associações, nos dizeres do artigo 53 do Código Civil, são constituídas pela união de pessoas que se organizam para fins não econômicos, não havendo entre os associados, direitos e obrigações recíprocas, ressaltando, assim, seu aspecto eminentemente pessoal (universitas personarum). Tem-se, desse modo, que haverá a instituição de associação quando não houver fim lucrativo ou intenção de dividir o resultado, embora tenha patrimônio, formado pela contribuição de seus membros para intenção de fins culturais, educacionais, esportivos, religiosos morais, etc. Contudo, conclui-se que não se perde a categoria de associação ao realizar negócios para manter ou aumentar o seu patrimônio, sem todavia, proporcionar ganhos aos associados. A seu turno, a parte especial do atual Código Civil, se incumbiu de tratar das particularidades referentes às Sociedades, em seu Livro II (Do Direito de Empresa), Título II (Da Sociedade), nos artigos 981 a 1.141, subdividindo-se, em sociedades empresárias, que tem por objeto o exercício de atividade própria de empresário sujeita a registro, e sociedade simples, que seriam todas as demais. Por outro lado, as fundações, diferentemente das sociedades e das associações não são formadas pela união de indivíduos, mas sim, pelo destacamento de um patrimônio que se personifica para a realização de finalidade ideal ou não lucrativa. Discorrendo acerca das fundações particulares Maria Helena Diniz, esclarece: são universalidades de bens, personalizadas pela ordem jurídica, em consideração com um fim estipulado pelo fundador, sendo este objetivo imutável e seus órgãos servientes, pois todas as resoluções estão delimitadas pelo instituidor. É, portanto, um acervo de bens livres, que recebe da lei a capacidade jurídica de realizar as finalidades pretendidas pelo seu instituidor, em atenção aos seus estatutos, desde que religiosas, morais, culturais e assistenciais (CC, art. 62, parágrafo único). Não tem fins econômicos, nem fúteis. No que se refere às organizações religiosas, além de deverem obediência ao Código Civil, ao estarem elencadas em inciso independente em seu artigo 44, devem atentar-se às regras específicas a depender do tipo de organização. Ao passo que, apesar de guardarem semelhanças com as associações e as fundações, reclamam distinção legal, devendo aplicar-lhes, como pessoas jurídicas de direito privado, as disposições afetas às associações, no que for compatível. Analisando o inciso V, do artigo 44, do CC, nota-se que os partidos políticos figuram como sendo pessoas jurídicas de direito privado, tendo natureza de associação civil . Contudo, os partidos políticos já foram considerados pessoa jurídica de direito público interno, nos termos do artigo 2º da Lei de nº. 5682/71. Por derradeiro, as empresas individuais de responsabilidade limitada, são verdadeiras pessoas jurídicas unipessoais, sendo sua responsabilidade limitada ao capital integralizado, que não poderá ser inferior a cem vezes o salário mínimo vigente no país, conforme estabelece o artigo 980-A, do Código Civil. 2.4 - Personalidade As pessoas morais adquirem personalidade, ou seja, tornam-se capazes de serem titulares de direitos, com a inscrição do ato constitutivo no Cartório de Registro de Pessoas Jurídicas de direito privado, oportunidade em são apresentadas duas vias do estatuto social, sendo que uma fica arquivada em cartório e a outra é entregue ao representante, nos termos do artigo 120 da Lei nº. 6015/73. A partir desta solenidade começa a existência legal das pessoas coletivas, tendo capacidade para exercer todos os direitos compatíveis com a sua natureza, inclusive direitos da personalidade (art. 52, CC), observadas as limitações legais. Contudo, existem divergências doutrinárias quanto à extensão da capacidade das pessoas coletivas. Para uns, a pessoa jurídica teria a capacidade limitada aos direitos patrimoniais, devido sua natureza peculiar. Caio Mário da Silva Pereira um dos maiores expoentes representante dessa corrente, afirma: Enquanto a pessoa física encontra na sua capacidade a expansão plena de sua alteridade ou de seu poder de ação, com linhas de generalidade que lhe asseguram a extensão ilimitada (em tese), as pessoas jurídicas, pela própria natureza, têm o poder jurídico limitado aos direitos de ordem patrimonial. Todavia, outros, porém, alegam que a capacidade jurídica desses entes coletivos abrange todos os campos do direito, fazendo com que a pessoa jurídica possa exercer não só os direitos patrimoniais, mas todos os direitos subjetivos que não forem inerentes à pessoa natural. Assim, conforme verificado na dicção do artigo 52 do CC, verifica-se que assiste razão ao segundo posicionamento, não se olvidando quanto às limitações existentes que os entes morais possuem, devido sua natureza sui generis, em virtude de que desde o momento em que adquire capacidade jurídica, podem exercer todos os direitos subjetivos compatíveis com sua natureza peculiar, necessitando, para isso, somente de um órgão exteriorizador de sua vontade, qual seja a pessoa natural. CAPÍTULO 3 - A RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA 3.1 - Elementos do Crime e os Pontos Controvertidos Acerca de sua Aplicação à Pessoa Jurídica 3.1.1- Teoria Analítica do Crime Os doutrinadores Zaffaroni e Pierangeli, buscando demonstrar, de maneira didática, o que vem a ser o conceito analítico de crime, o descreve como um todo unitário, mas passível de fracioná-lo para melhor compreensão. Tal lição ficou conhecida como conceito estratificado de crime, sinônimo de conceito analítico de crime, aduzindo que o crime é composto pelos seguintes estratos: ação típica, ilícita e culpável. Outrossim, o fato típico se compõe dos seguintes elementos: conduta, resultado, nexo de causalidadee tipicidade, analisados de maneira progressiva. 3.1.1.1 - Conduta Para que alguém seja responsabilizado criminalmente é necessário que determinadas condições sejam satisfeitas, figurando a conduta como o primeiro elemento integrante do fato típico, sendo conceituada como ação ou omissão decorrente de um comportamento humano. Neste ponto, é que reside o primeiro argumento contrário ao instituído da responsabilização penal, vez que devido à natureza peculiar dos entes morais, estes não realizam conduta, ante à ausência de consciência e vontade, inerente somente às pessoas naturais, expressado pelo brocardo latino societas delinquere non potest. Comungando desse entendimento, José Carlos de Oliveira Robaldo, leciona: O Direito Penal se preocupa não só com o desvalor do resultado como também com desvalor da conduta. Somente a conduta humana reprovável é que merece atenção da norma penal incriminadora. Para as três teorias que se preocupam, no Direito Penal, com o conceito de conduta (clássica/causalista, finalista e social) a mesma deve corresponder a um comportamento humano voluntário (...). Rogério Greco também se filia a esta corrente, entendendo que a pessoa jurídica não comete crimes, sendo que quem os pratica são seus sócios, diretores, etc, nunca ela própria, pois vigente a máxima societas delinquere non potest. Esclarecendo, ainda, que esse também é o entendimento de Eugênio Raul Zaffaroni, ao afirmar: Não se pode falar de uma vontade, em sentido psicológico, no ato de uma pessoa jurídica, o que exclui qualquer possibilidade de admitir a existência de uma conduta humana. A pessoa jurídica não pode ser autora de delito, porque não tem capacidade de conduta humana no seu sentido ôntico-ontológico da mesma. Em que pese os posicionamentos diversos, que preceituam que tal responsabilização seria um retrocesso do Direito Penal, inúmeros penalistas defendem a responsabilidade penal dos entes coletivos, ante a previsão expressa no § 3º do artigo 225 da nossa Constituição Federal e sua posterior regulamentação com o advento da Lei nº 9.605/98, denominada Lei dos Crimes Ambientais. Desse modo, na atualidade, por já estarem superadas as concepções ficcionistas acerca da natureza da pessoa jurídica, ante a adoção das teorias realistas, conforme exposto no capítulo II, posto atender à essência dos entes morais, vez que tais entidades têm vontade própria e distinta de seus dirigentes e administradores, explicitando, portanto, sua realidade jurídica, matéria esta que será analisada com acuidade no item 3.3.3. Nesse diapasão, Sérgio Salomão Shecaira, também afirma que a pessoa jurídica possui vontade institucionalizada, paralela à vontade humana que é resultante de sua própria existência natural, concluindo que a pessoa jurídica pode tomar decisões que nem sempre se coadunam com as opiniões de todos os membros. Por conseguinte, sustenta-se que a vontade da pessoa jurídica, malgrada ser executada por pessoas naturais, é uma realidade. Na mesma linha de raciocínio de Shecaira, Fausto Martins de Sanctis, discorre acerca do tema: Sendo realidades jurídicas, criminológicas, sociais e econômicas, as pessoas jurídicas são efetivamente capazes de conduta, fato não negado pelos demais ramos do direito à exceção da dogmática penal. A vontade dos entes coletivos, sendo independente de seus integrantes, pessoas físicas permite afirmar que cometem, como estas, infrações não só administrativas e civis como criminais. Assim, tem-se que a vontade de ação ou vontade de conduta é um fenômeno não exclusivo das pessoas naturais, mas afetos incontestavelmente às pessoas jurídicas, materializado pela exteriorização da vontade do colegiado, composto por pessoas físicas, podendo, desse modo, cometer infrações penais utilizando-se de seus órgãos, cujas ações e omissões são consideradas como ínsitas aos entes coletivos, estabelecendo uma relação criminal de co-autoria necessária. A negação incondicional do instituto em comento seria o verdadeiro retrocesso do Direito Brasileiro, na medida em que os critérios da função social da propriedade atrelado às diversas questões transindividuais de cunho ambiental se afloram no consciente de toda sociedade. Logo, a não aplicabilidade de sanções de cunho penal às pessoas morais contrapõe à própria preservação do meio ambiente e, por conseguinte, da própria sociedade. 3.1.1.2 - Relação de Causalidade O Código Penal em seu artigo 13 aduz “o resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido”. Verifica-se, portanto, a adoção à teoria da equivalência dos antecedentes causais ou da conditio sine qua non, a qual considera causa como sendo a ação ou a omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido. Isso significa que todos os fatos que antecedem o resultado se equivalem, desde que indispensáveis à sua ocorrência. De igual maneira com que se procede a análise da imputação de conduta às pessoas naturais, deve-se verificar a existência do liame que une a conduta do ente coletivo como resultado lesivo ao bem jurídico tutelado e, se tal ação foi realmente condicionante para ocorrência do mesmo. Em caso afirmativo, não há que se refutar a existência da conduta ilícita. Buscando melhor verificar se uma ação foi condicionante à ocorrência do resultado, o professor Sueco Tryrén, criou o chamado processo hipotético de eliminação, recomendando uma exclusão mental de determinadas condutas da cadeia causal, e, se diante das ações subtraídas o resultado não ocorreria, o fato suprimido deve ser considerado como causa do resultado. Importante ressaltar que, em se tratando de crimes formais e de mera conduta não haverá a exigência do resultado naturalístico para que ocorra a consumação do crime e, por conseguinte, inexistente o liame entre conduta e resultado. 3.1.1.3- Tipicidade A palavra tipo, na lição de Zaffaroni, “é um instrumento legal, logicamente necessário e de natureza predominante descritiva, que tem por função a individualização de condutas humanas penalmente relevantes”. Assim, pelo tipo penal consistir na adequação perfeita da conduta praticada pelo agente ao modelo abstrato previsto na lei penal, surgem alguns problemas. Observa-se que nenhum dispositivo do Código Penal brasileiro trata de tipos específicos relacionados às pessoas jurídicas, tendo a legislação sistematizado apenas condutas tomando-se por referência ações humanas e, não somente lesões a bens jurídicos relevantes. Inclusive, alguns doutrinadores têm defendido a elaboração de um novo Código Penal específico para aplicar sanções aos entes coletivos. Contudo, esta proposta se mostra descabida e inapropriada, vez que são necessárias apenas adaptações ao código já existente. Neste sentido, Fausto de Sanctis, afirma que: Não há dúvida que colocada a questão nestes termos, não se demandaria a elaboração de um novo Código Penal, mas a alteração de alguns dispositivos, para que a responsabilidade criminal deixe de ser uma exclusividade dos seres humanos. Assim, tem-se que para evitar discussões no que se refere à aplicabilidade do Código Penal às pessoas jurídicas, vez que o referido ordenamento destina-se somente às pessoas físicas, cria-se a necessidade de se realizar adequações, contudo, não deixando de atentar-se às características peculiares dos entes morais. 3.1.1.4 - Culpabilidade Culpabilidade é o juízo de reprovação pessoal que se realiza sobre a conduta típica e ilícita praticada pelo agente. Nas lições de Welzel, “culpabilidade é a reprovabilidade da configuração da vontade”. Toda culpabilidade é, desse modo ‘culpabilidade de vontade’ somente. Extraindo-se da concepção finalista da ação, trazida por Welzel, determinados elementos normativos compõem a culpabilidade, quais sejam: a) imputabilidade; b) potencial consciência sobre a ilicitude do fato; c) exigibilidade de conduto diversa. Em que pese argumentos contrários, alguns autores, a citar Luiz Régis Prado, afirmam que a culpabilidade,enquanto juízo de censura só pode ser endereçada a uma pessoa natural, não se estendendo às pessoas jurídicas. Comungando deste entendimento César Roberto Bitencourt analisa separadamente os elementos normativos que compõem a culpabilidade. Esclarece, ainda, que a pessoa jurídica seria inimputável, e que a imputabilidade do agente só existe quando ele apresenta condições de normalidade e maturidade psíquica, e atributos como “maturidade” e “alterações psíquicas” são exclusivos da pessoa natural, sendo impossível serem transferidos às entidades coletivas. Em análise à consciência da ilicitude do fato, o citado autor afirma que não se pode exigi-la da pessoa jurídica, posto que a atividade se desenvolve por meio de seu diretores ou prepostos. Não sendo razoável, nessas circunstâncias, formular-se um juízo de reprovabilidade em razão de conduta da empresa que, eventualmente, contraria a ordem jurídica. Por outro lado, quanto ao elemento da exigibilidade de conduta diversa, afirma que, embora, em tese, possa ser exigido, esbarra-se no caráter sequencial de tal análise, em virtude de falecer o elemento da imputabilidade, não podendo se falar em potencial consciência da ilicitude do fato, vez que somente é exigido e exigível aos imputáveis. Em sentido contrário, João Marcelo de Araújo Júnior, citado por Gaspar Alexandre, entende que a responsabilidade da pessoa jurídica não é igual à responsabilidade cumulativa que nasce das somas das responsabilidades individuais, nem está fundada numa responsabilidade por fato de outrem. Esclarece tratar-se de uma responsabilidade originária da entidade, de fundamento social, porquanto a entidade, do ponto de vista ético ou moral, possui responsabilidade por atuar dentro do corpo social do qual extrai o seu ganho e sua própria existência. Infere-se, portanto, que no atuar do ente coletivo, não há que se dar guarida àqueles que defendem que a culpabilidade das entidades baseia- se em fato alheio, uma vez que o ente moral possui vontade própria, sendo emanada de seu estatuto social, não se olvidando quanto à capacidade de praticar condutas criminosas por intermédio e mediante a volição de seus administradores, órgãos e prepostos. Ademais, no que tange à imputação de fato culpável à pessoa jurídica, por óbvio não se deve analisá-la como se fosse pessoa natural, em razão de sua natureza peculiar. Logo, a culpabilidade da pessoa jurídica é verificada diante da fruição dos resultados trazidos pelos danos realizados pela pessoa natural, possibilitando, assim, o juízo de reprovabilidade social, sobre as lesões a bens jurídicos relevantes, isto é, dentro da análise estrita do presente trabalho, no que concerne aos danos ambientais que são guarnecidas pelo direito penal. 3.1.1.5 - Princípio da Personalidade da Penal O Princípio da personalidade da pena encontra-se fulcrado no artigo 5º inciso XLV, da Carta Política de 1988, sendo utilizado como fundamento por aqueles que refutam a responsabilidade penal dos entes morais, in verbis: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XLV - nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido; Preceituando o mencionado princípio que, apenas o autor da lesão ao bem jurídico tutelado seja responsabilizado, excluindo-se da esfera de punição terceiros que não comungaram do ilícito. Nesse sentido, pondera Osvaldo Henrique Duek Marques, que : Atribuir à pessoa jurídica a autoria de um infração penal, por fato de terceiro, constituíra o retorno à responsabilidade coletiva e objetiva, oriunda da época de totêmica, na qual os clãs primitivos atuavam como um todo, solidários na ação e na responsabilidade. As sanções atingirão todos os integrantes da entidade, tenham ou não participação no crime, o que violará o princípio da personalidade da pena. Servindo, desse modo, como argumento aos combatentes da responsabilidade em comento, de que a condenação penal de um pessoa jurídica atingiria todos os seus membros, incluindo àqueles que não colaboraram com a decisão que culminou a lesão, v.g., sócios minoritários sem direito de voto. Estes posicionamentos, contudo, não merecem prosperar, vez que mesmo as sanções impostas às pessoas naturais atingem de certa maneira terceiros, exorbitando os fins almejados. Em análise, na aplicação das penas, seja restritiva de direito seja privativa de liberdade, em se tratando de indivíduos naturais, os efeitos morais da condenação estendem, por exemplo, aos cônjuges, aos dependentes e todos aqueles que tenham ligação com o condenado. Ademais, quando da aplicação de pena de multa, muito embora, v.g., aplicada apenas a um dos cônjuges, a sanção recai sobre o patrimônio de ambos. Nesse sentido, Fernando Galvão da Rocha, observa que: O Princípio segundo o qual nenhuma pena passará da pessoa do condenado não constitui verdadeiro obstáculo ao reconhecimento da responsabilidade penal das pessoas jurídicas. Toda e qualquer pena deve ser dirigida diretamente ao autor da violação à norma protetiva do bem jurídico, mas seus efeitos podem serem sentidos por terceiros. No caso da pessoa jurídica, a penalidade que lhe possa ser aplicada atingirá apenas indiretamente os sócios ou quotistas que, eventualmente tenham se oposto à realização da atividade delitiva. Assim, em se tratando de sanções penais, não mais vigora a aplicação de penalidades corpóreas, tais como aquelas trazidas por Beccaria. Sobre essa questão, João Marcelo de Araújo Filho, esclarece que no Direto Penal contemporâneo, busca-se reforçar no âmbito da cidadania a ideia de vigência, utilidade e da importância da norma violada pelo infrator para convivência social. Destarte, conclui-se que não há nenhum empecilho, tampouco violação ao princípio da personalidade da pena na aplicação de penalidades aos entes coletivos. Contudo, deve-se observar as características sui generis da entidade, conforme exposto no capítulo 4, acerca das modalidades de sanções aptas à responsabilização penal coletiva. CAPÍTULO 4 - RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA NOS CRIMES AMBIENTAIS 4.1 - Conceito de Meio Ambiente Antes de adentrar na seara da tutela ambiental, oportuno buscar os conceitos de meio ambiente, posto existir certa confusão acerca dos elementos que o compõe. Importante frisar a definição de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira: “Meio ambiente. Ecol. O conjunto de condições e influências naturais que cercam um ser vivo ou uma comunidade e que agem sobre ele(s).” José Afonso da Silva, em seu escólio afirma que, a própria expressão meio ambiente é redundante, pois a palavra ambiente engloba a de meio, uma vez que a palavra ambiente “indica a esfera, o círculo, o âmbito que nos cerca, em que vivemos” , conceituando o meio ambiente como sendo: “ interação do conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas formas”. Desse modo, tem-se que integram o meio ambiente natural, o solo, a água, o ar atmosférico, a fauna, a flora, exercendo interseções e interação entre as espécies e meio em que vivem. Já meio ambiente artificial, engloba o espaço urbano construído pelo homem, desdobrando em espaço urbano fechado (conjunto de edificações) e espaço urbano aberto (conjunto de equipamentos públicos, tais como ruas, praças e áreas verdes. Por derradeiro, o meio ambiente cultural é constituído pelo patrimônio histórico, artístico, arqueológico, paisagístico e turístico. Assim, saindo da esfera do senso comum, buscando um conceito amplo do que vem a ser meio ambiente, a Lei nº. 9605/98, conhecida por Lei dos Crimes Ambientais, trouxe que além da tutela penal incidir sobre o meio ambientenatural, irá aplicar penalidades àqueles que lesarem o ordenamento urbano e patrimônio cultural, nos termos da seção IV, do Capítulo V, da citada l 4.2 - Tutela Penal Ambiental no Ordenamento Pátrio 4.2.1- Responsabilidade penal da pessoa jurídica na Lei. 9605/98. Atendendo ao dispositivo constitucional trazido pela Constituição Federal de 1988, fulcrado em seu artigo 225, § 3º, o legislador editou a Lei nº. 9.605, vulgarmente conhecida por Lei dos Crimes Ambientais, no Diário Oficial em 13 de fevereiro de 1998, regulamentando mediante legislação infraconstitucional, a responsabilidade penal das pessoas jurídicas. De fato, somente com o advento da referida norma e a adoção do nominado instituto, foi que se deu início às inúmeras discussões doutrinárias e jurisprudenciais acerca do tema, posto que a Lei 9605/98 regulamentou a responsabilidade penal dos entes coletivos, até então não reconhecida no ordenamento brasileiro, porém, bastante difundida em outros países que adotam o sistema da common law, com escopo de coibir os crimes cometidos contra o meio ambiente, conforme exposto no capítulo 3 deste trabalho. Em que pese os argumentos que afirmam que a lei dos crimes ambientais fere o princípio da legalidade, posto que o texto legal não prevê expressamente quais os crimes podem ser cometidos pela pessoas jurídicas, o fato é que, andou bem o legislador, vez que não raras as vezes as pessoas físicas se utilizam de todo o potencial da pessoa jurídica para cometerem crimes ambientais, sendo que esta goza de todas as vantagens de tais ilícitos, e a pessoa natural se esconde por de trás do ente social, na tentativa de escusar-se da aplicação da lei penal. Neste diapasão, infere-se, portanto, que a responsabilização do ente moral, não exclui a pessoa natural do pólo passivo, sendo que a recíproca também é verdadeira, uma vez que o Direito Brasileiro busca cada vez mais, criar e aplicar normas que visem coibir as ingerências praticadas contra o meio ambiente, sempre com um olhar de cautela, evitando-se o tangenciamento dos preceitos estabelecidos pelo Princípio de Intervenção Mínima buscado pelo Direito Penal. Outro aspecto combatido na Lei 9605/98, no que tange à responsabilização penal dos entes coletivos, refere-se à ausência de norma processual ou procedimento específico a respeito da matéria. Todavia, tem-se no artigo 27 do ordenamento em comento, que os delitos de menor potencial ofensivo serão regidos pela Lei 9099/95, inferindo-se, portanto, que apesar da lei ter-se mantido silente, deve-se aplicar, sem óbices, as regras do JECRIM (Juizado Especial Criminal) e o Código de Processo Penal. Ada Pellegrini Grinover, comungando desse entendimento, esclarece que a carência de dispositivos processuais próprios não impede a responsabilização penal das pessoas jurídicas, devido à integração que pode ser feita entre a Lei nº. 9605/98 e as normas existentes no ordenamento jurídico sobre a representação em juízo, competência, processo e procedimento, atos de comunicações processuais, interrogatório, entre outras, além das garantias processuais. O legislador dispôs expressamente no artigo 3º da Lei dos Crimes Ambientais, que: As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou no benefício da entidade. Assim, analisando o dispositivo colacionado acima, Luiz Regis Prado afirma que a legislação brasileira adotou o mecanismo francês denominado emprumt de criminalité, também denominado responsabilidade subsequente, por ricochete ou de empréstimo, para responsabilizar penalmente as pessoas jurídicas, de modo que, toda a infração imputada à uma pessoa jurídica será quase sempre também imputável a uma pessoa natural. Sendo que a responsabilidade do primeiro pressupõe a da segunda. Fato este que será discorrido no item 4.3.3, a respeito do entendimento firmado pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça, que em se tratando de crimes ambientais, há a necessidade de imputação simultânea da pessoa física e a jurídica, existindo uma relação de co-autoria necessária em relação aos sujeitos envolvidos em crimes praticados contra o meio ambiente. Alessandra Rapassi Mascarenhas leciona que o artigo 3º em comento segue o critério amplo em relação à responsabilidade penal da pessoa jurídica, vez que esta surge de uma decisão de seu representante ou de órgão colegiado, que pode ordenar ao empregado a fazer ou não fazer determinada coisa, por conseguinte, o ilícito pode ocorrer de uma ação ou omissão de qualquer preposto desde que tenha havido uma ordem neste sentido, ou uma ausência de fiscalização por parte do representante ou do órgão colegiado. Desse modo, oportuno a ressalva em relação a esta modalidade de responsabilização, em que as pessoas coletivas integrarão o pólo passivo do processo criminal somente se a infração tiver sido praticada no seu interesse ou de maneira a beneficiá-la. Assim, não seria razoável que o ente coletivo fosse penalizado por condutas praticadas por seus membros em benefício exclusivamente da pessoa natural, utilizando-se da entidade para praticar o ilícito. Contudo, tem-se que o ônus probatório de se demonstrar que a entidade não galgou dos benefícios do ilícito, cabe à pessoa jurídica, posto que existente uma presunção iuris tantum de que o delito ou fora praticado no interesse coletivo ou em seu beneficio, presumindo-se, desta maneira, a vantagem pela simples prática do crime ambiental. 4.2.2 - A Necessidade de Imputação Simultânea da Pessoa Física e da Pessoa Jurídica Com o advento da Lei 9.605/98, o instituto tornou-se o centro de inúmeras controvérsias que circundam a responsabilização penal das pessoas jurídicas, argumentos trazidos até então no presente estudo. Dispondo o artigo 3º da referida legislação que: Art. 3º As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade. (grifo do subscritor) Assim, para que o ente coletivo seja responsabilizado criminalmente, deverá se atentar ao fato de que, aplica-se somente o instituto, em caráter de exceção, aos crimes ambientais, consoante o princípio da intervenção mínima, o qual preceitua que o Direito Penal tutelará apenas bens jurídicos relevantes, os quais os diversos ramos do Direito não conseguiram guarnecê-los com eficiência, in casu, o Direito Civil e o Administrativo. Partindo do pressuposto da ultima ratio, observa-se o entendimento solidificado no âmbito do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, in litteris: EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA (ART. 168-A DO CÓDIGO PENAL). RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA. RESTRIÇÃO A CRIMES AMBIENTAIS. ADESÃO AO REFIS. DESCUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES. NECESSIDADE DE PAGAMENTO INTEGRAL DO DÉBITO. DATA DO PARCELAMENTO. APLICAÇÃO DA LEI Nº 9.964/2000. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. IMPOSSIBILIDADE. RETIRADA DA SOCIEDADE. IRRELEVÂNCIA. DOLO ESPECÍFICO. DIFICULDADE FINANCEIRA DA EMPRESA NÃO EVIDENCIADA. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA. TESE A SER ANALISADO APÓS A INSTRUÇÃO CRIMINAL. RECURSO IMPROVIDO. 1. A única previsão legal para a responsabilização criminal de pessoa jurídica ocorre nas hipóteses de crimes ambientais e, mesmo assim, desde que haja também imputação à pessoa física que por ela responde. 2. A adesão ao REFIS não implica, necessariamente, na extinção da punibilidade, que está condicionada ao pagamento integral do débito. Considerando que a inclusão no REFIS ocorreu em 28.04.00, quando já em vigor a Lei nº 9.964, publicada em 11.04.00, é esta a norma a ser aplicada, daí decorrendo a exigência de pagamento integral do débito para a extinção da punibilidade. 3. O fato de o paciente não mais integrar a sociedadeno momento do descumprimento das obrigações assumidas no REFIS não altera esse quadro, considerando que a punibilidade estava apenas suspensa, ficando sua extinção condicionada ao pagamento integral do débito, o que não ocorreu. 4. O tipo previsto no art. 168-A do Código Penal não se esgota somente no "deixar de recolher", isto significando que, além da existência do débito, deve ser analisada a intenção específica ou vontade deliberada de pretender algum benefício com a supressão ou redução do tributo, já que o agente "podia e devia" realizar o recolhimento. 5. Não se revela possível reconhecer a inexigibilidade de conduta se não ficou evidenciada a alegada crise financeira da empresa, cabendo ao magistrado de primeiro grau melhor examinar a matéria após a instrução processual. 6. Recurso improvido. (RHC20558/SP RECURSO ORDINARIO EM HABEAS CORPUS 2006/0266781-3 Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA (1131) T6 - SEXTA TURMA 24/11/2009.(grifo do subscritor) Todavia, para ocorrer a responsabilização criminal coletiva deverão estar presentes no caso concreto alguns requisitos necessários. Enumerando a necessidade da dupla imputação, isto é, pessoa física e jurídica são denunciadas como co-autoras do delito ambiental, em que pese ser a pessoa jurídica um ente autônomo com vontade própria, seus atos são exteriorizados por pessoa física. Frise-se, à colação da recente decisão também do Superior Tribunal de Justiça, em apreciação do Resp800817/SC 2005/0197009-0, julgado pela 6ª Turma, extraindo-se da lavra do Ministro Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ/SP), datada de 04/02/2010, in verbis: EMENTA: RECURSO ESPECIAL. CRIME CONTRA O MEIO AMBIENTE. OFERECIMENTO DA DENÚNCIA. LEGITIMIDADE PASSIVA. PESSOA JURÍDICA. RESPONSABILIZAÇÃO SIMULTÂNEA DO ENTE MORAL E DA PESSOA FÍSICA. POSSIBILIDADE. RECURSO PROVIDO. 1. Aceita-se a responsabilização penal da pessoa jurídica em crimes ambientais, sob a condição de que seja denunciada em coautoria com pessoa física, que tenha agido com elemento subjetivo próprio. (Precedentes) 2. Recurso provido para receber a denúncia, nos termos da Súmula nº 709, do STF: "Salvo quando nula a decisão de primeiro grau, o acórdão que provê o recurso contra a rejeição da denúncia vale, desde logo, pelo recebimento dela. (grifo do subscritor) No mesmo sentido: Conforme já pacificado neste tribunal, admite-se a RPPJ desde que haja a imputação simultânea do ente moral e da PF que atua em seu nome e benefício. (STJ, Quinta Turma, Habeas Corpus n° 93.867. Julgado em 8 de abril de 2008). (grifo nosso). Seguindo na mesma esteira do Tribunal Superior, os tribunais de segunda instância também se posicionaram pela necessidade de haver dupla imputação das pessoas jurídicas, in litteris, alguns trechos das mencionadas decisões: Indispensável, de início, fazer menção à chamada Teoria da Dupla Imputação, segundo a qual tanto a pessoa jurídica quanto a pessoa física que a comanda devem responder pelo crime ambiental causado. Se assim não o fosse, os verdadeiros agentes degradadores (por meio de ação direta ou indireta - a mando), se tornariam impunes com a persecução penal apenas de uma entidade fictícia, pois é cediço que a pessoa jurídica é uma ficção jurídica, dependendo de seus dirigentes para manifestação da vontade. E por isso que o legislador procurou cominar concomitantemente e de forma expressa a responsabilidade do dirigente frente aos abusos cometidos pela pessoa jurídica. (...) Assim, sempre que se tratar de responsabilidade criminal da pessoa jurídica haverá, também, responsabilização do administrador que emitiu o comando para a conduta (...)E não havendo imputação simultânea do administrador, pessoa física que, no exercício de sua qualidade ou atribuição conferida pelo Estatuto Social, teria praticado o fato delituoso, agiu com acerto a autoridade judiciária ao rejeitar a denúncia, máxime porque, como já assentado, trata- se de litisconsórcio passivo necessário. Ad argumentandum tantum, o simples fato do recorrido Jorge Luiz Censi Pimentel ter assinado o auto de intimação do departamento de fiscalização sanitária (fl. 21) não autoriza a instauração de processo criminal por crimes praticados no âmbito da sociedade, mormente quando não se estabeleceu qualquer liame entre o recorrido e a conduta apontada como ilícita, sob pena de se reconhecer a responsabilidade penal objetiva. Ademais, o próprio alvará sanitário traz como responsável pela administração do hotel a sócia administradora Carmen Gumz, a qual em depoimento à polícia judiciária relatou que o recorrido Jorge Luiz Censi Pimentel cuida dos assuntos burocráticos do estabelecimento. (...) Por fim, não é demais lembrar a impossibilidade do recebimento da denúncia somente contra o Hotel, sob pena de tornar letra morta a Teoria da Dupla Imputação, instituto que já mereceu a devida análise no corpo deste acórdão. (TJSC, Segunda Câmara Criminal, Recurso Criminal n° 2008.018939-3. Julgado em 17 de junho de 2008.) O legislador infraconstitucional exige mais para a responsabilidade penal da pessoa jurídica. Adotou o sistema da dupla imputação. Significa dizer, pressupõe a co-autoria necessária entre a pessoa jurídica (coletividade) e a pessoa física (agente individual), de conformidade com o disposto no pr. ún. do art. 3, Lei 9.605/98. (..) A previsão de co-autoria necessária entre a pessoa jurídica e a pessoa física se irradia desde a transação penal a exigir desde logo a individualização de todos os autores do delito sob pena de invalidar o ato. (TRF1, Terceira Turma, Apelação Criminal n° 2005.41.00.001246-1. Julgado em 8 de junho de 2009) O dispositivo supracitado deixa mais claro a adoção do sistema de dupla imputação, distinguindo-se as pessoas jurídicas dos seus membros. E, conforme já pacificado no Colendo Superior Tribunal de Justiça, admite- se a RESPONSABILIDADE PENAL da PESSOA JURÍDICA desde que haja imputação simultânea do ente moral e da pessoa física que age em seu nome e em seu proveito, o que ocorreu no presente caso. (TJMG, Quinta Câmara Criminal, Apelação Criminal n° 1.0223.06.202025- 8/001(1). Julgado em 30 de junho de 2009) Conclui-se, portanto, que apesar de entendimentos divergentes, os tribunais pátrios, de maneira bastante esclarecedora, buscaram aplicar, de modo efetivo, as sanções penais compatíveis às pessoas jurídicas. 4.3 - Sanções Aplicáveis à Pessoa Jurídica A Lei dos crimes ambientais trata-se de uma legislação de natureza mista, vez que trouxe em seu bojo sanções de natureza administrativa, civil e penal para condutas e atividades lesivas ao meio ambiente. Art. 3º As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade. (grifo do subscritor). Parágrafo único. A responsabilidade das pessoas jurídicas não exclui a das pessoas físicas, autoras, co-autoras ou partícipes do mesmo fato. Assim, o parágrafo único do dispositivo supra, ressaltou que quando envolvidas no mesmo fato lesivo, a responsabilidade da pessoa jurídica exclui a responsabilidade da pessoa natural, pois elas são cumulativas, seja como co-autoras ou partícipes. Extrai-se, ainda, do artigo 3º, in fine, a enumeração taxativa de quais são as possibilidades concretas para se responsabilizar criminalmente a pessoa jurídica. Sendo: decisão do representante legal; decisão contratual; decisão do órgão colegiado; desde que a pessoa jurídica tenha recebido alguma vantagem com prática criminosa, seja no interesse ou benefício de sua entidade. As normas gerais para aplicação das sansões às pessoas jurídicas, encontram-se estabelecidas no Capítulo II, nos artigos 6 usque 24, da Lei nº. 9.605/98. Por sua vez, o artigo 21 da Lei dos crimes ambientais, traz as modalidades de penas que poderão ser impostas às pessoas jurídicas: “ As penas aplicáveis isolada, cumulativa ou alternativamente às pessoas jurídicas,de acordo com o disposto no art. 3º, são: I - multa; II - restritivas de direitos; III - prestação de serviços à comunidade.” Todavia, em observância à característica sui generis dos entes morais, o artigo 22 da lei dos crimes ambientais, enumera quais são as penas restritivas de direito passíveis de serem impostas às pessoas jurídicas: Art. 22. As penas restritivas de direitos da pessoa jurídica são: I - suspensão parcial ou total de atividades; II - interdição temporária de estabelecimento, obra ou atividade; III - proibição de contratar com o Poder Público, bem como dele obter subsídios, subvenções ou doações. O parágrafo 1º, inciso I, do artigo 22, dispõe que “A suspensão de atividades será aplicada quando estas não estiverem obedecendo às disposições legais ou regulamentares, relativas à proteção do meio ambiente”. Interpretando esse parágrafo, Luiz Paulo Sirvinskas afirma que essa desobediência se refere às disposições legais ou aos regulamentos e pode ser cometida por pessoa jurídica, sendo que para as pessoas físicas, a desobediência se refere às prescrições legais, ou seja à leis. Ainda, de acordo o referido autor, a suspensão parcial ou total da atividade mencionada no inciso I, também está prevista como sanção administrativa, conforme se verifica no artigo 72, inciso XI, da referida lei. Trata-se de uma medida drástica e somente poderá ser aplicada mediante determinação judicial, devendo o juiz fixar o período de dias em que a empresa ficará paralisada. O parágrafo segundo do artigo em comento, traz que “ A interdição será aplicada quando o estabelecimento, obra ou atividade estiver funcionando sem a devida autorização, ou em desacordo com a concedida, ou com violação de disposição legal ou regulamentar”. Dessume-se, todavia, que essa modalidade de interdição deverá ser sempre temporária, uma vez que a qualquer tempo pode regularizá-la e retomar as atividades, ao contrário da suspensão que poderá ser ou não definitiva. Assim, se a pessoa jurídica regularizar sua situação junto aos órgãos competentes, mesmo que por meio de títulos precários decorrente do ato administrativo, poderá retomar o desenvolvimento da atividade que por ventura estaria paralisada, em razão da falta de alguns requisitos necessários ao normal desempenho da atividade empresarial. Por derradeiro, o parágrafo terceiro estabelece que “A proibição de contratar com o Poder Público e dele obter subsídios, subvenções ou doações não poderá exceder o prazo de dez anos.” Verifica-se, portanto, que o legislador buscou, por questões óbvias, coibir que entidades envolvidas em delitos, in casu, ambientais, pudessem constituir um liame obrigacional com o Poder Público, e assim, de alguma maneira auferir recursos do erário. Consistindo a citada proibição em uma maneira de afastar qualquer possibilidade de os Entes Públicos, por um período de até 10 anos, não manterem nenhum vínculo obrigacional, tampouco de fomento com as entidades criminosas. Por sua vez, a prestação de serviço à comunidade, na forma do artigo 23, da legislação em estudo, poderá consistir em: Art. 23. A prestação de serviços à comunidade pela pessoa jurídica consistirá em: I - custeio de programas e de projetos ambientais; II - execução de obras de recuperação de áreas degradadas; III - manutenção de espaços públicos; IV - contribuições a entidades ambientais ou culturais públicas. Em análise, verifica-se que as penas de prestação de serviço à comunidade, destinadas aos entes coletivos, não guardam entre si, finalidade com o corolário do Princípio da Prevenção que norteia o Direito Ambiental, vez que não impõe uma atuação preventiva, apta a evitar possíveis lesões face ao meio ambiente. Entretanto, excepcionando a assertiva supra, o inciso I, do artigo 23, da Lei nº. 9605/98, estabelece que a pessoa jurídica causadora de crimes ambientais, deverá obrigar-se a custear programas e projetos ambientais. Neste prisma, a sanção servirá, de maneira mediata, para resguardar o objeto jurídico tutelado, posto que o fomento de mecanismos educacionais poderá evitar danos ambientais futuros, que muitas vezes lesionam o meio ambiente de maneira tão potencial, que impossibilitam a restauração do status quo ante. Quanto às outras modalidades de prestação de serviço a comunidade aplicadas às pessoas jurídicas julgadas culpadas pela prática de crimes ambientais, estas não se vinculam à atividade-fim da empresa, sendo prestadas em outros setores, tornando-se inócuo o caráter educativo ambiental. Depreende-se, assim, que a condenação deveria, sempre ser voltada para projetos que pudessem levar à população os conhecimentos sobre os riscos e perigos decorrentes da atividade da empresa e, ao mesmo tempo, ensinar métodos adequados para diminuí-las. No artigo 24 do citado ordenamento, há a inserção do instituto da despersonalização da pessoa jurídica, já existente há tempos na seara civilista, sendo transplantada na órbita penal.Prevendo a possibilidade de liquidação forçada do patrimônio da pessoa jurídica constituída ou utilizada com o fim de permitir, facilitar ou ocultar a prática de crimes ambientais. Até então, a norma se mostra adequada, contudo, na parte final do artigo em comento, fica evidente determinada incongruência com os ditames ambientais estabelecidos, vez que, o patrimônio será perdido em favor do Fundo Penitenciário Nacional, órgão este que nada tem a ver com a matéria. Não há que se olvidar a necessidade de angariar recursos para proporcionar uma melhoria no sistema penitenciário, que, aliás, mostra-se decadente. Todavia, a questão ambiental merece preferência, vez que a conduta fora dirigida a lesionar o próprio meio ambiente. Logo, pelo exposto, extrai-se que aos aplicadores do direito cabe a efetiva execução do disposto na Lei dos Crimes Ambientais (Lei nº. 9605/98), a fim de reforçar a proteção ao meio ambiente contra o seu principal devastador, qual seja, a pessoa jurídica. CONSIDERAÇÕES FINAIS Ante ao que foi exposto no presente trabalho podem ser extraídas algumas considerações: No que se refere às pessoas jurídicas em si, verificou-se que não é somente ao homem, enquanto pessoa natural, que o ordenamento jurídico confere capacidade para ser sujeito de direito e deveres. O direito atribui personalidade jurídica também a tais entes, tornando-os sujeitos capazes de contrair esses direitos e deveres quase da mesma maneira do que ocorre com as pessoas naturais, observadas as suas peculiaridades. Com efeito, pelo fato de grande parte dos doutrinadores ter adotado a teoria da realidade técnica para as pessoas jurídicas, entende que elas tenham existência real, distinta da dos seus membros. Uma vez personificada, o direito lhes consagra autonomia jurídica, tornando-as entidades inteiramente distintas das pessoas físicas que as compõem. Em suma, as pessoas jurídicas têm capacidade para exercer todos os direitos subjetivos que forem compatíveis com sua natureza peculiar, necessitando para tanto, de um órgão exteriorizador de sua vontade, qual seja o ser humano. No que tange à responsabilidade penal das pessoas jurídicas no contexto global, observou-se que os países que predominantemente adotam tal instituto são, em sua maioria, aqueles pertencentes ao sistema da common law, muito embora, alguns países pertencentes ao sistema da civil Law, também, têm-se revelado simpatizantes do instituto em epígrafe. Da análise dos elementos do crime da pessoa jurídica, chegou-se ao entendimento de que as mesmas possuem vontade própria, independentemente da vontade das pessoas naturais que as compõem, sendo capaz, como estas de realizar sob o aspecto do direito penal, idênticos atos, ilícitos ou não, por meio de seus órgãos, cujas ações ou omissões são consideradas como condutas praticadas pela própria pessoa jurídica. Acerca das questões que geram maior polêmica no que se refere à aplicabilidade do instituto, constatou-se que as pessoas jurídicas possuem capacidade de ação, cuja vontade é institucionalizada, sendo manifestada através de seus
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